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sexta-feira, 1 de novembro de 2019

Mercosul: revisão da TEC, redução unilateral pelo Brasil, prós e contras - Mailson da Nobrega, Paulo Nogueira Batista Jr.

Não vou me pronunciar agora, pelo menos não em detalhe. Sou a favor, primeiro de uma proposta brasileira, para uma revisão baixista da TEC conjuntamente. Se não houver acordo, o Brasil deveria propor uma resolução do Conselho do Mercosul, autorizando os países a negociarem livremente com terceiras partes acordos de livre comércio, preservando a cláusula MFN para dentro.
Se não for possível, o Brasil pode, então, denunciar o Mercosul, mas isso só será efetivo em dois ou três anos.
Só em último caso, proceder a uma revisão unilateral, com ou sem autorização do Mercosul.
Em todas essas etapas, progressivas e graduais, nunca imediatas, o Brasil deve proceder a uma REVISÃO interna de sua estrutura tributária, no sentido de reduzir TODOS os gravamos incidindo sobre a produção interna e sobretudo sobre a exportação. Acho que isso vai ser o mais difícil, mas é IMPRESCINDÍVEL, pois o Estado brasileiro é o principal criminoso em toda essa empreitada.
Claro, quando falo de Estado, estou falando de todos nós: os três poderes, perdulários e gastadores, os industriais, e os consumidores carneiros, que concedem pagar caro para alimentar os ogros famélicos descritos mais acima.
Paulo Roberto de Almeida
São Paulo, 1/11/2019

Por Maílson da Nóbrega
Blog do Mailson na Revista Veja, 12 mar 2018, 08h23








É preciso abrir a economia. E de forma unilateral

A abertura objetiva expor a indústria à competição internacional, aumentando a eficiência e a produtividade


No meu último post, mostrei como o longo período de protecionismo tornou a nossa economia uma das mais fechadas do mundo. A abertura levada a efeito na segunda metade dos anos 1980 e na primeira dos anos 1990 começou a ser revertidas no governo de FHC. A situação piorou nos governos do PT, particularmente no período de Dilma Rousseff.
Vários estudos mostram que uma economia aberta expõe sua indústria a pressões competitivas que contribuem para a inovação e para a busca de eficiência. Os decorrentes aumentos de produtividade tornam a indústria mais competitiva e mais capaz de exportar e de competir com produtos estrangeiros.
Não à toa, os países desenvolvidos têm tarifas de importação inferiores a 5%. Nos Estados Unidos, andam por volta de 2,5%. A brasileira está perto de 20%.
Semana passada, o governo americano adotou na uma ação protecionista. Impôs 25% de impostos sobre as importações de aço e de 10% sobre as de alumínio, erro grave que pode gerar retaliações. Essa não é a prática usual naquele país.  É provável que cedo ou tarde o erro será reparado.
Voltando ao Brasil, estudo recente do Banco Mundial mostrou que seis milhões de brasileiros poderiam sair da linha de pobreza se o país abrisse mais sua economia. Em consequência dos ganhos de produtividade, o potencial de crescimento poderia aumentar em um ponto percentual. Cerca de 400 mil empregos poderiam ser criados.
A abertura livraria o Brasil do equívoco de buscar produzir todos os elos das cadeias produtivas, numa tentativa pouco justificada de tudo fabricar no território nacional. Isso provoca má alocação de recursos, aumenta a ineficiência e inibe os ganhos de produtividade. O resultado é a perda de competividade.
Há um equívoco comum quando se discute a abertura da economia. Muitos dos que concordam com a medida enveredam por outro erro, qual seja o de defender que a abertura deverá ser precedida de negociações com nossos parceiros comerciais.
A abertura deve ser necessariamente unilateral. Ela não é uma medida de comércio exterior. Seu objetivo é criar incentivos ao aumento da produtividade, contribuindo para aumentar a capacidade de crescer, gerar emprego e ampliar a renda dos trabalhadores. Não pode depender de negociações com outros países.
As negociações seriam complexas e demoradas. Em muitos casos não resultariam na reciprocidade imaginada pelos defensores da negociação. Suponha, por exemplo, que o Japão não aceitasse reduzir suas tarifas em atendimento a pedido do governo brasileiro. A abertura seria abortada? Claro que não.
    A abertura da economia, além de seus efeitos benéficos para a indústria e para o país, pode fornecer ao Brasil a base para demandar reciprocidade. É o inverso do que se pensa.

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04:11:39 | 01/11/2019 | Economia | Revista Carta Capital | Paulo Nogueira Batista Jr | BR
    Brasil, Argentina, Mercosul

    Paulo Nogueira Batista Jr.

