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quarta-feira, 4 de março de 2020

Breves Lições com Dennys Xavier: Thomas Sowell (LVM)


Hoje tive o prazer de receber não um, o mais recente, mas QUATRO livros editados pela LVM, todos eles sob o emblema unificado de "Breves Lições", ensaios organizados pelo professor Dennys Garcia Xavier em torno da vida e da obra de quatro grandes economistas liberais: Friedrich Hayek (também um filósofo), Hans Hoppe (igualmente filósofo e sociólogo), Ayn Rand (mais uma romancista e filósofa do que propriamente economista) e, sobretudo, Thomas Sowell, um livro que tive a honra e o privilégio de prefaciar.

Thomas Sowell é, possivelmente, um dos maiores economistas americanos vivos, e já
deveria ter recebido o Prêmio Nobel, não tanto por suas elaborações "matemáticas", mas sobretudo pelo seu imenso trabalho de "educação popular" nas mais variadas vertentes da economia, não só relativas a problemas tipicamente americanas, como o racismo, por exemplo, mas sobretudo pelo trabalho enciclopédico que ele desenvolve em escala universal, de "pedagogia econômica" num terreno que os franceses chamariam de haute vulgarisation, ou seja, traduzir fenômenos complexos em linguagem acessível ao leigo, ao leitor não especializado. Tenho vários livros dele, sobretudo o Thomas Sowell Reader, que é um compêndio de seus mais importantes ensaios e artigos de opinião, todos eles rigorosamente embasados num enorme conhecimento da história do mundo, em todas as épocas.

Dennys Xavier conduziu um trabalho primoroso de coordenação de ensaios sobre os grandes pensadores da liberdade em seus quatro livros até agora produzidos sobre esses gigantes da filosofia social de cunho liberal, até libertário.

Meu prefácio ao livro de Thomas Sowell começa por uma confissão: demorei muito tempo a descobri-lo, mas também quando o fiz, comecei a comprar os seus livros sequencialmente.

“Thomas Sowell: um intelectual completo”; Brasília, 12 julho 2019, 9 p. Prefácio a livro organizado por Dennys Garcia Xavier com contribuições de estudos sobre o grande economista americano por estudiosos do Brasil. Publicado no livro intitulado Thomas Sowell e a aniquilação de falácias ideológicas: Breves Lições, com organização de Dennys Xavier (São Paulo: LVM, 2019, 312 p.; ISBN: 978-6550520168).

Nele eu digo basicamente o seguinte: 


"Um dos livros de Sowell que mais aprecio, porque talvez também combine com meu espírito contrarianista, é o seu famoso Economic Facts and Fallacies (2008), na verdade um tipo de abordagem que ele seguiu, invariavelmente, em muitos dos seus demais livros, em especial aqueles voltados a desmentir políticas distributivistas, ações afirmativas, supostos efeitos do racismo ou das disparidades sociais, demonstrando aos incautos, com base em certezas acachapantes, como nosso julgamento superficial sobre a aparente “racionalidade” de certas opções políticas não fazem nenhum sentido do ponto de vista da eficiência ou da consistência econômica. O frontispício dessa obra, uma citação de John Adams, deixa transparecer sua atitude básica em face de opiniões subjetivas ou de percepções de senso comum: 
Fatos são coisas teimosas; e quaisquer que sejam nossos desejos, nossas preferências, ou os ditados de nossas paixões, eles não podem alterar o estado dos fatos e das evidências.


Paradoxalmente, ele trata os principais postulados econômicos como evidências de alcance geral, tal como revelado no título de seus livros mais conhecidos, e mais usados como text-booksBasic Economics: A Citizen's Guide to the Economy (2000) e Basic Economics: A Common Sense Guide to the Economy (3ª. edição, 2007). Em consonância com essa atitude inerente à sua metodologia, ele nunca hesitou em marchar contra a corrente, seja nas questões raciais – um tema especialmente delicado num país com remorso de seu apartheid passado, talvez nunca terminado, e que empreendeu uma cruzada nas ações “afirmativas” –, seja nos problemas de desigualdades de renda dentro e entre os países. Ele não apenas toma posição contra essas verdades de senso comum, que nada mais são do que pensamento politicamente correto envelopado em belas frases progressistas, como demonstra, com apoio em estudos empiricamente embasados, como a visão dos bem pensantes e das almas caridosas não passam no teste da realidade prática ou da eficiência econômica. Nisso ele se aproxima de um outro intelectual que também nadou contra a corrente durante a maior parte da sua vida: o francês Raymond Aron, tão denegrido em sua terra natal quanto, entre nós, Roberto Campos ou Eugênio Gudin, dois liberais clamando no deserto. 
O debate econômico nos Estados Unidos – em grande medida graças aos grandes bastiões do liberalismo clássico que são os think tanks da linha hayekiana ou miseniana, e escolas de pensamento econômico como Chicago – nunca foi tão dominado pela vertente social-democrática quanto o foi na Europa continental, em especial na França e nos países latinos. Na França, por sinal, durante muito tempo se repetiu que era “melhor estar errado com Jean-Paul Sartre do que ter razão com Raymond Aron”, mas é também verdade que a praga do politicamente correto teve início nas universidades americanas para depois se espalhar como erva daninha por instituições congêneres de quase todos os países do mundo. Na América Latina, a chegada da praga foi mais delongada, pois o desenvolvimentismo estava na linha de frente do debate público, sujeito às controvérsias conhecidas e que foi abordado em várias das obras tipicamente econômicas de Sowell: como seria de se esperar ele recusa as teorias vulgares da dependência e da exploração como causas do atraso.
A maior parte das falácias econômicas é partilhada por pessoas não formalmente instruídas na teoria ou na história econômica. Mas mesmo economistas podem ser levados a defender algumas falácias simplesmente por ignorar certos fatos econômicos – a verdadeira obsessão de Sowell com a fundamentação empírica de todas as suas demonstrações – ou por operar um corte seletivo na realidade econômica, sem observar uma metodologia rigorosa que os teria levado a outras “descobertas” ou argumentos. No caso da América Latina, por exemplo, não só a opinião pública educada (entre elas políticos e acadêmicos), mas também economistas se deixaram seduzir pela “teoria”, aparentemente “comprovada pela evidência histórica”, da “deterioração dos termos do intercâmbio”, ou seja, a baixa relativa e contínua dos preços das matérias primas comparativamente ao valor dos produtos industrializados. O confronto tendências opostas entre preços de commodities e de manufaturas alimentou vários programas de industrialização substitutiva, com todas as consequências criadas pelo excesso de protecionismo e de dirigismo estatal nas décadas seguintes à disseminação dessa “teoria” a partir de suas fontes cepaliana e prebischianas. A França, por sua vez, é um dos poucos países do Ocidente avançado onde livros de economistas recomendando a adoção explícita e aberta do protecionismo recebem certa adesão entre colegas."

Eu recomendaria a todos os meus leitores que adquirissem não só o Thomas Sowell, mas os três outros: Hayek, Rand, Hoppe, pois os ensaios neles contidos – dezenas de brilhantes textos de intelectuais brasileiros – equivalem a uma grande aula de economia.

quinta-feira, 9 de maio de 2019

Friedrich Hayek at his best: a little big philosophical magnum opus - Instituto Mises Brazil

