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segunda-feira, 12 de agosto de 2013

"Inflação no centro da meta, só em 2015", diz Almeida (sim, mas nao sou eu; e' o Mansueto)

Entrevista


"Inflação no centro da meta, só em 2015", diz Almeida


Eliane Velloso, Edla Lula e Paulo Henrique de Noronha
Brasil Econômico12/08/2013
"Tanto este ano quanto no próximo as expectativas para a inflação estão girando em torno de 5,8% ou 6%", diz Mansueto Almeida.

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O pesquisador e economista do IPEA, Mansueto Almeida, traça um cenário sombrio para a economia brasileira.

Semana passada, quando a presidente Dilma Rousseff comemorou o resultado do IPCA de julho dizendo que "a inflação está sob controle", Mansueto Almeida, economista e pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), postou em seu blog: "Quem fala isso, é porque não entende de economia e/ou não olhou os dados".
Duro crítico da política econômica oficial, que usa regularmente a internet para expor suas conclusões, Mansueto, que é PhD em Políticas Públicas pelo prestigiado Massachussets Institute of Technology (MIT), enumera, nesta entrevista ao Brasil Econômico, uma série de erros que o governo vem cometendo na economia - a começar por sua comunicação.
Ele lembra que no final do ano passado, na hora de explicar as medidas para reverter o superávit fiscal e o PIB abaixo da meta, "todo mundo do governo desapareceu, a sociedade ficou sem saber o que eram aquelas medidas". Mansueto traça um cenário sombrio para a economia brasileira, dizendo que o governo fez apostas erradas.
Está preocupado, por exemplo, com o excesso de subsídios e desonerações, que um dia terão que ser pagos - "não tem almoço grátis". E diz que, se em 2014 o dólar chegar a R$ 2,40, a Petrobras terá que reajustar o preço dos combustíveis.
"Quem ganhar a eleição no próximo ano, logo após assumir, terá uma agenda muito difícil. O ano de 2015 será de ajustes, não será possível ficar fazendo mais do mesmo", prevê, acrescentando que trazer a inflação para a meta será tarefa para o novo governo, em 2015.
O senhor é um crítico ácido e frequente da política econômica oficial. Afinal, o que está errado?
Há um conjunto de coisas erradas. O governo fez algumas apostas, de que o crescimento no país iria retornar e a taxa de investimento aumentar, baseado em políticas como o direcionamento de créditos para alguns segmentos, mais subsídios para determinados tipos de investimentos, e algumas desonerações tributárias mais específicas para setores diferentes. Uma série de coisas que poderiam ter dado certo, mas que de fato não entregaram o resultado esperado.
Com o tempo, os investidores externos e domésticos foram ficando apreensivos e perdendo a confiança no potencial de crescimento da economia brasileira. Além disso, alguns indicadores pioraram muito. Nossa taxa de investimento hoje é de 18% do Produto Interno Bruto (PIB) e há um déficit em conta corrente que caminha para 4% do PIB.
Nossa economia fiscal, no início deste governo, era de 3,1% do PIB e agora o superávit caminha para metade disso. Então, há uma série de indicadores que, na margem, pioraram. Há uma incerteza muito grande em relação ao futuro da economia brasileira e as medidas do governo para tentar solucionar não estão sendo muito efetivas, não trazem o benefício esperado. O mais grave é o problema de comunicação do governo com a sociedade e o mercado. Essa falta de transparência não era necessária.
Em que medida esta falta de transparência em relação às contas públicas interfere na performance da economia brasileira?
Isso cria uma série de incertezas desnecessárias. Um exemplo bom é o resultado fiscal do ano passado. Em agosto ou setembro já se sabia que o crescimento seria ruim, que o governo não teria condições de cumprir a meta de superávit primário. Mas em vez de fazer aquilo que fez em 2009, quando claramente mostrou que não seria possível cumprir a meta e reduzi-la, o governo optou, na última semana do ano, na véspera de um feriado, por adotar uma série de medidas.
Todo mundo do governo desapareceu para dar explicações sobre o que estava acontecendo. A sociedade ficou sem saber o que eram aquelas medidas, tomadas apenas para cumprir a meta do superávit primário. Esse tipo de ação sem transparência e sem uma comunicação efetiva com a sociedade é muito ruim para a credibilidade da política econômica.
Quando começou a se deteriorar essa comunicação?
