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terça-feira, 18 de março de 2014

Politica economica: entrevistas com economistas, 2 - Blog MansuetoAlmeida

Debate na Revista Época Negócios -2

Neste post, completo minhas impressões das dez entrevistas da revista Época Negócios com economistas de diferentes visões.
(6) Otaviano Canuto: gosto muito do Otaviano por vários motivos, dentre os quais, ele sabe escutar e debater de forma extremamente elegante. Otaviano coloca corretamente que o principal desafio para o próximo governo é revisitar o gasto público, i.e. reduzir o crescimento da despesa não financeira. Se isso não for feito, o equilíbrio virá pelo aumento da carga tributária; exatamente o mesmo ponto destacado pelo economista Samuel Pessôa.
Canuto destaca o problema da burocracia de pagar impostos no Brasil que, segundo o Banco Mundial, exige 2,6 mil homens-hora por ano. Assim, da mesma forma que Samuel, Canuto mostra que reduzir o número de impostos e a burocracia no pagamento de impostos aumentaria a eficiência das empresas.
Canuto não avança muito sobre quais gastos do setor público deveriam ser controlados, mas corretamente aponta para um amplo levantamento da eficácia das políticas públicas. Como ele fala, “há no gasto público direitos conquistados, benesses resultado de intervenções no passado que não são mais justificáveis”. Para bom entendedor meia palavra basta.
(7) Luiz Carlos Mendonça de Barros: o economista mostra a complementariedade entre os governos FHC e Lula. Um vez as reformas necessárias para o Brasil crescer e o outro deu continuidade a política econômica e ampliou os programas de transferência de renda. O resultado foi uma década de crescimento inclusivo, com o apoio do boom das commodities.
O economista mostra que o governo Dilma errou no diagnóstico do problema de crescimento do Brasil, ao incentivar a demanda quando o problema não era mais escassez de demanda. Fala que a “turma do governo” por um tempo agrediu o setor privado, mas que no período recente houve algum aprendizado, como é o caso da política de concessões. Critica também a política fiscal expansionista do governo que, na sua visão, atrapalha a tarefa do Banco Central de reduzir a inflação.
Um dos grandes equívocos da entrevista do economista é falar que o senador Aécio Neves fala através do Samuel Pessôa: reduzir salários, fazer reforma, etc. Nunca escutei algo do tipo “reduzir salários”. Mas a preocupação do economista reflete bem algo que escutei recentemente de político já aposentado: “há um programa para ganhar eleição e há outro para governar”. Será que não há como ser mais honesto com o eleitor? É isso que a sociedade de fato quer? Ótimo, então vamos discutir princípios gerais na eleição e esquecer programas de governo. Mas acho que os jornalistas não aceitarão.
No mais, outro equivoco do economista e de muitos outras pessoas é afirmar que reformas são sempre ruins e impopulares. A única forma de manter a conquista da classe média não é com mais subsídios, mas sim com o controle do crescimento do gasto, o que exigirá mudanças de regras (reformas), para que não haja um novo aumento de carga tributária. O economista fala que facilmente se recompõe o superávit primário no Brasil. Sim, com aumento de carga tributária e reversão das desonerações; mas não sei se isso é fácil como ele Mendonça de Barros afirma.
(8) Paulo Rabelo de Castro: achei a entrevista um pouco confusa e parte de um pressuposto, equivocado, que o grande problema do crescimento do gasto público está ligado a um problema de gestão. Isso não é verdade para o Governo Central. De 1999 a 2013, mais de 80% do crescimento da despesa não financeira do Governo Central decorre dos programas de transferência de renda e previdência. Poderia chamar o melhor gestor do mundo e com as regras atuais ele não poderia fazer absolutamente nada.
Confesso que não entendo quando o economista fala que o mercado bate palmas para a política econômica e para o desequilíbrio macroeconômico. Não conheço ninguém no mercado que “bate palmas para a política econômica”. Todos xingam, principalmente em ambientes fechados.
O economista critica a ênfase no aumento do primário que, segundo ele, quanto maior pior. Como assim? Ele está propondo superávit primário “zero”? aumento da dívida pública? É essa a proposta do economista Paulo Rabello de Castro?  Não, parece que ele está criticando o aumento do primário via aumento de impostos quando o caminho deveria ser cortar o gasto.
OK, entendi. Mas cortar quais gastos? Bom, o economista fala que a despesa corrente do governo está descontrolada mas não fala exatamente “qual despesa corrente”. Passa a impressão que um choque de gestão resolve tudo e critica o senador Aécio por não falar como vai reduzir a despesa com juros do setor público para em seguida falar que o governo Dilma tentou reduzir os juros de forma voluntariosa e errou. Mas esse é o debate.
O Brasil só conseguirá reduzir juros com um superávit primário maior que reduza de forma mais rápida a divida bruta e líquida e é falacioso achar que o aumento do superávit primário virá integralmente de corte de gastos. Isso é impossível no curto prazo a não ser com um corte brutal dos gastos sociais. É esta a proposta de ajuste do economista?
