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terça-feira, 26 de maio de 2009

1120) AInda a questao das cotas raciais e sociais: uma liminar na Justica

O debate em torno da questao, na verdade, comeca viciado e deformado, tanto da parte do deputado que se pronuciou contra o regime de cotas estaduais, como da parte do juiz que pretendia estabelecer a igualdade formal atraves da lei.
Acreito que ainda teremos muita confusao e equivocos em torno desta questao.
A seguir
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Paulo Roberto de Almeida

20:09 | Brasil
TJ-RJ suspende cotas em universidades públicas
25 de Maio de 2009
Por Fabiana Cimieri e Talita Figueiredo

Rio de Janeiro - O Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro concedeu hoje à tarde uma liminar que suspende os efeitos da lei estadual que estabeleceu cotas em universidades públicas estaduais. A ação contra as cotas para negros e estudantes de escolas públicas foi proposta pelo deputado estadual Flávio Bolsonaro (PP), que entrou na Justiça com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN). O deputado, que também é advogado, defendeu a ação no plenário do Órgão Especial.

Para ele, a lei é demagógica, discriminatória e não atinge seus objetivos. "O preconceito existe, não tem como negar, mas a lei provoca um acirramento da discriminação na sociedade. Até quando o critério cor da pele vai continuar prevalecendo? A ditadura do politicamente correto impede que o Legislativo discuta a questão", disse ele, durante sua defesa. A lei estadual tem o objetivo de garantir vagas a negros, indígenas, alunos da rede pública de ensino, pessoas portadoras de deficiência, filhos de policiais civis e militares, bombeiros militares e inspetores de segurança e administração penitenciária, mortos ou incapacitados em razão do serviço.

O relator do processo, desembargador Sérgio Cavalieri Filho, votou contra a liminar por achar que a política "de ação afirmativa tem por finalidade a igualdade formal e material". O Órgão Especial, no entanto, decidiu por maioria dos votos conceder a liminar, suspendendo os efeitos da lei. A decisão definitiva sobre o assunto ainda será analisada pelo Órgão Especial. A Uerj, a primeira instituição a adotar o regime de cotas, informou por meio de sua assessoria de imprensa que deverá se pronunciar amanhã sobre o tema.

3 comentários:

Gláucia disse...

Achei engraçado que nenhum jornalista perdeu tempo com a argumentação dos Desembargadores, preferindo apresentar como oficial a versão de um político histriônico...

De qualquer forma, é um debate que, como diz o Ministro da Educação, tem que acontecer. Acho que o Supremo - este Supremo - manterá. Há mais negros e mulheres no Supremo do que em todo o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, e possivelmente, do Rio também.

E aqui entre nós, Professor, mantenho que, se no Brasil atingirmos o que ocorreu nos EUA - a criação de uma classe alta negra, com o conseqüente aumento da disparidade de renda entre os integrantes desse grupo social - me darei por satisfeita.

Daí vem o sujeito dizer que as quotas não resolveram o problema da desigualdade nos EUA. Poderia acrescentar que não resolveram o problema dos déficits comerciais da potência do Norte, nem o da dependência de energia suja que existe naquele país, nem nenhum dos problemas que elas não se prestam a resolver.

O objetivo, pra mim, é claro: quero que meus filhos estudem com crianças negras, que nos clubes nem todos os negros estejam para servir, que numa diretoria de banco ou numa embaixada do Brasil, em 40 anos, não seja uma surpresa encontrar um negro. Não vejo outra maneira de fazer isso - em 40 anos, não em 400 - que não integrando os melhores dentre os negros nos espaços onde estão os melhores dentre os brancos.

Não é nada bonito, claro, dividir as pessoas em categorias. Até por isso, não há planos de incluir o quesito "raça" no RG de ninguém. Os critérios podem variar, o que traz o inconveniente da revista Veja salivando por uma história triste ou absurdo evidente em algum recanto entre Oiapoque e Chuí. Mas, num Brasil de Rio Grande do Sul, Bahia e Rondônia, não tem - felizmente - outra maneira.

