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sábado, 25 de janeiro de 2014

Brasil, Argentina, EUA, China, etc: dados quantitativos, e uma avaliação qualitativa

Fica difícil discutir quaisquer problemas, sejam eles econômicos ou de outra natureza, sem referir-se a dados objetivos, que possam ser, em primeiro lugar quantificados, que sejam mensuráveis segundo metodologias homogêneas e que, portanto, possam ser comparados entre si. Podemos ir a Davos, por exemplo, e recitar toda uma litania de bons propósitos e belos argumentos, sem referir-se a dados concretos, de conjuntura, de tendências, de estrutura. Por isso, de vez em quando é bom dar uma olhada nos dados e ver o que eles nos revelam, ou deixam de revelar.
Estes daqui, por exemplo, retirados de um número anterior da revista Economist. Vejamos o que eles nos dizem:


 Pelo que se percebe,  o crescimento na China permanece relativamente alto, embora com tendência a arrefecer, e de toda forma bem mais modesto do que as cifras nas casas de dois dígitos a que nos acostumamos nos últimos anos. O crescimento na Argentina aparentemente é vigoroso, mas vejam que a produção industrial caiu quase 5% no último ano, e que as transações correntes também apresentam deterioração sensível. Os Estados Unidos, a despeito de um crescimento global mais modesto, vem tendo uma recuperação industrial mais vigorosa do que no Brasil. A França, por sua vez, cresce muito pouco, ou quase nada, e tem uma produção industrial estagnada. A Índia também, a despeito de um crescimento razoável, provavelmente impulsionado pelos serviços, vem tendo seu crescimento industrial em recuo, com dados negativos para 2013. A China é de todos os países o que mais cresce no plano industrial, embora os dados mais recentes já revelem também uma queda na dinâmica industrial.

Na frente dos preços, reparem que a Venezuela é o destoante absoluto, seguida pela Argentina, mas a Economist deixou de publicar os seus dados (e o FMI já reclamou várias vezes) porque eles não são confiáveis; devem andar pela casa dos 30% anuais, talvez mais agora, com a desvalorização abrupta do peso, que já perdeu mais de 23% neste mês de janeiro de 2014. A Índia e a Turquia não fazem melhor, mas o Brasil vem logo atrás, numa taxa que é mais do que o triplo dos demais países emergentes, e praticamente quatro vezes mais do que os países ricos.

Déficits de transações correntes são correntes, se ouso dizer, em quase todos os países, com algumas exceções notáveis, entre eles China e Alemanha (esta absurdamente superavitária para o gosto dos demais parceiros europeus). Superávits podem ter, por exemplo, exportadores de petróleo (Arábia Saudita, Noruega, Rússia), ou então grandes países exportadores (Taiwan, por exemplo) ou centros financeiros como Suíça, Cingapura. Os demais conhecem pequenos déficits, financiáveis com investimentos diretos. No caso dos EUA, mesmo um déficit que seria mortal para países como Argentina, México ou Brasil, o problema é mais do que compensado por dois fatores: confiança do mundo em sua economia e na menor interferência do governo, o que atrai investimentos diretos e mesmo aplicações financeiras, e capacidade de "exportar" parte de seus problemas para o resto do mundo, via emissão de dólares. No caso da Argentina, parece ser modesto, mas ele se acelerou nos últimos meses, e é muito provável que já tenha passado de 4% do PIB (mas a desvalorização acaba corrigindo esse tipo de problema, que é o que vai ocorrer no caso do Brasil).  

Finalmente, o déficit orçamentário e os juros pagos pelos bônus governamentais são outros indicadores importantes, mas aqui é preciso igualmente especificar o que está por trás deles. O Japão, por exemplo, que tem um enorme déficit, consegue se financiar internamente, a uma taxa mais do que razoável, ao passo que o Brasil, que tem um déficit que poderia ser modesto, este consome uma parte absurdamente mais elevada das receitas públicas, pelo nível de juros. Eles não se comparam a nenhum outro, e somos de fato campeões mundiais nesse quesito, sendo seguidos de perto pelo Paquistão (12%) e depois pela Turquia (a mais de 10%). Reparem que mesmo na área do euro, a França é obrigada a pagar juros bem maiores do que a Alemanha, que fica na média da zona do euro.

Esta é a apreciação quantitativa, que é um retrato, apenas, dos efeitos provocados por políticas econômicas diferentes, algumas moderadamente corrretoras de desequilíbrios, outras induzindo a esses desqeuilíbrios.
A França, por exemplo, depois de quase dois anos de resultados negativos (com o desemprego já em 11% e ainda crescendo), resolveu inverter suas políticas anti-austeridade. Parece que o presidente François Hollande, finalmente, se rendeu à lei de Say, ou seja, a oferta cria a sua própria demanda. Ele vai começar a atuar do lado da produção, e não mais pelo lado do consumo (isto é, salários e outras compensações).
Quando é que o Brasil vai fazer o mesmo?

Finalmente, ainda pelo lado qualitativo, eu observo uma gradual deterioração da qualidade das políticas públicas em diversos países, avançados e ditos em desenvolvimento. No caso do Brasil, parece que os homens públicos não conseguem ler os sinais do mundo real, e continuam insistindo em políticas erradas.
Quando eu ouço, então, a rádio brasileira, e leio as muitas notícias, eu fico mais preocupado ainda, ao constatar a indigência intelectual de alguns argumentos. Se formos descer, sem pretender, ao nível do chamado "povinho miúdo", com essas manifestações ridículas que ocorrem em várias cidades, a constatação é de uma tristeza só: o atraso mental, em certas pessoas, é realmente muito grande. Bem, não é por outra razão que temos dirigentes como os nossos...

Paulo Roberto de Almeida 
Hartford, 25 de janeiro de 2014

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