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quarta-feira, 24 de abril de 2013

Um balanco sobre Margareth Thatcher - Luiz Felipe Lampreia

Um balanço sobre tão controvertida personagem nunca é final, pois a história desse período ainda se ressente de interpretações políticas para um e outro lado, mas o artigo ressalva justamente, o lado contraditório, muito pouco consensual, da maior parte das ações e iniciativas da "dama de ferro".
Paulo Roberto de Almeida


Um balanço final 

O Globo, 24 de abril de 2013
  
Luiz Felipe Lampreia Instituto Millenium
O enterro de Margaret Thatcher,realizado na semana passada em Londres com toda pompa e circunstância, simbolizou o fim de uma batalha pelo futuro da Inglaterra.Ela foi a grande vencedora da luta pela modernização do país.Os perdedores foram os dogmáticos do velho Partido Trabalhista, que tudo pretenderam socializar e que, por pouco, não transformaram a Grã Bretanha num país de terceiro nível. Thatcher foi sempre implacável, por vezes mesmo cruel com os que lhe se opunham, fossem eles os generais argentinos, os mineiros galeses ou os burocratas das grandes empresas estatais. Sua força de convicção conduzia a uma visão maniqueista do mundo e uma ausência de sensibilidade social.Por isso, é muito difícil amá-la, como se pode amar Kennedy, Juscelino ou Churchill.Mas, a grande maioria de simpatizantes no desfile do féretro pelas ruas de Londres demonstrou que a sociedade britânica considerou Margaret Thatcher merecedora de respeito como uma grande líder.
Na Europa dos anos oitenta, após um período de lenta agonia,o marxismo e seu primo-irmão, o socialismo em todas as suas variantes, chegaram ao colapso. A União Soviética naufragou e os países do Leste europeu sacudiram um jugo de quarenta e cinco anos.Pelo mundo afora, todos os partidos comunistas que haviam amarrado sua sorte a Moscou foram liquidados.Da mesma forma, o socialismo fabiano que havia inspirado o Partido Trabalhista britânico chegou ao ponto de impasse completo, depois de tentar estatizar todas as forças produtivas da nação.Na década de oitenta, todas estas utopias se desvanceram deixando para trás um rastro enorme de sacrifícios inúteis e de sangue.
A virada foi um movimento das diversas sociedades europeias em busca de luz, uma revolta espontânea como ocorreu na Hungria em 1989,por exemplo, ou na derrubada do vergonhoso muro de Berlim. Margaret Thatcher e outros grandes líderes europeus como Helmut Kohl e Vaclav Havel, para citar apenas os mais conhecidos, foram os farois que deram norte às profundas tendências libertárias que sopravam na Europa dessa época. Esta é a melhor imagem que vai perdurar da filha do pequeno comerciante inglês que se tornou a primeira mulher chefe do governo britânico.

segunda-feira, 22 de abril de 2013

Margareth Thatcher, seu legado e a América Latina - Paulo Roberto de Almeida


Margareth Thatcher, seu legado econômico e a América Latina

Paulo Roberto de Almeida

Recebi, de um estudante de jornalismo preparando reportagem sobre a morte da ex-primeira-ministra Margareth Thatcher e seu legado econômico, as seguintes perguntas para responder:
2) A crise econômica de 2008 é uma comprovação de que o modelo econômico da ex-primeira-ministra era falho? De que forma os críticos ao neoliberalismo se apropriam das crises econômicas dos últimos anos para fundamentar seus argumentos contra Thatcher?
3) Qual é o legado deixado por Thatcher? Esse legado pode ser classificado em positivo ou negativo? 

Como as perguntas encontram-se na ordem exatamente inversa de importância substantiva, e de relevância jornalística, altero sua ordem e passo a responder sumariamente o que segue abaixo. Como também sei que apenas parte reduzida de minhas respostas será aproveitada na matéria em preparação, permito-me postar neste blog a integralidade de meu texto.