O argumento completo em defesa da liberdade
Se soubéssemos antecipadamente quais seriam seus resultados, não precisaríamos da liberdade
Nota do IMB
Dia 8 de maio, é aniversário de Friedrich August von Hayek. Fosse ele vivo, estaria completando 120 anos em 2019.
Alguns consideram que o melhor ensaio de Hayek seja O uso do conhecimento na sociedade, no qual ele explica detalhadamente a importância do sistema de preços: são os preços que transmitem todas as informações detalhadas que diferentes pessoas ao redor do mundo possuem sobre aspectos específicos de vários mercados.
Em termos puramente econômicos, realmente aquele é o melhor artigo. 
Entretanto, o texto abaixo, um excerto de seu gigantesco livro A Constituição da Liberdade, é definitivamente o seu mais impressionante.
Seu tamanho relativamente curto (para um ensaio) esconde sua grande profundidade e sua incrível sagacidade. Você pode lê-lo várias vezes — a cada releitura, descobrirá algo novo.
Hayek apresenta seu argumento contra os controles e as regulações estatais — e apresenta também sua constatação sobre como o conhecimento é disseminado e utilizado na sociedade — da forma mais completa e profunda possível. Ele apresenta argumentos que fazem você interromper sua leitura, pensar e repensar.
Por exemplo, ele argumenta que, se já soubéssemos antecipadamente todos os resultados que surgiriam em um ambiente de liberdade, não precisaríamos da liberdade: apenas implementaríamos diretamente todos esses resultados.
Ele também explica que todo o propósito da liberdade é exatamente o de descobrir, no futuro, tudo aquilo que ainda não sabemos no presente. Sendo assim, o argumento em prol da liberdade é, em última instância, baseado na humildade e no respeito pela sabedoria e pela experiência humana futura.
Eis um ensaio profundamente brilhante, o qual, sem exageros, fará diferença em como você encara o mundo e como você viverá o resto de sua vida.
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O argumento em prol da liberdade individual fundamenta-se, principalmente, no humilde reconhecimento de que somos ignorantes.  A realização dos nossos objetivos e do nosso bem-estar depende de uma série de fatores sobre os quais somos inevitavelmente ignorantes.
Se existissem indivíduos oniscientes, se pudéssemos conhecer não apenas tudo o que influi na realização dos nossos desejos atuais, mas também conhecer nossos desejos e necessidades futuras, não haveria muita razão para defendermos a liberdade. 
Por outro lado, a liberdade do indivíduo tornaria, evidentemente, impossível uma previsão perfeita. 
A liberdade é essencial para que o imprevisível exista; nós a desejamos porque aprendemos a esperar dela a oportunidade de realizar a maioria dos nossos objetivos. E, justamente porque o indivíduo sabe tão pouco e, mais ainda, como raramente podemos determinar quem de nós conhece mais, confiamos aos esforços independentes e competitivos de muitos a criação daquilo que desejaremos, quando tivermos a oportunidade de apreciá-lo. 
Por mais humilhante que seja para o orgulho humano, devemos reconhecer que o progresso e até a preservação da civilização dependem de um máximo de oportunidades para que o imprevisível possa acontecer.  Estas casualidades ocorrem graças à combinação de conhecimentos e atitudes, aptidões e hábitos adquiridos pelos indivíduos, e também quando indivíduos treinados se defrontam com problemas específicos que estão preparados para solucionar. 
Nosso inevitável desconhecimento de tantas coisas significa que teremos de lidar, em grande parte, com probabilidades e acasos. Naturalmente, tanto na vida social quanto na individual, os acidentes favoráveis não ocorrem simplesmente. Devemos estar preparados para quando acontecerem. 
Mas, mesmo assim, ainda são acasos, e não se transformam em certezas. Envolvem riscos deliberadamente aceitos, possíveis reveses de indivíduos e grupos que têm tanto mérito quanto outros que prosperam, possibilidade de fracassos ou de recaídas, até para a maioria, e apenas uma probabilidade de ganhos líquidos no cômputo geral. 
O máximo que podemos fazer é aumentar as possibilidades de que certa combinação de dons individuais e de circunstâncias leve à criação de algum novo instrumento ou ao aperfeiçoamento de um instrumento antigo e melhorar a perspectiva de que tais inovações se tornem rapidamente conhecidas por aqueles que podem beneficiar-se delas. 
Seres imperfeitos
Todas as teorias políticas pressupõem, evidentemente, que a maioria dos indivíduos é muito ignorante. Aqueles que defendem a liberdade se diferem dos outros porque incluem na categoria de ignorantes eles próprios e também os mais sábios. Comparada com a totalidade do conhecimento que é continuamente utilizado no processo evolutivo de uma civilização dinâmica, a diferença que existe entre o conhecimento dos mais sábios e aquele que pode ser deliberadamente empregado pelos mais ignorantes é insignificante.
Embora não percebamos habitualmente, todas as instituições da liberdade constituem de adaptações a esta fundamental constatação da ignorância, adaptadas para lidar com possibilidades e probabilidades, mas não com a certeza. Não existe certeza na ação humana e é por esta razão que, para fazer o melhor uso do nosso conhecimento individual, devemos seguir as normas indicadas pela experiência como as mais adequadas de um modo geral, embora não saibamos quais serão as conseqüências de sua observância em casos específicos.
O homem aprende pela frustração de suas esperanças. É óbvio que não devemos aumentar a imprevisibilidade dos acontecimentos com a criação de tolas instituições humanas. Na medida do possível, deveríamos ter como objetivo a melhoria das instituições humanas, a fim de aumentar as possibilidades de previsão correta. Todavia, acima de tudo, deveríamos proporcionar o máximo de oportunidades para que indivíduos que não conhecemos aprendessem fatos que nós mesmos ainda desconhecemos e utilizassem este conhecimento em suas ações. 
E é graças aos esforços harmônicos de muitas pessoas que se pode utilizar uma quantidade de conhecimento maior do que aquela que um indivíduo isolado pode acumular ou do que seria possível sintetizar intelectualmente. E graças a essa utilização do conhecimento disperso é que se tornam possíveis realizações superiores às que uma mente isolada poderia prever. 
É justamente porque liberdade significa renúncia ao controle direto dos esforços individuais que uma sociedade livre pode fazer uso de um volume muito maior de conhecimentos do que aquele que a mente do mais sábio governante poderia abranger.
As chances de erro
A partir destas premissas básicas sobre as quais se fundamenta a justificativa da liberdade, segue-se que não poderemos alcançar suas metas se limitarmos o uso da liberdade apenas àquelas circunstâncias especiais nas quais sabemos que ela será benéfica. Não é liberdade aquela concedida somente quando seus efeitos benéficos são conhecidos de antemão. 
Se soubéssemos de que forma a liberdade seria usada, não teríamos necessidade de justificá-la. Nunca conseguiremos os benefícios da liberdade, nunca alcançaremos os avanços imprevisíveis que ela possibilita, se ela não for também concedida nos casos em que sua utilização parecer indesejável. 
Portanto, não se pode alegar como argumento contra a liberdade individual que as pessoas frequentemente abusam dessa liberdade.  Liberdade significa, necessariamente, que cada um acabará agindo de uma forma que poderá desagradar aos outros. 
Nossa fé na liberdade não se baseia nos resultados previsíveis em determinadas circunstâncias, mas na convicção de que ela acabará liberando mais forças para o bem do que para o mal. 
Segue-se, também, que a importância de termos liberdade de ação não está de modo algum relacionada com a perspectiva de nós, ou a maioria, estarmos, algum dia, em condições de utilizar tal possibilidade. Conceder apenas o grau de liberdade que todos têm a possibilidade de exercer significaria interpretar sua função de modo totalmente errado. 
Por esse raciocínio errôneo, a liberdade utilizada apenas por um homem entre um milhão pode ser mais importante para a sociedade e mais benéfica para a maioria do que qualquer grau de liberdade que todos nós poderíamos desfrutar. Poder-se-ia dizer até que, quanto menor a oportunidade de se fazer uso da liberdade para determinado fim, mais preciosa ela será para a sociedade como um todo. Quanto menor a oportunidade, tanto mais grave será perdê-la quando surgir, pois a experiência que oferece será quase única. 
Por outro lado, é provavelmente correto dizer que a maioria não se interessa diretamente senão por uma parcela mínima das coisas importantes que uma pessoa deveria ter liberdade de fazer. A liberdade é tão importante justamente porque não sabemos como os indivíduos a usarão. Se não fosse assim, também seria possível chegar aos resultados da liberdade se a maioria decidisse o que os indivíduos deveriam fazer. Mas a ação da maioria está necessariamente restrita ao que já foi testado e averiguado, a questões que já obtiveram o consenso no processo de análise que deve ser precedido por diferentes experiências e ações de indivíduos diferentes.
Liberdade para o desconhecido
Os benefícios que a liberdade me concede são, assim, em grande parte, o resultado do uso que outros fazem dela e, principalmente, dos usos dos quais eu nunca me poderia valer. Por isso, o mais importante para mim não é necessariamente a liberdade que eu próprio posso exercer. É muito mais importante que alguém possa experimentar tudo do que a possibilidade de todos fazerem as mesmas coisas. 
Não é porque gostamos de poder fazer determinadas coisas, nem porque consideramos algum tipo de liberdade essencial à nossa felicidade, que temos direito à liberdade. O instinto que nos faz reagir contra qualquer restrição física, embora seja um aliado útil, nem sempre representa padrão seguro para justificar ou delimitar a liberdade. O importante não é o tipo de liberdade que eu próprio gostaria de exercer e sim o tipo de liberdade de que alguém pode necessitar para beneficiar a sociedade. Só poderemos assegurar essa liberdade a uma pessoa desconhecida se a conferirmos a todos.
Os benefícios da liberdade não são, portanto, limitados aos homens livres — ou, pelo menos, um homem não se beneficia apenas daqueles aspectos da liberdade dos quais ele próprio tira vantagem. Não há dúvida de que, ao longo da história, maiorias não-livres se beneficiaram com a existência de minorias livres, e as sociedades não-livres de hoje se beneficiam daquilo que podem obter e aprender de sociedades livres.
Evidentemente, os benefícios que obtemos com a liberdade de outros tornam-se maiores na medida em que cresce o número daqueles que podem exercer a liberdade. 
A tese que justifica a liberdade para alguns aplica-se, portanto, à liberdade para todos. Mas é ainda melhor para todos que alguns sejam livres do que ninguém; e, também, bem melhor que muitos possam gozar de plena liberdade do que todos terem uma liberdade restrita. 
O mais significativo é que a importância da liberdade de agir de determinada maneira nada tem com o número de pessoas que querem agir assim: a proporção poderia ser inversa. Uma consequência disto é que uma sociedade pode ser tolhida por controles, embora a grande maioria possa não se dar conta de que a sua liberdade foi restringida de forma considerável. Se agíssemos a partir do pressuposto de que só é importante o uso que a maioria venha a fazer da liberdade, estaríamos criando uma sociedade estagnada com todas as características da falta de liberdade.
A natureza das mudanças
As inovações imprevistas que aparecem constantemente ao longo do processo de adaptação consistirão, primeiramente, em novos arranjos ou modelos, em que se encontram coordenados os esforços de diferentes indivíduos, e em novas organizações para o uso de recursos, por natureza tão passageiras quanto as condições específicas que permitiram seu aparecimento. 
Haverá, em segundo lugar, modificações de instrumentos e de instituições, adaptadas às novas circunstâncias. Algumas delas serão também meras adaptações temporárias às condições do momento, enquanto outras constituirão melhoramentos que, por aumentar a versatilidade dos instrumentos e hábitos existentes, serão mantidos. 
Estes últimos representarão uma adaptação melhor, não apenas às circunstâncias específicas de tempo e espaço, mas a uma característica permanente do nosso meio. Nestas "formações" espontâneas está incorporada uma percepção das leis gerais que governam a natureza. Esta incorporação cumulativa da experiência em instrumentos e formas de ação permitirá uma evolução do conhecimento explícito, de normas genéricas expressas que podem ser transmitidas pela linguagem de uma pessoa a outra. 
Este processo de surgimento do novo pode ser mais bem entendido na esfera intelectual quando seu resultado são idéias novas. Neste campo, a maioria de nós percebe pelo menos alguns estágios individuais do processo; sabe necessariamente o que está ocorrendo e, por esta razão, em geral, reconhece a necessidade de liberdade. A maioria dos cientistas compreende que não podemos planejar o avanço do conhecimento, que na busca rumo ao desconhecido — e é isso que constitui a pesquisa — dependemos, em grande parte, dos caprichos dos gênios e das circunstâncias, e que o avanço científico, assim como uma idéia nova que surge na mente de um indivíduo, será a consequência de uma combinação de conceitos, hábitos e circunstâncias que a sociedade proporciona a um indivíduo, resultando tanto de acasos felizes quanto de um esforço sistemático.