Em meados do ano passado. Tivemos dois movimentos simultâneos. Piorou a interlocução do Ministério da Fazenda com o Banco Central e piorou a comunicação da equipe econômica com a sociedade e com o mercado. No momento em que a gente teve frustração na expectativa de crescimento econômico, o Ministério da Fazenda começou a adotar um tom mais otimista na tentativa de reverter as expectativas pessimistas.
Mas esse tom otimista fez com que o diagnóstico da equipe econômica se distanciasse cada vez mais do diagnóstico do mercado financeiro e dos analistas independentes. Aí começou um diálogo entre cegos e mudos. Analistas qui e lá fora estavam muito preocupados e apreensivos com os rumos da economia brasileira e, de outro lado, havia a convicção externada por membros da equipe econômica de que as coisas estavam caminhando na direção correta e que o crescimento iria voltar. Parecia até que analistas e governo estavam vivendo em mundos paralelos...
Será que o governo foi pego de surpresa por essa mudança de cenário e, sem saber o que responder, se retraiu?
Talvez seja um pouco disso. Falar pelo governo é sempre muito delicado, mas faz parte do jogo. Mesmo quando a situação está ruim, os policy makers (elaboradores de políticas) têm que tentar mostrar que conhecem a situação, que estão a par dos problemas e que estão adotando as medidas adequadas.
Na realidade, isso nunca foi feito de forma muito clara no ano passado. E foi piorando com o passar do tempo. Talvez porque parte da equipe econômica tivesse incertezas e não queria externar, e acabou se retraindo. Isso dificultou até o anúncio da agenda positiva do governo. As concessões são um bom exemplo. Quando se tem incertezas, a posição do mercado e dos investidores é sempre se retrair e esperar a poeira baixar.
O senhor comunga da ideia de que o governo abandonou o tripé macroeconômico de câmbio flutuante, meta de inflação e superávit primário?
Não diria que abandonou, mas tenho convicção de que a gestão do tripé macroeconômico piorou bastante, especialmente na questão fiscal e nas metas de inflação. Nos últimos cinco anos, com exceção de 2009, a inflação vem ficando próxima a 6% ao ano. Antes, quando a inflação esperada para o ano seguinte se distanciava da meta, o Banco Central (BC) tomava medidas para aproximar a taxa para o centro.
Nos últimos anos, isso não ocorreu. Ninguém acreditava que o BC iria tomar as medidas necessárias para trazer a inflação para o centro da meta. E quando isso ocorre num mercado de trabalho aquecido, você causa um problema, porque as pessoas vão demandar reajustes salariais baseados não no centro da meta, mas numa taxa de 6%. O custo disso é muito alto.
O último dado de inflação (variação do IPCA em apenas 0,03% em julho), que é muito bom, eu diria que é um ponto fora da curva. Os preços livres nos últimos meses estão rodando a 8% ao ano. O que trouxe a inflação para baixo foi o preço administrado. Combustível, tarifa de transporte urbano. São coisas que conseguem segurar por algum tempo, mas não por muito tempo.
A última vez que teve aumento de tarifa de transportes em São Paulo foi em 2011. Ano passado não teve, este ano não teve, próximo ano é eleitoral, provavelmente não terá. Mas em algum momento vai ter que reajustar, ou vai causar um prejuízo brutal para o setor privado. Você tem hoje um fato novo que é a desvalorização do real. E isso também contribui para aumentar um pouco a inflação.
E qual é a sua expectativa de inflação?
Tanto este ano quanto no próximo as expectativas estão girando em torno de 5,8% ou 6%. Ninguém espera que a inflação vá voltar para o centro da meta nem este ano, nem no próximo. Essa é uma agenda que ficou para o próximo governo.
O governo tem demonstrado uma tendência de recorrer a subsídios para segurar as tarifas controladas. Essa política é sustentável?
Tudo isso tem um custo. E nada é sustentável. Uma das primeiras coisas que a gente aprende no curso de Economia é que não existe almoço de graça. O governo vai ter que pagar de alguma forma o empresário que tem a concessão pública e a única forma de pagar é com recursos públicos. Ele vai ter que pegar esse dinheiro que estava planejando gastar em outro serviço público e vai jogar no transporte para cobrir o prejuízo que os empresários estão tendo, porque não puderam aumentar tarifas.