1) Qual é o legado deixado por Thatcher? Esse legado pode ser classificado em positivo ou negativo?
PRA: Nenhum legado de dirigente político pode ser visto de forma maniqueísta, ou bom ou mau, ou positivo ou negativo, ou branco ou preto. Isso se chama reducionismo, ou simplismo. Todo dirigente, nas circunstâncias dadas em que recebe o poder e inicia um governo, tem de enfrentar um conjunto de desafios que são de diversas ordens: conjunturais (se o país está em crescimento ou em recessão, por exemplo), estruturais (se o país conhece um processo sustentado de modernização e de melhorias sociais), ou sistêmicas (como funcionam os sistemas de saúde, de educação, de segurança, a logística e o ambiente dos negócios, a infraestrutura, etc.). Para cada um desses conjuntos de problemas, o novo dirigente tem de fornecer soluções, em parte baseados em seu programa eleitoral (de candidato), em parte com base na expertise de seus auxiliares (ministros e outros dirigentes), e em parte ainda em função das possibilidades do governo em questão (déficit ou superávit orçamentário, desequilíbrios nas contas públicas, situação do balanço de pagamentos, carências sociais, etc.).
O Reino Unido que Margareth Thatcher “herdou” dos trabalhistas, em 1979, era um país em perfeita decadência, como eu próprio constatei, visualmente, ao visitar a Inglaterra pouco antes de sua vitória eleitoral: um país sujo, em constantes greves, com serviços públicos funcionando precariamente, desemprego, delinquência, inflação, déficits interno e externo, desconfiança e desalento da população, pouca confiança na sua capacidade de cumprir requisitos de defesa estabelecidos pela OTAN, enfim, quase um país de Terceiro Mundo, que no começo daquela década ainda havia enfrentado uma crise série de desvalorização da libra.
Esse era o resultado de décadas de um pacto perverso entre a “CUT” e a “Fiesp” deles, entre patrões e sindicatos, a TUC, o Trade Union Congress, que fazia chantagem para conseguir aumentos reais de salários para os seus afiliados, mesmo que isso significasse mais inflação para o resto da população e o Labour (mas mesmo o Partido Tory, os Conservadores) eram complacentes com esse estado de coisas, levando o país à prostração. O dono do venerável e mais do que secular jornal Times não podia tomar decisões quanto à modernização do seu parque gráfico, pois era o sindicato dos gráficos que decidia quantos trabalhadores eram necessários para rodar o jornal diariamente. Sindicatos de ferroviários, eletricitários, condutores de ônibus e até coveiros mantinham a população refém de suas chantagens salariais. Esse era o país que Thatcher assumiu.
A continuidade desse estado de coisas, depois de duas ou três décadas de “consenso” socialdemocrata levaria o Reino Unido a uma decadência ainda mais forte: sua economia já tinha sido ultrapassada pela da Itália (ainda em crescimento) e se colocava entre as últimas da Europa pela baixa dinâmica de investimentos e inovações. Pouco depois, a colônia Hong Kong, com seus milhões de chineses morando em sampans no Rio das Pérolas, ultrapassaria a metrópole em renda per capita, o que terminou de humilhar a Grã-Bretanha.
Se considerarmos que depois de Thatcher a Inglaterra era um dos países mais dinâmicos da Europa, com o dobro do crescimento dos países continentais, e a metade de suas taxas de desemprego, com um setor financeiro renascido das cinzas, e o país acolhendo investimentos estrangeiros, podemos considerar que, sob esse ponto de vista, seu legado foi positivo. Tão positivo que o Labour, obrigado a corrigir seu programa econômico esquizofrênico (datado de 1919, e que ainda recomendava coletivização da economia) e a manter praticamente intactas todas as realizações econômicas da era Thatcher. Algo semelhante ocorreu no Brasil, com o pacto perverso da CUT com a Fiesp produzindo inflação desenfreada nos anos pré-Real, com o PT se opondo de maneira desleal ao programa de privatização e tentando sabotar o Plano Real, se opondo (até no STF) à Lei de Responsabilidade Fiscal, acusando mentirosamente o governo que terminava de ter deixado uma “herança maldita” (quando foi a própria campanha de Lula e a política econômica esquizofrênica do PT que produziram a crise de 2002), para finalmente roubar o “software” dos inimigos demonizados de forma fraudulenta e passar a governar exatamente com os mesmos instrumentos e ferramentas do governo anterior, mantendo todas as suas políticas. O Labour foi obrigado, como o PT o foi, a governar de forma mais racional e mais responsável. Esse foi o legado da Thatcher, como foi para o Brasil o legado de FHC e do PSDB para o governo de Lula e do PT.