    Uma diminuição apressada de tarifas de importação pode destruir empresas, empregos e até setores inteiros da indústria
    Rei na considerável tumulto nas relações entre o Brasil e a Argentina. Falou-se até em saída do Brasil do Mercosul ou em exclusão da Argentina. Não chegaremos a esses extremos, mas o quadro é, sem dúvida, preocupante. Deixando de lado ruídos políticos e declarações espalhafatosas, a questão central para o Mercosul é a intenção brasileira de promover abertura radical da economia. O Ministério da Economia planeja aparentemente uma redução rápida das tarifas de importação. Como o Mercosul é uma união aduaneira e não apenas uma área de livre-comércio, o plano precisa passar pelos outros integrantes do bloco.
    Em outras palavras, é necessário negociar reduções na tarifa externa comum (TEC) do Mercosul. Embora o Mercosul seja uma união aduaneira incompleta, pois diversos produtos têm regimes próprios ou fazem parte de listas de exceções, a maior parte das importações está na TEC, com eventuais alterações exigindo entendimentos entre os membros do bloco.
    Vazou recentemente para o jornal Valor Econômico um plano de abertura, apresentado pelo Ministério da Economia e o Itamaraty aos outros três sócios do Mercosul. O ponto central do plano é uma acentuada redução das tarifas no setor industrial em apenas quatro anos. Para alguns segmentos importantes, a queda seria drástica. Por exemplo, para automóveis, têxteis e vestuário as tarifas cairiam de 35% para 12%. Sobre ônibus, de 35% para 4%. Sobre calçados, de 31,8% para 12%. Sobre máquinas, materiais e aparelhos e elétricos, de 12% para 4,2%. São apenas alguns exemplos de uma extensa relação de segmentos industriais que seriam afetados pela queda das tarifas.
    Diante das reações negativas, integrantes da equipe econômica apressaram-se a explicar que o documento vazado era "uma hipótese metodológica" e "um exercício acadêmico". Estranha explicação, pois não é usual que participantes de reuniões oficiais internacionais se debrucem sobre elucubrações acadêmicas. Seja como for, com a vitória de Fernández na Argentina, os planos de abertura radical tornaram-se mais difíceis. O governo Macri simpatizava com essa abordagem. O futuro governo Fernández indicou discordâncias.
    Aí é que mora o perigo para o Mercosul. Se o governo Bolsonaro insistir com idéias desse tipo e o novo governo argentino resistir, haverá risco de erosão do bloco. O governo brasileiro pode ser levado a propor a transformação da união aduaneira em área de livre-comércio, com supressão da TEC. Já apareceram defensores dessa ideia no Brasil. Cada um dos quatro países ficaria então livre para aplicar as tarifas que quisesse, obedecidos outros compromissos internacionais.
    Vale a pena? Não acredito. Poderíamos perder preferências tarifárias de que desfrutamos no mercado argentino e no resto do Mercosul, o que tem importância considerável para a indústria brasileira. Não se deve perder de vista que a
    Argentina é um dos principais mercados para as exportações industriais brasileiras, especialmente para as de maior valor agregado. Além disso, e talvez mais importante, não interessa ao Brasil, em especial à já combalida indústria brasileira, embarcarem planos ambiciosos de abertura. Idéias desse tipo são perigosas e têm grande potencial destrutivo.
    A revisão das tarifas de importação deve pautar-se pela moderação e obedecer a alguns princípios. Primeiro, qualquer diminuição de tarifas deve ser gradual para que os produtores nacionais tenham tempo de se adaptar. Uma diminuição apressada pode destruir empresas, empregos e até setores inteiros da indústria.
    Segundo, a abertura deve ser negociada e não unilateral. Como obter mais acesso para as exportações brasileiras em outros mercados se entregarmos o nosso de mão beijada, sem contrapartidas?
    Terceiro, é preciso lembrar que as tarifas de importação relativamente altas praticadas pelo Mercosul constituem uma compensação - e apenas parcial para desvantagens competitivas sistêmicas que enfrentam as empresas do bloco. E o que os brasileiros chamam de custo Brasil - as deficiências de infraestrutura e logística, as elevadas taxas de juro e as dificuldades de acesso a crédito de longo prazo, os períodos prolongados de sobrevalorização cambial, o peso e a complexidade dos tributos, entre outros fatores.
    Sem enfrentar essas desvantagens sistêmicas, que dificilmente serão superadas em prazo curto, um plano de abertura radical poderá ter impacto tenebroso sobre muitos setores importantes da economia, acelerando o processo de desindustrialização e obstruindo o desenvolvimento do País. paulonbjr@hotmail.com

