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domingo, 6 de fevereiro de 2011

Aquecimento global: o debate continua (argumentos pro...)

Quero dizer, antes de qualquer outra coisa, que não nego as evidências do aquecimento global, grande parte dele antrópico.
Mas também digo que não sou malthusiano porque acredito -- talvez ingenuamente -- que a inteligência e a engenhosidade humanas (ou seja, a pesquisa científica e os avanços tecnológicos) saberão encontrar respostas antes que a catástrofe se abata sobre nós.
Os adeptos do que já foi chamado de "Igreja dos Santos do Aquecimento Global dos últimos Dias" (apud Reinaldo Azevedo) proclama que a "catástrofe" já está entre nós, sob a forma de chuvas aluvionais, secas, inundações, enfim, algo como as sete pragas do Egito (bíblico) se precipitando sobre esta humanidade tão pecadora (e alguns malucos da antiglobalização até dizem que tudo é culpa do capitalismo predador e assimétrico).
Mas não quero zombar dos cientistas, longe disso, inclusive porque gostaria de ser um deles (mas me faltaram a matemática e a física em algum momento do ginásio).
Acho apenas que os recursos (isto é economia) da humanidade são muito escassos, e deveriam ser encaminhados para as prioridades verdadeiras. Para mim, como se diz, first things, first. E as primeiras coisas são a pobreza extrema, a não educação, a falta de saneamento e saúde. E também a democracia.
Acredito que com tudo isso, vai ficar mais fácil lutar contra os efeitos do aquecimento global. Cientistas também podem ser autistas.
O que não me impede de dar todo o destaque a suas informações e suas opiniões.
Como, por exemplo, estas do Alexandre, que postou neste outro post, e que recupero para dar o devido destaque, para contextualizar os comentários:

Aquecimento global: perigos do novo malthusianismo e argumentos racionais
QUARTA-FEIRA, 2 DE FEVEREIRO DE 2011
Volto a postar, por importante, pequena nota informativa sobre a questão em epígrafe, por ter sido objeto de comentários recentes, que transcrevo aqui, junto com meus comentários-resposta, desta data.
Paulo Roberto de Almeida

1497) Aquecimento Global: ceticismo sadio sempre é recomendavel
QUARTA-FEIRA, 11 DE NOVEMBRO DE 2009
(...)

Alexandre disse...
Demorei a encontrar esse post. O prof. Paulo é tão profícuo em seu blog que o artigo logo ficou para trás dos novos :-)

A respeito dos comentários acima: ambos têm um desprezo implícito pelas evidências. Uma vaga impressão de que cientistas podem estar errados, e portanto nunca se justifica nenhuma ação baseada em seus achados.

Existem diferentes graduações de incerteza na ciência, e qualquer cientista que mereça esse nome tem plena consciência disso. Mesmo que nenhum conhecimento humano esteja além da possibilidade de refutação (caso contrário nem seria científico), isso não impede que, na prática, consideremos certas coisas como fatos.

O vírus HIV causa AIDS, e isso é um fato - mesmo que alguns auto-proclamados "mavericks" digam o contrário, usando uma argumentação muito similar àquela dos negadores do Aquecimento Global Antópico (AGA).

Cigarro multiplica sua possibilidade de desenvolver vários tipos de câncer, e isso é um fato comprovado em várias e várias pesquisas documentadas. De novo, os que confundiram a opinião pública por décadas dizendo o contrário usaram argumentos muito similares aos dos negadores do AGA.

Ambos os exemplos acima têm um nível de certeza que nos permitem tomar decisões baseados neles. Embora, no princípio teórico, até isso possa ser refutado, essa possibilidade é ínfima. A possibilidade das toneladas de evidências acumuladas estarem corretas é incomparavelmente maior, e pessoas de juízo, que realmente pesam os riscos, preferem não corrê-los.

Da mesma maneira, o AGA foi medido, verificado e re-verificado à exaustão nas últimas décadas, o que fica evidente quando se procura a literatura científica pertinente. Apenas quem tomou conhecimento da questão pela via dos auto-proclamados "mavericks" sem procurar entender o fenômeno ainda procura pelos em casca de ovo.

Um texto interessante, em linguagem acessível ao leigo (mas mesmo assim cientificamente preciso e com as devidas referências), é o disponível neste link. Para os mais exigentes, de novo, recomendo ir direto na fonte - os institutos de pesquisa atmosférica (NOAA, NASA, Inpe, Max Planck, JMA, MetOffice, etc.) Algumas universidades também têm muita informação disponível online, com destaque para a Universidade de Chicago, que disponibilizou toda a cadeira de física do AGA para não-cientistas em vídeo.

Sem se conhecer essa base de evidências, descartá-la a priori é simplesmente ignorar os fatos.
Domingo, Fevereiro 06, 2011 6:17:00 PM

========

Pronto, está postado com o devido destaque.
Paulo Roberto de Almeida

3 comentários:

Mário Machado disse...

A um grande problema na opinião do debatedor. Eu não estou negando o número e os modelos, não tenho conhecimentos para isso e parece haver um animado debate dentro da própria comunidade cientifica.

O que eu não concordo e luto contra é o marxismo verde que pretende criar o "novo homem" agora por meio do uso da ecologia.

