Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, em viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas.
O que é este blog?
Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;
Defesa e MRE organizam Seminário de Coordenação Temática Assessoria de Comunicação Social (Ascom) Ministério da Defesa
Brasília, 8/12/2016 – Com o propósito de buscar convergências entre as
agendas dos Ministérios da Defesa (MD) e das Relações Exteriores (MRE),
realizou-se, no último dia 7, o 1º Seminário de Coordenação MD-MRE,
organizado pelo Instituto Brasileiro de Estudos de Defesa Pandiá
Calógeras (IBED-MD) e o Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais
(IPRI-FUNAG-MRE).
O ministro da Defesa, Raul Jungmann, comentou: “considero esta reunião,
em sequência da outra [realizada com o Ministro José Serra], das mais
importantes, estratégicas, históricas para o Brasil. Não é para Relações
Exteriores, não é para a Defesa, é para o Brasil, porque aqui podemos
clarear e contribuir muito para nossos conceitos, nossas abordagens,
nossas convergências e divergências”.
Fotos: Ten Maurílio Kelly/EMCFA
No evento, realizado no auditório do MD, embaixadores e autoridades militares abordaram assuntos como cenário internacional – visões e perspectivas; fronteiras – vias de aproximação e áreas problemas; adidos de defesa e seu apoio à diplomacia e às relações internacionais; operações de Paz; e Base Industrial de Defesa.
A mesa inicial contou com a presença do diretor do Instituto de Pesquisas em Relações Internacionais da Fundação Alexandre de Gusmão, ministro Paulo Roberto de Almeida; do diretor do Pandiá Calógeras, Demétrio Carneiro da Cunha Oliveira; e do chefe do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas (EMCFA), almirante Ademir Sobrinho.
Na abertura do encontro, o almirante Ademir Sobrinho (CEMCFA) apresentou a visão da Defesa sobre o mundo atual. Citou a intensificação dos conflitos étnicos e religiosos; o incremento do tráfico de drogas, do contrabando, do crime organizado; o crescimento do terrorismo internacional; a falência de Estados; a ampliação da possibilidade de acesso de criminosos e terroristas às chamadas “armas sujas” (biológicas e radiológicas); o emprego de redes sociais para ativação de grupos terroristas e simpatizantes; as alterações climáticas no mundo; e a crise de refugiados.
Segundo o almirante, no caso do Brasil, na área de defesa, temos que equacionar políticas e estratégias que se adequem aos interesses do País, nesse ambiente tão permeado de ameaças e incertezas. “Podemos afirmar, com tranquilidade, que a parceria entre a diplomacia e a defesa brasileira será um importante catalisador da cooperação em todos os continentes, e vai continuar contribuindo, significativamente, para prevenção de conflitos, para consolidação da paz e para estabilidade internacional. Vai cooperar para que o Brasil defina seu rumo no conserto das nações”, afirmou.
Busca de convergências Os painéis do seminário foram resultado do encontro de alto nível entre o Ministro da Defesa, Raul Jungmann, e o Ministro das Relações Exteriores, José Serra, ocorrido no mês passado. “Essa aproximação é fato novo e deve ser considerada como extremamente relevante por se tratar de dois ministérios tipicamente de Estado. Essa busca de convergências só tem ganhadores, em especial o maior ganhador será o povo brasileiro, a quem servimos com orgulho”, explicou o diretor do Pandiá Calógeras, Demétrio Carneiro da Cunha Oliveira.
Durante as exposições, os debates transcorreram em torno do envolvimento do País no cenário internacional. O secretário de Planejamento Diplomático, ministro Braz Baracuhy, citou a relação Estados Unidos e China, que poderá definir uma dinâmica preponderante no sistema internacional nos próximos anos, com consequências importantes para o entorno estratégico do Brasil.
Embora grande parte dos problemas internacionais não estejam na América do Sul, seus reflexos geram incerteza nos países da região em matéria de segurança e defesa. “Isso contribui para exacerbar tensões, para rearmar, para adquirir maior capacidade militar, porque a incerteza está associada à sensação de falta de segurança, gerando reações”, disse o vice-chefe de Assuntos Estratégicos do MD, general Fernando Rodrigues Goulart, em sua apresentação.
A última discussão apresentada foi a do secretario de Produtos de Defesa, Flávio Basílio, sobre a inclusão do Ministério da Defesa no Conselho de Ministros da Câmara de Comércio Exterior (CAMEX).
Participaram, ainda, dos painéis, pelo MRE: o diretor do Departamento de Assuntos de Defesa e Segurança, embaixador Nelson Antonio Tabajara de Oliveira; a diretora do Departamento da América do Sul Meridional, embaixadora Eugênia Barthelmess; o diretor do Departamento da América do Sul Setentrional e Ocidental, embaixador Tarcísio de Lima Costa; a diretora do Departamento de Organismos Internacionais, ministra Maria Luiza Escorel; o coordenador geral de Mecanismos Regionais, conselheiro Arnaldo de Baena Fernandes; o subchefe da Divisão de Operações de Promoção Comercial, secretário José Renato Ferreira.
Pelo MD, também participaram o subchefe de Logística Operacional, brigadeiro Tarcisio Aquino Brito Veloso; o gerente da Seção de Assuntos Setoriais da SCOA, coronel Amaro Soares de Oliveira; e o gerente da Seção de Adidos de Defesa, coronel Igor Sidhartha Boechat.
Já sob o impacto da Lei de Segurança Nacional, mas ainda antes do Estado Novo. Em todo caso, ele foi muito bem recebido, com todo o apoio do Itamaraty, como convinha ao maior escritor da época, um dos grandes intelectuais do século.
Paulo Roberto de Almeida
Versal Editores, Casa Stefan Zweig e Goethe-Institut apresentam
8O ANOS DA CHEGADA DE STEFAN ZWEIG AO BRASIL
Em 21 de agosto de 1936, o RMS Alcântara atracou no porto do Rio de Janeiro trazendo a bordo uma celebridade: o austríaco Stefan Zweig, um dos maiores sucessos literários do mundo. De passagem para uma conferência do P.E.N. Club em Buenos Aires, essa escala de pouco mais de uma semana no Rio de Janeiro foi decisiva: Zweig se encantou pelo país. Registrou suas impressões no texto que intitulou "Pequena viagem ao Brasil", precursor do famoso "Brasil, um país do futuro".
Outras duas vezes Zweig haveria de desembarcar no mesmo porto: em 1940 e em 1941, já para vir morar em Petrópolis, onde ele e sua segunda mulher, Lotte, decidiram pôr um fim à vida em fevereiro de 1942, no meio da Segunda Guerra Mundial. Como diz seu biógrafo Alberto Dines em Morte no paraíso, a tragédia de Stefan Zweig: "Morreu pouco depois de completar 60 anos. De tanto retornar, revive. Stefan Zweig matou-se, mas recusa desaparecer. Está vivo."
Para falar dos 80 anos desde que Zweig pisou pela primeira vez no Brasil, a Versal Editores e o Goethe-Institut convidam dois diretores da Casa Stefan Zweig de Petrópolis: Tobias Cepelowicz (que, garoto, testemunhou a ida de Zweig a uma escola judaica no Rio) e Kristina Michahelles, tradutora de diversas livros de sua obra.
PALESTRANTES: Kristina Michahelles (Jornalista, tradutora de diversas obras do autor e diretora da Casa Stefan Zweig) e Tobias Cepelowicz (Diretor da Casa Stefan Zweig) DIA E HORÁRIO: 18 de novembro, das 18h30 às 19h45 LOCAL: Biblioteca do Goethe-Institut Rio de Janeiro (Rua do Passeio, 62, 2° andar - Centro) ENTRADA FRANCA
Confusa essa história, ou confusa a matéria (o que é mais provável): não se sabe se os cortes em órgãos do sistema Mercosul foram sugeridos pelo Itamaraty -- o que seria incongruente com o caso do Tribunal Permanente de Revisão, por exemplo, ainda que justificado no caso de penduricalhos "sociais" criados pelo companheiros, sem qualquer conexão com o Tratado de Assunção -- ou se o Planejamento decidiu de maneira mais ou menos arbitrária, ou de forma totalmente arrogante, e ao arrepio do Itamaraty.
Até que se esclareça claramente esses "cortes", permanecem as dúvidas, mas também acho que o Brasil participa de uma série imensa de inutilidades, às quais o Brasil aderiu pela inconsciência de alguns funcionários de alguns órgãos de Estado (ou até de estados e agências públicas, eventualmente inclusive de diplomatas) que talvez pensem que dinheiro nasce em árvores, ou que dinheiro público não custa nada.
Em todo caso, a tal de "diplomacia ativa e altiva" (e soberana, não esquecer), ou seus representantes credenciados vão botar a boca no trambone, denunciando o "crime contra" a política externa brasileira e a dignidade do Brasil, a traição da "diplomacia companheira" e seus grandes "objetivos estratégicos" para colocar o Brasil no primeiro plano do cenário internacional, enfim, todas essas coisas magnifícas, como vocês podem imaginar.
Paulo Roberto de Almeida
Brasil estuda deixar 34 organizações internacionais para reduzir custos
Por Lisandra Paraguassu
BRASÍLIA
(Reuters) - O governo brasileiro estuda abandonar 34 organizações
internacionais, entre elas seis instituições do Mercosul, para reduzir
os custos resultantes da participação do país nessas entidades, disseram
fontes com conhecimento do assunto à Reuters.
Entre as entidades
que podem deixar de ter a participação brasileira, segundo uma lista a
qual a Reuters teve acesso, estão a Secretaria-Geral Ibero-Americana,
que prepara as cúpulas da região, e a Organização das Nações Unidas para
o Desenvolvimento Industrial (Unido), responsável pelo desenvolvimento
industrial de países mais pobres.
A
lista foi preparada pelo Ministério do Planejamento, responsável por
pagar as cotas brasileiras às instituições internacionais. A intenção,
de acordo com uma das fontes, é diminuir custos.
Os números mais
recentes, explica a fonte, apontam para uma dívida de mais de 3 bilhões
de reais do governo brasileiro com dezenas de organizações
internacionais. Até hoje, no entanto, não havia se cogitado uma decisão
unilateral de saída, já que há um custo diplomático para isso.