Como percebemos mais facilmente que nossos avanços na esfera intelectual muitas vezes são fruto do imprevisto e do não-planejado, somos levados a exagerar a importância da liberdade de pensamento e a ignorar a importância da liberdade de ação. Mas a liberdade de pesquisa e de opinião e a liberdade de expressão e discussão, cuja importância é plenamente compreendida, são significativas somente no último estágio do processo de descoberta de novas verdades. 
Enaltecer o valor da liberdade intelectual, em detrimento do valor da liberdade de ação, equivaleria a tomar o topo de um edifício como o todo. Novas idéias devem ser discutidas, diferentes pontos ajustados, pois estas idéias e pontos de vista surgem dos esforços, em circunstâncias sempre novas, de indivíduos que se valem, em suas tarefas concretas, dos novos instrumentos e formas de ação que eles assimilaram.
A complexidade do progresso
O aspecto não intelectual deste processo — a formação do ambiente material modificado, no qual o novo emerge — exige, para a sua compreensão e apreciação, um esforço de imaginação bem maior do que os fatores destacados pela perspectiva intelectualista. 
Embora às vezes possamos identificar os processos intelectuais que conduziram a uma idéia nova, provavelmente nunca poderíamos reconstituir a sequência e a combinação das contribuições que não levaram à aquisição do conhecimento explícito; provavelmente nunca poderíamos reconstituir os hábitos adequados e as aptidões que foram empregadas, os meios e as oportunidades utilizadas e o ambiente peculiar dos atores principais que permitiram aquele resultado. 
As nossas tentativas de compreender essa parte do processo não podem ir além de mostrar, em modelos simplificados, as forças que nele operam e de indicar o princípio geral e não o caráter específico das influências que atuam no caso. Os homens sempre se preocupam apenas com o que sabem. Portanto, as características que, durante o processo, não são conhecidas ao nível da consciência costumam ser ignoradas e provavelmente nunca podem ser identificadas em detalhe.
Na realidade, estas características inconscientes, além de geralmente desprezadas, muitas vezes são consideradas um obstáculo e não uma contribuição ou uma condição essencial. Por não serem "racionais", no sentido de serem utilizadas em nosso raciocínio, frequentemente são consideradas irracionais, contrárias à ação inteligente. 
Todavia, embora a maior parte dos elementos não-racionais que afetam nossa ação possa ser irracional neste sentido, a maioria dos "meros hábitos" e "instituições sem sentido", que usamos e pressupomos em nossas ações, representa condições essenciais para a realização de nossos objetivos, constituindo formas de adaptação da sociedade que já demonstraram sua eficácia e utilidade, que estão sendo constantemente aperfeiçoadas e das quais depende a dimensão daquilo que podemos realizar. Embora seja importante descobrir suas falhas, nem por um momento poderíamos ir em frente sem confiar nelas constantemente.
A maneira pela qual aprendemos a organizar nosso dia, a nos vestir, a comer, a arrumar nossas casas, a falar, a escrever e a utilizar outros incontáveis instrumentos e implementos da civilização, sem esquecer a experiência prática (o know-how) da produção e do comércio, dá-nos constantemente os fundamentos nos quais se devem basear nossas próprias contribuições ao processo de civilização. 
E, no novo uso e aperfeiçoamento dos instrumentos que nos são oferecidos pela civilização, surgem as novas idéias que serão empregadas finalmente na esfera intelectual.  
Embora o uso consciente do pensamento abstrato, uma vez iniciado, tenha até certo ponto uma vida própria, não poderia perdurar e desenvolver-se por muito tempo sem os desafios constantes que se apresentam, pois os indivíduos são capazes de agir de uma maneira nova, de experimentar outras maneiras de fazer as coisas e de mudar toda a estrutura da civilização, na tentativa de se adaptar à mudança. 
O processo intelectual é, com efeito, apenas um processo de elaboração, seleção e eliminação de idéias já formadas. E o fluxo de novas idéias nasce, em grande parte, da esfera na qual a ação, muitas vezes não racional, e acontecimentos materiais se influenciam reciprocamente.  Este fluxo estancaria se a liberdade fosse confinada à esfera intelectual.
A importância da liberdade, portanto, não depende do caráter elevado das atividades que ela torna possíveis. A liberdade de ação, mesmo nas coisas simples, é tão importante quanto a liberdade de pensamento. Tornou-se um senso comum desmerecer a liberdade de ação apelidando-a de "liberdade econômica".  Mas o conceito de liberdade de ação é muito mais amplo do que o de liberdade econômica (o qual ela engloba).  
E, o que é mais importante, é extremamente duvidoso que haja ações que possam ser consideradas meramente "econômicas" e que as restrições à liberdade possam ficar limitadas aos chamados aspectos "econômicos". 
Considerações econômicas são apenas aquelas pelas quais conciliamos e ajustamos nossos diferentes objetivos, nenhum dos quais, em última análise, é econômico (exceto os do avarento ou do homem para o qual ganhar dinheiro se tornou um fim em si mesmo).
Os objetivos são abertos 
O que dissemos até agora se aplica, em grande parte, não apenas ao uso dos meios para a realização dos objetivos individuais, mas também a estes mesmos objetivos. 
Uma sociedade é livre, entre outras razões, porque as aspirações dos indivíduos não são limitadas, uma vez que o esforço consciente de alguns indivíduos pode gerar novos objetivos, que posteriormente serão adotados pela maioria. Devemos reconhecer que mesmo o que agora consideramos bom ou bonito pode mudar — se não de uma forma perceptível que nos permita adotar uma posição relativista, pelo menos no sentido de que, em muitos aspectos, não sabemos o que será bom ou bonito para outra geração. 
Também não sabemos por que consideramos isto ou aquilo bom, nem quem está com a razão quando há divergência acerca do que é bom ou não. Não somente em termos do seu conhecimento, mas também em termos dos seus objetivos e valores, o homem é um produto da civilização; em última análise, é a importância destas aspirações individuais para a perpetuação do grupo ou da espécie que determinará se persistirão ou mudarão. 
Evidentemente, é um erro acreditar que podemos tirar conclusões acerca da qualidade dos nossos valores apenas porque compreendemos que são produto da evolução. Mas dificilmente poderíamos duvidar que estes valores são criados e alterados pelas mesmas forças evolutivas que produziram nossa inteligência. Podemos apenas saber que a decisão final a respeito do que é bom ou ruim não caberá à sabedoria de indivíduos, mas à decadência dos grupos que adotaram idéias "erradas".
Medidas de sucesso
É na busca dos objetivos a que o homem se propõe em determinado momento que podemos comprovar se os instrumentos da civilização são adequados; os ineficazes serão abandonados e os eficientes mantidos. Mas não se trata apenas do fato de que, com a satisfação de necessidades antigas e com o aparecimento de novas oportunidades, surgem constantemente novas finalidades. O sucesso e a perpetuação deste ou daquele indivíduo ou grupo dependem tanto dos objetivos por eles perseguidos, dos valores que governam suas ações, como dos instrumentos e da capacidade de que dispõem. 
A prosperidade ou extinção de um grupo dependerá tanto do código de ética ao qual obedece, ou dos ideais de beleza e felicidade a que se atém, como do grau em que aprendeu, ou não, a satisfazer suas necessidades materiais. 
Em qualquer sociedade, certos grupos podem ascender ou declinar de acordo com as metas que perseguem e os padrões de conduta que observam. E as metas do grupo que teve êxito tenderão a ser adotadas pelos demais membros da sociedade. 
Na melhor das hipóteses, podemos entender somente em parte a razão pela qual os valores que defendemos ou as normas éticas que observamos contribuem para a perpetuação da nossa sociedade. E nem podemos ter certeza de que, em condições de mudança constante, todas as normas que, comprovadamente, contribuem para a consecução de um determinado fim continuarão desempenhando esta função. 
Embora se costume supor que todo padrão social estabelecido contribui, de certa forma, para preservar a civilização, o único meio de confirmá-lo será averiguar se, concorrendo com os padrões adotados por outros grupos ou indivíduos, ele continua a se mostrar adequado.
A concorrência permite alternativas
A concorrência, na qual se baseia o processo de seleção, deve ser entendida no seu mais amplo sentido. Ela implica não apenas a concorrência entre indivíduos como também a concorrência entre grupos organizados e não organizados. Encará-la como algo que se contrapõe a cooperação ou a organização seria interpretar incorretamente sua natureza. 
O esforço para conseguir certos resultados mediante a cooperação e a organização é tão inerente à concorrência quanto os esforços individuais. A distinção relevante não está entre a ação individual e a ação de grupo mas, por um lado, entre as condições em que seja possível experimentar alternativas, baseadas em diferentes pontos de vista ou métodos, e, por outro lado, as condições nas quais um organismo detém o direito exclusivo e o poder de impedir que outros participem. 
Somente quando tais direitos exclusivos são conferidos na pressuposição de que certos indivíduos ou grupos possuem conhecimento superior, o processo deixa de ser experimental e as convicções que prevalecem em dado momento podem tornar-se um obstáculo ao progresso do conhecimento.
Defender a liberdade não significa opor-se à organização — que constitui um dos meios mais poderosos que a razão humana pode empregar —, mas opor-se a toda organização exclusivista, privilegiada ou monopolística, ao emprego da coerção para impedir que outros tentem apresentar melhores soluções. 
Toda organização baseia-se em certos conhecimentos; organização significa dedicação a um objetivo específico e a métodos específicos, mas até a organização destinada a aumentar o conhecimento só será eficiente na medida em que o conhecimento e as convicções nas quais seu plano se baseia forem verdadeiros. 
E, se qualquer fato vier a contradizer as convicções nas quais está alicerçada a estrutura da organização, isto só se tornará evidente se ela fracassar e for suplantada por outro tipo de organização. A organização, por este motivo, poderá ser benéfica e eficiente enquanto for voluntária e se der em uma esfera livre, e terá de se ajustar a circunstâncias que não foram consideradas em sua concepção, ou então fracassar. 
Transformar toda a sociedade em uma única organização, criada e dirigida conforme um único plano, equivaleria a extinguir as próprias forças que formaram as mentes humanas que a planejaram.
Vale a pena parar por um momento e analisar o que aconteceria se fosse empregado em todas as ações somente aquilo que o consenso geral considerasse o conhecimento mais avançado. Se fossem proibidas todas as tentativas que parecessem supérfluas à luz do conhecimento aceito pela maioria, e se se indagasse apenas a respeito das coisas consideradas significativas pela opinião dominante ou se realizassem apenas as experiências ditadas por esta opinião, a humanidade chegaria talvez a um ponto em que seu conhecimento permitiria prever as consequências de todas as ações comuns e evitar todas as desilusões ou fracassos. 
Então, aparentemente, o homem teria sujeitado seu ambiente à sua razão, pois somente empreenderia aquelas tarefas cujos resultados fossem totalmente previsíveis. Poderíamos imaginar que a civilização teria deixado de evoluir, não por se terem esgotado as possibilidades de um crescimento futuro, mas porque o homem teria conseguido sujeitar tão completamente todas as suas ações e o meio ambiente imediato ao seu nível de conhecimento, que novos conhecimentos não teriam qualquer oportunidade de surgir.
O racionalista que deseja sujeitar tudo à razão humana encontra-se, assim, diante de um verdadeiro dilema. O uso da razão visa ao controle e à possibilidade de previsão. Mas o processo evolutivo da razão baseia-se na liberdade e na imprevisibilidade da ação humana. 
Aqueles que exaltam os poderes da razão humana normalmente veem apenas um lado da interação do pensamento e da conduta, na qual a razão atua na prática e, ao mesmo tempo, é modificada por esta prática. Eles não percebem que, para haver progresso, o processo social que possibilita a evolução da razão deve permanecer livre do seu controle. 
Congelando o processo
Resta pouca dúvida de que o homem deve parte de seus maiores sucessos ao fato de não ter sido capaz de controlar a vida social. Seu avanço contínuo provavelmente dependerá de sua renúncia deliberada aos controles que agora estão em seu poder. 
No passado, as forças evolutivas espontâneas, embora muito limitadas pela coerção organizada do estado, ainda podiam afirmar-se contra este poder. Dados os meios tecnológicos de controle hoje à disposição do governo, talvez já não seja possível afirmar isso; de qualquer forma, em breve poderá tornar-se impossível. 
Não estamos longe do momento em que as forças deliberadamente organizadas da sociedade poderão destruir as forças espontâneas que tornaram possível o progresso.

