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segunda-feira, 22 de setembro de 2014

O que está em jogo nestas eleições: alternância ou barbarie?


O que está em jogo nestas eleições:
Reflexões de circunstância e de alguma constância

Paulo Roberto de Almeida

Eleições, todas elas, são, majoritariamente, um retrato instantâneo da realidade em que se vive, e, num segundo plano, mas de forma inconsciente ou minimizada, uma projeção utópica do futuro que se deseja. Ou seja, se espera que políticos – mandatários ou representantes do povo – possam fazer pelos seus eleitores aquilo que gostaríamos que eles fizessem por nós, todos nós. Trata-se, portanto, de um reflexo da conjuntura em que se vive e de uma esperança depositada num cenário prospectivo, que se imagina ser melhor do que o atual.
Os militantes da causa, e os true believers (existe certa identidade entre as duas categorias), votam pelos chefes, pelas palavras de ordem que lhes são passadas e que eles incutem como obrigação pessoal, quaisquer que sejam a dita conjuntura e os cenários prospectivos que eles possam traçar individualmente: eles são obedientes e determinados, mas também são poucos, no conjunto dos eleitores e sozinhos não poderiam determinar um resultado eleitoral, a não ser marginalmente, ou em circunstâncias excepcionais. Na maior parte das vezes, eleições são o resultado da expressão majoritária de eleitores comuns, cidadãos trabalhadores, pessoas simples, que sempre fazem algum tipo de cálculo quanto à melhor representação de seus interesses.
Eleitores, em geral, mesmo os mais ignorantes e deseducados politicamente, votam de acordo com os seus interesses materiais, não de acordo com crenças abstratas, salvo aquela minoria de militantes disciplinados e de true believers, já mencionados.
A massa dos eleitores brasileiros é constituída por pessoas da baixa classe média e dos chamados estratos populares, ou seja, pessoas e famílias com renda não superior a 2,5 salários mínimos, que compram quase tudo pelo famoso sistema dos “dez vezes sem juros”, e que possuem uma educação elementar, talvez rústica, para empregar uma palavra neutra. Muitos integram aqueles analfabetos funcionais de que falam algumas pesquisas sobre a capacidade de leitura e compreensão (mínimas) de grande parte da população adulta (talvez mais de um terço). Mesmo os que completaram mais de um ciclo de estudos, não internalizaram de verdade sua educação formal, e retiram a maior parte de sua percepção do mundo dos meios audiovisuais de comunicação e de informação, que são os canais abertos de massa, rádios populares e, crescentemente, a internet. Todos eles possuem celulares, mesmo camponeses e garis de rua, e todos eles possuem uma compreensão razoável do que seja um político: um sujeito que está ali para tirar vantagens pessoais a cada quatro anos, mas que pode, eventualmente, trazer algum benefício ao eleitor e à sua família, geralmente um emprego no Estado, o asfalto, a iluminação pública, a saúde, a segurança.
Eleições são momentos de acordos tácitos entre os candidatos e os eleitores, os primeiros mentindo desbragadamente, os segundos fingindo que acreditam, mas esperando tirar mais vantagens do candidato A do que do candidato B.
As eleições brasileiras de 2014 não serão diferentes na forma e nas modalidades de suas predecessoras, com a distinção atual de que o partido hegemônico construiu uma formidável máquina eleitoral – graças ao uso indiscriminado e inescrupuloso de recursos públicos, legal e ilegalmente – e faz absoluta questão de continuar mantendo controle sobre o poder, de uma forma ou de outra (e provavelmente mais de outra do que de uma). Sendo um partido true believer, mas especificamente neobolchevique e não religioso – ou religioso à sua maneira –, ele acha que encarna os interesses populares, e que é o único capaz de transformar o Brasil à sua imagem e semelhança. O que seria isso?: idealmente, uma sociedade igualitária, voltada para a promoção social e a inclusão dos mais pobres na sociedade de consumo, junto com a limitação do que ele percebe serem as perversidades econômicas e as iniquidades sociais naturalmente vinculadas ao capitalismo. Eles acreditam sinceramente nisso, mas apenas os militantes da causa, e esta é a sua legitimação política aos olhos de seus eleitores potenciais.
Na prática, e de forma muito diferente da imagem idealizada, os oligarcas que dominam o partido, com a ajuda de apparatchiks profissionais – exatamente segundo o modelo bolchevique – constituem uma associação voltada exclusivamente aos seus interesses pessoais, e que não hesitam, e sobretudo não hesitarão, em usar quaisquer meios disponíveis para preservar e aumentar esse poder de que dispõem atualmente. Nesse sentido, eles correspondem etimologicamente ao que se poderia chamar de máfia, ou seja, uma entidade inescrupulosa voltada para a defesa exclusiva dos interesses dos oligarcas que a compõem, e para a expansão de sua riqueza e poder, de todos os tipos.
De fato, seu comportamento é o de uma máfia, mas que atua não exclusivamente pelo segredo e na clandestinidade, escondendo os seus crimes (o que eles também fazem, sem nenhuma hesitação). Como partido político, que é sua face mais visível, eles também atuam de forma aberta – embora não desprezem os meios ilegais quando necessário, e em outras circunstâncias também – e têm a missão de conquistar seus devotos mais fiéis, como uma igreja de true believers, enfim. Aparentemente, ele foram bem sucedidos, pois conseguiram criar um formidável curral eleitoral que responde pelo nome de Bolsa Família. É isso que torna estas eleições diferentes das precedentes.
O que está em jogo, portanto, nestas eleições, é a continuidade da máfia no poder, ou uma alternância eleitoral, o que se afigura difícil. A pequena educação política da população brasileira parece indicar que a máfia será bem sucedida em seu projeto de continuidade do poder. É isto que está em jogo em outubro de 2014.

Paulo Roberto de Almeida
Toronto, 21 de setembro de 2014

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