    segunda-feira, 6 de maio de 2019

    O chantecler confundiu alhos com bugalhos - Mailson da Nobrega

    Blog de Mailson da Nobrega, 12 de abr de 2019 , 12h48

    PRODUTIVIDADE OU MEDIOCRIDADE

    Produtividade ou mediocridade
    A economia cresce pela conjugação de três elementos: o investimento, o emprego da mão de obra e a produtividade. O segundo pode ser desdobrado em dois: a mão de obra propriamente dita e o capital humano, isto é, o estoque de conhecimentos e os atributos sociais e de personalidade do trabalhador — incluindo a criatividade —, adquiridos com a educação e a experiência.
    A produtividade é o principal desses três elementos. Tem a ver com eficiência, cujo aumento permite produzir mais com os mesmos recursos. Para Paul Krugman, prêmio Nobel de Economia, “a produtividade não é tudo na economia; a longo prazo, é quase tudo”. Ela não costuma, todavia, ser valorizada entre nós como fonte básica do crescimento econômico. Muitos desconhecem o seu papel.
    Em aula magna no Instituto Rio Branco, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, disse que éramos o país de maior crescimento quando tínhamos como principal parceiro os Estados Unidos. Isso teria mudado quando essa posição foi assumida pela China. “De fato, a China passou a ser o grande parceiro comercial do Brasil e, coincidência ou não, tem sido um período de estagnação do Brasil.”
    Na verdade, esses dois momentos se explicam essencialmente pelo desempenho da produtividade. É o que está escrito no livro Anatomia da Produtividade no Brasil (Editora FGV, 2017). O crescimento da produtividade no período 1950-1980 alcançou 4,2% anuais, enquanto se expandiu 0,6% ao ano nas três décadas posteriores, ou seja, um sétimo apenas. O Brasil cresceu muito ou pouco em função do desempenho da produtividade. O ministro confundiu alhos com bugalhos.
    O medíocre crescimento da economia teria sido pior sem a China, cuja demanda por nossas commodities explica os expressivos superávits que passamos a exibir na balança comercial (58,3 bilhões de dólares em 2018), o que equivale a ganhos de produtividade. O decorrente fortalecimento do balanço de pagamentos nos permitiu minimizar os efeitos da crise financeira global de 2008.
    Não vamos “vender nossa alma” à China, como disse o ministro, mas precisamos ampliar as nossas vantajosas relações comerciais. Se a reforma da Previdência ocorrer, o desafio seguinte será o de ganhar produtividade.
    Quatro ações são essenciais: (1) elevar os investimentos em infraestrutura, particularmente a de transporte, para melhorar a operação da logística; (2) promover uma reforma tributária para eliminar o caos da tributação do consumo, mediante a instituição de um tributo nacional sobre o valor agregado (IVA), em substituição à confusão do ICMS, do ISS, do PIS e da Cofins; (3) gradativamente, abrir a economia para expor a indústria à competição internacional, o que incentivará a busca de eficiência; e (4) melhorar a qualidade da educação, de modo a incrementar a produtividade do trabalhador brasileiro, que representa 20% da produtividade do trabalhador americano. Sem isso, nosso desempenho econômico será igual ou inferior ao atual, com graves efeitos no emprego e na renda dos brasileiros.
    Publicado em VEJA de 17 de abril de 2019, edição nº 2630

    quarta-feira, 7 de novembro de 2018

    Superministerio da economia: uma ideia que não faz sentido - Mailson da Nobrega (OESP)

    Uma ideia que não faz sentido

    A criação do Superministério da Economia comete muitos erros

    Mailson da Nóbrega, ex-ministro da Fazenda no governo Sarney
    O Estado de S. Paulo, 7/11/2018