2) A crise econômica de 2008 é uma comprovação de que o modelo econômico da ex-primeira-ministra era falho? De que forma os críticos ao neoliberalismo se apropriam das crises econômicas dos últimos anos para fundamentar seus argumentos contra Thatcher?
PRA: A crise de 2008 não tem nada a ver com um suposto modelo econômico de MT. Quem tem modelo econômico são acadêmicos de gabinete. Margareth Thatcher tinha um imenso desafio a resolver, o que ela fez, não aplicando algum modelo econômico, como gostam certos economistas teóricos e keynesianos de botequim, mas sim algumas ideias bem simples, como aliás se encarregam de lembrar que a filha de um quitandeiro chegou a ser primeira-ministra: um país, um governo, não pode viver acima de seus meios (e isso vale para uma casa, para uma empresa e para a economia nacional); uma empresa privada, buscando lucro, sempre será mais eficiente do que qualquer governo tentando prestar um serviço coletivo; uma empresa estatal sempre será deficitária, e buscará recursos no governo; sindicatos são máquinas de criar desemprego e reservas de mercado, assim como o fazem patrões protegidos da concorrência interna (por carteis) ou externa (por tarifas altas e protecionismo regulatório); concorrência sempre é boa para satisfazer os consumidores; controles de preços nunca dão certo; taxar muito o trabalho provoca desemprego; taxar muito o capital gera desinvestimentos e fuga de capitais; manipular juros e câmbio acabam dando em desastres e o melhor é deixá-los o mais possível próximos do equilíbrio de mercado; um país não pode estacionar no processo de modernização, e sim continuar sempre inovando e sendo competitivo para simplesmente não ser ultrapassado por economias mais dinâmicas; enfim, um conjunto de ideias simples que eram bem mais pragmáticas do que teóricas.
Se algum modelo havia em suas “receitas” para corrigir o país decadente que era o Reino Unido esse era o da economia liberal, cujos fundamentos ela foi buscar em Ludwig Von Mises e em Friedrich Hayek. Isso não tem nada a ver com neoliberalismo, um falso conceito inventado pela esquerda órfã do desastre socialista para tentar encontrar um rótulo qualquer para aqueles que estavam revertendo décadas de políticas keynesianas que levaram os países à estagnação e à crise. Se tratava de liberalismo clássico, apenas isso, aquele fundamentado em Adam Smith, David Ricardo, James e John Stuart Mill, e nos já citados economistas da escola liberal alemã ou austríaca.
A crise de 2008, como várias outras crises – basta ler o clássico de Charles Kindleberger, Pânicos, Manias e Crises – foi criada por uma bolha, como sempre ocorre (financeira, da bolsa, de títulos do governo, etc.). Desta vez foi a bolha imobiliária que precipitou a crise bancária americana e daí para o resto do mundo, pelo funcionamento em rede dos mercados financeiros. Quem criou a crise foram os governos, ao manterem juros artificialmente baixos, ao estimular indevidamente e exageradamente a construção imobiliária, ao expandir o crédito acima da capacidade de endividamento das família (e ao oferecer garantias falsas para casos de insolvências), enfim, ao manipular os mercados e os indicadores macroeconômicos. Ora, a economia liberal se