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quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Importando cerebros (no Brasil parece que é proibido...)

O pior nacionalismo que possa haver é o nacionalismo educacional. É o mais burro, dito simplesmente.
O Brasil se desenvolveu importando gente, pensando importar braços apenas. Os imigrantes foram pensados como substitutos dos escravos nas fazendas de café, e minha avó italiana veio para o Brasil exatamente para isso mesmo.
Só que com os braços vem os cérebros, pois gente empreendedora costuma trazer o cérebro junto quando vem trabalhar: só os muito servis, deixam o cérebro em casa e se entregam totalmente ao patrão, como ainda acontece em certos serviços muito subservientes...
Pois bem, depois o Brasil achou que já tinha sido generoso demais e fechou as portas à imigração, numa das políticas mais estúpidas de que se tem notícia em nossa história.
A Constituição de 1988 acrescentou mais um grão (ou uma tonelada) à estupidez ambiente, proibindo a contratação de professores estrangeiros pelas universidades brasileiras.
Poucas vezes em nossa história, a estupidez de alguns se manifestou de maneira tão primária como nessa ocasião. Depois, felizmente, se corrigiu parcialmente essa anomalia duplicada com burrice, ao se suspender essa cláusula constitucional, mas o preconceito contra a inteligência estrangeira persiste em vários campos da vida nacional, em primeiro lugar no próprio governo.
Quando vejo, ou ouço, representantes do MEC, de outros setores do governo, ou, em geral, professores do terceiro ciclo dizendo que são contra a abertura da educação nacional no quadro da liberalização dos serviços no GATT-OMC, por que isso "faria com que nossas universidades fossem compradas por investidores estrangeiros", eu me pergunto o que é que pode fazer pessoas universitárias, medianamente alfabetizadas, portanto, serem tão estúpidas a esse ponto, de professarem explicitamente nacionalismo educacional, de se opoerem à internacionalização da educação brasileira, em nome de não se sabe bem qual nacionalismo pedagógico que faria com os os cérebros nacionais fossem inevitavelmente superiores aos estrangeiros?
Como é que as pessoas não se dão conta de que estaríamos muito melhor se, em lugar dessas Faculdades Tabajara de Cabrobó da Serra, nós pudessemos ter pelo menos cópia de Harvard, de Yale, de Princeton.
Claro, não conto com essas universidades da primeira linha vindo inteiras para o Brasil (ainda que todas elas tenham programas de cooperação e de intercâmbio com vários países ao redor do mundo, os menos estúpidos, digamos assim), mas mesmo uma universidade ou faculdade de segunda ou terceira linha, nos EUA, puramente comercial, viria, supostamente, para introduzir padrões mais elevados de educação, e talvez a custos mais razoáveis. Seria, é óbvio, do interesse desses investidores, do contrário eles não viriam, pois ninguém investe para perder dinheiro, e só se ganha dinheiro se você consegue oferecer um produto de melhor qualidade a menor custo.
Sim, a despeito do que possam dizer esses professores obtusos, educação é uma mercadoria, sim, uma das mais sofisticadas, e não só pode, como deve, ser objeto de comércio, isto é, de concorrência, de abertura de mercados, de total liberdade de intercâmbio, para que os melhores possam prosperar, vencer, ficar ricos.
Por isso, considero que o setor no Brasil -- que aliás não está fechado ao capital estrangeiro; ele só não vem porque o Brasil é um país muito complicado para negócios de maneira geral, para negócios que dependam do governo, em particular -- deveria estar mais aberto aos talentos estrangeiros.
Essa característica fez a fortaleza americano ao longo do tempo. É isso que devemos perseguir...
Paulo Roberto de Almeida

Internacional
A grande disputa por cérebros
Ben Wildavsky *
THE WASHINGTON POST, 06/08/2010

A transmissão do conhecimento constitui um novo tipo de livre comércio, o de mentes, e o protecionismo não é positivo