    A criação do Superministério da Economia, envolvendo as pastas da Fazenda, do Planejamento e da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, comete muitos erros. A pretensão parece ser a de criar um novo czar da economia, com carta branca para resolver décadas de problemas do setor público. Trata-se de obra ciclópica, que não depende de um indivíduo nem tem como ser levada a cabo num período de governo. 
    O czar da economia foi uma figura do regime militar, quando se governava por decretos-leis, os quais somente podiam ser aprovados ou rejeitados pelo Congresso Nacional. Hoje reformas dependem, em muitos casos, de complexas emendas à Constituição. Medidas provisórias, que eram renovadas indefinidamente (a do Plano Real foi reeditada mais de 30 vezes), agora só podem ser reeditadas uma única vez. 
    Diz-se que a concentração de tamanho poder nas mãos de um superministro facilitaria o ajuste fiscal e a privatização em larga escala. Mesmo que essa fosse a saída para atingir tais objetivos, o que não é, a ideia desconsidera a complexidade e a gama de funções dos três ministérios. 
    O Ministério da Fazenda, um gigante, demanda do ministro dedicação de 12 horas diárias ou mais. Sob suas ordens estão 40 organizações: nove órgãos singulares, 15 órgãos colegiados, quatro autarquias, cinco empresas públicas e três sociedades de economia mista. O ministro preside, entre outros, o Conselho Monetário Nacional (CMN), o Conselho de Política Fazendária (Confaz) e o Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP). A eles se subordinam o Banco Central - até que adquira autonomia operacional -, o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal, o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro), a Secretaria da Receita Federal, a Secretaria do Tesouro Nacional, a Secretaria de Previdência, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e muitos outros. 
    A incorporação do Planejamento comete um erro elementar, o de juntar funções que devem ser segregadas: as de elaboração e execução do Orçamento. É assim em praticamente todo o mundo, inclusive nos Estados Unidos. Lá, a preparação do Orçamento está a cargo de um órgão da Casa Branca, o Office of Management and Budget (OMB), enquanto a execução cabe ao Departamento do Tesouro. Ambos têm status ministerial. 
    A fusão poderia piorar a qualidade do Orçamento. A separação tem uma lógica. Sua elaboração considera o médio e o longo prazos; o órgão que o executa focaliza as questões de curto prazo, ligadas à política fiscal. Afora esse erro, a junção agregaria às já amplas responsabilidades do superministro a supervisão de 23 órgãos e entidades: quatro colegiados, nove secretarias e seis fundações e empresas públicas. A ele se subordinariam, entre outros, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e a Escola Nacional de Administração Pública (Enap). O Planejamento cuida de assuntos que não se ajustam ao papel da Fazenda, caso da gestão de pessoal civil da União. 
    Quanto à pasta da Indústria, o futuro superministro parece identificá-la apenas como fonte de pressão para obter protecionismo, subsídios e incentivos fiscais. Acontece que ela conduz várias atividades relevantes para a indústria, o comércio exterior e os serviços. A esse ministério pertencem oito secretarias e três órgãos e entidades, entre os quais o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi), o Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade Industrial e Tecnologia (Inmetro), a Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa), a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (Abdi) e o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). 
    Em todo o mundo existe um ministério para cuidar dos assuntos ligados à indústria, ao comércio exterior e aos serviços. Há casos de duas pastas, uma para a indústria e outra para o comércio exterior. Novamente, os EUA são exemplo com o Departamento do Comércio, que supervisiona atividades ligadas à indústria e ao comércio. 
    No Japão há o Ministério da Economia, Comércio e Indústria, que sucedeu em 2001 ao Ministério do Comércio Internacional e da Indústria (Miti, na sigla em inglês). O Miti, um dos mais poderosos órgãos do governo japonês, teve participação decisiva nas medidas que permitiram a ascensão do país no pós-guerra. A ele cabiam a política industrial e o fomento às atividades de pesquisa e investimento. A nova pasta continua separada do Ministério das Finanças.  
    Em termos de gastos, a criação do Superministério da Economia economizaria muito pouco. Desapareceriam os órgãos de assessoramento direto dos ministros do Planejamento e da Indústria, mas eles são compostos, na grande maioria, por servidores públicos, que não podem ser demitidos. Cargos comissionados ocupados por não integrantes do funcionalismo federal seriam eliminados, mas não a ponto de justificar a fusão. 
    Em resumo, a criação do superministério da Economia parece não ter ponderado os riscos de aglutinar a enorme quantidade de funções, órgãos e entidades integrantes das três pastas. Grande parte deles precisa ser mantida. Como a medida não produziria um super-homem capaz de assumir, supervisionar e coordenar as extensas funções e atividades que lhes caberiam, o superministério tenderia a resultar em muita confusão, vários conflitos e grande ineficiência. 
    A ideia não leva em conta a História. A mesma fusão foi decidida por Fernando Collor e deu errado. Foi abandonada logo após o impeachment, quando Itamar Franco reorganizou a estrutura das pastas ministeriais. Paulo Guedes não precisa ser um superministro para se tornar um dos mais relevantes membros do próximo governo. Poderia desistir de uma ideia que não faz o menor sentido. 

    * SÓCIO DA TENDÊNCIAS CONSULTORIA, MAÍLSON DA NÓBREGA FOI MINISTRO DA FAZENDA

    segunda-feira, 7 de julho de 2014

    Educacao: a escolha fatal do Brasil pelos 10pc do PIB vai atrasar ainda mais o setor - Mailson da Nobrega

    Escolha fatal: 10% do PIB para a educação Coluna: Mailson da Nóbrega
    Veja, 5/07/2014

    A lei que obriga a aplicar 10% do PIB em educação é equivocada. Quase dobra os atuais 5,8% do PIB. que é a média dos países da OCDE. A regra será cumprida até 2024. O gradualismo dá a ideia de responsabilidade e realismo. Teríamos tempo para nos preparar. Nada disso. Trata-se de escolha inconsequente, irrealista e futura causa de oportunidades perdidas.
    A história está cheia de escolhas fatais, adotadas com boas intenções ou com o mero objetivo de poder c fama. Quando erradas, podem condenar um país ao declínio ou à pobreza por muitas gerações. No século XV, a dinastia Ming interrompeu a exploração marítima chinesa por considerá-la a fonte da crise nas finanças públicas. Segundo o historiador americano David Landes, quem fosse ao mar, mesmo para comércio, podia receber a pena de morte. A China era uma potência naval.
    Seus navios eram dez vezes maiores do que as caravelas portuguesas. Em 1421, o almirante Zheng He navegou pelo mundo com uma frota de 317 navios e 28000 homens.