Ano passado o governo fez o descasamento entre o preço internacional do petróleo e o preço vendido aqui no mercado doméstico. A fórmula era permitir que parte da Cide fosse direcionada para a Petrobras. A gente não tem mais essa opção. Se o câmbio continuar em R$ 2,30 e eventualmente for para R$ 2,40 em 2014, a Petrobras vai ter que reajustar o combustível, em um ano de eleições.
O que acha de alterar a Lei de Responsabilidade Fiscal para se investir em mobilidade urbana?
Não se deve mudar a lei. Devese analisar cada caso e discutir no Senado no âmbito da Comissão de Assuntos Econômicos. Aumentar o endividamento faria sentido se fizesse parte de uma rediscussão do pacto federativo. O que as pessoas esquecem é que a carga tributária no Brasil é muito elevada, é 36% do PIB para um país de renda média em torno de US$ 10.500 - é a maior carga tributária do mundo para países com nosso nível de desenvolvimento.
Não vamos resolver nossos problemas aumentando a carga para 45% do PIB. Mas quando a gente olha todas as propostas em discussão - aumentar recursos para a saúde, para a educação, investir em mobilidade - se somar tudo, a gente vai caminhar para uma carga de 45% do PIB. Será necessário definir o que é prioritário, o que deve ser subsidiado, o que deve ser cobrado e fazer o investimento correspondente.
Relatórios de bancos estrangeiros estão considerando o mau humor do mercado com relação ao Brasil... isso afeta os investimentos externos?
O investimento estrangeiro direto continua em um nível muito elevado, o dinheiro continua entrando até porque, com o dólar elevado, ficou mais barato investir aqui. Por outro lado, como aumentou a incerteza do investidor, ele cada vez mais vai exigir uma taxa de retorno maior. O aumento de incertezas é que torna os investimentos mais caros.
Outro problema é que como estamos entre os cinco maiores destinos de investimento externo nos últimos três anos, esse movimento se direciona para o setor extrativo (mineração ou petróleo e gás) ou de serviços, não torna o Brasil uma economia mais exportadora. O segundo ponto é que a captação de dinheiro lá fora é importante para empresas e para bancos domésticos e isso vai ficar cada vez mais difícil nesse cenário de incertezas.
O governo errou ao adotar medidas como as desonerações?
O governo falhou em várias coisas. O Brasil era um país que, depois da redemocratização, adotou várias reformas, que continuaram até o primeiro mandato de Lula. Mas a partir de 2006 essa agenda ficou esquecida, parou, e não houve mais mudanças institucionais. Houve apenas a criação do fundo de previdência dos servidores públicos. As outras reformas foram muito tímidas.
Há uma agenda longa de redução do custo Brasil: cortar impostos, aumentar investimento público, facilitar a abertura e encerramento de empresas. Todo investimento na área de portos, rodovias e ferrovias demorou muito. Quando se pega qualquer comparação internacional, a qualidade de nossa infraestrutura é sempremal avaliada.
Isso tem relação também com a regulação: o número de impostos e o tempo que o empresário gasta para cumprir a legislação tributária fiscal. Há estudos antigos mostrando que esse é um problema grave e que a gente não avançou em praticamente nada nos últimos seis anos.
E a indústria? Está realmente patinando?
Até 2008 havia um crescimento de vendas e a indústria acompanhava esse movimento. A partir dali, surgiu um mundo diferente, com excesso de produtos manufaturados no restante do mundo. E descobriu-se que o custo de produção no Brasil é muito caro. Seja para produzir algo intensivo em trabalho, como sapato, seja para produzir máquinas e equipamentos.
Quando é para produzir algo intensivo em trabalho, como nas indústrias de confecção, calçados e brinquedos, a gente não consegue concorrer com os asiáticos, que têm o custo da mão de obra muito mais barato que o Brasil. Por exemplo, em Bangladesh, o salário mínimo é de US$ 37 e o país exporta US$ 20 bilhões em confecções.
Já na indústria de máquinas e equipamentos, o problema é que não temos a produtividade e nem a tecnologia para concorrer com Japão, Alemanha ou Estados Unidos. A indústria está atrás de descobrir qual é o nicho em que ela vai ser competitiva. O que vemos é que a indústria vai perder participação no PIB. O Brasil falhou na agenda de produtividade, não vem crescendo como deveria.
Ou seja, a indústria terá que se segurar com o mercado interno...
Nem isso. Antigamente o que salvava a indústria era o mercado doméstico. Mas num país em que você tem excesso de produtos manufaturados mais baratos, o varejo importa. A indústria hoje está bastante preocupada, tomando várias medidas para aumentar a produtividade e ter uma estrutura de custo enxuta para ser competitiva. Mas esse é um cenário que a gente não sabe bem como vai evoluir.