sexta-feira, 21 de setembro de 2018

Um pouco mais de Roberto Campos, desta vez no céu, ou no limbo dos economistas - Paulo Roberto de Almeida

Uma coisa puxa outra, e acabei me lembrando que, já tendo começado o governo companheiro, fiz uma outra rememoração de Roberto Campos, aos três anos de sua morte, desta vez em conversa com Keynes, Hayek e Marx, em torno de um bom copo de whiskey (mas não sei se servem bebidas alcóolicas no céu):

1332. “O que Roberto Campos estaria pensando da política econômica?”, Brasília, 30 setembro 2004, 4 p. Ensaio colocando RC em conversa com Keynes, Hayek e Marx, no limbo, a propósito do terceiro ano de sua morte. Preparada versão reduzida, sob o título de “O que Roberto Campos pensaria da política econômica”, publicada no caderno econômico d’O Estado de São Paulo(Sábado, 9 de outubro de 2004, p. B2). Relação de Publicados nº 471.

O que Roberto Campos estaria pensando da política econômica?

Paulo Roberto de Almeida
Preparada versão reduzida, sob o título
“O que Roberto Campos pensaria da política econômica”,
publicada no caderno econômico d’O Estado de São Paulo
(Sábado, 9 de outubro de 2004, p. B2).
Relação de Publicados nº 471.

No dia 9 de outubro se estará ultrapassando a marca dos três primeiros anos do falecimento, em 2001, do diplomata, economista, administrador público, político e pensador Roberto Campos, que foi também um comentarista cáustico e voluntariamente impiedoso de nossas (ir)realidades quotidianas e bizarrices institucionais. Infelizmente para nós (mas talvez felizmente para os seus adversários “filosóficos”), ele não viveu o suficiente para assistir, a partir de 2002, a uma das mais formidáveis revoluções intelectuais já registradas em toda a história do Brasil: nada mais, nada menos do que a incrível conversão da água em vinho, isto é, a transformação do antigo partido adepto das rupturas econômicas – e propenso a fazer passar as “prioridades sociais” antes do respeito aos contratos da dívida – em um grupo comprometido com a responsabilidade fiscal, com a boa gestão das contas públicas e, surpresa das surpresas, com a aceitação decidida e consentida, não só da renovação do acordo de assistência financeira com o FMI, como também das condicionalidades associadas ao seu “menu” de política econômica (mais parecido a um regime de emagrecimento do que a uma churrascaria rodízio).
O que estaria pensando de tudo isso o iconoclasta, irônico e irreverente Roberto Campos? O que estaria escrevendo a respeito da atual política econômica o mais arguto dos polemistas brasileiros contemporâneos, o homem a quem seus inimigos políticos teimavam em chamar de “Bob Fields”, como se ele fosse menos patriota ou menos comprometido com o interesse nacional do que aqueles que o provocavam com slogans mal concebidos, mas que hesitavam em (ou simplesmente evitavam) enfrentá-lo num debate aberto e responsável sobre esses temas candentes da atualidade econômica?
Onde quer que ele possa estar no presente momento – e eu o imagino no limbo econômico das soluções imperfeitas, como compete a todos os partidários da disciplina da escassez, esses adeptos realistas da “ciência lúgubre”, sentado confortavelmente à esquerda de Hayek e à direita de Keynes –, ele deve estar soltando gostosas gargalhadas, comentando com seus incrédulos parceiros essa verdadeira “reversão de expectativas” a que o Brasil assistiu nos últimos dois anos e meio. Vamos imaginar um possível diálogo entre os três, com algumas rápidas incursões por parte de Marx (também, e mais do que nunca, no limbo) e uma única e breve intervenção do seu discípulo russo, Vladimir Ulianov, em férias de paragens mais quentes.
Roberto Campos, que nasceu no mesmo ano da revolução bolchevique, não teria perdido a oportunidade para, em primeiro lugar, espicaçar este último e provocar o filósofo alemão, cujas doutrinas serviram de inspiração para a mais desastrada tentativa de superar os limites estreitos da escassez econômica em nome de uma suposta gestão socialista das forças produtivas. “O que você está achando da ‘nova política econômica’ Vladimir?”, perguntaria ele, para ouvir o outro resmungar ressabiado: “Os companheiros assumiram numa situação de verdadeira guerra econômica, pois os especuladores de Wall Street e os sabotadores internos queriam a derrocada imediata do novo governo. Eles precisaram, temporariamente, compor com as forças do mercado e com os banqueiros gananciosos, mas ainda guardam munição para combater a exploração capitalista e a opressão burguesa. Espere para ver.” 
Sem esperar pelo resto, Roberto Campos dirigiu-se de maneira não menos provocadora ao autor do Capital,: “Você acha mesmo, Karl, que nossos amigos saberão construir a sociedade ideal, na qual cada um contribuirá na medida de suas capacidades e cuja distribuição se fará segundo as necessidades de cada um de seus membros?” “Mas isto não é para agora, seu capitalista utópico”, respondeu o filósofo da mais valia, “e sim para a etapa comunista da revolução brasileira, isto é, para a última e derradeira fase da construção socialista. Por enquanto, até eu recomendaria uma política de transição e uma acomodação com os mercadores do templo, isto é, os donos do capital. De toda forma, ainda estamos no começo: não se esqueça que no Manifestode 1848 eu preconizava primeiro o aprofundamento da globalização capitalista. Estou satisfeito com o que estou vendo: o novo governo caminha a passos rápidos no processo de internacionalização das empresas brasileiras, contribuindo com a missão histórica da rápida universalização do modo capitalista de produção. O socialismo está ao alcance da mão.”
Marx recebeu a surpreendente adesão do liberal Hayek, que também achava que o governo tinha tomado o caminho da servidão, construindo as bases da mesma economia coletivista que um dia tragou sua querida Áustria, sob a forma do dirigismo nazista, assim como a Rússia, sob a economia totalmente estatizada dos bolchevistas. “E o senhor, Herr Campos, não está preocupado ao ver a atual orientação do Brasilianische economik Regierung?”, indagou ele, com o semblante carregado. “De fato, meu caro Friedrich”, comentou Campos, “vários dos membros da nomenklatura tropical padecem de incurável nostalgia em relação aos antigos tempos revolucionários. Mas isso justamente não ocorre com das Finanz Ministerium de Herr Palocci: sua Realeconomik não causaria nenhum tipo de constrangimento ao seu amigo Friedman, de Chicago. Ele até agora se guiou pelo mais retos princípios do Ideal Liberalismus e estou certo de que ouviria com prazer algumas de suas receitas práticas sobre como escapar da servidão, hoje representada por um Estado economicamente opressor da liberdade de empreender, tão bem defendida em sua obra.”
Enquanto Hayek se deleitava ao ouvir essas palavras, Keynes fazia tilintar de impaciência o gelo de seu legítimo scotch, atacando sem mais esperar: “Mas esse doutor em medicina poderia ter evitado o amargo purgante de uma tão inútil quanto cruel recessão, se tivesse seguido uma das receitas da Teoria Geral, que recomendava injeções fiscais anti-cíclicas para poupar os Brazilian workers do desemprego e da perda do poder de compra. Ele precisava ter assegurado a demanda agregada, bem como o nível das despesas públicas, e deveria ter reintroduzido os controles de capitais, evitando a todo custo cair nas mãos daqueles fundamentalistas do FMI”. 
“Você está mal informado, Maynard”, retrucou Campos, que tinha intimidade suficiente com o inglês para chamá-lo pelo seu nome do meio. “O Estado brasileiro não consegue sequer assegurar um dedal orçamentário para a recuperação das esburacadas estradas federais, quanto mais essa injeção fiscal que você recomenda para estimular a demanda agregada. O que ele faz, de um lado, é uma oferta desagregada de promessas insustentáveis de crescimento, ao mesmo tempo em que retira, por outro lado, as poucas poupanças da sociedade, pela mão de uma máquina de arrecadação mais ameaçadora do que um dreadnoughtbritânico.” Antes que Keynes formulasse novas recomendações de política econômica a partir das idéias de algum economista morto, Campos completou, com a mais fina ironia britânica: “As conseqüências econômicas de misterPalocci são, em todo caso, menos perigosas do que as recomendações bizarras dos seus discípulos no Brasil, que pretendem dar cabo de algo que nunca existiu em meu país: o liberalismo econômico. Francamente, Maynard, eles estão completamente out of touch! Passe o gelo, por favor, e se puder a sua garrafa também.”
Virando-se novamente para Hayek, Campos aduziu com um sorriso maroto: “Não aconteceu em minha vida, mas eu ainda vou assistir, no Brasil, aqui do alto, à mais incrível revolução capitalista que se poderia esperar de um antigo líder socialista radical.” Tendo Marx justificado que isso talvez representasse alguma necessidade histórica da fase de transição para o capitalismo globalizado – que, afinal de contas, tinha tido sua marcha interrompida por setenta anos de tropeços socialistas –, Campos concluiu, rendendo uma homenagem à prosa barroca do Manifesto: “Eu também acho Karl: os seus amigos ex-socialistas, hoje neocapitalistas, não têm mais nada a perder, senão os grilhões mentais que os prendem às velhas soluções estatizantes de um passado tão mítico quanto, hoje em dia, inexeqüível. Esses grilhões mentais precisam ser rompidos e eles serão rompidos”. E dirigindo-se a ambos: “Vamos brindar com um gole de Schnaps a esta revolução burguesa tropical?”


