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segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Economia Brasileira Contemporânea (1945-2004) - resenha Paulo R Almeida


8. “Intérpretes e protagonistas da história econômica brasileira”, Brasília, 13 dezembro 2004, 3 p. Resenha de Fabio Giambiagi, André Villela, Lavínia Barros de Castro e Jennifer Hermann (orgs.), Economia Brasileira Contemporânea (1945-2004) (Rio de Janeiro: Elsevier, 2005, 432 pág.; ISBN 85-352-1415-1). Publicado na revista Desafios do Desenvolvimento (Brasília: IPEA-PNUD, ano 2, nº 6, janeiro de 2005, p. 77; link: http://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&view=article&id=1760:catid=28&Itemid=23).  Relação de Trabalhos nº 1365. Relação de Publicados nº 536.

Intérpretes e protagonistas da história econômica brasileiraImprimirE-mail
Paulo Roberto de Almeida
Poucos são os livros que, no momento de sua publicação, podem ostentar, de imediato, a classificação de "clássico" ou mesmo de "indispensável". No terreno da teoria econômica, e particularmente no das políticas econômicas, livros costumam ser tão efêmeros quanto as políticas e as circunstâncias históricas que os viram nascer. No que se refere à história e às políticas econômicas da era republicana no Brasil, um exemplo de clássico é a coletânea organizada por Marcelo de Paiva Abreu para sintetizar os primeiros cem anos de experimentos levados a cabo pelos mais distintos regimes políticos: A Ordem do Progresso.

Economia Brasileira Contemporânea é, igualmente, um livro que já nasce clássico, não apenas porque complementa e amplia a discussão iniciada com aquela coletânea publicada em 1989, mas porque descreve e analisa, com rara maestria, o itinerário econômico do Brasil contemporâneo e seus principais problemas: a luta pela estabilidade, o desafio do crescimento sustentado e do desenvolvimento, a restrição externa e a dependência financeira, os problemas da pobreza, da desigualdade distributiva e da baixa qualificação educacional da população brasileira. Isso se deve ao fato de que não apenas os organizadores possuem competência acadêmica, experiência prática e faro político, mas também souberam cercar-se dos melhores nomes. Registre-se que realizaram a proeza, tanto intelectual quanto prática, de reunir dois inimigos da história econômica recente, Antonio Delfim Netto e Gustavo Franco.

O texto de Delfim analisa a evolução da economia brasileira entre 1947 e 2003, com ênfase no processo de desenvolvimento e sua principal restrição: as crises de balanço de pagamentos. Gustavo Franco segue o itinerário da luta contra a inflação e chega ao Plano Real, do qual foi um dos principais formuladores e administradores, até sair no episódio da passagem para o regime de flutuação cambial, em janeiro de 1999. Outros autores comparecem com temas relevantes, como a restrição de poupança (Edward Amadeo e Fernando Montero), as causas do crescimento econômico (Regis Bonelli), seu financiamento (Rogério Studart), a desigualdade distributiva (Lauro Ramos e Rosane Mendonça) e a terrível escassez de educação (Sergio Guimarães Ferreira e Fernando Veloso).

Esses são os eixos temáticos dessa obra verdadeiramente indispensável, mas eles constituem apenas a segunda parte do livro, pois a primeira está dedicada a oferecer, sob responsabilidade dos próprios organizadores (com a colaboração de Sérgio Besserman Vianna), uma visão panorâmica e abrangente de todo o desenvolvimento da economia e da política econômica brasileira entre 1945 e a atualidade. O grande mérito desse livro sobre outras coletâneas, situa-se na combinação do material histórico, de enfoque propriamente cronológico, com a discussão pormenorizada oferecida nos capítulos temáticos.

A obra não se dirige em primeiro lugar aos economistas profissionais, mas fundamentalmente aos estudantes universitários. Também deve interessar ao cidadão comum que busca entender não só as raízes da presente situação - um notável desempenho industrial, um pujante agronegócio, ao lado das mazelas sociais conhecidas e de persistentes desequilíbrios macroeconômicos, seja no plano fiscal e da dívida interna, seja ainda na vilipendiada "dependência financeira externa" - como as causas de nosso frustrante fracasso em alcançar os países de maior desenvolvimento relativo.

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Agora a versão completa: 

Intérpretes e protagonistas da história econômica brasileira

Resenha de:
Fabio Giambiagi, André Villela, Lavínia Barros de Castro e Jennifer Hermann (orgs.),
Economia Brasileira Contemporânea (1945-2004)
(Rio de Janeiro: Elsevier, 2005, 432 pág.; ISBN 85-352-1415-1).