    Assim, Portugal e Espanha — e não a China — lideraram as grandes descobertas e estenderam seus domínios à África, à Ásia e às Américas. Landes afirma que tal isolamento explica os cinco séculos do declínio chinês. A China, a maior potência mundial da época, tornou-se pobre e humilhada por invasores europeus e japoneses. Somente quando Deng Xiaoping decidiu abraçar a economia de mercado (1978) a China iniciou a recuperação.
    Outro historiador, o britânico Ian Kershaw, analisou dez escolhas fatais na II Guerra, entre 1940 e 1941. Destaco duas delas, que contribuíram para a vitória dos aliados: (1) a invasão da União Soviética pela Alemanha, que enfraqueceu seu poder bélico; e (2) o ataque a Pearl Harbor pelo Japão, que fez com que os Estados Unidos entrassem no conflito.
    Claro, a nova lei não terá a dramaticidade dos casos citados, que tiveram forte repercussão mundial. Aqui, vai ser apenas nosso o ônus do aumento de gastos em educação. Será mais um efeito do ambiente criado pelos governos do PT, segundo os quais sempre é possível ampliar gastos sociais, mesmo que seja inviável sua continuidade ou que beneficiem essencialmente os não pobres, como nas despesas previdenciárias. Criticar o aumento desses gastos é considerado preconceito contra os pobres, insensibilidade, neoliberalismo e semelhantes. Como ser contra investir mais em educação? Daí o amplo apoio do Congresso ao projeto de lei.
    Dois êxitos dos últimos cinquenta anos — Coréia do Sul e China — se devem à boa formulação e gestão de políticas de educação, que resultam em ganhos de eficiência nos gastos. Seus dispendios na área equivalem, proporcionalmente, a somente dois terços dos nossos. Dinheiro não é tudo.
    Defensores da lei dos 10% já reconhecem que isso é muito mais do que se vê nos aíses ricos, mas agora recorrem a outro parâmetro: nosso menor gasto per capita em educação. No Brasil, a despesa por aluno é de 3067 dólares, contra 9313 dólares da OCDE (devo esses dados a Hélio Schwartsman). Na verdade, em relação às nações desenvolvidas, o Brasil gasta menos per capita em quase tudo, e não apenas em educação, pelo simples fato de ainda não sermos ricos. A renda per capita média da OCDE em 2009 era de 35900 dólares, mais de quatro vezes a do Brasil, de 8 472 dólares. - Ninguém faz comparações desse tipo. Por exemplo. não se avalia a carga tributária pela arrecadação, mas por sua relação com o PIB. Se a ideia valesse, os benefícios per capita do INSS, equivalentes a 4 157 dólares, deveriam ser igualados aos da OCDE, de 17 880 dólares, também de mais de quatro vezes os nossos (sempre dados de 2009, por razões de uniformidade). Em proporção do PIB, a despesa do INSS iria de 7,5% para 32,2%, quase a carga tributária (então de 32,3% do PIB).
    A lei tem outros problemas, advindos da ideologia e do corporativismo que impregnam seu texto. No caso dos 10% do PIB em educação, seu efeito será piorar a já grave situação fiscal.
    A educação não precisa de mais dinheiro, e sim de uma revolução na gestão e na forma de remunerar os professores, para melhorar sua qualidade. A lei pouco ou nada contribuirá para isso. Tende a ser uma escolha ruinosa.

    Maílson da Nóbrega é economista.

    domingo, 4 de agosto de 2013

    O problema da educação não é falta de dinheiro - Mailson da Nobrega (Veja)