Paulo Roberto de Almeida é doutor em ciências sociais, mestre em planejamento econômico e professor universitário.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

Ainda Roberto Campos, com Marx e Hayek, discutindo a politica companheira - Paulo Roberto de Almeida

Este artigo é também sobre Roberto Campos, no terceiro ano de sua morte, batendo um papinho sobre as políticas econômicas companheiras com dois colegas economistas:


1333. “O que Roberto Campos estaria pensando da política econômica?”, Brasília, 30 setembro 2004, 4 p. Ensaio colocando RC em conversa com Keynes, Hayek e Marx, no limbo, a propósito do terceiro ano de sua morte. Preparada versão reduzida, sob o título de “O que Roberto Campos pensaria da política econômica”, publicada no O Estado de São Paulo (sábado, 9/10/2004, caderno Econômico, p. B2). Reproduzido in totum no site do jornalista Diego Casagrande (Porto Alegre: 8/11/2004) e no site do Ministério do Planejamento. Relação de Publicados n. 498.


O que Roberto Campos estaria pensando da política econômica?

Paulo Roberto de Almeida
Preparada versão reduzida, sob o título
“O que Roberto Campos pensaria da política econômica”,
publicada no caderno econômico d’O Estado de São Paulo
(Sábado, 9 de outubro de 2004, p. B2;
Relação de Publicados nº 471.

No dia 9 de outubro se estará ultrapassando a marca dos três primeiros anos do falecimento, em 2001, do diplomata, economista, administrador público, político e pensador Roberto Campos, que foi também um comentarista cáustico e voluntariamente impiedoso de nossas (ir)realidades quotidianas e bizarrices institucionais. Infelizmente para nós (mas talvez felizmente para os seus adversários “filosóficos”), ele não viveu o suficiente para assistir, a partir de 2002, a uma das mais formidáveis revoluções intelectuais já registradas em toda a história do Brasil: nada mais, nada menos do que a incrível conversão da água em vinho, isto é, a transformação do antigo partido adepto das rupturas econômicas – e propenso a fazer passar as “prioridades sociais” antes do respeito aos contratos da dívida – em um grupo comprometido com a responsabilidade fiscal, com a boa gestão das contas públicas e, surpresa das surpresas, com a aceitação decidida e consentida, não só da renovação do acordo de assistência financeira com o FMI, como também das condicionalidades associadas ao seu “menu” de política econômica (mais parecido a um regime de emagrecimento do que a uma churrascaria rodízio).
O que estaria pensando de tudo isso o iconoclasta, irônico e irreverente Roberto Campos? O que estaria escrevendo a respeito da atual política econômica o mais arguto dos polemistas brasileiros contemporâneos, o homem a quem seus inimigos políticos teimavam em chamar de “Bob Fields”, como se ele fosse menos patriota ou menos comprometido com o interesse nacional do que aqueles que o provocavam com slogans mal concebidos, mas que hesitavam em (ou simplesmente evitavam) enfrentá-lo num debate aberto e responsável sobre esses temas candentes da atualidade econômica?
Onde quer que ele possa estar no presente momento – e eu o imagino no limbo econômico das soluções imperfeitas, como compete a todos os partidários da disciplina da escassez, esses adeptos realistas da “ciência lúgubre”, sentado confortavelmente à esquerda de Hayek e à direita de Keynes –, ele deve estar soltando gostosas gargalhadas, comentando com seus incrédulos parceiros essa verdadeira “reversão de expectativas” a que o Brasil assistiu nos últimos dois anos e meio. Vamos imaginar um possível diálogo entre os três, com algumas rápidas incursões por parte de Marx (também, e mais do que nunca, no limbo) e uma única e breve intervenção do seu discípulo russo, Vladimir Ulianov, em férias de paragens mais quentes.
Roberto Campos, que nasceu no mesmo ano da revolução bolchevique, não teria perdido a oportunidade para, em primeiro lugar, espicaçar este último e provocar o filósofo alemão, cujas doutrinas serviram de inspiração para a mais desastrada tentativa de superar os limites estreitos da escassez econômica em nome de uma suposta gestão socialista das forças produtivas. “O que você está achando da ‘nova política econômica’ Vladimir?”, perguntaria ele, para ouvir o outro resmungar ressabiado: “Os companheiros assumiram numa situação de verdadeira guerra econômica, pois os especuladores de Wall Street e os sabotadores internos queriam a derrocada imediata do novo governo. Eles precisaram, temporariamente, compor com as forças do mercado e com os banqueiros gananciosos, mas ainda guardam munição para combater a exploração capitalista e a opressão burguesa. Espere para ver.”
Sem esperar pelo resto, Roberto Campos dirigiu-se de maneira não menos provocadora ao autor do Capital,: “Você acha mesmo, Karl, que nossos amigos saberão construir a sociedade ideal, na qual cada um contribuirá na medida de suas capacidades e cuja distribuição se fará segundo as necessidades de cada um de seus membros?” “Mas isto não é para agora, seu capitalista utópico”, respondeu o filósofo da mais valia, “e sim para a etapa comunista da revolução brasileira, isto é, para a última e derradeira fase da construção socialista. Por enquanto, até eu recomendaria uma política de transição e uma acomodação com os mercadores do templo, isto é, os donos do capital. De toda forma, ainda estamos no começo: não se esqueça que no Manifesto de 1848 eu preconizava primeiro o aprofundamento da globalização capitalista. Estou satisfeito com o que estou vendo: o novo governo caminha a passos rápidos no processo de internacionalização das empresas brasileiras, contribuindo com a missão histórica da rápida universalização do modo capitalista de produção. O socialismo está ao alcance da mão.”
Marx recebeu a surpreendente adesão do liberal Hayek, que também achava que o governo tinha tomado o caminho da servidão, construindo as bases da mesma economia coletivista que um dia tragou sua querida Áustria, sob a forma do dirigismo nazista, assim como a Rússia, sob a economia totalmente estatizada dos bolchevistas. “E o senhor, Herr Campos, não está preocupado ao ver a atual orientação do Brasilianische economik Regierung?”, indagou ele, com o semblante carregado. “De fato, meu caro Friedrich”, comentou Campos, “vários dos membros da nomenklatura tropical padecem de incurável nostalgia em relação aos antigos tempos revolucionários. Mas isso justamente não ocorre com das Finanz Ministerium de Herr Palocci: sua Realeconomik não causaria nenhum tipo de constrangimento ao seu amigo Friedman, de Chicago. Ele até agora se guiou pelo mais retos princípios do Ideal Liberalismus e estou certo de que ouviria com prazer algumas de suas receitas práticas sobre como escapar da servidão, hoje representada por um Estado economicamente opressor da liberdade de empreender, tão bem defendida em sua obra.”
Enquanto Hayek se deleitava ao ouvir essas palavras, Keynes fazia tilintar de impaciência o gelo de seu legítimo scotch, atacando sem mais esperar: “Mas esse doutor em medicina poderia ter evitado o amargo purgante de uma tão inútil quanto cruel recessão, se tivesse seguido uma das receitas da Teoria Geral, que recomendava injeções fiscais anti-cíclicas para poupar os Brazilian workers do desemprego e da perda do poder de compra. Ele precisava ter assegurado a demanda agregada, bem como o nível das despesas públicas, e deveria ter reintroduzido os controles de capitais, evitando a todo custo cair nas mãos daqueles fundamentalistas do FMI”.
“Você está mal informado, Maynard”, retrucou Campos, que tinha intimidade suficiente com o inglês para chamá-lo pelo seu nome do meio. “O Estado brasileiro não consegue sequer assegurar um dedal orçamentário para a recuperação das esburacadas estradas federais, quanto mais essa injeção fiscal que você recomenda para estimular a demanda agregada. O que ele faz, de um lado, é uma oferta desagregada de promessas insustentáveis de crescimento, ao mesmo tempo em que retira, por outro lado, as poucas poupanças da sociedade, pela mão de uma máquina de arrecadação mais ameaçadora do que um dreadnought britânico.” Antes que Keynes formulasse novas recomendações de política econômica a partir das idéias de algum economista morto, Campos completou, com a mais fina ironia britânica: “As conseqüências econômicas de mister Palocci são, em todo caso, menos perigosas do que as recomendações bizarras dos seus discípulos no Brasil, que pretendem dar cabo de algo que nunca existiu em meu país: o liberalismo econômico. Francamente, Maynard, eles estão completamente out of touch! Passe o gelo, por favor, e se puder a sua garrafa também.”
Virando-se novamente para Hayek, Campos aduziu com um sorriso maroto: “Não aconteceu em minha vida, mas eu ainda vou assistir, no Brasil, aqui do alto, à mais incrível revolução capitalista que se poderia esperar de um antigo líder socialista radical.” Tendo Marx justificado que isso talvez representasse alguma necessidade histórica da fase de transição para o capitalismo globalizado – que, afinal de contas, tinha tido sua marcha interrompida por setenta anos de tropeços socialistas –, Campos concluiu, rendendo uma homenagem à prosa barroca do Manifesto: “Eu também acho Karl: os seus amigos ex-socialistas, hoje neocapitalistas, não têm mais nada a perder, senão os grilhões mentais que os prendem às velhas soluções estatizantes de um passado tão mítico quanto, hoje em dia, inexeqüível. Esses grilhões mentais precisam ser rompidos e eles serão rompidos”. E dirigindo-se a ambos: “Vamos brindar com um gole de Schnaps a esta revolução burguesa tropical?”