De
acordo com o Itamaraty, não há uma decisão fechada sobre a lista. As
sugestões foram passadas pelo Planejamento e encaminhadas às áreas
responsáveis e às embaixadas onde ficam às organizações para que avaliem
a relevância do Brasil permanecer ou não nos organismos.
Em
alguns casos, a saída da organização não faz sentido, como no caso da
Secretaria do Tribunal Permanente de Revisão do Mercosul, órgão
administrativo do tribunal responsável por solução de controvérsias nas
normas e entre os membros do bloco.
De acordo com uma das
fontes, foram poucos os casos julgados na última década, o que pode
levar a crer, em uma análise fria dos números, que o órgão tem pouca
importância. Uma saída do órgão, no entanto, deixaria o país sem
representação em caso de uma controvérsia com outro país do bloco.
A
lista inclui ainda outras cinco organizações do Mercosul, como o
Instituto Social do Mercosul, o Fundo de Promoção do Turismo e o
instituto de políticas públicas de direitos humanos do bloco.
Alguns
órgãos apontados pelo Planejamento são pouco conhecidos, como o Acordo
de Conservação de Albatrozes e Petréis ou a Comissão Internacional da
Pimenta do Reino. Mas a proposta inclui, por exemplo, a Secretaria-Geral
Ibero-Americana e outras organizações da Cúpula dos Estados
Ibero-Americanos, incluindo a organização para a Educação, a Ciência e a
Cultura e para a Juventude.
Na última cúpula, em 2014, o
presidente interino Michel Temer representou o Brasil como
vice-presidente. A presidente afastada Dilma Rousseff esteve em 2012 no
encontro do órgão, na Espanha.
De acordo com uma das fontes, há
casos em que o Brasil já pensou em sair há alguns anos, como do Sistema
Econômico Latino-Americano (Sela), que tem sede em Caracas.
A
avaliação na época era de que a organização havia perdido parte da sua
razão de ser com a criação da Comunidade de Estados Latino-Americanos e
Caribenhos (Celac), mas acabou-se desistindo da ideia de deixar a
entidade quando outros países, que também sairiam, mudaram de posição.
Dentro
do Itamaraty há quem avalie que a preparação de uma lista de
organizações pelo Planejamento, mesmo que tenha sido passada ao
Ministério das Relações Exteriores para análise, mostra que ainda há um
desprestígio da diplomacia, mesmo com as promessas do novo chanceler,
José Serra, de valorizar a pasta.
Outros, no entanto, consideram que é possível sim rever a participação do Brasil em algumas organizações.
A
saída de organismos internacionais seria mais uma medida para corte de
custos no Ministério das Relações Exteriores. De acordo com uma das
fontes, Serra recebeu a promessa de recomposição do orçamento do
Itamaraty, mas o ministério passará, de qualquer forma, por uma
reestruturação.
Na última quarta-feira, foi publicado no Diário
Oficial da União o corte de 46 cargos em comissão no Itamaraty, a
maioria nos níveis mais baixos. Ao contrário dos demais ministérios,
onde os chamados CCs são ocupados por indicados políticos, no Itamaraty,
por lei, só podem ser dados a diplomatas de carreira.
Editorial resposta do Estadão à campanha sórdida dos dirigentes e mercenários do partido totalitário contra o processo de impeachment. Se não fosse por outros motivos, eles deveriam ser banidos da vida pública também por isso.
Paulo Roberto de Almeida
O jogo sujo da campanha para enxovalhar o Brasil no exterior O jogo sujo da desinformação
Editorial / O Estado de S. Paulo, domingo, 29 de maio de 2016
O Brasil, sua democracia e suas instituições estão sendo enxovalhados no exterior por uma campanha de difusão de falsidades cujo objetivo é denunciar a “ilegitimidade” do presidente em exercício Michel Temer. Diante da ousadia desses delinquentes a serviço da causa lulopetista, não basta ao Itamaraty limitar-se a orientar suas missões no exterior sobre como responder a essa onda de desinformação. Será necessária uma atitude mais resoluta para contra-arrestar as mentiras e deixar claro aos governos e à opinião pública de outros países que o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff vem cumprindo todos os requisitos legais, e também para defender a decisão soberana dos eleitores brasileiros, devidamente representados no Congresso que votou pelo afastamento da petista.
Na mais recente ofensiva da patota petista, um jornalista usou uma rotineira entrevista do porta-voz do Departamento de Estado dos Estados Unidos, Mark Toner, para tentar induzir a Casa Branca a reconhecer que houve um “golpe” no Brasil e que a democracia no País foi arruinada.
Na entrevista, dia 24 passado, o jornalista, não identificado, mencionou os diálogos entre o então ministro do Planejamento, Romero Jucá, e o ex-presidente da Transpetro Sergio Machado – a quem o repórter chamou de “ex-magnata do petróleo” –, sugerindo ter havido ali um arranjo para derrubar Dilma. Então o repórter perguntou: “À luz dessas revelações, não seria hora de começar a considerar que o que aconteceu no Brasil pode ter sido um golpe brando?”.
O porta-voz Mark Toner respondeu que, para o governo americano, conforme já manifestado “várias vezes”, o processo democrático brasileiro e suas instituições “são estáveis o bastante e fortes o suficiente”, razão pela qual o País “é capaz de superar sua crise política”. Em seguida, para encerrar a conversa, disse: “Desse ponto em diante, não falarei sobre a política interna do Brasil”.
O verdadeiro papel daquele jornalista ficou explícito: não se tratava de fazer uma entrevista, mas sim de provocar um constrangimento. Disse o repórter: “Bom, isso é interessante. O novo governo acabou com todas as investigações anticorrupção contra os políticos que a ele haviam aderido” – algo que simplesmente não é verdade. E ele desatou a fazer um discurso como se estivesse numa assembleia estudantil: “Eles começaram a vender bens estatais, estão falando em mudar a política externa brasileira e formaram um Ministério inteiramente masculino, feito de gente ligada ao mercado e à indústria, gente que era hostil a uma porção de prioridades do governo anterior, e nada disso foi feito com o voto popular. O povo não teve nenhuma palavra nisso. Houve mesmo um processo democrático? Os Estados Unidos consideram aquilo um processo democrático?”.
Para não permitir que o Departamento de Estado americano continuasse a servir como palanque para o embuste lulopetista, o porta-voz interrompeu a conversa depois de reafirmar a crença dos Estados Unidos na força da democracia do Brasil e de dizer que não faria nenhum reparo às “mudanças internas no governo brasileiro”.
Não se trata de um episódio isolado. Os advogados da causa petista, aqui e no exterior, não se sentem constrangidos em apelar para a desinformação quando se trata de tentar caracterizar a “ilegitimidade” de Michel Temer. Um desses ativistas, o americano Glenn Greenwald, chegou ao cúmulo de publicar reportagem na qual diz que Temer não poderia assumir a Presidência porque “está por oito anos impedido de se candidatar a qualquer cargo público”. Ou seja, o jornalista tratou como condenação definitiva o que é apenas a opinião da Procuradoria Regional Eleitoral de São Paulo, a propósito de uma multa de R$ 80 mil imposta a Temer por ter feito doações eleitorais acima do teto.
Derrotado fragorosamente quando tentou emplacar a tese do “golpe”, rejeitada in totum pelo Supremo Tribunal Federal, restou à trupe lulopetista espalhar mundo afora que Temer é “ilegítimo”. É esse o jogo sujo que o Itamaraty terá de enfrentar.
SPG, o ex-SG do Itamaraty na gestão Lula (durante sete anos), é muito conhecido para ser apresentado. Ressalto apenas que ele continua um persistente defensor do antigo regime lulopetista, ignorando por completo as acusações de corrupção contra o ex-presidente e sua sucessora, e repetindo seus mesmos conceitos sobre política externa, política econômica, integração regional e temas afins.
Suas considerações sobre estas questões objetivas mereceriam, por certo, muitos outros argumentos de natureza econômica ou sobre opções de integração regional e de inserção na economia mundial, que não me cabe fazer aqui, neste momento, tanto porque teriam de ser muito longos, como porque desvirtuariam a transcrição de sua entrevista, neste espaço.
Ele pode ter razão em algumas alegações -- sobre as negociações entre o Mercosul e a União Europeia, por exemplo -- mas continua insistindo numa velha concepção do desenvolvimento brasileiro derivada diretamente de suas teses cepalianas e nacionalisteiras atrasadas, que, repito, teriam de ser longamente rebatidas. Já o fiz em diversas oportunidades, como posso fazer novamente em próxima ocasião.
No momento cabe registrar sua insistência nas mesmas teses mentirosas da presidente afastada e dos blogueiros mercenários sobre o processo de impeachment, e sua total negação das realidades do regime hiper-corrupto do lulopetismo, uma quadrilha mafiosa que simplesmente destruiu a economia brasileira.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 29/05/2016
ENTREVISTA A SAMUEL
PINHEIRO GUIMARAES, EX VICECANCILLER DE LULA
“En Brasil hubo una conspiración”
El ex vicecanciller de Lula y ex número uno del
Mercosur niega que Lula y Dilma hayan desplegado una diplomacia “ideológica” y
advierte contra acuerdos de libre comercio.
Martín
Granovsky
Página
12, 20 mayo 2016
–¿El de Michel Temer es un gobierno legítimo?
–El gobierno
de Michel Temer es interino. Y es el resultado de una conspiración.