Aumentar imposto de importação é uma saída?
Do ponto de vista de proteger a indústria faz sentido,mas é preciso perguntar se o consumidor e o eleitor querem isso. Por que o eleitor votou no governo atual e no governo passado? Porque ele teve um ganho de renda brutal. Todas as análises dos últimos dez anos mostram isso e ninguém pode ir contra os dados. A desigualdade de renda diminuiu. As pessoas premiaram o governo nas eleições porque tiveram acesso maior a crédito, ganho de renda real, puderam comprar eletrodomésticos.
Mas qual seria o caminho?
Há duas agendas. A da indústria é ter que investir mais em inovação e melhorar a gestão da empresa. No Brasil, há uma diferença muito grande na gestão de empresas do mesmo setor. E tem a agenda governamental, que não depende muito dos empresários.
Um ponto é diminuir o número de impostos. Uma empresa pequena, tanto faz ter dois, quatro ou dez funcionários, se ela não estiver no Simples, terá que contratar um contador, pois o empresário não conhece a legislação. O custo que vai pagar para levar o produto ao porto e quanto tempo vai levar para exportar é um problema que não depende do empresário, depende de haver boas estradas e portos eficientes.
E o BNDES?
O BNDES é um banco que, sem ajuda nenhuma do Tesouro, tem capacidade de empréstimo anual perto de R$ 100 bilhões. É um valor muito alto em qualquer lugar do mundo. Mas nos últimos cinco anos o governo começou a aumentar seu endividamento para dar recursos ao BNDES. Isso talvez fosse necessário em 2009, quando houve a crise.
Mas muito do que se fez foi desnecessário. O aumento do endividamento foi muito rápido e numa magnitude grande. O total de empréstimos do Tesouro para bancos públicos no final de 2007 era de R$ 14 bilhões, o equivalente a 0,4% do PIB. O último dado, de junho, mostra o total de empréstimos para bancos públicos em R$ 438 bilhões, equivalente a 9,6% do PIB. Saímos de 0,4% para 9,6%.
Parte era necessário, mas parte não. Como empréstimos ou parcerias com empresas privadas muito boas, que poderiam pegar recursos com bancos privados. Comparando, um dos programas sociais que todos reconhecem que funciona no Brasil, o Bolsa Família, favorece 40 milhões de pessoas e custa 0,5% do PIB.
E a participação dos bancos comerciais na oferta de crédito?
Os bancos públicos tiveram uma ampliação muito grande da oferta de crédito em 2009 e isso fez sentido porque havia uma retração enorme por parte dos bancos privados. Depois é que não fez muito sentido. Em 2011 e 2012 houve a redução forçada dos juros nos bancos públicos, o governo teve sucesso nisso, porque havia excesso de liquidez no mercado internacional. Os bancos públicos expandiram muito os empréstimos porque usam recursos subsidiados. Eu receio que tenha havido exagero na expansão desse tipo de empréstimo dos bancos públicos.
O Brasil pode reduzir os juros e também os bancos puderam reduzir os juros de forma relativamente rápida, mas era visível que aquilo não seria sustentável. Se você olhar os balanços que estão saindo dos bancos privados, apesar de eles terem reduzido a concessão dos empréstimos, a oferta de créditos continua aumentando, só que numa velocidade menor que a dos bancos públicos. O lucro dos bancos privados cresce - então eles estão fazendo corretamente.
É bom ter banco público, é bom ter competição. Mas tem que ter cuidado para não quebrar o banco público. Não se pode forçar os bancos a determinados tipos de políticas que eles não vão ter condições de cumprir. A gente fez isso nos anos 70 e 80 e deu no que deu.
A política de estímulo ao consumo se esgotou?
Claramente, sim. A economia está crescendo muito menos e, embora o nível de desemprego esteja baixo, o risco de desemprego aumentou e a renda real não está crescendo tão forte quanto antes. E o consumidor está mais endividado. Ninguém sabe como tudo isso vai evoluir, mas o consumidor está apreensivo.
Só com a expectativa de mudanças na política monetária dos EUA, o dólar chegou a R$ 2,30. Quando os EUA de fato iniciarem essa política, o que vai impactar efetivamente no Brasil?
