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segunda-feira, 5 de setembro de 2011

David Landes: Prometeu Liberado -- a Revolução Industrial na Europa


Uma resenha de 2005, quase esquecida:

Um Prometeu industrial desengonçado
Paulo Roberto de Almeida



David S. Landes: 
Prometeu Desacorrentado: transformação tecnológica e desenvolvimento industrial na Europa ocidental, de 1750 até os dias de hoje
(2. ed. Rio de Janeiro: Campus, 2005, 628 p.).



A tradução do título para o português é imprecisa: trata-se de um Prometeu unbound, isto é, liberado, não unchained. Mas isso não tira o valor da segunda edição deste clássico, agora com novo prefácio e epílogo - no mais o texto permanece igual ao de 1969, originalmente um ensaio da Cambridge Economic History. David Landes, professor emérito de Harvard, já tinha feito um complemento a Adam Smith, em A Riqueza e a Pobreza das Nações (Campus, 1998), soberbo nos desenvolvimentos globais, mas falho no que toca à América Latina e ao Brasil, analisados pela ótica enviesada da ("esqueçam-o-que-escrevi") teoria da dependência de FHC.

O titã liberado é o sistema fabril: seu aparecimento na Inglaterra chocou Marx, que condenou a vil exploração do proletariado. Ele ainda não tinha visto nada, pois a China modorrava na imobilidade industrial. Hoje as fábricas chinesas não se distinguem, pelas condições de trabalho, das manufaturas de Manchester do século 19. A história é européia, mas esse Prometeu desajeitado que é a grande indústria leva seus grilhões ao mundo, o que desespera os antiglobalizadores, mas encantaria Marx, que confiava no papel revolucionário do capitalismo para destruir as "muralhas da China", o despotismo asiático e os reinos bárbaros do Oriente.

A China, a Índia e as nações islâmicas fracassadas do Oriente Médio constituem, precisamente, o objeto do epílogo, a parte verdadeiramente nova do livro. Landes argumenta que a globalização "não é uma causa, nem uma ideologia. É simplesmente a procura de riqueza". A civilização industrial do Ocidente foi a mais formidável máquina de criação de riquezas da história, ao associar possibilidades tecnológicas com o faro pelos negócios de homens liberados das restrições do mercantilismo. Por que esse processo revolucionário ainda não conseguiu romper os grilhões do subdesenvolvimento? É que empréstimos, ensinamentos e presentes podem até ajudar, mas de nada adiantam se o movimento não for conduzido a partir de dentro. 

Landes demonstra como as condições tecnológicas e institucionais foram reunidas na Europa Ocidental e continuam a distinguir o Ocidente desenvolvido, ainda que países do Oriente - como o Japão, a Coréia e, agora, a China - lhe tenham seguido os passos. Esses bons alunos da escola européia, a começar pelos Estados Unidos, copiaram as técnicas, não necessariamente as instituições e as políticas econômicas. Landes diz que não é relevante que os "orientais" não tenham seguido a via do liberalismo, e sim que tenham integrado suas economias aos mercados globais, algo que os pregadores de uma industrialização à la List dificilmente reconhecem. 

O cerne do livro não é uma discussão das economic policies dos "copiadores" e sim um fascinante racconto storico do desenvolvimento tecnológico da industrialização européia. São seis capítulos, com poucas seções internas e relativamente poucas estatísticas, mas muitos dados qualitativos e análises sobre cada fase. Uma introdução metodológica explica por que a revolução industrial ocorreu na Europa e não em outros lugares. Coloca a questão - que será seguida ao longo do livro - das razões pelas quais as mudanças ocorreram em épocas e locais determinados da Europa, isto é, como o padrão de desenvolvimento diferiu de um país para outro. Nesse sentido, a Europa é um grande laboratório, por ter nações ricas e pobres, grandes e pequenas, todas as formas de governo e um rico mosaico de tradições culturais.

Desde a Revolução Industrial inglesa, disseminada pelo continente, até o período entre guerras e a reconstrução subseqüente, Landes descreve as indústrias mais relevantes do ponto de vista tecnológico: têxtil, metalúrgica, química e de maquinaria, além da mineração de carvão por seu papel energético. Todas elas são situadas no contexto da organização industrial, isto é, da coordenação dos fatores de produção e do manejo dos produtos manufaturados. O resultado é um painel fascinante das raízes da "hegemonia" ocidental, não em virtude de uma história colonialista e opressora, e sim da capacidade de mobilizar e transformar as forças da natureza, liberando o Prometeu desengonçado do capitalismo industrial dos velhos grilhões da miséria educacional e da secular opressão da pobreza material.


1420. “Um Prometeu industrial desengonçado”, Brasília, 17 abr. 2005, 2 p. Resenha de David S. Landes: Prometeu Desacorrentado: transformação tecnológica e desenvolvimento industrial na Europa ocidental, de 1750 até os dias de hoje (2. ed. Rio de Janeiro: Campus, 2005, 628 p.). Publicada na Desafios do Desenvolvimento (Brasília: IPEA-PNUD, a. I, n. 10, mai. 2005, p. 76 link: http://desafios2.ipea.gov.br/desafios/edicoes/10/artigo13441-1.php); sob o título “Prometeu desacorrentado: transformação tecnológica e desenvolvimento”, no Meridiano 47 (Brasília: IBRI, n. 61, ago. 2005, p. 16-17; link: http://www.mundorama.info/Mundorama/Meridiano_47_-_1-100_files/Meridiano_61.pdf); na revista Plenarium (Brasília: Câmara dos Deputados, a. II, n. 2, nov. 2005, p. 340-341). Relação de Publicados n. 561, 582, 595 e 652. 

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