Participaron de ella, en forma coordinada, distintos sectores: los políticos
involucrados en denuncias de corrupción; los políticos y partidos de oposición,
como el Partido de la Socialdemocracia Brasileña, desconformes con la para
ellos inesperada derrota por escaso margen de 2014; los políticos conservadores
desde el punto de vista social, como los evangélicos; los medios de
comunicación en especial el sistema Globo, con decenas de canales de
televisión, de radios, diarios y revistas; el Poder Judicial, desde el juez
Sergio Moro, mesiánico y dispuesto a practicar en su lucha contra la corrupción
actos ilegales de todo tipo, hasta los ministros de la Corte Suprema que,
pudiendo y debiendo hacerlo, no lo disciplinaron; los intereses extranjeros que
vieron en las dificultades económicas la oportunidad de revertir políticas de
defensa de los capitales nacionales para promover la reducción del Estado y la
apertura hacia los bienes y capitales extranjeros, como en el caso de Petrobrás
y los riquísimos yacimientos de petróleo del pré-sal, o como en el caso del
Banco Nacional de Desarrollo; el mercado financiero, estos es, los grandes
inversores y millonarios que abarcan a 71.440 brasileños cuya renta mensual
media es de 600 mil dólares; los rentistas, temerosos de una política de
reducción de tasas de interés; las asociaciones empresarias como la Fiesp, la
Febraban, la CNI y la CNA; los defensores de las políticas de austeridad que
quieren la reducción de los programas sociales, la revisión de derechos de los
trabajadores, el equilibrio fiscal mediante la reducción del Estado y de los
programas sociales y el fin de la fiscalización de los abusos de las empresas;
y, finalmente, los diputados, senadores, economistas y periodistas que fueron
intérpretes, portavoces o beneficiarios de los intereses que acabo de
describir. Tomemos un nombre como ejemplo: Eduardo Cunha.
–El presidente de la Cámara de Diputados durante la
votación de la admisibilidad del juicio político.
–Sí. Corrupto.
Luego fue alejado del cargo por el Supremo Tribunal Federal, que podría haberlo
apartado antes. Sin que hubiera ninguna prueba de acto ilícito practicado por
la presidenta, votaron por el juicio político 367 diputados y eventualmente lo
harán 54 senadores, todos ellos representantes de los sectores sociales más
conservadores y de los individuos más ricos en una de las sociedades más
desiguales del mundo. Defendieron a los intereses extranjeros más voraces y
podrían llegar a anular el resultado de elecciones en las que 54 millones de
brasileños eligieron a Dilma Rousseff. Quieren terminar con la continuidad de
un proceso de desarrollo social, político y económico de Brasil que se inició
en 2003 con la derrota de un proyecto neoliberal, sumiso y reaccionario. La
composición del gabinete de Temer, sus lazos ostensibles y públicos con los
intereses económicos conservadores y las acusaciones de corrupción que pesan
sobre ellos indican perfectamente el carácter de conspiración que derribó a
Dilma Rousseff. El objetivo final de esa conspiración es la recuperación total
del poder en las elecciones de 2018.
–¿Qué posibilidades tiene Dilma de no ser desplazada
definitivamente por el Senado?
–Hay grandes
posibilidades de que no sea separada. Deben votar su alejamiento dos tercios de
los senadores, 54 sobre un total de 81. Las manifestaciones populares, de
personalidades y de sectores significativos contra el gobierno de Temer y
contra sus primeras políticas, en favor de la democracia y contra el golpe, se
están haciendo más amplias e intensas a pesar de que los grandes medios buscan
minimizarlas. Los elementos fundamentales para evitar un desplazamiento son la
participación del Presidente Lula al frente de las manifestaciones populares,
la resistencia a cada iniciativa que el gobierno interino presente en el
Congreso y la movilización coordinada de las organizaciones sociales.
–Al asumir como canciller, José Serra indicó diez
líneas de acción de su gestión futura y dijo que la diplomacia brasileña no
sería “ideológica” ni estaría al servicio de un partido político. Usted fue
vicecanciller, presidente del Mercosur y secretario de asuntos estratégicos.
¿La diplomacia era “ideológica”?
–La política
exterior de Brasil tiene que basarse en los objetivos de soberanía, integridad
territorial, desarrollo económico, social y político y debe guiarse por la
Constitución, que en su artículo 4 define los principios de la política
externa. Entre ellos, el objetivo de promover la integración latinoamericana.
Por un lado, la política exterior de Brasil tiene que considerar la
localización geográfica del país, con sus doce naciones vecinas, las asimetrías
entre Brasil y los vecinos, sus extraordinarias dimensiones territoriales, de
población y de desarrollo económico, pero también sus disparidades de todo
orden. Debe tener en cuenta sus enormes recursos naturales y simultáneamente
las circunstancias de un mundo en el que se verifica una gran concentración del
poder económico, político y mediático, con gigantescas multinacionales, con
políticas de restricción del desarrollo económico y tecnológico, con las
grandes potencias en crisis económica prolongada y con una velada disputa por
la hegemonía entre los Estados Unidos y China. La política exterior de los
gobiernos del PT se guió con firmeza y coherencia según los principios de
autodeterminación, de no intervención, de cooperación entre países
subdesarrollados, de integración sudamericana y por los objetivos de lucha por
la desconcentración del poder a nivel mundial y por la multipolarización,
contra la unilateralidad de las grandes potencias. Los gobiernos buscaron la
defensa de la paz y el desarme de los países fuertemente armados, lucharon por
el derecho al desarrollo y contra el calentamiento global y la pobreza. Por eso
en Sudamérica Brasil sostuvo relaciones de cooperación y de respeto político
con gobiernos tan distintos como los de Colombia, Perú, Chile, Venezuela,
Argentina, Uruguay, Paraguay, Ecuador, Bolivia, etcétera.
–¿Y con Estados Unidos?
–Brasil
mantuvo una política de cooperación, como en el caso del etanol. De respeto
mutuo, como en la Ronda de Doha. Y de divergencia siempre que fuese necesario,
como sucedió con el ALCA. De los comentarios del Presidente Obama sobre el
Presidente Lula puede inferirse que las relaciones con Brasil siempre fueron
consideradas importantes por los Estados Unidos. Con la Unión Europea hay un
acuerdo de asociación estratégica, cosa que la UE firmó con muy pocos países.
Brasil acordó la construcción y la transferencia de tecnología de un submarino
nuclear y la compra, construcción y transferencia de aviones de combate
Grippen. China se convirtió en el primer socio comercial de Brasil y aumentó
sus inversiones. Los acuerdos prevén operaciones por 54 mil millones de
dólares, además de la participación conjunta en los Brics, en el Banco de los
Brics, en el Acuerdo de Reservas y en el Banco Asiático de Infraestructura.
Toda la política exterior se basó en la cooperación respetuosa, sin el intento
de enseñar a ningún Estado, país o sociedad cómo debía organizarse política o
económicamente. Todo esto prueba cabalmente, para quien conoce un mínimo de
política internacional y quiere ir más allá del prejuicio mediático o de los
preconceptos partidarios, que la política desarrollada desde 2003 no fue ni
ideológica ni partidaria, y tampoco buscó beneficiar los intereses de un
partido. Ni siquiera del principal partido de gobierno, el PT.
–¿Sudamérica tiene que empezar a firmar acuerdos de
libre comercio?
–El centro de
la política exterior brasileña debe ser América del Sur. En América del Sur,
Mercosur. Dentro de Mercosur, la Argentina. No comprender eso significa una
enorme miopía y cultivar el fracaso. El desarrollo de un país como Brasil debe
basarse en la industrialización. Brasil tiene un 85 por ciento de su población
urbana, una agricultura que no emplea mano de obra en gran escala, un sector de
servicios subdesarrollado, con gran necesidad de generar empleos para absorber
el crecimiento de la fuerza de trabajo y dar empleo pleno a los subempleados y
a los 50 millones de beneficiarios del plan Bolsa Familia, cuyo ingreso mensual
es inferior a 20 dólares por día. Con esos datos, pensar en la construcción de
una economía y una sociedad con base agrícola es un absurdo técnico, político y
social. Bien: la industrialización necesita de mercados seguros, como los
regionales, a través de acuerdos que estimulen el desarrollo de empresas de capital
nacional y atraigan empresas extranjeras, y también a través de la acción del
Estado para construir infraestructura y completar la iniciativa privada. Ese
mercado, en América del Sur, es el Mercosur, con su arancel externo común. Los
países industrializados que desean escapar de sus crisis a través de aumentar
sus exportaciones lo que quieren hoy es eliminar ese arancel externo común. La
celebración de acuerdos de libre comercio sería el fin del Mercosur. Si esto es
así, el acuerdo Mercosur-Unión Europea funcionaría, en realidad, como el
primero de una serie de acuerdos de libre comercio con los Estados Unidos,
China y Japón. Los países del Mercosur, en especial Brasil y la Argentina,
terminarían abriendo totalmente sus mercados para los productos industriales
europeos y luego para los norteamericanos, chinos y japoneses, darían
concesiones asimétricas por ejemplo en compras gubernamentales y a cambio
recibirían concesiones irrisorias en materia agrícola. Incluso las mayores
concesiones serían irrisorias si a cambio se pierden las posibilidades de
industrialización. Los acuerdos de libre comercio tan defendidos por los
grandes medios, académicos e importadores significarían el fin del Mercosur
como instrumento de industrialización y desarrollo.
Diplomático de carrera y ensayista, Samuel Pinheiro
Guimaraes fue uno de los diseñadores de la diplomacia de Lula y Dilma junto con
Celso Amorim y Marco Aurélio García. Aceptó contestar las preguntas de
Página/12 al final de una semana que empezó con la visita del canciller de
Michel Temer, José Serra, el ex candidato a la presidencia derrotado en 2002 y
2010.
Conselheiro e amigo do novo ministro das
Relações Exteriores, o diplomata fala de suas contribuições à nova
gestão da pasta e reflete sobre os caminhos da política externa
brasileira
TERESA PEROSA
27/05/2016 - 21h26 - Atualizado 28/05/2016 12h35
Revista Época
Depois do discurso de posse do novo ministro das Relações Exteriores, o senadorJosé Serra (PSDB), analistas apontaram para influência indelével do ex-ministro Rubens Ricupero nas entrelinhas das novas diretrizes da política externa anunciada na ocasião. Ele minimiza seu impacto nas mudanças no Itamaraty. “Não como se eu estivesse em Brasília ao lado do Serra”, diz. Ainda assim, dois homens fortes da gestão, Sérgio Danese, o novo embaixador em Buenos Aires, e Marcos Galvão,
recém-nomeado Secretário-geral do ministério, são indicação pessoal
sua. Ricupero foi ministro da Fazenda durante a gestão de Itamar Franco e
secretário-geral da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e
Desenvolvimento (Unctad) e hoje é professor da Fundação Armando Álvares
Penteado (FAAP) em São Paulo. Em entrevista à ÉPOCA, Ricupero fala sobre
os primeiros dez dias de Serra a frente do Itamaraty e sobre a
necessidade de cautela na reavaliação do Mercosul. >> Como fica o Itamaraty com José Serra ministro das Relações Exteriores? ÉPOCA – O senhor é apontado como uma das inspirações e grandes
conselheiros do ministro José Serra. O senhor foi consultado por ele?