Se as universidades financiadas com trabalho coletivo (com dinheiro público) não puderem ser flexíveis para fazer valer políticas de Estado, sociologicamente justificáveis - ainda que politicamente possamos ser contrários a elas -, então é porque o patrimonialismo está de tal modo entrincheirado nas nossas almas que realmente acreditamos que uma vaga na USP é um direito do aluno com o tal "mérito".

Pra mim, é o oposto: o vestibular existe porque a universidade pública, para melhor cumprir sua função, tem que selecionar alunos, e tem que selecioná-los da forma considerada mais útil para o coletivo, para quem paga a conta. A universidade gratuita é uma forma de o Estado financiar o desenvolvimento do país, e não o enriquecimento dos alunos - o que não quer dizer que eles não possam ou não devam se enriquecer com o conhecimento e o status adquirido.

Por isso, assim como um dia esse Estado - por suas várias manifestações - decidiu que os alunos desejados não eram aqueles capazes de decorar datas e sim aqueles capazes de fazer associações lógicas, esse mesmo Estado - por suas várias manifestações, como provam políticas inclusivas adotadas nas autônomas USP, UNESP e UNICAMP - caminha no sentido de que é positivo para a sociedade brasileira (o contribuinte, aquele que paga a conta) que haja maior "representatividade fenotípica", por assim dizer, entre os alunos.

Opor a isso um pretenso direito do aluno à sua vaga é função direta daquele pensamento que tão bem conhecemos: cargos e verbas públicas são propriedade dos homens bons, e não investimentos feitos pela sociedade para serem alocados da forma mais proveitosa para essa sociedade.

Paulo Roberto de Almeida disse...

Confesso que não entendi o quê, exatamente, essa minha correspondente assíduam Gláucia, pretende discutir em seu longo comentário cheio de afirmações ambíguas e frases relativamente obscuras. Não logro perceber o seu argumento principal.
Retomo o argumento principal: o sistema de cotas, ou de reserva de vagas, utilizado por universidades do Rio de Janeiro em função de uma lei estadual que pretende valorizar as minorias raciais (negra e indígena, suponho, embora os "amarelos", ou asiáticos, também devessem ser considerados uma minoria, para dizer o mínimo). Aliás, em certos municípios, brancos também poderiam ser assimilados a minorias, comparativamente, por exemplo, aos mulatos ou mestiços, que aparentemente são assimilados a afro-descendentes e, portanto, potenciais beneficiários dessa política de cotas ou reservas.
O Tribunal de Justiça aceitou o argumento de um confuso advogado, aliás deputado, e cassou o sistema de cotas, e agora o estado procura reverter a situação, tentando cassar ou modificar essa decisão de justiça.
A Glaucia diz que deveriamos fazer no Brasil algo semelhante ao que foi feito nos EUA: criar "uma classe alta negra", o que revela um curioso pensamento classista, ou pelo menos voluntarista no plano das relações sociais.
Sempre entendi que não cabe ao Estado, ou ao país criar qualquer classe e sim tratar todos os cidadãos em pé de igualdade. Entendo também que a criação de uma classe alta negra nos EUA -- seja lá o que isso queira dizer -- foi resultado do próprio trabalho dos envolvidos, sua educação, sua poupança, seu desempenho, enfim. Se ela pretende dizer que essa classe alta negra foi criada por políticas de ação afirmativa, resta a ser provado, mas tenho dúvidas.
Ela também diz que quer ver seus filhos estudarem ao lado de crianças negras, o que indica que ela pretende fazer negros se inscreverem nas escolas onde estão os seus filhos. Pode ser que o impedimento seja apenas uma questão de renda, não de discriminação.
Em todo caso, esse ativismo pró-negros pode revelar apenas condescendência ou paternalismo, pois o ideal em qualquer Estado democrático seria que todos fossem tratados de forma absolutamente igualitária.
O mais curioso é que ele pretende apenas integrar os melhores dentre os negros, o que revela um curioso espírito de seleção darwiniana -- no conceito errado e equivocado do que seja darwinismo -- que pode ser profundamente iníquo com os excluídos: por que apenas os melhores, se todos são negros e supostamente discriminados?
Sinto muito, mas seu pensamento é muito confuso e não expressa claramente o que pretende, ou propõe.
Da próxima vez seja mais clara: defenda abertamente o sistema de cotas ou proponha a solução que lhe pareça mais apropriada.
Eu tenho a minha solução: investimentos maciços em educação pública, com bolsas e subsídios para todos aqueles que não dispõem de recursos para custear estudos. mas cobrança pelo mérito, pois transferências unilaterais sem busca de resultados não é política de ação afirmativa e sim esmola ou assistência caridosa...

