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quinta-feira, 25 de abril de 2013

Venezuela: uma agenda carregada para o novo "presidente"

Venezuela: a herança maldita de Chávez 

Veja.com, 24/04/2013
Hugo Chávez chegou ao poder na Venezuela em fevereiro de 1999 e, ao longo de catorze anos, criou gigantescos desequilíbrios econômicos, acabou com a independência das instituições e deixou um legado problemático para seu sucessor. Confira alguns dos desafios que o novo presidente terá de enfrentar:

1) PDVSA em ruínas
O petróleo, extraído quase inteiramente pela PDVSA, a Petrobras da Venezuela, é responsável por 50% das receitas do governo venezuelano. Além do prejuízo de uma economia não diversificada, Chávez demitiu em 2003 40% dos funcionários da companhia após uma greve geral e os substituiu por aliados. A partir daí, as metas de investimento não foram cumpridas e a produção estagnou.
O plano de investimentos da PDVSA divulgado em 2007 previa a produção de 6 milhões de barris por dia este ano, mas entrega menos da metade. A exploração de petróleo caiu de 3.2 milhões de barris diários (em 1998) para 2,6 milhões (dado de 2011). O caudilho foi beneficiado, no entanto, pelo aumento do preço do produto e usou a fortuna para financiar programas assistencialistas e comprar aliados na América Latina. 
Os candidatos já disseram que vão manter as 'misiones', como são conhecidos os programas assistencialistas. O desafio será fazer isso sem afetar a capacidade de investimento na petrolífera e aumentando a produção. 

2) Desmonte das instituições
Em 1999, Chávez aprovou uma nova Constituição que eliminou o Senado e estendeu seu mandato para seis anos, além de conseguir uma lei que lhe permitia governar por decreto. A concentração de poderes promovida pelo caudilho, no entanto, não se restringiu ao Legislativo. O Judiciário foi tomado por juízes alinhados ao chavismo. A cúpula das Forças Armadas também demonstrou lealdade ao coronel logo depois de anunciada sua morte, quando as tropas foram colocadas nas ruas com o objetivo declarado de "manter a ordem". "Vida longa, Chávez. Vida longa, revolução", bradou o ministro da Defesa, Diego Alfredo Molero Bellavia. A oposição em várias oportunidades pediu a obediência à Constituição.
A imprensa também não escapou do controle imposto por Chávez. Em 2007, o governo não renovou a concessão do maior canal de televisão venezuelano, a RCTV. Recentemente, a Globovisión, única emissora que ainda mantém uma linha crítica ao governo, admitiu que está negociando a venda do canal, inviabilizado pelas constantes pressões e prejudicado pelo combalido mercado de anunciantes na Venezuela. 

3) Criminalidade alta
A criminalidade disparou na Venezuela ao longo dos 14 anos de governo Chávez. Em 1999, quando se elegeu, o país registrava cerca de 6.000 mortes por ano, a uma taxa de 25 por 100.000 habitantes, maior que a do Iraque e semelhante à do Brasil, que já é considerada elevada. Segundo a ONG Observatório Venezuelano de Violência (OVV), em 2011, foram cometidos 20.000 assassinatos do país, em um índice de 67 homicídios por 100.000 habitantes. Em 2012, a organização registrou 21.672 homicídios, ou 73 a cada 100.000 habitantes. 
O Ministro de Interior e Justiça divulgou a ocorrência de 16.072 homicídios no país em 2012, contra 14.092 registrados em 2011, um aumento de 14%. Com isso, a taxa de homicídios passou de 48 para 54 a cada 100.000 habitantes. Os números de outro órgão oficial são diferentes. Dados do Corpo de Investigações Científicas, Penais e Criminalísticas, citados pelo jornal El Universal, apontam 21.600 assassinatos em 2012, contra 18.850 em 2011.

4) Inflação galopante
A economia venezuelana tem um histórico de inflação alta, desde antes de Chávez chegar ao poder. Contudo, a gastança pública aliada a uma política expansionista e estatizante fez com que a alta dos preços atingisse níveis absurdos. Segundo o FMI, a inflação anual venezuelana fechou 2012 a 26,3%. Para 2013, a projeção é que o índice chegue a 29%. Os números poderiam ser muito piores se não fosse o controle de preços exercido pelo governo. No entanto, essa regulação afetou a produção e levou a escassez de alimentos básicos como leite e carne. A desvalorização de mais de 30% da moeda, que entrou em vigor em fevereiro, fez com que alguns preços duplicassem.

5) Crise elétrica
Entre o final de 2009 e início de 2010, a Venezuela sofreu uma crise no setor elétrico, agravada pela estiagem que reduziu drasticamente os níveis dos rios que alimentam as hidrelétricas. Preocupado em ajudar financeiramente os aliados latino-americanos, o governo Chávez deixou de investir em novas usinas. E as companhias do setor elétrico, sob a praga da gestão chavista, tiveram queda na produção por falta de manutenção, corrupção e aumento escandaloso do número de funcionários. A crise foi tão grave que paralisou vários setores da economia e obrigou o governo a declarar estado de emergência no país.
Para contornar a situação, Chávez propôs o "banho socialista" de três minutos, pediu para os venezuelanos usarem lanternas para ir ao banheiro no meio da madrugada e exortou as grandes empresas a gerar sua própria eletricidade. Em 2012, Chávez reconheceu que a Venezuela ainda sofria com problemas elétricos, mas disse que, se não tivesse chegado ao poder em 1999, o país se iluminaria com lanternas e cozinharia com lenha.
O fato é que ainda hoje apagões são registrados em todo o país. O discurso de Nicolás Maduro agora é colocar a culpa nos "inimigos da pátria", que estariam sabotando o sistema de energia. Na reta final da campanha, o governista acusou a oposição a planejar um grande apagão e ordenou que as estações elétricas fossem ocupadas por militares.

6) Exportação do bolivarianismo
Boa parte dos recursos do petróleo venezuelano foi usada por Chávez para comprar aliados na região e ampliar o alcance de sua 'revolução bolivariana'. O maior beneficiário é Cuba, cuja mesada vinda dos cofres venezuelanos equivale a 22% do PIB - a ilha foi o destino do coronel ao longo de todo o tratamento contra o câncer e a oposição venezuelana denuncia a interferência dos irmãos Castro na política do país. Chávez também abasteceu o caixa de campanha de candidatos presidenciais populistas na América Latina e Central, como Cristina Kirchner, na Argentina, Evo Morales, na Bolívia, e  Daniel Ortega, na Nicarágua. Na última semana, o principal candidato opositor às eleições presidenciais, Henrique Capriles, afirmou que a Argentina deve 13 bilhões de dólares ao país pelos convênios para envio de petróleo.

7) Endividamento estatal
Durante a era Chávez, o endividamento do governo subiu de 37% para 51% do PIB. A dívida pública externa oficial está em 107 bilhões de dólares, sem contar a dívida da PDVSA com fornecedores e sócios e os débitos do governo com empresas expropriadas. No total, a conta deve chegar a 140 bilhões de dólares, um grande desafio ao próximo presidente venezuelano, seja de que lado ele estiver.

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