Rubens Ricupero – Sou amigo dele há muitos anos. Eu conheço
Serra há 30 anos, embora eu seja mais velho do que ele. Nós somos mais
ou menos da mesma origem: eu nasci no Brás, ele nasceu na Mooca. Tenho
uma ligação com ele que não tenho com nenhum outro político. Quando ele
começou a ser convidado para esse cargo, conversou comigo, conversou com
(o diplomata e ex-ministro) Sérgio Amaral, e com muita gente, Fernando
Henrique também, porque ele ainda estava em dúvida. Tanto Sérgio Amaral
como eu procuramos encorajá-lo. Para nós, o Itamaraty precisava muito de
um ministro politicamente forte. O ministério vem de um período
terrível, com três ministros que eram diplomatas, de boa qualidade.
Conheço e aprecio todos eles, mas eles não tinham força política. Nem
com a presidente (Dilma Rousseff), nem com o Ministério do Planejamento.
O Itamaraty ficou muito enfraquecido com isso. O problema não é ser ou
não diplomata. Por exemplo, o (ex-chanceler) Celso Amorim era diplomata e
foi um ministro forte muito ligado ao (presidente Luiz Inácio) Lula (da
Silva). Lula parecia gostar do assunto, foi um período positivo. Com
Dilma, o Itamaraty não só saiu daquele centro de decisões, como perdeu
muita coisa, perdeu recursos, ficou em uma situação aflitiva. Nós
achávamos que seria muito bom para o ministério ter um ministro como
ele, embora eu esteja fora do Itamaraty há 20 anos. Ajudei sugerindo
nomes, falei para ele com muita ênfase a necessidade de manter tanto
quanto possível a cúpula, a começar pelo Sérgio Danese, que foi meu
assistente. Tanto Danese quanto Marcos Galvão são quase como dois irmãos
mais jovens para mim, foram meus assistentes inclusive quando ensinei
história das relações diplomáticas do Brasil no Rio Branco. O primeiro
livro que eu fiz "Brasil no Mundo" foi todo organizado pelo Sérgio
Danese. Sérgio e Marcos são quase como se fossem da minha família. Serra
conhecia ambos. Evidentemente, a minha recomendação, que foi apoiada
pelo Sérgio Amaral, ajudou ele a se orientar. Também procurei ajudar em
matéria de conversar com ele sobre as linhas gerais da política que ele
ia seguir. Ele tem ideias muito claras. O arcabouço do discurso (de
posse) que Serra fez ele me mandou já pronto. Ele me mandou o esqueleto
básico: a estrutura do discurso já estava pronta. Sugeri uma ou outra
coisa, em temas como meio ambiente, América Latina, México, Argentina e
direitos humanos. Mas foram pontos de redação que sugeri. Ele deve ter
ouvido várias pessoas para montar o discurso. Mas o discurso basicamente
foi ele que escreveu, já me mandou o discurso praticamente pronto. Um
tema, por exemplo, como esse do Mercosul, que tem sido levantado. Eu
disse a ele desde o início - e acho que ele já estava mais ou menos
evoluindo para essa posição - que antes de cogitar transformar a
natureza do Mercosul, que é um tipo de acordo comercial muito raro, uma
união aduaneira.. A união aduaneira é muito mais que um acordo de livre
comércio. O acordo de livre comércio é um acordo cujo objetivo é
simplesmente abolir as barreiras ao comércio entre os membros, mas cada
um dos membros conserva em relação a terceiros a sua própria barreira.
Não há uma coordenação dessas barreiras em relação aos que não são
membros do acordo. Já no caso de uma união aduaneira, ela além de ter
tudo o que tem no acordo de livre comércio, ela tem isso e mais um plus:
o fato de que ela tem uma barreira comum em relação a terceiros. Em
tese, todos os membros de uma união aduaneira têm que ter as mesmas
tarifas em relação a aqueles que não são membros. Então, evoluir de
união aduaneira para umacordo de livre comércio, é, de certa forma, uma
redução de status. É como se você fosse algo maior e decidisse ser
menos, porque é difícil ser mais. Eu disse a ele: é preciso avaliar
bem, porque muitos setores do Brasil e da Argentina dependem muito da
união aduaneira. Um dos setores é o automobilístico. Essas coisas
requerem uma avaliação cuidadosa: conversar com os setores e depois
tomar uma decisão. Ele mais ou menos já estava nessa linha e creio que
agora deve ter conversado na Argentina sobre isso. Mas quero esclarecer
que meu papel é de um amigo dele que ele ouve de vez em quando. Saí do
Brasil antes do voto do Senado. Cheguei na quarta-feira (dia 25) de
volta da Europa. Não é propriamente como as pessoas muitas vezes pensam,
como se eu estivesse em Brasília ao lado do Serra. Não é o caso, estou
longe. >> Oliver Stuenkel: "O Itamaraty pode voltar a ter o status de um ministério-chave"
ÉPOCA – Qual sua avaliação das decisões e declarações dadas pelo ministro até agora?
Ricupero – Gostei muito da forma final do discurso. Achei que
ficou mais rico porque ele acrescentou muita coisa em relação ao que eu
tinha visto. Acrescentou um parágrafo inteiro sobre o fato de que a
chave do êxito no comércio não são os acordos de livre comércio, mas sim
a competitividade. Esse é um tema que defendo há anos, mas posso te
garantir que não tive nada a ver com isso. Quando eu dei os palpites,
não tinha me ocorrido isso. Vi que ele incluiu, não sei se alguém
sugeriu ou ele mesmo pensou. O discurso me pareceu muito redondo, muito
forte. Pelo que eu posso ver, noto que a repercussão tem sido muito
positiva. Ele se destaca muito, porque, nas outras áreas, parece ter
havido problemas, como no caso do Ministério da Cultura. O Itamaraty,
pelo que eu vejo, está indo muito bem. >> José Serra quer um novo Mercosul
ÉPOCA – O que a indicação de Marcos Galvão traz para a Secretaria-geral do Itamaraty?
Ricupero – Marcos é excelente. Desses diplomatas novos, é uma
das maiores vocações que o Itamaraty tem. Ele,durante muito tempo,
trabalhou comigo, inclusive no Ministério da Fazenda. Ele estava ao meu
lado, como Sérgio Danese também estava comigo na Fazenda na época do
Real. Depois, ele teve sua carreira própria. No Brasil, o último posto
que ele teve e em que ele se saiu brilhantemente, o Marcos era o
subsecretário de Assuntos Internacionais da Fazenda, com o Guido
Mantega. Ele era aquilo que na linguagem internacional chamam de "sherpa
brasileiro". Seu papel era organizar reuniões do G20. Teve um papel
muito forte, desde o início. O Marcos teve um desempenho brilhante na
criação do G20, onde ele trabalhou muito com o Mantega, se destacou. O
Marcos vem de um posto extremamente interessante porque ele era o nosso
embaixador na Organização Mundial do Comércio (OMC) em Genebra. E lá ele
teve um desempenho muito bom. Como a ênfase agora vai ser comércio,
ninguém melhor do que ele porque a OMC é digamos a Roma, é a cidade
santa do comércio. Quem passa pela OMC conhece muito o comércio, tanto
as negociações na própria OMC como de acordos bilaterais e regionais,
porque todos esses acordos fazem referência ao Acordo Geral sobre
Tarifas e Comércio (GATT), que é a constituição da OMC. O Marcos conhece
isso muito bem. Então, nada melhor do que uma pessoa como ele para
poder ser o segundo no ministério nessa hora.
ÉPOCA – Uma
das relutâncias de Serra em assumir a pasta teria sido o fato de não
estar certo que Agência Brasileira de Promoção de Exportações e
Investimentos (Apex) e Câmera de Comércio Exterior (Camex) viriam para o
Itamaraty. Ele chegou a manifestar isso para o senhor?
Ricupero – Não, porque desde o primeiro momento em que ele
falou comigo, essa ideia já estava equacionada, isso nunca me foi
apresentado como dúvida. Pelo menos, desde o momento de quando eu me
reuni pela primeira vez com ele na casa do Sérgio Amaral, nós discutimos
que pessoas poderiam trabalhar na Apex e etc. Já havia a ideia unânime
do Roberto Jaguaribe. Há muito tempo que há esse problema porque a Apex
tem recurso, mas não tem aquela rede que o Itamaraty tem dos setores de
promoção comercial que existem no mundo inteiro. E o Itamaraty tem a
rede, mas não tem o recurso. Então, o lógico é juntar as duas coisas.
ÉPOCA
– O agora ministro Serra já se posicionou em outras ocasiões como um
crítico do Mercosul. Como o senhor mencionou, a revisão da união
aduaneira implicaria em um passo para trás. O senhor acredita que haverá
uma mudança nesse sentido?
Ricupero – Qual era o argumento básico que se dizia para
abandonar a união aduaneira? É porque segundo se alega, nenhum dos
países membros pode negociar acordos bilaterais ou regionais sem que os
outros todos participem. Isso nunca foi testado na prática. E isso não
faz parte da natureza da união aduaneira. Isso é apenas uma resolução de
ministros do Mercosul. Há uma resolução que, assim como foi adotada,
pode ser revogada. É uma decisão que pode ser mudada a qualquer momento
sem abandonar a união aduaneira. Mas esse problema era alegado, porque
de fato durante muito tempo, como se sabe, a Argentina estava em uma
situação difícil. Ela não queria negociar com a União Europeia. Mas esse
problema desapareceu hoje em dia porque a Argentina está na mesma
linha. Outro país que poderia criar problema eventualmente seria a
Venezuela. Mas a Venezuela nunca aderiu inteiramente ao Mercosul, ela
entrou mais politicamente. As negociações sobre as tarifas e as
concessões que a Venezuela teria que fazer no Mercosul nunca foram
concluídas. A Venezuela é um país que teoricamente está dentro, mas não
está e já tinha declarado, ainda na época recente da Dilmam que não
seria obstáculo. A Venezuela não participaria da negociação com a União
Europeia, mas também não seria um obstáculo. Paraguai e Uruguai são
mais desejosos do que o Brasil. Então é como querer encontrar pelo em
casca de ovo: qual é o problema da união aduaneira? Em que ela está
atrapalhando o Brasil? Eu nunca encontrei alguém que me dissesse. A não
ser esse problema da Argentina, mas isso agora acabou. O problema não é
nosso, é mais pela Europa agora. A França tem medo por causa da questão
das carnes. Eles antes se escudavam atrás da coisa da Argentina. Agora,
isso não existe mais. (O Serra era crítico) mais por isso porque não
tínhamos flexibilidade, não podíamos negociar, mas agora isso acabou.
