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domingo, 13 de junho de 2010

Brasil e China: duas economias comparadas - Revista Veja

Por que o Brasil não pode ser como a China?
A resposta salta aos olhos: poupamos pouco, o governo "despoupa" muito, nossa produtividade cresce (se crescer) mediocremente...

O Brasil não pode (ainda) crescer em ritmo chinês
Giuliano Guandalini e Marcelo Sakate
Revista VEJA, 16 de junh de 2010

Na Ásia, o PIB crescer 11% é ótima notícia. No Brasil, 9% é sinal de alerta de superaquecimento da economia

VEJA TAMBÉM
• Quadro: As diferenças entre as economias do Brasil e da China (abaixo)

Os números divulgados na semana passada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) confirmaram que o Brasil experimenta os seus dias de China. O total de mercadorias e serviços produzidos pelo país (o produto interno bruto, PIB) cresceu 9% no primeiro trimestre em relação ao mesmo período de 2009, o maior valor para a série histórica iniciada em 1995. Entre as economias mais relevantes do planeta, apenas a China obteve resultado superior. Lá, ninguém celebrou nem franziu a testa. Aqui, houve comemoração. "Vivemos um momento de ouro no país. É um crescimento exuberante. Acho que o Brasil merecia e precisava disso", festejou o presidente Lula. Mas também preocupação. Falou-se em superaquecimento da economia e em crescimento não sustentável. O que esses termos significam?

Os ponteiros ao lado apontam para os números que explicam as limitações da economia brasileira. Imagine que os indicadores são os painéis de dois carros de competição, um chinês e um brasileiro. Se tomarmos os carros pelas economias dos dois países, assim que elas se aproximarem de um crescimento anual de dois dígitos, um ritmo bastante veloz, os pilotos condutores das políticas econômicas vão bater os olhos nos ponteiros e tirar suas conclusões. Vão bater os olhos primeiro no ponteiro que mede a inflação. O chinês vai ficar tranquilo - 3,1% de inflação não assusta. O brasileiro vai se inquietar ao ver a marca de 5,2% no acumulado até maio deste ano. A reação do chinês será pisar no acelerador. A do brasileiro vai ser oposta, e ele tentará reduzir o número de rotações por minuto do motor, desacelerando, portanto, a atividade econômica.

Quando os dois bólidos metafóricos forem para os boxes, os engenheiros e projetistas terão informações capazes de explicar por que o da China não apresentou problemas e o do Brasil se superaqueceu quando acelerou. Eles olharão os números dos ponteiros que medem a taxa de poupança e a taxa de investimento. A China poupa 54,3% de toda a riqueza nacional que produz e investe outros 44,4% dela. O Brasil poupa menos de 20% do seu PIB e investe também alguma coisa em torno disso. Quanto mais um país poupa, mais ele investe e mais rapidamente pode crescer sem inflação. Segundo cálculo do economista Octavio de Barros, diretor de Pesquisas Macroeconômicas do Bradesco, a taxa de investimento deveria subir a 22% do PIB para que o Brasil pudesse avançar 5% ao ano sem inflação. Conclui ele: "Como o crescimento estimado neste ano para o Brasil é de 7,7%, fica claro que estamos acelerando demais".

Um exemplo ajuda a entender a razão disso no nível da microeconomia. Digamos que uma determinada fábrica decide duplicar sua produção mas não tem poupança para investir em máquinas e tecnologia. Essa fábrica vai ser obrigada a comprar o dobro de matéria-prima, dobrar o número de empregados - ou duplicar as horas trabalhadas, pagando horas extras - e pôr as máquinas para produzir no dobro da velocidade. O resultado disso é mais produção? Sim. Mas ela é sustentável? Não, porque logo os fornecedores vão cobrar mais pela matéria-prima, já que a demanda aumentou; os empregados vão exigir aumento de salário; e, com o ritmo acelerado, as máquinas vão quebrar mais frequentemente e se desgastar precocemente. O exemplo vale para o nível macroeconômico - ou seja, a economia de um país. Os mesmos fenômenos que inviabilizariam a tentativa da fábrica que resolveu duplicar sua produção atuariam para tornar insustentável o esforço de um país que crescesse em ritmo incompatível com suas taxas de poupança e investimento.

Essa constatação leva os olhos dos engenheiros e projetistas para outro ponteiro - o que mede a produtividade. O da China marca 4%. O do Brasil mal saiu do zero - está em 0,3%. O aumento de produtividade significa fazer mais com menos insumos. Sem produtividade, não existe crescimento real - outro nome para crescimento sustentável. A produtividade de um país não aumenta sem poupança e investimento em educação e tecnologia. E por que o Brasil não investe mais? Por diversas razões. A mais ponderável é a "despoupança" do governo. Despoupar significa gastar mais do que se arrecada. Enquanto Brasília despoupar e Pequim poupar, os chineses vão nos ver pelo retrovisor.