Se eles aumentarem um pouquinho a taxa de juros, que o mercado esperava mais para 2015, isso claramente afeta o fluxo de capital para países emergentes. Significa que a gente terá um câmbio muito mais desvalorizado e taxas de juros maiores. Câmbio desvalorizado ajuda a indústria, mas também deixa mais caro vários insumos. E taxas de juros maiores afetam o crédito para consumo e capital de giro.
O que vai acontecer nos próximos anos ainda é uma incerteza muito grande, mas eu diria até que os EUA não se recuperando de forma muito rápida é melhor para o Brasil no curto prazo. E no longo prazo é muito bom ter uma economia norte-americana mais forte. Só que isso vai exigir um dever de casa do brasileiro. Se a recuperação for mais rápida do que todo mundo espera, no curto prazo o Brasil vai sentir isso em juros, em câmbio e em fuga de capitais. O problema é que todos os analistas mostram que o cenário de crescimento que havia até 2008 não vai se repetir nas próximas duas décadas.
E a gente tem um problema adicional. Com a taxa de desemprego muito baixa, é mais difícil conseguir mão de obra qualificada. Hoje, a agenda de crescimento da produtividade para o Brasil é ainda mais importante do que era dez anos atrás. Naquela época, quando começou o ciclo recente de crescimento, que foi até 2010, se partiu de uma economia com desemprego em 12%. Agora, a taxa é de 6% e passamos por mudanças demográficas rápidas. Para crescer, será preciso fazer uma série de reformas e aumentar a produtividade. Não dá para apenas comprar mais máquinas e dar emprego, porque não vai ter mão de obra.
E o orçamento federal?
Ninguém dá muita bola para o orçamento no Brasil, quando na verdade deveria ser a votação mais importante do ano. Há alguns problemas. Primeiro, grande parte dos subsídios no Brasil não passa pelo orçamento, a sociedade não tem dimensão do volume de subsídio concedido e nem se discute quem está recebendo esse subsídio.
Outro grande problema é que o governo não faz o debate do que é prioritário, deixa os deputados e senadores fazerem várias emendas. O orçamento sai do Congresso com um volume de investimento muito acima do que você sabe que terá capacidade de executar. E, logo no início do ano, se faz o contingenciamento. Aí, antes e depois de votações importantes ao longo do ano, o governo negocia com sua base quais emendas vai executar, ou não.
E se mudar para o orçamento impositivo?
Do ponto de vista da economia, não vai acontecer nada. Porque um governo que quer gastar muito e é premiado pela sociedade para gastar muito, vai continuar gastando muito. Mas muda a relação entre o Congresso e o Executivo. Se o orçamento impositivo passar, o governo vai ter que executar o que for aprovado. Então a base de negociação entre governo e Congresso passa a se dar na discussão orçamentária. E aí o poder de barganha passa das mãos do Executivo para o Legislativo. O problema é mais político do que econômico.
Qual sua expectativa para a economia brasileira em 2014?
A gente vai ficar em banho-maria, com alguma agenda positiva na área de concessões, como o leilão dos campos do pré-sal. Quem quer que ganhe a eleição no próximo ano, logo depois da eleição vai ter uma agenda muito difícil. O ano de 2015 vai ser um ano de ajustes, não será possível ficar fazendo mais do mesmo. Nos últimos dez anos, a economia cresceu, a pobreza caiu, as desigualdades diminuíram. Mas há muitas outras coisas que não podem mais ser feitas. Por exemplo, o próximo governo deve colocar para a sociedade a rediscussão do cálculo do reajuste do salário mínimo.
Há uma discussão no mercado sobre o fim do "prazo de validade" do ministro Guido Mantega e da equipe econômica. Qual a sua avaliação?
Eu até entendo essa apreensão do mercado. Mas o ministro da Fazenda, apesar das críticas que se possa ter à atuação dele, é uma pessoa simpática e que cumpre ordens. Quando o Mantega foi presidente do BNDES, não havia esses megaempréstimos do Tesouro para o banco. Mas isso não é o ministro da Fazenda, é uma equipe de Fazenda, com o consentimento do presidente da República.
Agora, depois da eleição de 2014, a agenda para qualquer que seja o governo vai exigir uma atuação diferente do que fez a equipe econômica que está aí. Essa é uma equipe muito boa para expandir crédito público, conceder crédito subsidiado num momento em que o problema do Brasil era de falta de demanda. Mas esse não é mais o problema do Brasil. Hoje o problema do Brasil está ligado a questões de oferta.

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