ÉPOCA
– Em seu discurso de posse no Itamaraty, Serra declarou que a política a
ser capitaneada por ele seria livre de “partidarização” e ideologia.
Uma das críticas que ele sofre agora seria que há uma “ideologização”
pelo outro lado, já que a aproximação prioritária é com governos mais
alinhados ao discurso liberal, como Macri na Argentina e Enrique Peña
Nieto, no México.
Ricupero – Essa crítica não tem nenhuma procedência. Vi isso
no artigo do Celso Amorim. Acho que Matias Spektor também disse isso,
mas em ambos os casos eles estão errados. Uma coisa é você privilegiar o
relacionamento com países como Cuba ou Nicarágua, que são distantes do
Brasil, com os quais nós nunca tivemos tantos vínculos nem comerciais
nem econômicos, nem de nenhuma natureza. A nossa relação com Cuba e
Nicarágua sempre foi uma relação muito distante. Portanto, no momento em
que se começa a dizer que Cuba, Nicarágua são parceiros preferenciais
porque são bolivarianos, ai sim a única justificativa é a ideologia,
porque não há outra. Você só pode se sentir próximo de Cuba e Nicarágua
porque eles são bolivarianos e o PT tinha alguma afinidade com eles. No
caso da Argentina e do México, é diferente. O caso da Argentina e do
México é que eles são os dois maiores países latino-americanos e os
únicos que têm um peso específico comparável ao Brasil pelo tamanho do
território, pelo tamanho da economia, da população. É claro que são
menores do que nós, mas são países muito expressivos. O México tem uma
economia muito pujante que não está muito distante da brasileira. Esses
dois países formam com o Brasil os três maiores países da América
Latina. Então, que esses três países tenham uma relação estreita é
imposição da própria realidade. Na Europa, todo mundo sabe que o
parceiro privilegiado da França é a Alemanha e que o parceiro
privilegiado da Alemanha é a França, porque são as duas grandes
potências que são o centro de gravidade da União Europeia. Isso entre os
próprios governos. Por exemplo, o (Nicolas) Sarkozy era muito próximo
da (Angela) Merkel. Quando ele foi substituído pelo (François) Hollande,
não houve nenhuma diferença. Mudou de um partido de direita para um
partido socialista, mas a relação franco-alemã é a mesma. E será sempre a
mesma, porque sem esses dois, não há o centro de equilíbrio. Tanto para
a França como para a Alemanha o país mais importante, em seguida, é a
Inglaterra, o que é óbvio. Isso são considerações que nascem do próprio
realismo. Do realismo e da situação e não tem nada a ver com o fato de
ser o Macri. Se fosse ainda a Christina Kirchner, a Argentina seria a
mesma coisa, mas seria mais difícil, porque provavelmente com ela essa
questão do Mercosul ia ser uma dificuldade, porque ela não queria
negociar com a União Europeia. É óbvio que, enquanto nesses países, além
da importância em si, ainda haja governos como se diz em inglês
likeminded, que tenham a mesma abordagem, isso facilita. Mas isso não é
ideologia. Por exemplo, o Brasil quer um acordo comercial com o México,
se o México também que é ótimo. Seja lá qual for a ideologia, se os
dois lados quiserem, haverá o acordo. Acho uma crítica totalmente
improcedente. Seria verdade se você fosse dizer: o Brasil agora vai
resolver ter uma política privilegiada com um país qualquer de direita
que fica na América Central e no Caribe. Mas não é o caso, são países de
peso. >> Marco Aurélio Garcia: "Querem desacreditar a política externa brasileira"
ÉPOCA
– O ministro também foi criticado pelo tom das notas diplomáticas para
países que emitiram notas qualificando o processo de impeachment como
golpe de Estado. Na terça-feira (24), o Itamaraty distribuiu uma
circular em que pedia para que os embaixadores pelo mundo se engajassem
de forma mais ativa em relação à narrativa do golpe. Qual sua avaliação
sobre esses posicionamentos?
Ricupero – Disseram que as notas de resposta do Brasil aos
bolivarianos e outros tinham sido muito duras. Eu achei o contrário.
Duras têm sido as notas de intromissão em assuntos internos brasileiros.
Por exemplo, a nota da Venezuela é uma nota prolixa. Deve ser sete ou
oito vezes maior do que a resposta brasileira e se mete em assuntos
nossos - e nós não podemos tolerar nenhum tipo de interferência. Eu
achei a nossa resposta firme. Pessoalmente, se eu fosse ministro, eu
seria até mais duro, porque eu lembraria que é até irônico que países
como Venezuela, Cuba, Nicarágua queiram dar lições de democracia,
liberdade, de direitos humanos a qualquer outro país, porque obviamente
não são qualificados para isso. Mas o Brasil não fez isso. O Brasil
apenas se limitou na resposta a lembrar quais são os dispositivos
constitucionais aqui e o papel que foi desempenhado inclusive pelo
Supremo Tribunal Federal. Então me dizer isso me parece correto.
Trata-se simplesmente de elucidar as pessoas no exterior que o que se
passa no Brasil obedece ao que é previsto na Constituição e vem sendo
objeto de um controle frequente, quase que até repetitivo do Supremo
Tribuna Federal. Para considerar que apesar disso, o que está ocorrendo
não está de acordo, então tem que condenar todas as instituições
brasileiras, inclusive o Supremo Tribunal Federal. >> Aníbal Pérez-Liñan: “A crise no Brasil não se encerrará logo”
ÉPOCA
– Considerando que Serra terá um tempo limitado, caso se confirme o
impeachment da presidente Dilma Rousseff, serão pouco mais de dois anos,
o quanto ele vai conseguir realizar na prática nesse período?
Ricupero – Ele é uma pessoa que se caracteriza por ser um
grande trabalhador. No Senado, em pouco tempo, ele aprovou cinco ou seis
projetos e projetos importantes, inclusive aquele flexibilizando a
operação da Petrobras. É preciso lembrar que o Serra é um trabalhador
infatigável. E eu tenho certeza que ele se lançará a isso com muita
disposição. Acredito que as perspectivas são boas porque, desde que haja
interesse da outra parte, não precisa muito tempo para negociar um
acordo. Um acordo é uma questão de alguns meses. Você pode negociar e ai
apenas fazer com que ele entre em vigor. Vai depender um pouco do tipo
de receptividade que se encontre do outro lado.
‘Governo não tem a opção de fracassar’, diz José Serra
Eliane Cantanhêde
O Estado de S.Paulo, 22 Maio 2016
Com promessa de ‘turbinar’ o Itamaraty, Serra prepara viagem à Argentina para começar ‘atualização’ do Mercosul
BRASÍLIA - O novo chanceler, José Serra, enumera
os erros da política externa dos 13 anos de governo do PT, anuncia que
vai discutir uma “atualização” do Mercosul em sua primeira viagem
internacional, hoje, à Argentina, e assume um compromisso com a opinião
pública e os diplomatas: “Vamos turbinar o Itamaraty”.
Serra
disse estar acertando com o ministro do Planejamento, Romero Jucá, como
cobrir a carência de R$ 800 milhões do Itamaraty, que tem até atrasado
salários e aluguéis e imóveis no exterior. Fora isso, há dívidas de R$
6,7 bilhões do Brasil a organismos e bancos internacionais, tema também
em discussão.
Ele também prometeu abrir o País ao mundo e uma relação melhor
com os Estados Unidos. “Nossa relação comercial com os EUA deve com
certeza se tornar mais próxima e o grande investimento aí é a remoção de
barreiras não tarifárias”, disse na noite de sexta-feira, em entrevista
ao Estado na qual resumiu os desafios do governo Michel Temer: “Não temos a opção de fracassar. Tem que dar certo”.
O que é uma política externa “regida pelos valores do Estado e da Nação”?
A política externa lida com os interesses nacionais num
contexto mundial e vamos ter uma política de Estado, numa nova
modalidade de política externa independente. Além de não se alinhar às
potências, será independente de partidos e de aliados desses partidos no
exterior, diferentemente do que havia nos governos do PT. O sr. não vê diferenças entre a
política externa de Lula e a de Dilma? O sr. chegou a ficar bem próximo
do chanceler de Lula, Celso Amorim, quando o sr. era ministro da Saúde e
ele embaixador em Genebra e atuaram juntos para a quebra de patentes de
medicamentos contra a Aids.
Trabalhamos muito bem e de forma produtiva. Aliás, o Celso
deixou de fumar cachimbo por minha causa. Eu disse que ele não podia
fumar cachimbo e ir a reuniões antitabagismo e ele jurou que tinha
deixado de fumar. Minha relação com o Celso foi muito boa. Depois, no
Itamaraty, prefiro não analisar. Uma crítica a Amorim era que ele era antiamericanista, mas o sr., pelo passado de UNE e de esquerda, também é visto assim.
Não é bem assim, mas, de todo modo, não tenho condições agora
de revisar a minha biografia e o que eu pensava a respeito. Só que tive
uma experiência pessoal que foi muito importante, quando passei parte do
meu exílio nos Estados Unidos, nas Universidades de Princeton e
Cornell, e comecei a conhecer a sociedade e a democracia americanas
muito de perto. Daria uma outra entrevista eu contar o impacto que eu
tive ao viver o cotidiano e junto à base da sociedade a democracia
americana. O sr. assume num momento em que o
Brasil precisa revigorar as relações com Washington, depois que elas
ficaram esgarçadas pela contaminação ideológica no Brasil e pela
espionagem da NSA até da presidente...