coloca frontalmente contrária a todas essas manipulações do governo e prega, justamente, juros de mercado, garantias reais, investimento sustentado em ativos financeiros existentes, não em crédito criado artificialmente pelos governos; os liberais verdadeiros pregam inclusive falências bancárias, em caso de sobre-exposição dos bancos, assim como se coloca contra o monopólio emissionista dos governos, gerador de inflação e de desvalorização da moeda, deixando todos bem mais pobres.
Os supostos críticos do neoliberalismo deveriam dirigir suas baterias contra os governos, não contra os economistas liberais. Afinal de contas são os governos que fixam as taxas de juros, que emitem moeda, que expandem o crédito, que dão garantias aos compradores de casa (ao avalizar seus títulos hipotecários), são eles que manipulam o câmbio, não os mercados, que simplesmente reagem segundo as reações espontâneas e não coordenadas de milhares de agentes econômicos individuais, que estão sempre buscando valorizar ou aumentar seus ativos atuando de maneira especulativa. Os supostos crises do neoliberalismo estão totalmente equivocados em suas críticas a mercados desregulados, pois a regulação dos governos, e das instituições multilaterais – como BIS ou FMI, por exemplo – é muito intensa e extensa, apenas que feita por burocratas, que não podem, obviamente, prever todos os movimentos de milhares de agentes econômicos disputando fatias de ganhos especulativos nos mercados.
Os keynesianos são os mais equivocados de todos, pois eles acreditam que governos podem, impunemente, produzir bondades, apenas “injetando liquidez” nos mercados, ou seja, emitindo dinheiro, produzindo inflação, déficit ou dívida pública. O próprio conceito macroeconômico de Keynes é equivocado, ao ignorar as lições mais elementares da microeconomia, como a lei da oferta e da procura e do equilíbrio dos mercados. Não foi o neoliberalismo, nem a austeridade que provocou as crises na Grécia, na Irlanda ou em Portugal, e sim a prodigalidade gastadora dos governos, sua irresponsabilidade no tratamento da política monetária, as bondades distribuídas de forma irresponsável pelos políticos sob a forma de altos salários para os funcionários públicos, as pensões generosas, os muitos seguros sociais existentes (que levam a um exército de assistidos com o dinheiro público, ou seja, de todos), etc. Nenhum banqueiro ou especulador de Wall Street obrigou a Grécia a se endividar de forma irresponsável; foram seus governos que tomaram recursos externos (sob a cobertura do euro e das taxas de juros mais favoráveis) acima da capacidade do país, que dispunha de produtividade abaixo do aceitável para atuar da forma como fizeram seus dirigentes.
Não há tampouco legitimidade nas críticas dos sociais-democratas contra a política social de Margareth Thatcher, pois ela legou um país mais organizado, com mais investimentos e maior nível de renda, ultrapassando novamente a Itália e a França. Os problemas que advieram depois, muito depois, em 2008-2009, não têm nada a ver com a sua gestão, terminada em 1991, e continuada integralmente sob Tony Blair (assim como Lula continuou com as políticas de FHC, que estão sendo desmanteladas, todavia, a partir de 2006).