Quadro: As diferenças entre as economias do Brasil e da China

5 comentários:

Fabricio de Souza disse...

Fazendo uma alusão única e excluvisa à matéria escrita sobre a China, acredito que, pelo menos esses dez chineses, não irão nos ver pelo retrovisor:

http://www.estadao.com.br/noticias/geral,mais-um-funcionario-de-fabricante-chines-de-iphone-se-suicida,557476,0.htm

Rodrigo L. disse...

Não tenho muitas informações para argumentar sobre a economia Chinesa, mas algo me diz que se não vivessem num regime autoritário, muitas das condições que permitem o crescimento deste país não seriam possíveis... mas falando de Brasil, acredito que os gastos superiores a arrecadação não são o único ou o principal fator que contribuem para este cenário, acho que o hábito (inexistente) de poupar do Brasileiro provavelmente é mais responsável por isso do que os gastos do governo.

Agora mudando o foco deste comentário rapidamente, gostaria de comparar uma opinião pessoal com a de outros frequentadores deste blog: A Veja é realmente a revista de grande circulação mais ridiculamente parcial, tendenciosa e comprometida com interesses particulares que existe no Brasil ou é apenas impressão minha?

Paulo Roberto de Almeida disse...

Rodrigo,
A China é uma economia que caminhou rapidamente para o capitalismo selvagem, depois de decadas de socialismo irracional. Como também é um Estado perfeitamente orwelliano, certas coisas que acontecem por la, nao sao possiveis no Brasil. Nao existe seguranca no trabalho, por exemplo, nem seguro desemprego, nem direitos sociais tao extensos quanto no Brasil (previdencia e assistencia, entre outros), o governo pode manipular a economia muito mais facilmente.
A China faz um esforço enorme de educação, mas as familias tem de pagar pela universidade e até por escolas privadas de melhor qualidade.

Esqueça a Veja: se trata de uma revista de informação oportunista, que atende a essa imensa faixa da classe média mal informada. Pessoas como você, sabem separar informação padronizada de outras fontes de melhor qualidade.
Paulo Roberto de Almeida

Sabine disse...

Se me permitem entrar na conversa, não acho que a Veja ganhe o título de A mais parcial. A Carta Capital também é descaradamente parcial. Mais descarada que a Veja, acho, já que essa última me parece dominar melhor a arte da maquiagem do viés (e não estou dizendo isso como um elogio). Aliás, Rodrigo ou PRA ou quem mais se habilite a opinar, alguma dessas revistas brasileras semanais de grande circulação consegue ser imparcial? Algum veículo da mídia brasileira (jornais, TV aberta, TV a cabo, rádio)? Essa não é uma pergunta retórica, eu realmente gostaria de saber opiniões (o professor PRA até já falou um pouco a esse respeito em outro comentário que fiz sobre Veja e Carta Capital).

Paulo Roberto de Almeida disse...

Sabine,
Sao duas realidades, e duas revistas completamente diferentes. A Veja se interesse no contexto de uma enorme corporacao capitalista de comunicações e de informações, que defende declaradamente a economia de mercado e os valores capitalistas. Seria estranho se nao o fizesse, pois se trata de uma corporacao familiar com interesses concretos no mundo dos negócios e com intençao de crescer em diferentes vertentes da midia e até fora dela.
A Veja pode até defender posições do governo, mas apenas quando isso também corresponder ao seu interesse empresarial. No geral, ela tem de responder a seus anunciantes, a seu público, aos seus jornalistas, ou seja, é o resultado do consenso possível numa sociedade relativamente aberta e democrática.
A Carta Capital é um empreendimento de pessoas comprometidas com certas ideias, que sabemos quais sao. Você nunca encontrará NADA contra o governo (pois é este quem sustenta o empreendimento desses esquerdistas sem dinheiro) e NUNCA contra Cuba, pois eles se identificam com o regime, por mais crimes que este possa cometer.
Eles se chamam Carta Capital, mas se poderia chamar CONTRA O CAPITAL, embora saibam que nao podem viver sem ele (mas vão buscá-los nas empresas estatais e diretamente no governo). É o que eu chamo de jornalismo de má fé, de impostura e de mentiras, mas que encontra grande espaço para se desenvolver no Brasil, pois mais da metade da academia "pensa" (bem, o verbo não se aplica exatamente) como eles.
Paulo Roberto de Almeida