NSA, o que é isso? Os EUA são uma peça essencial do mundo
contemporâneo, embora já não tão dominante como no passado, pois você
tem novos centros de poder e de economia, caso típico da China. Nossa
relação com os EUA é secular e fundamental e deve com certeza se tornar
mais próxima no comércio. O grande investimento aí é a remoção de
barreiras não tarifárias. Eles têm uma rede de proteção não tarifária,
na área fitossanitária, por exemplo, que exige negociação. Vamos
trabalhar incessantemente nessa direção. Uma eventual eleição do republicano Donald Trump pode atrapalhar esse processo?
Prefiro não acreditar nisso... No seu discurso de posse o sr.
defendeu a reaproximação com parceiros tradicionais, como EUA, Europa e
Japão. É o fim da política Sul-Sul?
Veja, se o Brasil é um país continental, tem de ter relações
com o mundo inteiro. Nós vamos levar adiante nossa relação com a África,
mas não com base em culpas do passado ou em compaixão, mas sabendo como
podemos cooperar também beneficiando o Brasil. Aliás, minha ideia é
fazer um grande congresso no ano que vem entre Brasil e África, para
discutir comércio, cooperação e trocas, inclusive na área cultural, onde
temos grande afinidade. Quando fala em compaixão, o sr. quer dizer que o Brasil não vai mais perdoar dívidas de países africanos, como fez Lula?
Pedi um levantamento para definir o que será feito daqui em
diante. O Brasil não é um país que tem dinheiro sobrando, não somos um
país desenvolvido. Não implica estabelecer relações predatórias com
nenhuma parte do mundo, mas temos que gerar empregos e combate à pobreza
aqui dentro também. Dilma disse em entrevista ser ignorância uma política externa sem os vizinhos e sem os Brics.
A impressão que eu tenho é de que ela não sabe o que está
dizendo. Entendo as dificuldades e até esse certo desnorteamento e me
sinto constrangido e pouco à vontade para debater com ela nessas
condições. Muitos elogiaram, mas muitos
consideraram acima do tom diplomático suas notas contra o diretor da
Unasul e os países “bolivarianos” que criticaram o processo político
brasileiro. Foram acima do tom?
Foi um tom abaixo das agressões feitas. Na minha primeira
reunião no ministério eu disse que não iríamos nem calar nem escalar.
Essa é a linha. O que fizemos foi apontar o que não era verdadeiro.
Dizer que a democracia está atropelada no Brasil? Que não há garantias
democráticas? Basta qualquer um de fora passar uns dias aqui para ver
que a democracia está funcionando normalmente. Foi um processo
traumático? Foi. Mas todo dentro da democracia e do previsto pela
Constituição. Como fica a relação com Venezuela,
Cuba, Equador, Bolívia, Nicarágua e El Salvador, que se manifestaram
sobre o Brasil? E com o diretor da Unasul?
A tendência é ir tendo relativizações. Aliás, eu sou amigo do Ernesto Samper (da Unasul). Depois da nota, nós já nos falamos. Por que a primeira viagem é para a Argentina?
A Argentina é considerada por nós para lá de prioritária.
Entre os propósitos da viagem está o debate sobre a atualização do
Mercosul, criação do mecanismo de ação conjunta Brasil-Argentina e
acertar uma conferência regional sobre ilícitos nas fronteiras, uma
questão vital para o Brasil e para a Argentina. Quando se fala nisso, pensa-se no Paraguai, que, aliás, atuou para evitar notas oficiais contra o Brasil.
Uma ação dessa natureza é inviável sem a colaboração dos
países, porque não se resolve na linha das fronteiras, mas no interior
dos países. Estou convencido de que teremos a cooperação da Argentina,
do Paraguai, da Bolívia, da Colômbia... O Paraguai é um país que está se
modernizando e o chanceler deve vir aqui em breve. O sr. falou em atualização do Mercosul. O que significa isso, já que o sr. é considerado inimigo do Mercosul?
Não, não sou, mas o Mercosul é uma união alfandegária que
terminou sendo um obstáculo a acordos bilaterais de comércio. Houve uns
500 acordos bilaterais nos últimos anos, mas o Brasil só fez três: com
Israel, Palestina e Egito. É preciso aprofundar as condições da zona de
livre comércio, porque ainda há barreiras, e encontrar formas de
flexibilizar as regras para permitir acordos bilaterais mundo afora. Uma das críticas à política externa
do PT é que foi toda centrada no multilateralismo na OMC, que não deu
certo, vetando o bilateralismo, que todos os demais fizeram. Isso vai
mudar?
O multilateralismo poderia ter sido bom para o Brasil, mas, na
medida em que Doha, da OMC, não avançou, ficou preso nisso, sem
multilateralismo e sem acordos bilaterais. Mas, veja, não estou dizendo
que vamos abandonar a OMC, apenas que vamos ter os pés no chão. O Brasil vai reforçar relações com a Aliança para o Pacífico?
É uma grande prioridade. Relação Brasil-Chile sempre foi
próxima e temos boa relação com Colômbia e Peru. Queremos estreitar
relações com o México, que é da Aliança para o Pacífico e, assim como a
Argentina, é prioridade número 1. Aproximar dos pragmáticos e neutralizar os bolivarianos?
Posso ser sincero? Não tem nada a ver com conjunturas políticas. Tem a ver com estratégias mais permanentes. Na era Lula-Amorim, o Brasil
participava de negociações para a crise do Irã, para a crise do Oriente
Médio... O sr. vai priorizar o comércio em detrimento da diplomacia, ou
isso vai voltar?
Sem megalomania. Vamos participar pela paz, pelo entendimento,
usando as vantagens comparativas que o Brasil possa ter, mas, repito,
sem megalomania. Com suas críticas à política externa do PT, vem aí uma dança de cadeiras em cargos-chave da chancelaria e das embaixadas?
Vamos manter uma política gradualista de preenchimento de
cargo e o mais importante é que nós vamos turbinar o Itamaraty. Nesses
anos todos, seja pelo jeito de fazer política externa, seja pelas
dificuldades orçamentárias mais recentes, houve certo desânimo e
ceticismo que comprometeram a autoestima do Itamaraty. Mas isso, eu
prometo, será revertido. Como, se o governo prevê um rombo de R$ 170,5 bilhões?
A carência imprescindível do Itamaraty é da ordem de R$ 800
milhões e não precisa ser tudo de uma vez. Então, o peso do Itamaraty
nas finanças públicas é insignificante e eu não posso atribuir senão ao
descaso tudo isso que vinha acontecendo. E as dívidas com organismos e bancos internacionais?
Quem paga é o Planejamento e hoje (sexta-feira)
passei um bom tempo com o ministro Romero Jucá discutindo isso. Ao
todo, são R$ 3 bilhões de dívida com os organismos, mais R$ 3,7 bilhões
para os bancos (BID, Bird, FMI...) Vai ter corte de embaixadas e consulados?
Eles criaram uns 60 postos e agora são 227. Será que tudo isso é necessário? Estamos vendo custo-benefício. A concessão de passaporte diplomático para o tal bispo evangélico foi uma derrapada?
Eu não assino passaportes, seria exótico se assinasse. O
problema é que a Igreja Católica sempre teve dois passaportes
diplomáticos, as evangélicas reivindicaram a mesma coisa, e algum
governo, acho que do Lula, concedeu. Não cabe ao governo definir que uma
igreja é mais ou menos importante que a outra. O Itamaraty é um trampolim para sua candidatura em 2018?
Claro que não, não tem trampolim nenhum. Tudo o que eu quero é
fazer uma boa administração aqui. Pode parecer uma declaração de
político tradicional, mas é verdadeira. Seus filhos acreditam nisso?
Meus dois filhos, sim, principalmente o homem. As mulheres são mais desconfiadas. E se o governo Michel Temer naufragar?
Os desafios são imensos, mas não temos a opção de dar certo ou
fracassar. Tem de dar certo, pelo País. O impeachment é doloroso e
traumático, mas é uma questão de salvação do Brasil.
Ex-ministro
e amigo de Serra defende fechamento de representações diplomáticas
brasileiras e diz que legitimidade do governo lá fora dependerá de êxito
no combate a crise
Amigo
de longa data de José Serra, o ex-secretário geral da Unctad (o órgão
da ONU para comércio e desenvolvimento) Rubens Ricupero diz que
"conversou bastante" com o novo chanceler quando este foi convidado a
assumir o Ministério de Relações Exteriores pelo presidente interino
Michel Temer.
"Procuramos - eu e (o ex-ministro do
Desenvolvimento) Sergio Amaral - dar a ele (Serra) um pouco de nossa
percepção da situação (das relações exteriores brasileiras)", diz o
diplomata aposentado.
Ricupero, que também foi ministro da Fazenda do
governo Itamar Franco e embaixador em Washington, nega que haja
contradição no fato de Serra prometer uma "desideologização" da
diplomacia brasileira e, ao mesmo tempo, enfatizar as relações com
países de governos mais liberais, como a Argentina de Mauricio Macri.
Para
ele, fechar representações em outros países em um contexto de escassez
de recursos é uma questão de "bom senso". "De que adianta ter um número
enorme de embaixadas e não ter dinheiro para pagar aluguel, água ou
telefone?"
E
o atual governo não precisa se preocupar com sua legitimidade no
exterior. "No fundo, a reputação que este governo vai ter fora e dentro
do Brasil dependerá de como ele enfrentar os problemas da economia e
outras áreas. Ou seja, se vai acertar ou não", diz.
"É um pouco
aquilo que se diz em inglês, 'Nothing succeeds like success' (Nada tem
mais sucesso do que o sucesso). Se o governo tiver êxito vai ser
aplaudido. Se não tiver, vai ser muito criticado."
Confira a entrevista que Ricupero concedeu à BBC Brasil, por telefone, da casa de uma de suas filhas, na França.
BBC
Brasil: Serra prometeu "desideologizar" as relações exteriores, mas em
seu primeiro discurso também falou na aproximação em países
politicamente mais alinhados ao atual governo brasileiro, como Argentina
e México. Isso não é uma contradição? Rubens Ricupero:
Não há contradição porque uma coisa é você apoiar uma ideologia clara,
como era o bolivarianismo, com a qual o PT tem certa identidade. Outra
muito diferente é reconhecer realisticamente que o Brasil precisa manter
uma relação mais estreita com os dois grandes países latino-americanos
que são comparáveis a nós em tamanho, economia e influência - o México,
no norte, e a Argentina, no sul.