    O problema da educação não é falta de dinheiro
    Mailson da Nobrega
    Revista Veja, 23/07/2013
    A qualidade do capital humano é essencial para o desenvolvimento. A baixa qualidade da educação explica a perda da liderança econômica da Inglaterra para os Estados Unidos por volta de 1870 e para a Alemanha no fim do século XIX. Para Rondo Cameron e Larry Neal, no livro “A Concise Economic History of the World”, a Inglaterra foi o último país rico a universalizar a educação fundamental. A Revolução Industrial ocorreu, secundo eles, “na era do artesão inventor. Depois, a ciência formou a base do processo produtivo”. Em vez dos recursos da natureza – algodão, lã, linho, minério de ferro -, a indústria passou a depender cada vez mais de novos materiais, nascidos da pesquisa científica. Nessa área, americanos e alemães, com melhor educação, venceram os ingleses. A Suécia, que era atrasada no início do século XIX, se industrializou rapidamente graças à educação. Em 1850, apenas 10% dos suecos eram analfabetos, enquanto um terço dos ingleses não sabia ler nem escrever.
    No Brasil, até os anos 1960, acreditava-se que a educação seria mero efeito do desenvolvimento. Em 1950 os respectivos gastos públicos eram de apenas 1,4% do PIB. A partir dos anos 1970, a visão se inverteu. Convencemo-nos de que a prosperidade depende da educação. Os gastos subiram e hoje atingem 5,8% do PIB. A educação fundamental foi universalizada na década de 90 (um século e meio depois dos Estados Unidos e quase meio século depois da Coreia do Sul). Agora, demandamos melhora da qualidade, mas a ideia está contaminada pelo hábito de esperar que a despesa pública resolva qualquer problema. Daí o equivocado projeto de lei que aumenta os gastos em educação para 10% do PIB. Na mesma linha, Dilma e o Congresso querem aplicar na educação grande parte das receitas do petróleo.
    Mais do que verbas, é urgente uma completa revisão das instituições educativas vigentes


    Proporcionalmente, nossos gastos em educação equivalem à média dos países ricos. Passamos os Estados Unidos (5,5% do PIB). Investimos mais do que o Japão, a China e a Coreia do Sul, três salientes casos de êxito na matéria (todos abaixo de 5% do PIB). Na verdade, a má qualidade da nossa educação tem mais a ver com gestão do que com falta de recursos. O professor José Arthur Giannotti assim se referiu aos jovens que foram às ruas pedir mais dinheiro para o setor: “Pleiteiam mais verbas sem se dar conta da podridão do sistema. Mais do que verbas, é urgente uma completa revisão das instituições educativas vigentes. A começar pela reeducação dos educadores, que, na maioria das vezes, ignoram o que estão a ensinar” (“O Estado de S. Paulo”, 19/6/2013).
    Outro educador, Naercio Menezes Filho, citou o interessante caso de Sobral (“Valor”, 21/6/2013). Entre 2005 e 2011 o município cearense avançou quatro vezes mais rápido no ensino fundamental do que São Paulo, sem aumento significativo de despesa. “O gasto por aluno que Sobral usa para alcançar esse padrão de ensino nas séries iniciais é de apenas R$ 3 130,00, enquanto a rede municipal de São Paulo gasta ao redor de R$ 6 000 por aluno, ou seja, duas vezes mais.” Destinar receitas do petróleo para a educação é um duplo equívoco: (1) o problema não é de insuficiência de recursos, mas de sua aplicação, como vimos; (2) não é correto financiar políticas públicas permanentes com recursos finitos e voláteis. No longo prazo, as reservas de petróleo se esgotarão, enquanto os preços (e as receitas) se sujeitam às oscilações do mercado mundial de commodities.
    A proposta desconhece outra lição da experiência: a receita de recursos naturais não renováveis deve pertencer às gerações futuras. O exemplo a seguir é o da Noruega, onde as receitas do petróleo são carreadas para um fundo que em 2012 acumulava 131% do PIB. O fundo serve para lidar com os efeitos de quedas dos preços do petróleo e principalmente com os custos previdenciários que advirão do envelhecimento da população.
    A educação brasileira precisa de uma revolução gerencial e de prioridades, inclusive para gastar melhor os recursos disponíveis. Ampliar os respectivos gastos e destinar-lhe as receitas do petróleo agrada a certas plateias, mas o resultado poderá ser apenas o aumento dos desperdícios. Será péssimo para as próximas gerações.
    Fonte: Revista Veja



    terça-feira, 29 de janeiro de 2013

    A destruição das instituições pelo PT - Mailson da Nóbrega

    O que o ex-ministro da Fazenda diz sobre a área fiscal se aplica um pouco a todas as demais instituições, especialmente as de caráter Politico.
    Paulo Roberto de Almeida

    Destruir é Facil
    Maílson da Nóbrega
    Veja - 28/01/2013

    Os governos do PT têm promovido o desmonte sistemático das instituições fiscais duramente construídas nos anos 1980. [O mesmo ocorre] também com a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) de 2000. O processo se acentuou recentemente com o falseamento de resultados orçamentários e o uso de contabilidade criativa para fazer crer que foram cumpridas as metas de superávit primário. Caíram muito a transparência e a credibilidade das estatísticas fiscais.

    A construção dessas instituições começou na crise da dívida externa da década de 80. O Brasil, como quase todos os países latino-americanos, firmou acordos com o FMI visando a assegurar um fiuxo mínimo de financiamento externo e a restaurar a confiança na sua economia. Esses acordos previam metas fiscais e a prestação de informações, tal como agora ocorre no apoio do Fundo a países europeus. Foi então que se percebeu o atraso institucional das finanças públicas brasileiras, que dificultava a geração de estatísticas e estimativas. O governo nem conhecia a si mesmo nem era controlado pela sociedade.