            Poucos são os livros que, no momento de sua publicação, podem aspirar  ostentar, de imediato, a classificação de “clássico” ou mesmo de “indispensável”. No terreno da teoria econômica, e particularmente no das políticas econômicas, livros costumam ser tão efêmeros quanto as  políticas e as circunstâncias históricas que os viram nascer, se estiolar em face dos dados teimosos da realidade e caminhar para um lento e inexorável declínio enquanto explicação possível em um dado momento histórico. Trata-se de um pequeno número, assim, os livros que sobrevivem ao embate da realidade e do tempo. No que se refere à história econômica e às políticas econômicas da era republicana no Brasil, um exemplo de clássico é a coletânea organizada por Marcelo de Paiva Abreu para sintetizar os primeiros cem anos de experimentos econômicos levados a cabo pelos mais distintos regimes políticos: A Ordem do Progresso.
            Esta obra coletiva é, igualmente e desde já, um livro que já nasce clássico, não apenas porque ele complementa e amplia a discussão iniciada com aquela coletânea publicada em 1989, mas também porque ele descreve e analisa, com rara maestria, o itinerário econômico do Brasil contemporâneo e seus principais problemas: a luta pela estabilidade macroeconômica, o desafio do crescimento sustentado e do desenvolvimento, a restrição externa e a dependência financeira, os problemas da pobreza e da desigualdade distributiva e da baixa qualificação educacional da população do Brasil. Isso se deve ao fato de que não apenas os organizadores possuem competência acadêmica, experiência prática e grande faro político, mas também porque eles souberam se cercar dos melhores nomes do terreno. Registre-se, desde já, que eles realizaram a proeza, tanto intelectual quanto prática, de reunir no mesmo empreendimento dois protagonistas inimigos da história econômica recente, Antonio Delfim Netto e Gustavo Franco.
            O texto de Delfim, por exemplo, analisa a evolução da economia brasileira entre 1947 e 2003, com ênfase no processo de desenvolvimento e sua principal restrição: as crises de balanço de pagamentos. Já Gustavo Franco, que nunca deixou de criticar o primeiro (por ter produzido crescimento com o terrível legado do inflacionismo estatal), segue o itinerário de luta contra a inflação até o Plano Real, do qual ele foi um dos principais formuladores e administradores, até sair no episódio da passagem para o regime de flutuação cambial, em janeiro de 1999. Outros autores comparecem com temas relevantes, como a restrição de poupança (Edward Amadeo e Fernando Montero), as causas do crescimento econômico (Regis Bonelli), seu financiamento (Rogério Studart), a desigualdade distributiva (Lauro Ramos e Rosane Mendonça) e, last but no the least, a terrível escassez de educação (Sergio Guimarães Ferreira e Fernando Veloso).
            Estes são os eixos temáticos desta obra verdadeiramente indispensável, mas eles constituem apenas a segunda parte do livro, pois a primeira se dedica, numa trajetória propriamente linear, a oferecer, sob responsabilidade dos próprios organizadores (com a colaboração de Sérgio Besserman Vianna), uma visão panorâmica e abrangente de todo o desenvolvimento da economia e da política econômica brasileira entre 1945 e a atualidade. Como bem ressaltam os organizadores, as ênfases das políticas econômicas vão mudando em função dos cenários (interno e externo) cambiantes e dos principais problemas em cada época: crescimento e superação dos gargalos estruturais, políticas de ajuste externo e de combate à inflação, planos de desenvolvimento e de estabilização e, igualmente importante, a própria mudança de enfoque no pensamento dominante: do desenvolvimentismo estatizante e protecionista à abertura da economia e à privatização.
            O grande mérito deste livro, sobre outras coletâneas existentes, situa-se, assim, na combinação do material histórico, de enfoque propriamente cronológico, com a discussão pormenorizada oferecida nos capítulos temáticos. Três temas, aponta o apresentador (Wilson Suzigan), ficaram de fora da coletânea: a industrialização, o desenvolvimento científico e tecnológico e o desenvolvimento regional, mas isso não chega a comprometer um volume equilibrado e abrangente, já que esses problemas perpassam, mais de uma vez, os capítulos históricos ou os temáticos. Os próprios organizadores reconhecem que a questão das finanças públicas também ficou ausente da segunda parte, mas ela já tinha sido objeto de uma obra básica, de caráter teórico e centrada no caso brasileiro, sob a responsabilidade de um dos autores (Fabio Giambiagi, com Ana Cláudia Além). Os capítulos contêm poucos gráficos e tabelas, mas um utilíssimo apêndice estatístico uniformiza a informação quantitativa para o conjunto dos trabalhos individuais, que passam assim a dispor de um referencial comum de indicadores macroeconômicos.
            A obra, cabe ressaltar, não se dirige em primeiro lugar aos economistas profissionais, mas fundamentalmente aos milhares de estudantes das dezenas de cursos universitários, de graduação ou de pós, que têm de, em algum momento, confrontar-se com os problemas reais do desenvolvimento econômico brasileiro. Ela também deve interessar ao cidadão comum, que busca entender não só as raizes da presente situação – um notável desempenho industrial, um pujante agronegócio, ao lado das mazelas sociais conhecidas e de persistentes desequilíbrios macroeconômicos, seja no plano fiscal e da dívida interna, seja ainda na vilipendiada “dependência financeira externa” –, como as causas de nosso frustrante fracasso em alcançar os países de maior desenvolvimento relativo (de fato a distância em relação a eles voltou a aumentar como resultado do baixo crescimento das duas últimas décadas).
            A obra tampouco pretende oferecer, em algum exercício de síntese, uma interpretação única do processo brasileiro de desenvolvimento, tanto porque os autores mantêm independência de pensamento e efoques analíticos distintos: ainda agora, Delfim Netto e Gustavo Franco, para voltar aos mais conhecidos autores, ostentam interpretações divergentes para o que o segundo chama de desenvolvimentismo inflacionista, ao passo que o primeiro  encontra mais pecados nos desequilíbrios externos do que no tratamento heterodoxo da inflação. 
            Trata-se, em todo caso, da mais importante contribuição bibliográfica surgida no mercado editorial dos livros didáticos de alta qualidade nos últimos anos, mas não só isso: o livro também apresenta utilidade para o tomador de decisões, assim como para os destinatários dessas decisões, que somos todos nós. Ele está, em consequência, destinado a permanecer como uma referência indispensável nessas categorias pelos próximos anos.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 13 de dezembro de 2004




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