3) Gostaria de saber se houve de fato alguma influência da política econômica de Thatcher na América Latina. Caso essa influência seja real, de que forma ela ocorreu?
PRA: Não, redondamente não. Se houve, foi tardia, equivocada, incompleta, ou implementada fora dos parâmetros. A América Latina já estava em crise bem antes de MT começar seu ciclo de mudanças de política econômica exclusivamente talhada para a situação do seu país, sem nada a ver com a situação dos países latino-americanos. A crise destes tinha a ver com o esgotamento das políticas de crescimento para dentro, com forte introversão econômica, excessivo protecionismo, manipulações exageradas dos governos nos mercados de capitais, laboral, no câmbio, nas políticas relativas ao investimento estrangeiro (fortemente restringido, como aliás todo o comércio) e dezenas de outros exemplos de dirigismo excessivo, estatizações e monopólios abusivos, controles de preços, de estoques, tributação excessiva e outros pecados mais ou menos mortais. Mais do que tudo, os países abusaram da liquidez financeira provocada pela alta dos preços do petróleos e a reciclagem de petrodólares para se endividarem além da conta (aproveitando os juros baixos, aliás abaixo da inflação, ou seja negativos), e a partir da elevação dos juros pelo Federal Reserve, em 1979, se descobriram incapazes de honrar, sequer suas dívidas, mas o simples pagamento do serviço da dívida. Ou seja, os problemas dos países latino-americanos tinham algo a ver, mas em nada deviam à decadência inglesa pré-Thatcher.
Da mesma forma, a solução encontrada não se encontrou num suposto modelo “thatcheriano” de política econômica, e sim em respostas desenhadas pelos próprios países, com a ajuda do FMI e de economistas liberais, no sentido de inverter todas aquelas políticas descritas acima. A reversão começou no México, logo em seguida à sua crise da dívida externa (1982), num momento em que as políticas econômicas de Thatcher sequer tinham começado a fazer efeito, o que só ocorreu a partir de meados da década; depois as mesmas políticas foram aplicadas no Chile e paulatinamente em outros países (mas o Brasil e a Argentina foram os mais tímidos, ou incompetentes, em aplicá-las, e por isso conheceram crises hiperinflacionárias, desvalorizações cambiais, mudanças de moedas e outros desastres, já bem depois que Thatcher abandonou o governo inglês. É um mito que os países latino-americanos tenham aplicado suas políticas, inclusive porque elas eram inaplicáveis fora do contexto britânico, com exceção, talvez, das privatizações de monopólios estatais, o que aliás respondia simples bom senso (as estatais eram ineficientes, deficitárias e não atendiam aos consumidores), e não por que isso fosse determinado por sofisticadas teorias econômicas.
Esse amálgama indevido, fantasmagórico, inexistente, totalmente equivocado entre um suposto “thatcherismo” econômico, mais a chamada “reaganomics” – que tampouco existiu, pois o presidente era um ignorante em econômica, se contentando com algumas ideias simples, geralmente liberais, mas sobretudo pragmáticas, um pouco como Thatcher, aliás – e o famoso “Consenso de Washington”, e a alegada influência dessas ideias “neoliberais” – um conceito equivocado, como já se disse – na América Latina são construções surrealistas criadas por uma esquerda desprovida de ideias claras sobre os processos econômicos, e que se compraz em colar rótulos vazios em dirigentes que aplicam políticas que contradizem seu keynesianismo de botequim. O chamado “Consenso de Washington”, por falar nele, é posterior ao início da fase de reformas em alguns países da América Latina, e visa, justamente, condensar num conjunto de ideias simples (mais uma vez) os ensinamentos de quase dez anos de reformas econômicas na região. Ele está orientado pelos mesmos princípios: equilíbrio fiscal, baixa inflação, orçamentos realistas, taxas de juros e de câmbio bem mais determinadas pelos mercados do que pelos governos, privatização e desmonopolização, abertura a comércio e aos investimentos, proteção dos ativos proprietários, etc. Nunca falou da liberalização dos movimentos de capitais ou da abertura financeira, como parece ignorar a esquerda. E, tanto quanto o “thatcherismo”, ele nunca foi aplicado na América Latina como se fosse um modelo prêt-à-porter, aplicável em quaisquer circunstâncias. Esse é outro mito, e uma outra mentira de certa esquerda, que manifestamente não entende de economia ou de processos reais de governança econômica (geralmente acadêmicos que atuam com base apenas em slogans políticos).
O único exemplo, provavelmente, de políticas à la Thatcher aplicadas na região se referem, como já indicado anteriormente, às privatizações de monopólios estatais, mas isso era uma decorrência da própria situação falimentar dessas empresas, não que houvesse um manual thatcheriano para empreender essas medidas (tanto porque cada processo foi diferente de um país a outro, provocando resultados bons e outros maus). Abertura a investimentos nem é uma ideia thatcheriana, e sim uma velha realidade da região (e de todas as outras), enterrada durante a grande dominação keynesiana, nacionalista e protecionista das décadas de 1930 a 1980, e retomada a partir de então.
Infelizmente, a América Latina atualmente – não todos os países – parece retornar aos velhos tempos: fechamento econômico, protecionismo comercial, dirigismo econômico, reestatizações, controles de preços, manipulações cambiais, etc. O Brasil, também infelizmente, parece ter acompanhado a Argentina no seu retorno ao velho protecionismo dos anos 1970; espera-se apenas que ela não a acompanhe no retorno muito mais nefasto aos anos 1930: controles de capitais, distorções cambiais, centralização estatal de várias operações financeiras externas, o que seria um bilhete certo para o desastre econômico, que é para onde está apontada a Argentina. Nem se mencione, aqui, o desastre econômico da Venezuela, um país destinado ao desastre do seu socialismo petrolífero.
Uma Thatcher faria bem a vários países da América Latina: infelizmente não se criam líderes políticos com perfil de estadista facilmente, sendo bem mais prolífica a fauna de demagogos, populistas e falastrões (e seus conselheiros econômicos que merecem o título de keynesianos de botequim).