    Entre 1983 e 1984, mais de 100 técnicos da Fazenda, do Planejamento, do Banco Central e do Banco do Brasil realizaram amplo diagnóstico da situação e propuseram medidas modernizadoras. O leitor pode não acreditar, mas quem executava o Orçamento da União era um departamento do BB e quem geria a dívida pública federal era um departamento do BC. O Tesouro não passava de uma entidade virtual. E o BC supria o BB de recursos por meio da famigerada “conta movimento”, de forma ilimitada. Nada disso transitava pelo Congresso. O BC atuava como banco de fomento e possuía equipes de análise de investimentos privados.

    Todo esse quadro mudou entre 1986 e 1988. Foram extintas a “conta movimento” e as atividades de fomento do BC. Criou-se a Secretaria do Tesouro Nacional, com funções que antes cabiam ao BB e ao BC. A expansão da dívida pública passou a ser autorizada pelo Congresso. Na sequência veio a LRF, cuja qualidade foi reconhecida por organizações internacionais e que teve papel relevante na execução e na credibilidade da gestão macroeconômica.

    O PT sempre se insurgiu contra essa evolução institucional. Alguns de seus líderes, hoje preeminentes, fizeram campanha contra as mudanças dos anos 1980. O partido tentou derrubar no Judiciário a LRF. Talvez por causa disso membros do governo acham hoje natural propor uma injustificável mudança na lei, permitindo, assim, a concessão indiscriminada de desonerações tributárias. Ou, na mesma linha, deduzir certos itens da despesa para fazer de conta que as metas foram cumpridas.

    A ideia dessa dedução nasceu no FMI, motivada pelas dificuldades políticas para efetuar a diminuição de gastos em programas apoiados pelo Fundo. Os cortes penalizavam excessivamente os investimentos, menos sujeitos a resistências. Isso reduzia o potencial de crescimento econômico e dificultava adicionalmente os ajustes. O FMI decidiu, então, fazer uma experiência. Certos investimentos seriam escolhidos de comum acordo com o país. os quais eram monitorados pelo Banco Mundial. Se fossem realizados, poderiam ser descontados do cálculo do superávit primário.

    Tratava-se, pois, de outro contexto. A escolha dos investimentos era criteriosa. Agora não. Agora, a ideia foi desmoralizada. Em vez de um "projeto piloto de investimentos”, de caráter experimental, o governo inclui itens a seu talante. Além disso, o PT recorreu a expedientes que na prática restabelecem a “conta movimento”, nesse instante com o BNDES. Manobras de setembro de 2010 permitiram contabilizar, como receita instantânea, parte da venda de 5 bilhões de barris de petróleo à Petrobras, no valor de 31,9 bilhões de reais, que não se sabe onde estão nem quando e se serão extraídos.

    Salvo no caso dos subsídios concedidos via BNDES a empresas escolhidas, cujo valor permanece oculto, as demais manobras têm cobertura legal, reconheça-se. O Executivo vem conseguindo inscrever, na legislação, as deduções, apoiado por um Congresso que renuncia às suas prerrogativas, tornando-se, lamentavelmente, cúmplice dessa destruição das instituições fiscais. Mais uma vez, fica provado o óbvio: destruir é mais fácil do que construir.

    domingo, 8 de agosto de 2010

    O custo do governo Lula - Mailson da Nobrega (Veja)

    Veja desta semana (11/08/2010) traz um artigo do economista e ex-ministro da Fazenda Mailson da Nóbrega sobre o enorme custo do governo Lula em termos fiscais e institucionais, mas também no plano moral, diplomático, do simples bom senso...
    Clicar na imagem para ter um arquivo em tamanho ampliado.

    sábado, 1 de maio de 2010

    2110) Nosso Guia descobriu o Brasil...em 2003

    Parece que só em em 2003 o Guia Genial dos Povos descobriu que o Brasil não foi feito por ele, e que o que tinha vindo antes -- como a estabilização do Plano Real, por exemplo -- era digno de ser mantido, preservado e até ampliado (o que ele não fez, pois que não empreendeu NENHUMA reforma digna desse nome).
    Pessoas que se pretendem salvadoras do mundo, e iniciadoras de um ciclo completamente novo na história do País, estão enganando a si mesmas, e tentando enganar os outros. Como nem todos os brasileiros são idiotas, como certos propagandistas das ideias alheias, esse tipo de demagogia, na verdade mentira deslavada, não cola, embora muita gente desinformada acabe acreditando que, sim, o Nosso Guia salvou a pátria e praticou a bondade universal.
    Pobres de espírito, ou gente de má fé, podem, eventualmete, acreditar nesse tipo de bobagem.
    Pessoas inteligentes, como aquelas que lêem este blog, sabem separar a verdade da mentira.
    Abaixo um artigo de Mailson da Nobrega sobre essa exata questão.
    Paulo Roberto de Almeida