Da mesma forma que o economista Bresser Pereira, Paulo Rabelo de Castro não acredita que nenhum dos candidatos tenha coragem de implementar o que ele defende. E o mais irônico é que tanto ele quando Bresser não concordam entre si, ou seja, não daria para eles se unirem e formarem um novo partido.
(9) Luiz Gonzaga Belluzzo: Bem no estilo Belluzzo fala que a indústria brasileira saiu derrotada nos últimos 35 anos e que adotamos políticas macroeconômicas ilusórias baseadas na valorização da taxa de câmbio e abertura da economia. Levando essa critica ao pé da letra, o ex-presidente Lula para ele foi tão ruim quanto os demais ao permitir a valorização do Real, que atrapalhou a indústria.
Esse é o problema dialético dessa turma: querem elogiar o presidente Lula mas têm vergonha da política econômica do presidente Lula baseado na expansão dos gastos sociais e do consumo com a valorização do Real. Eles queriam um Lula que tivesse olhado com amor para indústria com taxa de câmbio mais desvalorizada  e ampliado as políticas de transferência de renda e o consumo – uma combinação de políticas contraditórias. Exaltam a democracia mas sempre citam a política industrial da China como modelo.
Corretamente, o professor Belluzzo fica incomodado com o pouco esforço inovador do empresariado brasileiro. Por que será? Talvez porque não precise ser tão inovador dado o nível de proteção que temos. Mas ele tem razão quando fala da necessidade de incentivos à inovação a fundo perdido – todo mundo concorda.
O professor escorrega quando parte para afirmações vagas quando é questionado sobre inflação e diz que não vai entrar no fetichismo dos números. Pelo santo Deus o que é isso? Diz que a inflação não pode sair do controle, mas parece mostrar um certo saudosismo do crescimento com inflação de 10% ao ano!! Mas pelo menos reconhece a necessidade de um ajuste fiscal, embora não diga como fazê-lo.
Por fim, diz que não vê consistência nos candidatos da oposição e externa a esperança que a presidente Dilma seja “mais política e menos operacional”. O que isso significa? Será que o professor reprova a atuação de nossa presidenta como economista?
(10) João Paulo dos Reis Velloso: Tenho um grande respeito pelo ex-ministro João Paulo dos Reis Velloso e por continuar participando ativamente do debate econômico. Fala que no Brasil de hoje não temos uma visão estratégica e que há uma preocupação excessiva com o curto-prazo. É verdade.
Apesar de o seu foco em planejamento e no longo prazo, fala que temos problemas macroeconômicos e que a área fiscal está sendo mal conduzida. Acredita que qualquer um dos candidatos pode fazer as reformas necessárias, i.e. construir um plano estratégico de crescimento desde que haja vontade.
Comete um deslize ao ligar o problema do gasto público e o baixo investimento com o número de ministérios. O seu irmão Raul Velloso mostra como outros analistas que o que pesa são as transferências para famílias. Assim, fechar ministérios ajuda, dá um sinal positivo de austeridade, mas não resolve o problema. No mais, defende uma reforma trabalhista, algo que nenhum dos outros economistas falou.
Minhas considerações finais
O esforço da revista foi muito bom e, mais uma vez, gostaria de parabenizar os editores e os repórteres, dentre os quais José Paulo Kupfer, Cristiane Barbieri, Darcio Oliveira, David Cohen e Marcelo Cabral pelo trabalho.
Como já comentei antes, não vi ninguém elogiando a política macroeconômica do governo Dilma e notei que vários falam do resgate de credibilidade. A questão fiscal é minimizada por apenas dois dos dez economistas entrevistados: (1) Luiz Carlos Mendonça de Barros, que acredita ser fácil resolver o problema, e (2) Paulo Rabello de Castro que não aceita aumento do primário pelo aumento da receita.
Outros falam da importância de aumentar o primário mas não dizem como: (1) Reis Velloso, (2) Belluzzo, (3) Otaviano Canuto, (4) Bresser; (5) Delfim e (6) André Lara Resende.
Apenas dois entrevistados, Samuel Pessôa e Nelson Barbosa, são mais explícitos ao afirmar que há necessidade de controlar o crescimento dos gastos sociais, caso contrário, o equilíbrio virá exclusivamente pelo aumento da carga tributária. Coincidentemente ou não, os dois economistas conversam todas as segundas no IBRE-FGV.
Não podemos dizer que dessas entrevistas sai um modelo ou um novo modelo de desenvolvimento para o Brasil. Luiz Carlos Mendonça de Barros fala em manter as conquistas de FHC e Lula mas não fala como; Bresser tem um modelo analítico na cabeça mas falta um político que compre a ideia e um eleitor que olhe mais para o futuro do que para o presente; Belluzzo insiste na importância da indústria e da taxa de câmbio desvalorizada na linha do professor Bresser; mas não entra em detalhes para escapar do fetichismo dos números e nem explica como renegociar o contrato social.
No final, chega-se facilmente a uma conclusão. Os políticos parecem ter uma ideia melhor do que fazer e o que não fazer do que os economistas. No mais, ninguém fez menção a “nova matriz econômica” que, como já comentei antes, é uma agenda cada vez mais sem paternidade. Em algum momento teremos que fazer um teste de DNA.

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