Paulo Roberto de Almeida é doutor em ciências sociais, mestre em planejamento econômico e professor universitário.
(pralmeida@mac.com; www.pralmeida.org)


Versão publicada:

O Estado de São Paulo, Sábado, 9 de outubro de 2004
O que Roberto Campos pensaria da política econômica?
ENTRE HAYEK E KEYNES, HERR CAMPOS ESTARIA RINDO DA REVERSÃO DE EXPECTATIVAS VISTA NO BRASIL

(Subtítulo da edição impressa do jornal: “Diálogo de mortos: de Marx, Keynes, Hayek e Campos sobre o Brasil de Lula)

PAULO ROBERTO DE ALMEIDA


No dia 9 de outubro se completam três anos do falecimento, em 2001, do diplomata, economista, administrador público, político e pensador Roberto Campos, que foi também um comentarista cáustico e impiedoso de nossas bizarrices institucionais. O que estaria pensando o iconoclasta, irônico e irreverente Roberto Campos a respeito da política econômica do atual governo?
Onde estará ele no presente momento? Eu o imagino no limbo econômico das soluções imperfeitas, no purgatório da disciplina da escassez, na companhia de adeptos da "ciência lúgubre", sentado à esquerda de Hayek e à direita de Keynes, soltando gargalhadas a propósito da "reversão de expectativas" a que o Brasil assistiu nos últimos dois anos.
Roberto Campos não perderia a oportunidade para provocar o filósofo alemão cujas doutrinas serviram de inspiração para os propositores de uma "nova política econômica": "Você acha, Karl, que nossos amigos saberão construir a sociedade ideal, na qual cada um contribuirá na medida de suas capacidades e cuja distribuição se fará segundo as necessidades de cada um de seus membros?" "Isto não é para agora, seu capitalista utópico", responde o filósofo da mais-valia, "e sim para a etapa comunista, para a última fase da construção socialista. Por enquanto, até eu recomendo uma política de transição e uma acomodação com os donos do capital. No Manifesto de 1848 eu preconizava primeiro o aprofundamento da globalização capitalista. Estou satisfeito com o novo governo: ele promove a internacionalização das empresas brasileiras, ajudando na missão histórica da rápida universalização do modo capitalista de produção. O socialismo está ao alcance da mão."
Marx recebeu a surpreendente adesão do liberal Hayek, que também achava que o governo tinha tomado o caminho da servidão. "E o senhor, Herr Campos, não está preocupado com a orientação do Brasilianische economik Regierung?", indagou com o semblante carregado. "De fato, meu caro Friedrich", comentou Campos, "vários dos membros deste governo padecem de nostalgia em relação aos tempos revolucionários. Mas isso não ocorre com das Finanz Ministerium de Herr Palocci: sua Realeconomik não causaria nenhum constrangimento ao seu amigo Milton Friedman. Ele até agora se guiou pelos retos princípios do Ideal Liberalismus e estou certo de que ouviria com prazer suas receitas sobre como escapar da servidão, hoje representada por um Estado economicamente opressor da liberdade de empreender."
Enquanto Hayek se deleitava ao ouvi-lo, Keynes fazia tilintar o gelo de seu scotch, atacando sem mais esperar: "Mas esse doutor em Medicina poderia ter evitado o purgante de uma cruel recessão, se tivesse seguido as receitas da Teoria Geral, que recomenda injeções fiscais anticíclicas para poupar os Brazilian workers do desemprego. Ele precisa assegurar a demanda agregada e o nível das despesas públicas, além de controlar os capitais, evitando cair nas mãos dos fundamentalistas do FMI."
"Você está mal informado, Maynard", retrucou Campos, que tinha intimidade com o inglês para chamá-lo pelo nome do meio. "O Estado brasileiro não consegue sequer manter as estradas federais, quanto mais fazer essa injeção fiscal para estimular a demanda agregada. O que ele faz é uma oferta desagregada de promessas insustentáveis de crescimento, ao mesmo tempo em que retira a poupança da sociedade, usando uma máquina de arrecadação mais ameaçadora do que um dreadnought britânico." Antes que Keynes formulasse novas recomendações de política econômica a partir das idéias de algum economista morto, Campos completou, com a mais fina ironia britânica: "As conseqüências econômicas de mister Palocci são, em todo caso, menos perigosas do que as recomendações bizarras dos seus discípulos no Brasil, que pretendem dar cabo de algo que nunca existiu em meu país: o liberalismo econômico. Francamente, Maynard, eles estão completamente out of touch!
Passe o gelo, por favor, e a garrafa também."
Virando-se para Hayek, Campos aduziu com um sorriso maroto: "Não aconteceu em minha vida, mas ainda vou assistir, no Brasil, à mais incrível revolução capitalista que se poderia esperar de um antigo líder socialista." Tendo Marx justificado que isso era uma necessidade histórica da transição para o capitalismo globalizado - que tinha tido sua marcha interrompida por 70 anos de tropeços socialistas -, Campos concluiu, rendendo uma homenagem à prosa barroca do Manifesto: "Eu também acho Karl. Os seus amigos ex-socialistas, hoje neocapitalistas, não têm mais nada a perder, senão os grilhões mentais que os prendem às velhas soluções estatizantes de um passado tão mítico quanto, hoje em dia, inexeqüível. Esses grilhões mentais precisam ser rompidos e eles serão rompidos." E dirigindo-se a ambos: "Vamos brindar com um gole de Schnaps a esta revolução burguesa tropical?"

domingo, 21 de agosto de 2016

How economic ideas change the world: Keynes, Hayek, Friedman, and Reagan - Rutger Bregman (Evonomics)


As ideias sempre mudam o mundo, ainda que mais tarde do que se pensa, ou do que se gostaria. Mas, existem também aqueles que possuem ideias fixas, e são caraterizados por alguma forma de dissonância cognitiva -- como Madame Pasadena, por exemplo -- que não se apartam dessas ideias fixas mesmo que o mundo lhes caia sobre a cabeça. Como diz o autor deste interessante artigo:
"“A man with a conviction is a hard man to change.” So opens Leon Festinger’s account of these events in When Prophecy Fails, first published in 1956 and a seminal text in social psychology to this day. “Tell him you disagree and he turns away,” Festinger continues. “Show him facts or figures and he questions your sources. Appeal to logic and he fails to see your point.”
Pois é, alguns companheiros respondem inteiramente a esta definição.
Mas, o artigo trata basicamente de ideias econômicas, e por isso vale a pena ler.
Paulo Roberto de Almeida 


Capitalism

Ideas, However Outrageous, Have Changed the World, and They Will Again.