Isso
não significa que haja menosprezo pelos outros. Os países (da Aliança)
do Pacífico e mesmo Venezuela, Bolívia e Equador, todos são parceiros.
Mas (ter como foco a Argentina) é uma atitude realista, da mesma forma
que para a Franca a relação especial é com a Alemanha. Ninguém aqui
imaginaria que essa é uma opção ideológica - é uma imposição da
realidade.
Ideologia é postular uma relação especial com países
distantes, com os quais temos pouco em comum até na vida econômica, como
Cuba e Nicarágua, apenas porque eles fazem parte da aliança
bolivariana. BBC Brasil: Mas se a Argentina tivesse um governo kirchnerista a aposta não seria a mesma, seria? Ricupero:
Seria, porque, como disse, isso é uma imposição da própria vizinhança,
da realidade. Agora, não há dúvida que facilita (a relação), como o
ministro disse no discurso, o fato de Argentina e Brasil estarem
sintonizados, passando por momentos semelhantes, com problemas graves de
natureza econômica e com o mesmo tipo de transição. Também com novos
governos que têm uma visão parecida sobre a necessidade de uma inserção
internacional mais aberta. Isso facilita enormemente para que se comece a
mudar o panorama do Mercosul.
Uma coisa é um Mercosul em que o
Brasil quer negociar com outros países acordos de comércio e a Argentina
faz corpo mole, como até poucos meses atrás. Outra é ter um parceiro
que quer tanto quanto nós negociar ativamente com a União Europeia e
outros países. Há uma atitude diferente.
México, Colômbia, Peru,
Chile. Todos esses países querem se integrar no mundo, abrir-se ao
comércio e ao investimento - mesma linha que o Brasil segue agora. Então
é natural que você tenha mais afinidade com esses países. BBC
Brasil: A diplomacia de Lula foi marcada por uma expansão do ativismo
do Brasil lá fora e um aumento do número de embaixadas e consulados.
Serra pediu que fosse calculado quanto custaria fechar algumas dessas
representações. Fará uma diplomacia mais contida? Ricupero:
A diplomacia de Lula e do chanceler Celso Amorim refletiu um grande
momento positivo vivido pelo Brasil, inclusive na economia. Havia um
contexto mundial favorável, com crescimento acelerado da China e alto
preço das commododities. Agora, a situação mudou muito. Essa redução do
ativismo já foi perceptível no governo Dilma.
Todo país em fase de dificuldades orçamentárias
costuma reavaliar sua rede de representações para tirar melhor proveito
dos recursos. Os ingleses recentemente, com os conservadores no poder,
fecharam alguns postos diplomáticos e remodelaram outros. A França
também fez isso. É apenas um reflexo das dificuldades.
De
que adianta ter um número enorme de embaixadas e não ter dinheiro para
pagar aluguel, água ou telefone? Tenho colegas aqui no exterior que não
conseguem pagar conta da internet, telefone. Eu mesmo quando fui
embaixador em Washington durante o governo (Fernando) Collor tive de
pagar as contas da embaixada do meu bolso pra evitar um corte.
É
melhor que, nesses casos, haja uma atitude de bom senso de fazer com que
os gastos correspondam aos meios. É isso que eu acho que vai ser feito,
mas isso não significa diminuir o nível de atividade. Você pode
conseguir a mesma coisa utilizando melhor os recursos. BBC Brasil: A expansão de embaixadas foi um erro? Ricupero: Talvez
menos que erro. Foi um entusiasmo precipitado. Julgou-se que aquele
período de bonança duraria para sempre. E não só na política externa.
Havia essa atitude com relação a todos os gastos do governo. Por isso
eles se expandiram tanto. BBC Brasil: O tom das
notas emitidas em resposta a governos como Cuba, Nicarágua e Venezuela
(que condenaram o impeachment da presidente Dilma Rousseff) causou
polêmica e dividiu o Itamaraty. Para alguns, elas seriam muito
incisivas, políticas. Ricupero: Não concordo. A
surpresa seria se não houvesse reação. Porque as notas dos outros é que
foram de uma agressividade inacreditável na convivência diplomática. A
nota da Venezuela, por exemplo, é umas sete vezes mais longa que a nota
de resposta. A do Brasil é enérgica, mas está dentro do formato
diplomático tradicional. Não há nenhum juízo sobre o que está
acontecendo na Venezuela ou Cuba, sobre como são as eleições nesses
países. Nada que atente contra o princípio de não intervenção. Quem
interveio no Brasil foram eles. Apenas respondemos a uma agressão. BBC Brasil: O que esperar da diplomacia de Serra? Ricupero:
Uma diplomacia realista, pragmática e sóbria, comprometida com a
ampliação de nossas exportações e atração de investimentos para ajudar o
país a sair da crise. No momento o comércio exterior, o setor externo é
um dos poucos setores da economia que está começando a apresentar bons
resultados. É verdade que por razões negativas - as importações caíram
muito. Mas há a expectativa de se ampliar as exportações, e, com isso,
criar empregos no Brasil. BBC Brasil: O atual governo não pode ter dificuldades para garantir sua legitimidade lá fora? Ricupero:
Não se pode dar muita importância a essas coisas. No começo, sempre há
esse tipo de estranheza, porque obviamente aconteceu uma coisa (processo
de impeachment) que não é trivial e é preciso explicar (isso lá fora).
Mas o que tenho visto na imprensa internacional é uma descrição se não
positiva, ao menos bem informada (do que está ocorrendo no Brasil). Os
artigos que vi no New York Times, Financial Times, Economist, Le Monde
refletem a complexidade do que está se passando.
No fundo, a
reputação que este governo vai ter fora e dentro do Brasil dependerá de
como ele vai enfrentar os problemas da economia e outras áreas. Ou seja,
se vai acertar ou não. É um pouco aquilo que se diz em inglês "Nothing
succeeds like success" (Nada tem mais sucesso do que o sucesso). Se o
governo tiver êxito vai ser aplaudido. Se não tiver, vai ser muito
criticado. Protesto na Venezuela: para alguns analistas, país estaria à
beira de um colapso.
Temos no debate no exterior a mesma divisão
que no Brasil. Há quem seja favorável e quem seja contra (o
impeachment). Afinal, vivemos (com o impeachment) um dilema no sentido
estrito, do dicionário: uma situação em que uma pessoa é obrigada a
escolher entre duas alternativas ruins - tanto a continuação como a
mudança (eram ruins). E aí foi preciso ver marginalmente qual oferecia
uma esperança de melhora. BBC Brasil: A crise política e
econômica da Venezuela se aprofundou. Alguns analistas dizem que o país
está à beira de um colapso. Como o Brasil deve se posicionar? Ricupero:
Quando era diplomata cuidei de Venezuela por muitos anos. Não sei qual a
opinião do ministro (Serra) sobre isso, mas acredito que a gente deve
se manter dentro do princípio de não intervenção. Sei que a situação
está muito tensa e se agrava dia a dia, mas não vejo outra
possibilidade. Os países têm de encontrar seus caminhos por seus
próprios meios e os outros podem ajudar se forem solicitados. Os
resultados que vimos no mundo de ações que violam esse principio de não
ingerência - por exemplo, a invasão do Iraque, a derrubada do regime da
Líbia - foram todos desastrosos, ainda que tenham vindo embrulhados nas
melhores intenções. BBC Brasil: Serra deu indicações de
que deve apostar nas negociações de acordos bilaterais. As dificuldades
econômicas não podem ser um empecilho para atrair o interesse de outros
países? Quais os acordos mais prováveis? Ricupero:
Esses acordos já estão em andamento. Eu soube que (um acordo) com o
Peru está praticamente concluído. Imagino que vai ser mais fácil com
esses países que se mostram mais abertos, Peru, Chile, México, espero
que a Colômbia também.No caso dos EUA, é possível que se encontre uma
maneira de continuar o esforço que o (ex-)ministro Armando Monteiro
estava fazendo para examinar todas as barreiras não-tarifárias. Com a
União Europeia eu diria que vai ser prioridade máxima, porque em
conjunto a UE é de longe o maior parceiro comercial do Brasil e a maior
fonte de investimentos para o país. A China também deve receber atenção
especial. BBC Brasil: O Mercosul pode deixar de ser uma união aduaneira para virar área de livre comércio? Ricupero:
Não acho que isso seja uma decisão (do ministro), não está no discurso
dele. Essa ideia de deixar a união aduaneira é complexa, precisaria ser
analisada em todas as suas implicações. Há setores importantíssimos
tanto no Brasil quanto na Argentina que teriam dificuldade se não
houvesse a união aduaneira, como o automobilístico.
E
o atual governo não precisa se preocupar com sua legitimidade no
exterior. "No fundo, a reputação que este governo vai ter fora e dentro
do Brasil dependerá de como ele enfrentar os problemas da economia e
outras áreas. Ou seja, se vai acertar ou não", diz.
"É um pouco
aquilo que se diz em inglês, 'Nothing succeeds like success' (Nada tem
mais sucesso do que o sucesso). Se o governo tiver êxito vai ser
aplaudido. Se não tiver, vai ser muito criticado."
Confira a entrevista que Ricupero concedeu à BBC Brasil, por telefone, da casa de uma de suas filhas, na França. BBC
Brasil: Serra prometeu "desideologizar" as relações exteriores, mas em
seu primeiro discurso também falou na aproximação em países
politicamente mais alinhados ao atual governo brasileiro, como Argentina
e México. Isso não é uma contradição? Rubens Ricupero:
Não há contradição porque uma coisa é você apoiar uma ideologia clara,
como era o bolivarianismo, com a qual o PT tem certa identidade. Outra
muito diferente é reconhecer realisticamente que o Brasil precisa manter
uma relação mais estreita com os dois grandes países latino-americanos
que são comparáveis a nós em tamanho, economia e influência - o México,
no norte, e a Argentina, no sul.
Isso
não significa que haja menosprezo pelos outros. Os países (da Aliança)
do Pacífico e mesmo Venezuela, Bolívia e Equador, todos são parceiros.
Mas (ter como foco a Argentina) é uma atitude realista, da mesma forma
que para a Franca a relação especial é com a Alemanha. Ninguém aqui
imaginaria que essa é uma opção ideológica - é uma imposição da
realidade.