Unknown disse...

Concordo com o exposto por Paulo R. de Almeida...
Se o baixo índice de alunos negros e pardos, seja no ensino superior ou onde quer que seja é decorrente da cor da pele, é razoável que se implante o sistema de cotas raciais. Por outro lado, se o baixo índice de alunos negros ou afrodescendentes se dá em razão de eles serem egressos de escolas públicas e em decorrencia de sua situação financeira, então que se criem medidas para a melhoria do ensino público ou que sejam criadas cotas sociais, pois, ao menos assim, os que não tiveram oportunidade de estudo, em decorrência de sua situação financeira, terão as mesmas oportunidades. Medidas plausíveis seriam, por exemplo, construir escolas públicas de qualidade em periferias das grandes metrópoles.
A partir dessa perspectiva é que se começa a compreender o caráter demagógico que se esconde por trás dessas políticas: muito mais fácil ceder cotas que investir em escolas públicas de qualidade, as quais demandam enormes custos materiais ao Estado. Muito mais prático apoiar as cotas, e muito mais barato, porquanto custam absolutamente nada para o Estado. Se o objetivo das políticas raciais é melhorar as condições sociais dos afrodescendentes, isso se revela um tanto inócuo, em face da constatação de que irão preencher as vagas os negros mais bem preparados e de melhor nível econômico, os quais não precisam das cotas. As políticas raciais podem até possuir um valor simbólico, no sentido de se discutir o problema da discriminação racial no país. Isso até é bom. Mas o fato é que políticas como essas encontram mais respaldo e resultados significativos em países onde efetivamente o racismo teve e tem uma participação para a produção de desigualdade de oportunidades, como assim ocorre nos Estados Unidos e na África do Sul.
No campo dos objetivos traçados pela Constituição do Brasil, no art. 3º, consta o reconhecimento pelo poder constituinte da existência de pobreza e marginalização, mazelas que o Estado se prontificou a combater. Ora, o apartheid existente no Brasil é reconhecidamente social – e não racial como querem alguns –, ao ponto de a Carta Magna elencar tal fato entre suas normas pragmáticas. Infelizmente, agora, alguns setores mais radicais, defensores de determinado segmento populacional querem oficializar o racismo como política de Estado, apontando a cor da pele como principal fator das dificuldades encontradas por pessoas negras e pardas para o ingresso em setores da vida pública. Como é notório, as políticas raciais carecem de um fundamento sólido ao estabelecer diferenciação jurídica sem um fundamento razoável. Nada contra políticas afirmativas, pois essas são legítimas. O critério apontado como legitimado a sofrer um tratamento especial por parte do Estado é que está em flagrante descompasso para com as normas, princípios, objetivos e fundamentos traçados pela Constituição da República, estando, pois, carentes de constitucionalidade.
Percebe-se, ademais, que o sistema de cotas foi criado com a finalidade de repensar e rediscutir o sistema de vestibular que beneficia os alunos egressos de escolas particulares, sem que se atente para a seguinte pergunta: por acaso não há negros, pardos e afrodescendentes em escolas particulares? E nas escolas públicas não existem brancos? A resposta todos já sabemos. Evidente, portanto, que o argumento de aprofundamento da cidadania certamente não ocorre, pois tal sistema apenas beneficia uma classe media afrodescendente, mas não quem realmente a norma em debate pretende beneficiar.
Considerando-se inconstitucional todo ato normativo que contraria a Constituição, conclui-se que as leis que criam o sistema de cotas raciais são inconstitucionais, já que ferem o principio constitucional da igualdade. E assim é porque o sistema de cotas beneficia um grupo seleto de pessoas que não são discriminadas em razão da cor da pele, mas sim em razão de sua condição financeira, em detrimento de outras (os albinos, por exemplo) que não terão o mesmo beneficio, e que são igualmente desigualadas em razão de sua condição financeira.