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sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Confusao mental: comportamento cambial erratico do governo...

Bem, falar em governo é um pouco exagerado, neste caso, pois não existe, a rigor, uma política cambial do governo (supondo-se que exista governo, claro).
Existe uma política cambial do Banco Central (com objetivos muito bem definidos, ainda que não explícitos) e existe, ao que parece, uma outra política cambial, esta sim confusa, errática e contraditória, da Fazenda, que parece barata tonta no tiroteio, para usar uma imagem conhecida.
Uma política não bate com a outra, mas a única questão relevante aqui é: a política cambial da Fazenda bate com alguma coisa? Duvido, sinceramente, pois não existe discurso coerente, e sequer existe discurso, apenas frases desconexas, confusas, contraditórias, tropeços verbais no meio da escuridão, gaguejamentos borrachos de quem deveria andar sóbrio (sobretudo numa matéria séria como essa).
Enfim, sem ser especialista, como o citado na matéria abaixo, do sempre competente jornalista do CB, Antonio Machado (nome de poeta espanhol), ouso dizer que o real vai continuar a se valorizar, e que a política cambial (se existe) vai continuar confusa e errática.
O que não se diz, em parte alguma, é o enorme custo fiscal dessa compra sôfrega de dólares, aparentemente até por esse fantasma inacreditável chamado (ao que parece) "Fundo Soberano do Brasil".
Aqui se trata de uma mistificação completa: o Brasil não possui NENHUM dos requerimentos estruturais para ter um Fundo Soberano, que são superávits orçamentários (ou seja, folga fiscal) e superávit em transações correntes. Nada, nadica de pitiribas. E como se constitui esse tal de Fundo que não é fundo? Simplesmente com recursos orçamentários -- ao ARREPIO da LEI, diga-se de passagem -- que depois são usados e abusados pelo governo sem controle parlamentar e sem estar no orçamento. Ou seja, uma fraude completa.
Bem, deixo vocês com o artigo em questão/
Paulo Roberto de Almeida

Câmbio atormentado
Antonio Machado - Brasil S/A
Correio Braziliense, 8.10.2010

Afinal, questiona o especialista em mercado cambial Sidnei Moura Nehme, o que pretende o governo: apreciar ou depreciar o real? A questão parece improcedente, pelo menos depois que o ministro Guido Mantega disse que há uma guerra cambial no mundo, tema até então evitado pelos governos em geral, e que o Brasil não ficaria impassível. O Banco Central lhe dá razão, já que há meses passa o rodo no mercado cambial, enxugando os dólares que entram no país.

Por tudo isso é que Nehme explica que “essa, talvez, seja a questão inicial que os gestores de política monetária, cambial e fiscal do país devem procurar responder e, pelo que se observa”, acrescenta, a pergunta continua sem resposta. Sua certeza sobre a incoerência das ações do governo no câmbio sai da análise dos números apurados pelo Banco Central sobre o fluxo de divisas. São dados públicos.

O problema é que poucos como Nehme, economista e sócio-diretor da corretora NGO, se aplicam a estudá-los. A maioria se satisfaz com o que dizem os manuais de economia, segundo os quais a toda oferta restrita corresponde um aumento de preço. Se o BC enxuga os fluxos líquidos de dólares, o preço em relação ao real deveria aumentar.

Mas o BC faz mais: absorve toda a oferta e mais um pouco, isto é, dólares ainda indisponíveis no país. E o que acontece? O real vem ganhando gradativamente valor sobre o dólar, contrariando a lei da oferta e da procura. É a teoria que não se aplica ao país ou haveria algo mais? A resposta está nos dados tabulados pelo BC.

A eles: do início do ano até setembro, o saldo entre os ingressos e saídas de divisas foi positivo em US$ 17,121 bilhões. No mesmo período, o BC retirou do mercado à vista, por meio de leilões, US$ 29,362 bilhões. Comprou a mais que as entradas US$ 12,241 bilhões.