How economic ideas change the world: Keynes, Hayek, Friedman, and Reagan

By Rutger Bregman
Evonomics, August 20, 2016
In the late summer of 1954, a brilliant young psychologist was reading the newspaper when his eye fell on a strange headline on the back page:
PROPHESY FROM PLANET CLARION
CALL TO CITY: FLEE THAT FLOOD.
IT’LL SWAMP US ON DEC 21,
OUTER SPACE TELLS SUBURBANITE.
His interest piqued, the psychologist, whose name was Leon Festinger, read on. “Lake City will be destroyed by a flood from the great lake just before dawn, Dec. 21.” The message came from a homemaker in a Chicago suburb who had received it, she reported, from superior beings on another planet: “These beings have been visiting the earth, she says, in what we call flying saucers.”
It was precisely what Festinger had been waiting for. This was a chance to investigate a simple but thorny question that he had been puzzling over for years: What happens when people experience a severe crisis in their convictions? How would this homemaker respond when no flying saucers came to rescue her? What happens when the great flood doesn’t materialize?
With a little digging, Festinger discovered that the woman, one Dorothy Martin, wasn’t the only one convinced that the world was ending on December 21, 1954. Around a dozen of her followers — all intelligent, upstanding Americans — had quit their jobs, sold their possessions, or left their spouses on the strength of their conviction.
Festinger decided to infiltrate the Chicago sect. Right off, he noticed that its members made little effort to persuade other people that the end was near. Salvation was reserved for them, the chosen few. On the morning of December 20, 1954, Mrs. Martin was beamed a new message from above: “At the hour of midnight you shall be put into parked cars and taken to a place where ye shall be put aboard a porch [flying saucer].”
The excited group settled in to await their ascendency to the heavens.
The Evening of December 20, 1954
11:15 p.m.: Mrs. Martin receives a message telling the group to put on their coats and prepare.
12:00 a.m.: Nothing happens.
12:05 a.m.: One of the believers notices another clock in the room reads 11:55 p.m. The group agrees it is not yet midnight.
12:10 a.m.: Message from aliens: The flying saucers are delayed.
12:15 a.m.: The telephone rings several times: journalists calling to check if the world has ended yet.
2:00 a.m.: One of the younger followers, who expected to be a couple light years away by now, recalls that his mother was planning to call the police if he wasn’t home by 2 a.m. The others assure him that his departure is a worthy sacrifice to save the group, and he leaves.
4:00 a.m.: One of the believers says: “I’ve burned every bridge. I’ve turned my back on the world. I can’t afford to doubt. I have to believe.”
4:45 a.m.: Mrs. Martin gets another message: God has decided to spare the Earth. Together, the small group of believers has spread so much “light” on this night that the Earth is saved.
4:50 a.m.: One last message from above: The aliens want the good news “to be released immediately to the newspapers.” Armed with this new mission, the believers inform all the local papers and radio stations before daybreak.
When Prophecies Fail
“A man with a conviction is a hard man to change.” So opens Leon Festinger’s account of these events in When Prophecy Fails, first published in 1956 and a seminal text in social psychology to this day. “Tell him you disagree and he turns away,” Festinger continues. “Show him facts or figures and he questions your sources. Appeal to logic and he fails to see your point.”
It’s easy to scoff at the story of Mrs. Martin and her believers, but the phenomenon Festinger describes is one that none of us are immune to. “Cognitive dissonance,” he coined it. When reality clashes with our deepest convictions, we’d rather recalibrate reality than amend our worldview. Not only that, we become even more rigid in our beliefs than before.
Mind you, we tend to be quite flexible when it comes to practical matters. Most of us are willing to accept advice on how to remove a grease stain or chop a cucumber. No, it’s when our political, ideological, or religious ideas are at stake that we get the most stubborn. We tend to dig in our heels when someone challenges our opinions about criminal punishment, premarital sex, or global warming. These are ideas to which people tend to get attached, and that makes it difficult to let them go. Doing so affects our sense of identity and position in social groups — in our churches or families or circles of friends.
One factor that certainly is not involved is stupidity. Researchers at Yale University have shown that educated people are more unshakable in their convictions than anybody. After all, an education gives you tools to defend your opinions. Intelligent people are highly practiced in finding arguments, experts, and studies that underpin their preexisting beliefs, and the Internet has made it easier than ever to be consumers of our own opinions, with an- other piece of evidence always just a mouse-click away.
Smart people, concludes the American journalist Ezra Klein, don’t use their intellect to obtain the correct answer; they use it to obtain what they want to be the answer.
When My Clock Struck Midnight
I have something to confess. In the course of writing my defense of a 15-hour workweek, I stumbled across an article titled “Shorter Workweek May Not Increase Well- Being.” It was a piece in The New York Times about a South Korean study which claimed that a 10% shorter workweek had not made employees happier. Additional Googling led me to an article in The Telegraph which suggested that working less might be downright bad for our health.
Suddenly I was Dorothy Martin and my clock had struck midnight. Immediately, I mobilized my defense mechanisms. To begin with, I had my doubts about the source: The Telegraph is a somewhat populist newspaper, so how seriously should I take that article? Plus, there was that “may” in The New York Times headline. How conclusive were the study findings really? Even my stereotypes kicked in: Those South Koreans, they’re such workaholics — they probably kept working off the clock even when they reported fewer hours. Moreover, happiness? How exactly do you measure that?
Satisfied, I pushed the study aside. I’d convinced myself it couldn’t be relevant.
I’ll give you another example. I have elsewhere laid out the arguments in favor of universal basic income. This is a conviction in which I have invested a lot over the past few years. The first article I wrote on the topic garnered nearly a million views and was picked up by The Washington Post. I gave lectures about universal basic income and made a case for it on Dutch television. Enthusiastic emails poured in. Not long ago, I even heard someone refer to me as “Mr. Basic Income.” Slowly but surely, my opinion has come to define my personal and professional identity. I do earnestly believe that a universal basic income is an idea whose time has come. I’ve researched the issue extensively, and that’s the direction the evidence points.
But, if I’m being honest, I sometimes wonder if I’d even let myself notice if the evidence were pointing another way. Would I be observant enough — or brave enough — to have a change of heart?
The Power of an Idea
“Keep building your castles in the sky,” a friend quipped a while back after I sent him a couple of my articles. I could understand where he was coming from. After all, what’s the point of crazy new ideas when politicians can’t even manage to balance a budget?
That’s when I began to ask myself whether new ideas can genuinely change the world.
Now, your (very reasonable) gut response might be: They can’t – people will stubbornly stick to the old ideas that they’re comfortable with. The thing is, we know that ideas have changed over time. Yesterday’s avant-garde is today’s common sense. The question is not can new ideas defeat old ones; the question is how.
Research suggests that sudden shocks can work wonders. James Kuklinski, a political scientist at the University of Illinois, discovered that people are most likely to change their opinions if you confront them with new and disagreeable facts as directly as possible. Take the recent success of right-wing politicians who were already warning of “the Islamic threat” back in the 1990s, but didn’t get much attention until the shocking destruction of the Twin Towers on September 11, 2001. Viewpoints that had once been fringe suddenly became a collective obsession.
If it is true that that ideas don’t change things gradually but in fits and starts — in shocks — then the basic premise of our democracy, our journalism, and our education is all wrong. It would mean, in essence, that the Enlightenment model of how people change their opinions — through information-gathering and reasoned deliberation — is really a buttress for the status quo. It would mean that those who swear by rationality, nuance, and compromise fail to grasp how ideas govern the world. A worldview is not a Lego set where a block is added here, removed there. It’s a fortress that is defended tooth and nail, with all possible reinforcements, until the pressure becomes so overpowering that the walls cave in.
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Over the same months that Leon Festinger was infiltrating Mrs. Martin’s sect, the American psychologist Solomon Asch demonstrated that group pressure can even cause us to ignore what we can plainly see with our own eyes. In a now-famous experiment, he showed test subjects three lines on a card and asked them which one was longest. When the other people in the room (all Asch’s coworkers, unbeknownst to the subject) gave the same answer, the subject did, too — even when it was clearly erroneous.
It’s no different in politics. Political scientists have established that how people vote is determined less by their perceptions about their own lives than by their conceptions of society. We’re not particularly interested in what government can do for us personally; we want to know what it can do for us all. When we cast our vote, we do so not just for ourselves, but for the group we want to belong to.
But Solomon Asch made another discovery. A single opposing voice can make all the difference. When just one other person in the group stuck to the truth, the test subjects were more likely to trust the evidence of their own senses. Let this be an encouragement to all those who feel like a lone voice crying out in the wilderness: Keep on building those castles in the sky. Your time will come.
Long Was the Night
In 2008, it seemed as if that time had finally come when we were confronted with the biggest case of cognitive dissonance since the 1930s.
On September 15, the investment bank Lehman Brothers filed for bankruptcy. Suddenly, the whole global banking sector seemed poised to tumble like a row of dominoes. In the months that followed, one free market dogma after another crashed and burned.
Former Federal Reserve Chair Alan Greenspan, once dubbed the “Oracle” and the “Maestro,” was gobsmacked. “Not only have individual financial institutions become less vulnerable to shocks from underlying risk factors,”he had confidently asserted in 2004, “but also the financial system as a whole has become more resilient.” When Greenspan retired in 2006, everyone assumed he would be immortalized in history’s financial hall of fame.
In a House Committee hearing two years later, the broken banker admitted that he was “in a state of shocked disbelief.” Greenspan’s faith in capitalism had taken a severe beating. “I have found a flaw. I don’t know how significant or permanent it is. But I have been very distressed by that fact.” When a congressman asked him if he had been misled by his own ideas, Greenspan replied, “That’s precisely the reason I was shocked because I’d been going for 40 years or so with considerable evidence that it was working exceptionally well.”