    Quem descobriu o Brasil?: Lula ou Cabral?
    Maílson da Nóbrega
    Revista Veja, edição 2163 - 5 de maio de 2010

    "A história reconhecerá Lula pelas corajosas decisões de preservar a política econômica – que condenava – e de não buscar o terceiro mandato"

    Os menos avisados que escutam Lula podem pensar que fomos descobertos em 2003, e não em 1500. Seus discursos buscam deslustrar seus antecessores e propagandear o que entende como seus feitos. Não exagera a ponto de reivindicar a glória do descobrimento, mas chega perto. Diz que mudou o Brasil.

    Lula se gaba de ser o autor das boas transformações do país. É o que disse na Bahia, em março passado: "Este país começou a mudar, e isso incomoda muita gente". Bajuladores não faltam, como o que lhe atribuiu o epíteto de "nosso guia".

    No lançamento do PAC 2, Jaques Wagner, governador da Bahia, disse que "Lula está refundando o Brasil". Para a então ministra Dilma Rousseff, "este é o Brasil que o senhor, presidente Lula, recuperou para nós e que os brasileiros não deixarão escapar de suas mãos". Adulado e popular, Lula se imagina o marco zero.

    Mudanças como essas não acontecem em curto prazo. A Europa começou a emergir no século XV – suplantando a China e o mundo islâmico, até então centros de inovação e poder –, mas o processo de sua ascensão se iniciara muito antes, com destaque para a Carta Magna inglesa (1215) e para o Renascimento, que começou no fim do século XIII.

    Antes, mudanças ocorreram em áreas cruciais: cultura, sociedade, economia, política e religião. Copérnico, Vesálio e Galileu criaram a ciência moderna, abrindo caminho para o avanço tecnológico. Gutenberg revolucionou a imprensa. Depois, a reforma protestante de Lutero (século XVI) e a Revolução Gloriosa inglesa (1688) se tornaram fonte do moderno sistema capitalista e do predomínio econômico e militar do Ocidente.

    Indivíduos à frente de seu tempo contribuíram para mudanças ciclópicas. Entre 1776 e 1787, os pais fundadores da nação americana – os que participaram da Declaração de Independência, da Revolução ou da elaboração da Constituição – moldaram os princípios formadores dos alicerces sobre os quais se erigiria seu grande futuro.

    Felipe González, o governante socialista espanhol (1982-1996), abandonou velhas ideias e conduziu reformas estruturais, incluindo ampla privatização. Preparou seu país para a integração europeia e para longo ciclo de crescimento. Margaret Thatcher reverteu a trajetória de declínio da Inglaterra. Ronald Reagan renovou o capitalismo americano.

    O Brasil tem seus líderes transformadores. Entre outros, José Bonifácio, Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek. No período militar, sobressaem Ulysses Guimarães e Tancredo Neves, este em grande parte responsável pelo fim pacífico do autoritarismo.

    Ao proclamar-se o início de tudo, o presidente presta um mau serviço à história e aos brasileiros que gostam de ouvi-lo. Despreza o papel de Tancredo Neves na transição para a democracia, sem a qual não teria chegado ao poder. Obscurece a participação de Fernando Henrique Cardoso na construção da plataforma de lançamento da qual decolou.

    Lula gostaria de ser lembrado como um Getúlio ou um Juscelino, mas creio que a história – a quem cabe apontar o lugar dos atores políticos – o reconhecerá pelas corajosas decisões de preservar a política econômica – que condenava – e de não buscar o terceiro mandato. Evitou, assim, o retorno da inflação e o abalo das instituições políticas, que precisam de tempo para se consolidar.

    A continuidade deu tempo para o amadurecimento de mudanças anteriores. Permitiu-nos colher frutos da expansão da economia mundial e da emergência da China, hoje forte demandante de nossas commodities. Crescemos acima da média dos últimos 25 anos. As exportações triplicaram. Com estabilidade, crescimento e baixa inflação, foi possível alargar políticas sociais e assim reduzir as desigualdades sociais e a pobreza.

    Lula é um líder de massas sem paralelo na América Latina. Politicamente populista, não foi desastrado na economia, embora deixe más heranças, como o aparelhamento do estado, a piora da qualidade do regime fiscal e os efeitos da inconsequente política externa.

    Lula não descobriu o Brasil nem foi um líder transformador, mas não fez o estrago que se temia. Não é pouco. Não precisava, todavia, desconstruir as realizações do passado para marcar seu lugar na história, que parece garantido.