Paulo Roberto de Almeida (Hartford, 22 de abril de 2013)

domingo, 14 de abril de 2013

Contra Margareth Thatcher: o mau gosto britanico - Le Monde

Pronto, para não dizer que sou unilateral nos elogios a Margareth Thatcher (o que aliás nunca fiz, apenas tentando oferecer um depoimento sincero, e postagens inteligentes sobre sua obra e seu legado), coloco aqui, agora, uma matéria do Le Monde, que sintetiza todo o mau humor britânico contra a controvertida personagem.
Que fique bem claro: o lado positivo de sua gestão excede em muito, imensamente, os erros que ela possa ter cometido. Eu conheci, diretamente, as duas "Grã-Bretanhas": a de antes, decadente, suja, paralisada pelas máfias sindicais, e a que sucedeu: não perfeita, mas muito melhor, sem chantagem de lobistas irresponsáveis, novamente dinâmica.
Mas existe todo um público disposto a cuspir na tomba dela: são os ignorantes, os fundamentalistas, os intolerantes. Eles devem gostar de alguns dos links abaixo.
Paulo Roberto de Almeida
PS.: Seguir o link do Le Monde para ver as outras músicas anti-Thatcher.

"Ding Dong ! The witch is dead" au hit-parade après la mort de Thatcher

Le Monde.fr avec AFP | • Mis à jour le
Le groupe audio-visuel BBC a finalement décidé vendredi 12 avril, après beaucoup d'hésitations, de diffuser un court extrait de "Ding Dong ! The witch is dead" (La sorcière est morte), une chanson tiré du Magicien d'Oz devenue un tube sur internet après le décès de Margaret Thatcher, dans le cadre de son hit parade hebdomadaire sur Radio 1.
Une campagne menée par des opposants à l'ancienne première ministre britannique, décédée à 87 ans, a propulsé le titre en 3e position de l'Official Charts, organisme qui certifie les ventes de l'industrie musicale. Elle est devancée de 12 000 exemplaires par le numéro 1, mais gagne le droit à être émise sur la BBC.
Plus grand diffuseur de radio-télévision du monde, cette dernière a indiqué qu'elle jouerait dimanche un bref extrait sur Radio 1, dans l'émission The Official charts show, après les plaintes de personnes estimant que la chanson était agressive et manquait de goût. Le régulateur de la chaîne, Ben Cooper, a déclaré qu'il s'était senti coincé "entre le marteau et l'enclume" : "personne à Radio 1 ne souhaite causer d'offense, mais je crois aussi que nous ne pouvons pas ignorer la chanson dans notre émission".
LA LIBERTÉ DE PAROLE
"Personnellement, je crois qu'elle est déplaisante et déplacée, a ajouté le nouveau PDG de la BBC Tony Hall. Néanmoins, je crois vraiment qu'il ne serait pas bien d'interdire une chanson, car la liberté de parole est un principe important et que l'interdiction ne ferait que lui donner plus de publicité". "Nous avons convenu que nous ne jouerions pas la chanson en entier, mais que nous la traiterions plutôt comme une information d'actualité et que nous en diffuserions un court extrait pour la remettre dans son contexte", a-t-il dit.