The lesson of December 21, 1954, is that everything centers on that one moment of crisis. When the clock strikes midnight, what happens next? A crisis can provide an opening for new ideas, but it can also shore up old convictions.
So what happened after September 15, 2008? The Occupy movement briefly galvanized people, but quickly ebbed. Meanwhile, left-leaning political parties lost elections across most of Europe. Greece and Italy more or less canned democracy altogether and rolled out neoliberal-tinted reforms to please their creditors, trimming government and boosting labor market flexibility. In northern Europe, too, governments proclaimed a new age of austerity.
And Alan Greenspan? When, a few years later, a reporter asked him if there had been any error in his ideas, his reply was resolute: “Not at all. I think that there is no alternative.”
Fast forward to today: Fundamental reform of the banking sector has yet to happen. On Wall Street, bankers are seeing the highest bonus payments since the crash. And the banks’ capital buffers are as minuscule as ever. Joris Luyendijk, a journalist at The Guardian who spent two years looking under the hood of London’s financial sector, summed up the experience in 2013 as follows: “It’s like standing at Chernobyl and seeing they’ve restarted the reactor but still have the same old management.”
You have to wonder: Was the cognitive dissonance from 2008 even big enough? Or was it too big? Had we invested too much in our old convictions? Or were there simply no alternatives?
This last possibility is the most worrying of all.
The word “crisis” comes from ancient Greek and literally means to “separate” or “sieve.” A crisis, then, should be a moment of truth, the juncture at which a fundamental choice is made. But it almost seems that back in 2008 we were unable to make that choice. When we suddenly found ourselves facing the collapse of the entire banking sector, there were no real alternatives available; all we could do was keep plodding down the same path.
Perhaps, then, crisis isn’t really the right word for our current condition. It’s more like we’re in a coma. That’s ancient Greek, too. It means “deep, dreamless sleep.”
Capitalist Resistance Fighters
It’s all deeply ironic, if you think about it.
If there were ever two people who dedicated their lives to building castles in the sky with preternatural certainty that they would someday be proven right, it was the founders of neoliberal thought. I’m an admirer of them both: the slippery philosopher Friedrich Hayek and the public intellectual Milton Friedman.
Nowadays, “neoliberal” is a put-down leveled at anybody who doesn’t agree with the left. Hayek and Friedman, however, were proud neoliberals who saw it as their duty to reinvent liberalism. “We must make the building of a free society once more an intellectual adventure,” Hayek wrote. “What we lack is a liberal Utopia.”
Even if you believe them to be villains who made greed fashionable and are to blame for the financial crisis that left millions of people in dire straits — even then, there’s a lot you can learn from Friedrich Hayek and Milton Friedman.
One was born in Vienna, the other in New York. Both were firm believers in the power of ideas. For many years, both belonged to a small minority, a sect almost, that existed outside the cocoon of mainstream thought. Together, they tore apart that cocoon, upending the world in a way dictators and billionaires can only dream of. They set about shredding the life’s work of their archrival, the British economist John Maynard Keynes. Seemingly the only thing they had in common with Keynes was the belief that the ideas of economists and philosophers are stronger forces than the vested interests of business leaders and politicians.
This particular story begins on April 1, 1947, not quite a year after Keynes’ death, when 40 philosophers, historians, and economists converged in the small village of Mont Pèlerin in Switzerland. Some had traveled for weeks, crossing oceans to get there. In later years, they would be known as the Mont Pèlerin Society.
All 40 thinkers who came to this Swiss village were encouraged to speak their minds, and together they formed a corps of capitalist resistance fighters against socialist supremacy. “There are, of course, very few people left today who are not socialists,” Hayek, the event’s initiator, had once lamented. At a time when the provisions of the New Deal had pushed even the United States toward more socialistic policies, a defense of the free market was still seen as downright revolutionary, and Hayek felt “hopelessly out of tune with his time.”
Milton Friedman was also at the meeting of minds. “Here I was, a young, naive provincial American,” Friedman later recalled, “meeting people from all over the world, all dedicated to the same liberal principles as we were; all beleaguered in their own countries, yet among them scholars, some already internationally famous, others destined to be.” In fact, no fewer than eight members of the Mont Pèlerin Society would go on to win Nobel Prizes.
However, in 1947 no one could have predicted such a star-studded future. Large swaths of Europe lay in ruins. Reconstruction efforts were colored by Keynesian ideals: employment for all, curbing the free market, and regulation of banks. The war state became the welfare state. Yet it was during those same years that neoliberal thought began gaining traction thanks to the efforts of the Mont Pèlerin Society, a group that would go on to become one of the leading think tanks of the 20th century. “Together, they helped precipitate a global policy transformation with implications that will continue to reverberate for decades,” says the historian Angus Burgin.
In the 1970s, Hayek handed the presidency of the Society over to Friedman. Under the leadership of this diminutive, bespectacled American whose energy and enthusiasm surpassed even that of his Austrian predecessor, the society radicalized. Essentially, there wasn’t a problem around that Friedman didn’t blame on government. And the solution, in every case, was the free market. Unemployment? Get rid of the minimum wage. Natural disaster? Get corporations to organize a relief effort. Poor schools? Privatize education. Expensive healthcare? Privatize that, too, and ditch public oversight while we’re at it. Substance abuse? Legalize drugs and let the market work its magic.
Friedman deployed every means possible to spread his ideas, building a repertoire of lectures, op-eds, radio interviews, TV appearances, books, and even a documentary. In the preface to his bestselling Capitalism and Freedom, he wrote that it is the duty of thinkers to keep offering alternatives. Ideas that seem “politically impossible” today may one day become “politically inevitable.”
All that remained was to await the critical moment. “Only a crisis — actual or perceived — produces real change,” Friedman explained. “When that crisis occurs, the actions that are taken depend on the ideas that are lying around.” The crisis came in October 1973, when the Organization of Arab Petroleum Exporting Countries imposed an oil embargo. Inflation went through the roof and the economy spiraled into recession. “Stagflation,” as this effect was called, wasn’t even possible in Keynesian theory. Friedman, however, had predicted it.
For the rest of his life, Friedman never stopped emphasizing that his success would have been inconceivable without the groundwork laid since 1947. The rise of neoliberalism played out like a relay race, with think tanks passing the baton to journalists, who handed it off to politicians. Running the anchor leg were two of the most powerful leaders in the Western world, Ronald Reagan and Margaret Thatcher. When asked what she considered to be her greatest victory, Thatcher’s reply was “New Labour”: Under the leadership of neoliberal Tony Blair, even her social democratic rivals in the Labour Party had come around to her worldview.
In less than 50 years, an idea once dismissed as radical and marginal had come to rule the world.
The Lesson of Neoliberalism
Some argue that these days, it hardly matters anymore who you vote for. Though we still have a right and a left, neither side seems to have a very clear plan for the future. In an ironic twist of fate, the neoliberalist brainchild of two men who devoutly believed in the power of ideas has now put a lockdown on the development of new ones. It would seem that we have arrived at “the end of history,” with liberal democracy as the last stop and the “free consumer” as the terminus of our species.
By the time Friedman was named president of the Mont Pèlerin Society in 1970, most of its philosophers and historians had already decamped, the debates having become overly technical and economic. In hindsight, Friedman’s arrival marked the dawn of an era in which economists would become the leading thinkers of the Western world. We are still in that era today.
We inhabit a world of managers and technocrats. “Let’s just concentrate on solving the problems,” they say. “Let’s just focus on making ends meet.” Political decisions are continually presented as a matter of exigency — as neutral and objective events, as though there were no other choice. Keynes observed this tendency emerging even in his own day. “Practical men, who believe themselves to be quite exempt from any intellectual influences,” he wrote, “are usually the slaves of some defunct economist.”
When Lehman Brothers collapsed on September 15, 2008, and inaugurated the biggest crisis since the 1930s, there were no real alternatives to hand. No one had laid the groundwork. For years, intellectuals, journalists, and politicians had all firmly maintained that we’d reached the end of the age of “big narratives” and that it was time to trade in ideologies for pragmatism.
Naturally, we should still take pride in the liberty that generations before us fought for and won. But the question is, what is the value of free speech when we no longer have anything worthwhile to say? What’s the point of freedom of association when we no longer feel any sense of affiliation? What purpose does freedom of religion serve when we no longer believe in anything?
On the one hand, the world is still getting richer, safer, and healthier. That’s a huge triumph. On the other hand, it’s high time that we stake out a new utopia. Let’s rehoist the sails. “Progress is the realisation of Utopias,” Oscar Wilde wrote many years ago. A 15-hour workweek, universal basic income, and a world without borders… They’re all crazy dreams — but for how much longer?
People now doubt that “human ideas and beliefs are the main movers of history,” as Hayek argued back when neoliberalism was still in its infancy. “We all find it so difficult to imagine that our belief [sic] might be different from what they in fact are.” It could easily take a generation, he asserted, before new ideas prevail. For this very reason, we need thinkers who not only are patient, but also have “the courage to be ‘utopian.’”
Let this be the lesson of Mont Pèlerin. Let this be the mantra of everyone who dreams of a better world, so that we don’t once again hear the clock strike midnight and find ourselves just sitting around, empty-handed, waiting for an extraterrestrial salvation that will never come.
Ideas, however outrageous, have changed the world, and they will again. “Indeed,” wrote Keynes, “the world is ruled by little else.”
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2016 July 15