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quarta-feira, 19 de outubro de 2016

Grandes personalidades do seculo XX (para o bem e para o mal) - Paulo Roberto de Almeida



Paulo Roberto de Almeida

As personalidades mais relevantes no século XX, aquelas que provocaram o maior impacto político, intelectual, econômico e social na vida de milhões de habitantes do planeta, foram todas nascidas no século XIX. Minha lista, a seguir, é puramente indicativa, com mini-caracterizações a cada vez, mas sem maiores análises de conteúdo.
Três grandes pensadores mudaram nossa maneira de pensar o mundo: Karl Marx, Sigmund Freud e Albert Einstein. O primeiro morreu no próprio século XIX, mas seu maior impacto se deu no século XX, por meio de discípulos não exatamente filósofos sociais, como ele, mas revolucionários que conseguiram atrasar a economia de mercado, destruir países inteiros, e serem direta e indiretamente responsáveis pela morte de milhões de vítimas inocentes, a maior parte civis comuns. Freud tentou criar uma teoria científica do inconsciente: de certa forma conseguiu, mas seus discípulos bem menos dotados fizeram uma confusão tremenda na psicanálise, que hoje se divide entre freudianos ortodoxos e diversas outras correntes analíticas, desde os junguianos sensatos até os lacanianos indecifráveis. Einstein revolucionou as bases da física e da cosmologia, corrigindo Newton e abrindo novos caminhos para a pesquisa do universo.
O maior estadista do século XX era um imperialista decidido, Winston Churchill, que defendeu o império britânico até sua erosão inevitável, mas foi o homem que resistiu aos maiores tiranos do século XX, com destaque para Hitler. Foi ele quem alertou, desde o início, para os perigos do bolchevismo, sem sucesso porém, e para a ameaça terrível do hitlerismo, não apenas para o seu próprio país, mas para toda a humanidade, e isso desde o início, tendo ficado isolado durante muitos anos, até ser chamado na hora mais decisiva para a Grã-Bretanha, para a Europa e para o mundo. Ele não teria conseguido salvar o mundo de Hitler, contudo, se não fosse por Franklin Delano Roosevelt, um dos grandes (e poucos) estadistas dos Estados Unidos, um país geralmente fechado sobre si mesmo, mas que salvou a humanidade dos piores tiranos em diversas ocasiões (depois de terem tentado todas as outras vias, como ironizou o próprio Churchill). Estes dois são os homens que asseguraram a sobrevivência da civilização durante suas horas mais sombrias. Se Roosevelt não tivesse vindo em socorro do Reino Unido, este teria provavelmente soçobrado ante Hitler, mas isso devemos a Churchill, pois a tendência americana ainda era isolacionista até 1941, e Roosevelt teria grandes dificuldades em envolver o seu país na guerra, se não fosse pelo ataque japonês a Pearl Harbor, e a declaração de guerra da Alemanha nazista.
Do lado do mal, podemos igualmente alinhar três personalidades nascidas no século XIX: Adolf Hitler, Joseph Stalin e Mao Tsé-tung, tiranos absolutos, homens que trouxeram morte e destruição para os seus próprios povos e as infligiram a outros também, direta ou indiretamente. Stalin, na sequência de Lênin, um gênio em política, mas um ignaro em economia, foi o homem que mais matou comunista, além de cidadãos comuns, do seu próprio país. Hitler foi tirano absoluto, um demente político, um psicopata com imenso poder de sedução sobre um povo humilhado por Versalhes e por seus próprios erros políticos e econômicos: foi o que mais produziu destruições materiais, escravização de povos inteiros e o genocídio deliberado de milhões de inocentes, por razões puramente ideológicas e raciais. Mao foi outro tirano com a mesma obsessão pelo poder absoluto, que matou milhões de inocentes, direta e indiretamente, do seu próprio povo. Os três juntos devem ter eliminado mais de cem milhões de pessoas, entre militares, militantes e civis inocentes.
Entre outras personalidades impactantes não é possível esquecer John Maynard Keynes, o economista mais influente do século, embora não o de maior eficácia nas suas recomendações. Era um liberal, que por força das crises do entre-guerras, propôs a intervenção dos governos nos ciclos econômicos, para vencer, segundo ele, as fases depressivas. Ao inverter a famosa “lei de Say” – que afirmava que a oferta cria a sua própria demanda – ele conseguiu legitimar políticos que sempre acreditaram que o estímulo à demanda é capaz de impulsionar a economia. Deu no que deu, aliás até hoje, inclusive registrando-se os desastres dos “keynesianos de botequim”, que infelizmente conhecemos muito bem, pelos desastres provocados em nosso próprio país.