Por décadas, as universidades de pesquisa nos EUA foram as líderes mundiais no campo das ciências e da engenharia, imbatíveis desde a 2.ª Guerra pelo volume e excelência do conhecimento e inovação que criavam. Mas há sinais cada vez mais nítidos de que o restante do mundo vem conquistando terreno muito rápido, criando novas universidades, melhorando as existentes, competindo energicamente pelos melhores alunos e recrutando PHDs nos EUA, convencendo- os a retornar ao país para trabalhar em laboratórios das universidades e da indústria.
A ordem hierárquica no campo acadêmico está em vias de se inverter? Quase 3 milhões de jovens estudam fora do seu país natal - um aumento de 57% na última década. Os estudantes estrangeiros predominam em muitos cursos de doutorado nos EUA, representando 64% dos PHDs em ciência da computação, por exemplo. As universidades de Pequim e Tsinghua juntas ultrapassaram Berkeley com o maior número de alunos em doutorado nos EUA.
Metade dos melhores físicos do mundo não trabalham mais em seus países de origem. E grandes instituições, como as universidades de Nova York e de Nottingham, estão criando filiais no Oriente Médio e na Ásia. Existem hoje 162 campus satélites em todo o mundo, um aumento de 43% somente nos últimos três anos.
Ao mesmo tempo, um número crescente de países que tradicionalmente são os que mais enviam estudantes para fora, desde a Coreia do Sul até a Arábia Saudita, procuram melhorar a qualidade e a quantidade dos seus próprios cursos de graduação, travando uma feroz e dispendiosa disputa para recrutar estudantes e criar universidades de pesquisa de classe mundial.
Durante sua campanha em 2008, o então candidato Barack Obama falou em tom alarmante sobre a ameaça dessa concorrência acadêmica para a competitividade dos EUA. "Se quisermos continuar construindo os carros do futuro aqui não podemos nos permitir ver o número de doutorados em engenharia aumentando na China, na Coreia do Sul e no Japão, ao mesmo tempo que se observa uma queda aqui nos EUA", declarou Obama.
Essa preocupação não se restringe apenas aos EUA. Em alguns países, o nervosismo envolvendo essa competição no campo educacional e a fuga de cérebros resultou num forte protecionismo acadêmico. Índia e China são conhecidos pelos obstáculos burocráticos e legais que colocam às universidades ocidentais que pretendem instituir campus satélites nesses países para atender estudantes locais.
Muitas vezes, os alunos que querem deixar o país também enfrentam barreiras. Há alguns anos, o presidente de um prestigiado instituto de tecnologia na Índia proibiu seus formandos de aceitar estágios remunerados acadêmicos ou em empresas no exterior.
Há ainda outros impedimentos à mobilidade global que não são declaradamente protecionistas, mas limitam o acesso às universidades em todo o mundo. Nos anos posteriores aos atentados de 11 de setembro de 2001, por exemplo, preocupações legítimas com a segurança causaram enormes adiamentos na concessão de vistos e transtornos de caráter burocrático para estrangeiros que aspiravam estudar nos EUA. O número depois aumentou, mas persistem limites severos para vistos de trabalho e residência, que deveriam servir como atração para os mais brilhantes estudarem nos EUA.
Talvez parte da preocupação com esses novos empreendimentos acadêmicos no plano global seja compreensível, especialmente num período de grande incerteza econômica. Mas o protecionismo na área do ensino é um erro tão grande quanto o protecionismo comercial. A globalização do ensino superior deve ser estimulada, não temida - também nos EUA. Existem todas as razões para se acreditar que a disputa global pelo talento humano, a corrida para se produzir uma pesquisa inovadora, o movimento para estender os campus universitários a múltiplos países, e o ímpeto para preparar estudantes talentosos que poderão trazer mais vigor para economias com base no conhecimento, serão muito bons para os EUA também.
Sobretudo, porque a expansão do conhecimento não é um jogo de soma zero. Um maior número de doutorados e o florescimento da pesquisa na China, por exemplo, não vão tirar o acervo de conhecimento dos EUA. Como o conhecimento é um bem público, os ganhos intelectuais de um país sempre beneficiam outros. A pesquisa chinesa poderá muito bem fornecer as bases para empreendedores americanos, ou de outros países, inovarem.
Da mesma maneira que o livre comércio se traduz em produtos e serviços mais baratos, beneficiando produtores e consumidores, a competição acadêmica global terá como resultado uma livre movimentação de pessoas e ideias, com base no mérito, o que será muito positivo para os indivíduos, universidades e países. Hoje, a transmissão e a mobilidade do conhecimento, sempre constantes, constituem um novo tipo de livre comércio, o de mentes.
A redução gradativa no número de estudantes no mercado americano, ou a emergência de novos concorrentes ambiciosos na Ásia, na Europa e no Oriente Médio, não significam que as universidades americanas estão em rota inevitável de declínio.
Resistindo às barreiras protecionistas, internamente e no exterior, continuando a recrutar e acolher os melhores estudantes do mundo, enviando mais alunos para o estrangeiro, fomentando uma colaboração entre nações no campo da pesquisa e fortalecendo suas próprias universidades de pesquisa, os EUA conseguirão manter a excelência acadêmica já estabelecida e ao mesmo tempo expandir a soma da prosperidade e do conhecimento globais.

* PESQUISADOR SÊNIOR DA KAUFFMANN FOUNDATION

TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

Um comentário:

Regina disse...

Caro Paulo Roberto,
Não é sem razão que o Brasil é um exportador de cérebros. Para depois correr e tirar uma casquinha.....
Cordiais saudações,
Regina