O que eu descarto é isso, é usar uma emergência para vender revoluções políticas. O que eu recuso é focar em ações políticas anti-sistêmica no lugar de prepararmos as cidades para os efeitos do que pode vir a acontecer.

O que eu descarto a priori é usar a ciência para empurrar o velho "novo mundo possível".

Acho que agora ficou mais claro. O que eu disse de repercussões políticas da ciência que escapam do escopo dos cientistas passando a ser algo que deve ser socialmente debatido.

Sobretudo, o que eu descarto são "soluções" que vão resultar em fome, que os "ambientalistas (aqui excluo cientistas e falo de militantes)" querem empurrar goela abaixo.

Abs

Alexandre disse...

Obrigado aos dois pelo debate civilizado. Neste assunto, por motivos diversos, o ambiente às vezes se deteriora e impede uma troca verdadeira de argumentos.



Fico satisfeito de que, nesse ponto, a parte da discussão técnica fica superada, se não pela compreensão dos processos físicos (perfeitamente compreensível, pois demanda alguma base prévia de conhecimento), mas pelo menos pela razoável confiança no processo científico.

Uma observação a respeito do post do Mário, sobre o "animado debate" dentro da comunidade científica: debate, no sentido de ainda discutir-se se é verdade ou não, está tão superado quanto os exemplos que mencionei da AIDS ou do cigarro. Arrisco dizer que está até mais superado que estes, uma vez que o volume de evidências e estudos realizados é muito maior. Eu sei, quando nossa porta de entrada para este assunto é de articulistas ou instituições com forte viés ideológico, essa minha afirmação parece exagerada. De novo, recomendo a consulta às fontes científicas para tirar isso a limpo. Fico à disposição, dentro de minhas limitações, para fornecer referências.

Eu percebo aqui um vago receio do AGA ser usado como uma desculpa para um retorno marxista ou uma estatização exagerada. É um discurso comum, principalmente se aprendemos este tema através de fontes como o Heartland e Reinaldo Azevedo, e não o NOAA ou Ramanathan (um importante cientista de física atmosférica).

Eu sugiro uma leitura breve do capítulo resumido de adaptação e mitigação do relatório do IPCC pra se ter uma idéia mais concreta do que é proposto (link aqui).

Conter desmatamento, melhorar a eficiência dos motores de combustão interna ou investir em P&D de tecnologias limpas de energia não me parecem exatamente uma conspiração marxista.

Uma outra leitura útil seria descobrir que tipo de projeção de mudanças climáticas são feitas, e no que foram baseadas. Isso evitaria a vaga rejeição a "cenários apocalípticos" que não se sabe bem o que são. Um bom ponto de partida pode ser, de novo, o próprio relatório do IPCC (capítulo pertinente resumido aqui).

Uma vez que ambos demonstram confiarem no processo científico para se chegar à atual ciência, acho que cabe fazer a pergunta que realmente interessa, e que pode ter discussão mais fértil aqui:

Considerando as probabilidades (altas) e as conseqüências ruins (significativas) do nosso atual curso de emissões, o que, dentro da estrutura ideológica aceitável a vocês, seria um curso de ação promissor quanto às mudanças climáticas?

Algumas sugestões minhas:

- Um imposto pigouviano, que colocaria um preço na externalidade. Afinal, não há mercado para soluções se causar a externalidade for gratuito. Prefiro essa via ao cap-and-trade por ser mais viável e mais facilmente fiscalizado. A proposta não precisa significar aumento de carga tributária. Pode-se diminuir outros impostos proporcionalmente, e é nesse ponto que o eleitorado precisaria ficar de olho.

- Algum tipo de política pública que estimulasse o desenvolvimento de tecnologias limpas. Tenho apenas números dos EUA de anos atrás, mas o investimento de P&D nessa área não chegava a 1% do faturamento - muito menor que outras áreas de tecnologia.

- Estancamento imediato do nosso desmatamento, com a construção de estrutura suficiente para fiscalização e enforcement. A legalização fundiária e o georreferenciamento são condição essencial para o cumprimento das leis atuais ou desdobramentos legais futuros. Essa é, de longe, a principal fonte de emissões do Brasil.

- Abolição imediata dos subsídios aos combustíveis fósseis.

Que soluções seriam aceitáveis dentro do modelo idelológico da preferência de vocês? Ou: aceitando que o problema existe, como deveríamos responder a ele?

Alexandre disse...

Ah, sim, e um complemento em resposta à questão das prioridades levantada pelo prof. Paulo:

Sim, recursos são escassos. Pobreza, educação, saneamento + saúde, são problemas importantíssimos. A democracia, a estabilidade política e a liberdade delas decorrentes também são.

Mas fechar os olhos para as mudanças climáticas é comprometer todos estes valores. Um cenário de colheitas prejudicadas, doenças tropicais com maior área de ocorrência, irregularidade da água potável, mais os potenciais conflitos decorrentes, são todos fatores que prejudicam estas prioridades que o sr. preza.

E diria que deve-se mitigar com responsabilidade o AGA justamente para realizarmos estes ideais humanos. Colocar um contra o outro é criar um falso dilema.