De onde veio esse “excedente”? Das linhas de crédito no exterior dos bancos brasileiros. A operação é rentável, já que a diferença entre os juros internos (10,75% no overnight) e nos EUA, Europa e Japão, da ordem de zero, pende a favor do aplicador estrangeiro.

Se, além disso, o real valorizar-se entre o ato de entrega dos dólares ao BC e o arremate do crédito externo, obtém-se um retorno irrealizável, a curto prazo, em qualquer outro mercado no mundo.

A história é assim: o dólar cai em todo o mundo porque interessa aos EUA para sair da crise, sobretudo em sua queda de braço com o governo chinês, irredutível aos apelos para apreciar o renminbi. E aqui também cai por razões que nada têm a ver com as diretrizes do governo Obama, mas com as do governo Lula, como Nehme reflete.

Bicicleta dólar-real
Essa bicicleta dólar-real só se equilibra pela certeza de que o BC comprará qualquer excedente de divisas que zanzar pelo mercado. E por que o BC faz isso? Nehme, cujos textos costumavam ser lidos na Fazenda — e talvez ainda sejam — responde. “As compras do BC correspondem a um tipo sutil de interferência [no mercado cambial] habilmente mascarada pelo argumento de que a causa é o fluxo, já que poucos vão conferir os números”, diz. “O objetivo é apreciar o real para que funcione como antídoto a pressões inflacionárias.”

Álibi contra inflação
É para pensar. Repita-se: se não fica dólar dando sopa por aí, a taxa cambial, no mínimo, deveria ficar estável. Com o aumento da tributação sobre os fluxos para aplicações financeiras, parece que o câmbio pode reagir. A ver. Mas nem isso deveria ser necessário.

“Não há porque se falar em impacto do fluxo cambial na derrocada do preço do real, já que foi absolutamente neutralizado pelo BC ao adquiri-lo na totalidade”, reforça o especialista. A combinação de política monetária com política cambial, ele explica, desqualifica o sistema de câmbio flutuante e estimula os bancos a constituir as chamadas posições “vendidas” (apostas na apreciação do real).

BC e Fazenda divergem
E aí vem a Fazenda e dobra a alíquota do IOF, amplia o prazo de provisão do Tesouro para pagar dívida pública externa a vencer e prepara o Fundo Soberano do Brasil para “compras ilimitadas”, nas palavras de Mantega, que também sugeriu ao BC reintroduzir o tal “swap cambial reverso”, equivalente à compra futura de dólar.

Tudo isso é para abater o real. Mas só servirá para intensificar a força do real, como se constatou no passado. “Se não conseguimos nem definir o que queremos, como temos pretensão de nos reunir com o G-20 para debater o assunto?”, provoca Nehme. Com juros em desalinho, poupança interna no osso e mercado de derivativos sem amarras, já seria muito se o governo sanasse suas contradições.

Farol para os aflitos
A pressão de entrada dos dólares existe não só por incoerência de objetivos da política econômica. O problema é global. Agrava-se no Brasil pelo conflito entre a meta legal de inflação, nas cercanias de 4,5% de variação anual, e a sua sequela sobre o preço do dólar.

Sem o cenário de guerra cambial, prioridade na agenda de todos os governos, daria até para aguentar. O overnight a 11%, contra zero nas economias avançadas em crise, no entanto, funciona como farol para todos os que têm dólar na mão, e estão avisados pelo Federal Reserve sobre a iminência de um choque cambial, cujo nome técnico, quantitative easing, ou afrouxamento monetário, não disfarça a intenção. O país precisa proteger-se. Ou tranca transitoriamente o mercado cambial ou corta juros. Ambos juntos poderão ser um risco.

2 comentários:

Mário Machado disse...

Professor,

O senhor acha que poderia haver um aumento da pressão inflacionária se se reduzisse o volume de importações, por que a economia aquecida deve estar perto do limite de produção?

Abs,

Paulo Roberto de Almeida disse...

Certamente, meu caro, o BC sabe disso, e considera que as importações são boas para combater a inflação.
Só os meninos da Fazenda acham que elas são más.
O pessoal da FIESP também...