Ideologia é postular uma relação especial com países
distantes, com os quais temos pouco em comum até na vida econômica, como
Cuba e Nicarágua, apenas porque eles fazem parte da aliança
bolivariana. BBC Brasil: Mas se a Argentina tivesse um governo kirchnerista a aposta não seria a mesma, seria? Ricupero:
Seria, porque, como disse, isso é uma imposição da própria vizinhança,
da realidade. Agora, não há dúvida que facilita (a relação), como o
ministro disse no discurso, o fato de Argentina e Brasil estarem
sintonizados, passando por momentos semelhantes, com problemas graves de
natureza econômica e com o mesmo tipo de transição. Também com novos
governos que têm uma visão parecida sobre a necessidade de uma inserção
internacional mais aberta. Isso facilita enormemente para que se comece a
mudar o panorama do Mercosul.
Uma coisa é um Mercosul em que o
Brasil quer negociar com outros países acordos de comércio e a Argentina
faz corpo mole, como até poucos meses atrás. Outra é ter um parceiro
que quer tanto quanto nós negociar ativamente com a União Europeia e
outros países. Há uma atitude diferente.
México, Colômbia, Peru,
Chile. Todos esses países querem se integrar no mundo, abrir-se ao
comércio e ao investimento - mesma linha que o Brasil segue agora. Então
é natural que você tenha mais afinidade com esses países. Leia também: Maioria de brasileiros aprova entrada de refugiados no país, mas não na própria cidade ou casa, diz pesquisa BBC
Brasil: A diplomacia de Lula foi marcada por uma expansão do ativismo
do Brasil lá fora e um aumento do número de embaixadas e consulados.
Serra pediu que fosse calculado quanto custaria fechar algumas dessas
representações. Fará uma diplomacia mais contida? Ricupero:
A diplomacia de Lula e do chanceler Celso Amorim refletiu um grande
momento positivo vivido pelo Brasil, inclusive na economia. Havia um
contexto mundial favorável, com crescimento acelerado da China e alto
preço das commododities. Agora, a situação mudou muito. Essa redução do
ativismo já foi perceptível no governo Dilma.
Todo país em fase de dificuldades orçamentárias
costuma reavaliar sua rede de representações para tirar melhor proveito
dos recursos. Os ingleses recentemente, com os conservadores no poder,
fecharam alguns postos diplomáticos e remodelaram outros. A França
também fez isso. É apenas um reflexo das dificuldades.
De
que adianta ter um número enorme de embaixadas e não ter dinheiro para
pagar aluguel, água ou telefone? Tenho colegas aqui no exterior que não
conseguem pagar conta da internet, telefone. Eu mesmo quando fui
embaixador em Washington durante o governo (Fernando) Collor tive de
pagar as contas da embaixada do meu bolso pra evitar um corte.
É
melhor que, nesses casos, haja uma atitude de bom senso de fazer com que
os gastos correspondam aos meios. É isso que eu acho que vai ser feito,
mas isso não significa diminuir o nível de atividade. Você pode
conseguir a mesma coisa utilizando melhor os recursos. BBC Brasil: A expansão de embaixadas foi um erro? Ricupero: Talvez
menos que erro. Foi um entusiasmo precipitado. Julgou-se que aquele
período de bonança duraria para sempre. E não só na política externa.
Havia essa atitude com relação a todos os gastos do governo. Por isso
eles se expandiram tanto. BBC Brasil: O tom das
notas emitidas em resposta a governos como Cuba, Nicarágua e Venezuela
(que condenaram o impeachment da presidente Dilma Rousseff) causou
polêmica e dividiu o Itamaraty. Para alguns, elas seriam muito
incisivas, políticas. Ricupero: Não concordo. A
surpresa seria se não houvesse reação. Porque as notas dos outros é que
foram de uma agressividade inacreditável na convivência diplomática. A
nota da Venezuela, por exemplo, é umas sete vezes mais longa que a nota
de resposta. A do Brasil é enérgica, mas está dentro do formato
diplomático tradicional. Não há nenhum juízo sobre o que está
acontecendo na Venezuela ou Cuba, sobre como são as eleições nesses
países. Nada que atente contra o princípio de não intervenção. Quem
interveio no Brasil foram eles. Apenas respondemos a uma agressão. BBC Brasil: O que esperar da diplomacia de Serra? Ricupero:
Uma diplomacia realista, pragmática e sóbria, comprometida com a
ampliação de nossas exportações e atração de investimentos para ajudar o
país a sair da crise. No momento o comércio exterior, o setor externo é
um dos poucos setores da economia que está começando a apresentar bons
resultados. É verdade que por razões negativas - as importações caíram
muito. Mas há a expectativa de se ampliar as exportações, e, com isso,
criar empregos no Brasil. BBC Brasil: O atual governo não pode ter dificuldades para garantir sua legitimidade lá fora? Ricupero:
Não se pode dar muita importância a essas coisas. No começo, sempre há
esse tipo de estranheza, porque obviamente aconteceu uma coisa (processo
de impeachment) que não é trivial e é preciso explicar (isso lá fora).
Mas o que tenho visto na imprensa internacional é uma descrição se não
positiva, ao menos bem informada (do que está ocorrendo no Brasil). Os
artigos que vi no New York Times, Financial Times, Economist, Le Monde
refletem a complexidade do que está se passando.
No fundo, a
reputação que este governo vai ter fora e dentro do Brasil dependerá de
como ele vai enfrentar os problemas da economia e outras áreas. Ou seja,
se vai acertar ou não. É um pouco aquilo que se diz em inglês "Nothing
succeeds like success" (Nada tem mais sucesso do que o sucesso). Se o
governo tiver êxito vai ser aplaudido. Se não tiver, vai ser muito
criticado. Protesto na Venezuela: para alguns analistas, país estaria à
beira de um colapso.
Temos no debate no exterior a mesma divisão
que no Brasil. Há quem seja favorável e quem seja contra (o
impeachment). Afinal, vivemos (com o impeachment) um dilema no sentido
estrito, do dicionário: uma situação em que uma pessoa é obrigada a
escolher entre duas alternativas ruins - tanto a continuação como a
mudança (eram ruins). E aí foi preciso ver marginalmente qual oferecia
uma esperança de melhora. BBC Brasil: A crise política e
econômica da Venezuela se aprofundou. Alguns analistas dizem que o país
está à beira de um colapso. Como o Brasil deve se posicionar? Ricupero:
Quando era diplomata cuidei de Venezuela por muitos anos. Não sei qual a
opinião do ministro (Serra) sobre isso, mas acredito que a gente deve
se manter dentro do princípio de não intervenção. Sei que a situação
está muito tensa e se agrava dia a dia, mas não vejo outra
possibilidade. Os países têm de encontrar seus caminhos por seus
próprios meios e os outros podem ajudar se forem solicitados. Os
resultados que vimos no mundo de ações que violam esse principio de não
ingerência - por exemplo, a invasão do Iraque, a derrubada do regime da
Líbia - foram todos desastrosos, ainda que tenham vindo embrulhados nas
melhores intenções. BBC Brasil: Serra deu indicações de
que deve apostar nas negociações de acordos bilaterais. As dificuldades
econômicas não podem ser um empecilho para atrair o interesse de outros
países? Quais os acordos mais prováveis? Ricupero:
Esses acordos já estão em andamento. Eu soube que (um acordo) com o
Peru está praticamente concluído. Imagino que vai ser mais fácil com
esses países que se mostram mais abertos, Peru, Chile, México, espero
que a Colômbia também.No caso dos EUA, é possível que se encontre uma
maneira de continuar o esforço que o (ex-)ministro Armando Monteiro
estava fazendo para examinar todas as barreiras não-tarifárias. Com a
União Europeia eu diria que vai ser prioridade máxima, porque em
conjunto a UE é de longe o maior parceiro comercial do Brasil e a maior
fonte de investimentos para o país. A China também deve receber atenção
especial. BBC Brasil: O Mercosul pode deixar de ser uma união aduaneira para virar área de livre comércio? Ricupero:
Não acho que isso seja uma decisão (do ministro), não está no discurso
dele. Essa ideia de deixar a união aduaneira é complexa, precisaria ser
analisada em todas as suas implicações. Há setores importantíssimos
tanto no Brasil quanto na Argentina que teriam dificuldade se não
houvesse a união aduaneira, como o automobilístico.
Perguntar não ofende: O novo governo e o novo ministro vão desclassificar estas informações?
O MPF não pode requisitar os telegramas?
Paulo Roberto de Almeida
O sigilo cobre o período em que a empreiteira bancou viagens ao exterior do ex-presidente Lula
FILIPE COUTINHO
Época, 16/06/2015
O governo Dilma classificou como secretos e reservados pelo menos 760 documentos envolvendo a Odebrecht. O sigilo cobre justamente o período em que a empreiteira passou a pagar viagens ao exterior do ex-presidente Lula, muitas vezes apoiado pelas embaixadas brasileiras nos países visitados. Alguns documentos poderão ficar em segredo até 2030.
Apesar do discurso pró-transparência adotado após o recuo na tentativa de impedir a divulgação de telegramas desclassificados, o Itamaraty, apenas no governo Dilma, decretou o segredo por até 15 anos de um conjunto de 141 documentos secretos e 619 reservados que citam a Odebrecht.
A informação foi prestada pelo diplomata João Pedro Costa, Diretor do Departamento de Comunicações e Documentação, após consulta de ÉPOCA por meio da Lei de Acesso à Informação.
Costa é o mesmo diplomata que, na semana passada, sugeriu que fossem
colocados em segredo por até dez anos um conjunto de documentos
inicialmente classificados como reservados (sigilo de cinco anos) e que, pela lei já deveriam ser públicos, e que citam a Odebrecht durante o governo Lula.
A justificativa para o sigilo era o interesse da revista ÉPOCA, que já produziu reportagem acerca das ligações entre Lula e a empreiteira. A manobra foi divulgada pelo O Globo e
o Itamaraty decidiu então liberar os documentos, sem restrições. Mas
apenas os documentos reservados (com prazo de sigilo de cinco anos) e
que já são de domínio público. Os 760 documentos sigilosos que citam a
Odebrecht produzidos no governo Dilma continuarão em segredo.