Do lado do “bem econômico”, infelizmente com menor sucesso relativo nas definições de políticas econômicas, temos dois outros nomes do século XIX: Ludwig von Mises e Friedrich Hayek, dois liberais que tentaram alertar sobre os perigos das economias coletivistas, fascistas ou socialistas, mas que não foram ouvidos, e não foram seguidos na maior parte do século XX na maior parte dos países. O renascimento (muito parcial) do liberalismo, no pós-guerra deve-se, em grande medida a um economista, já nascido no século XX, Milton Friedman, que como muitos outros (penso, por exemplo, em Raymond Aron, na França), se esforçou para corrigir os equívocos keynesianos que os políticos insistiam em cometer. Não tiveram muito sucesso até que líderes políticos mais ou menos identificados com essas ideias – mas provavelmente mais influenciados pela situação de crise econômica vivida em seus países – começaram a inverter os claros exageros do keynesianismo aplicado: Margaret Thatcher, no Reino Unido, e Ronald Reagan, nos EUA, foram esses políticos que permitiram um breve e, como disse parcial, renascimento do liberalismo clássico, erroneamente etiquetado pelos intervencionistas e estatizantes como sendo um “neoliberalismo” (embora Friedman usasse esse nome desde 1952).
E no Brasil, quem poderia ser incorporado a essas personalidades do século XIX que impactaram decisivamente o país no decorrer do século XX? Sem dúvida alguma, e em primeiro lugar, o Barão do Rio Branco, o homem que “fechou” a cartografia nacional, consolidando as fronteiras territoriais e inaugurando a moderna diplomacia profissional, que antes (e depois) estava entregue a políticos improvisados em formuladores e executores da política externa. Depois dele, Getúlio Vargas, para o bem e para o mal, por ter construído o Brasil moderno – mas, segundo o poeta Mário de Andrade, o progresso também é uma fatalidade – e por ter feito do agente principal desse país moderno um Estado omnipresente e todo poderoso, que terminou por sufocar a economia e a própria sociedade. A outra personalidade nascida no século XIX e que poderia ter feito do Brasil do século XX um outro país – mas que infelizmente não teve a oportunidade maior – foi Oswaldo Aranha, um “nepote” de Vargas, com perfil de estadista que, se tivesse ascendido à presidência teria feito um país diferente daquele patrocinado por Vargas.
Um outro brasileiro, nascido no século XX, foi uma espécie de Raymond Aron brasileiro, Roberto Campos, no sentido em que ambos tiveram razão muito cedo para serem suficientemente convincentes no contexto de suas próprias sociedades. Na França da segunda metade do século XX, se dizia que era melhor estar errado com Jean-Paul Sartre do que ter razão com Raymond Aron (c’est mieux d’avoir tort avec Sartre que d’avoir raison avec Aron). No Brasil, Campos, chamado de Bob Fields pelos seus inimigos e até pelos nacionalistas rastaqueras que pululam até hoje no país (e agora no Estado), era desprezado inclusive na sua Casa profissional, onde a maioria, já dominada pelo cepalianismo ambiente, o considerava um entreguista, como aliás grande parte dos políticos e dos economistas em funções. Estes, para mim, foram as grandes personalidades do século XX, a maior parte nascida no século XIX.  Num próximo artigo falarei dos “derrotados” brasileiros nos séculos XIX e XX. Até lá.

Brasília,  25 de janeiro de 2016.

Addendum: Meu artigo sobre os “Dez grandes derrotados da nossa história (ou, como o Brasil poderia ter dado certo mas não deu)”, constante de relatos breves sobre dez grandes "fracassados" na história do Brasil [1) Hipólito José da Costa Pereira; 2) José Bonifácio; 3) Irineu Evangelista de Souza; 4) Joaquim Nabuco; 5) Rui Barbosa; 6) Monteiro Lobato; 7) Oswaldo Aranha; 8) Eugênio Gudin; 9) Roberto Campos; 10) Gustavo Franco] foi feito a pedido do site Spotniks, publicado no seu blog em 14/02/2016 (link: http://spotniks.com/dez-grandes-derrotados-da-nossa-historia-ou-como-o-brasil-poderia-ter-dado-certo-mas-nao-deu/) e reproduzido no blog Diplomatizzando (link: http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2016/02/dez-grandes-derrotados-de-nossa.html).

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