"Brûle en enfer Maggie", dit ce graffiti du centre de Londres.
Le tube s'est écoulé à 20 000 exemplaires selon l'Official Charts. "C'est une tentative de manipulation des hit-parades par des personnes qui essaient de faire passer un message politique. Beaucoup de gens vont trouver cela choquant et violent, et pour ces raisons, il serait mieux que la BBC s'abstienne de la jouer", avait déclaré au Daily Mail John Whittingale, président conservateur de la commission pour la culture, les médias et le sport au Parlement britannique.
Charles Moore, biographe officiel de l'ancienne première ministre a donné sa lecture du phénomène, dans une interview à la BBC : "Ce qui se passe, c'est que les médias – et en particulier la BBC qui a essayé pendant 24 heures d'être sympathique envers Mme Thatcher, mais n'a pas pu le supporter plus longtemps – promeuvent jour après jour l'idée que Mme Thatcher est une figure qui divise, et que les gens salissent sa réputation en célébrant sa mort". L'élue conservatrice a toujours reproché à la BBC un parti pris gauchisant.
CHANTEURS RÉJOUIS
Nombre de musiciens vedettes des années 1980 se sont ouvertement réjouis de sa mort. Bobby Gillespie, le chanteur du groupe écossais Primal Scream, s'est déclaré "heureux", dans une interview à l'AFP jeudi à Paris. Morrissey, leader des Smiths et auteur en 1988 de la chanson "Margaret on the guillotine", a condamné l'action de cette dernière, précisant qu'"aucune personnalité politique britannique n'a jamais été aussi méprisée par les Britanniques que Margaret Thatcher" dans un communiqué mardi.
Des "protest songs" des années 1980 ont par ailleurs été remis au goût du jour à l'approche des funérailles, mercredi à Londres. C'est le cas d'un fameux 33 tours "Tramp the dirt down" (Piétinez la tombe) sorti en 1989. "Quand enfin on te mettra en terre/ Je me tiendrai sur ta tombe et la piétinerai", y chante Elvis Costello.
Le tube fait partie de la playlist créée par le site Red Pepper, qui se présente comme "un magazine de révolte et de dissidence politique". Au programme : "Maggie Maggie Maggie (out out out)" du groupe The Larks, "The day that Thatcher dies" (le jour où Thatcher mourra) par Hefner, qui comprend ces paroles : "Nous rirons le jour où Thatcher mourra/Même si nous savons que ce n'est pas bien/ Nous danserons et chanterons toute la nuit". Le blog cite aussi "Kick out the Tories" (dégage les Conservateurs) de Newtown Neurotics et "Maggie's last party" de V.I.M.
Le premier ministre David Cameron et le chef de l'opposition Ed Miliband, se sont l'un et l'autre élevés contre les diverses manifestations "déplacées" à l'occasion du décès de Mme Thatcher.
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Margaret Thatcher durant une conférence du parti conservateur à Brighton, en 1981.

Le pouvoir hypnotique de Margaret Thatcher8

L'écrivain britannique Ian McEwan se souvient : "Nous nous demandions si la réalité n'avait pas accouché d'un personnage au-delà de notre imagination."

Ainda Margareth Thatcher - Monica Baumgarten De Bolle


O problema da maior parte dos artigos sobre Thatcher, ou daqueles que são inteligentes (os únicos que entram aqui), é que eles são geralmente elogiosos, focando em suas realizações, e deixando de lado os erros que ela cometeu (e que tenho procurado compensar aqui, colocando alguns da Escola Austríaca). Tirando esse aspecto, acredito que mesmo esses artigos elogiosos (mas inteligentes) podem contribuir para a ilustração dos mais jovens (e de alguns obtusos, também), já que escapam daquela arenga tradicional (e altamente estúpida) de apenas vincular seu governo a um tal de neoliberalismo, que no Brasil (e no resto da América Latina também) passa por xingamento da parte dos ignorantes.
Paulo Roberto de Almeida  

Não há hoje líderes como Margaret Thatcher

Para fazer reformas e tirar seu país da estagnação, a ex-primeira-ministra britânica não hesitou em escolher um caminho de alto custo político

Monica Baumgarten De Bolle
Revista Exame, edição 1039,  12/04/2013
Margaret Thatcher, ex-primeira-ministra britânica
Tenacidade e magnetismo: o receituário liberal irritava a oposição, mas ela venceu três eleições consecutivas
São Paulo - Ligas metálicas podem ser de dois tipos: as ferrosas, em que o ferro é o componente principal, e as não ferrosas, constituídas de outros metais. O ferro, além de resistente e de possuir propriedades magnéticas, é o elemento de núcleo mais estável da tabela periódica. Não foi à toa, portanto, que a única primeira-ministra na história do Reino Unido, Margaret Thatcher, recebeu a alcunha de Dama de Ferro.
Que o apelido tenha sido dado pelos soviéticos, os responsáveis pela Cortina de Ferro que a Dama posteriormente ajudou a derrubar, é mais do que mera coincidência. É uma deliciosa ironia, digna do humor nativo da ilha.
Uma figura controvertida até na morte — as manifestações depois do anúncio de seu falecimento foram elogiosas e críticas em igual medida —, Margaret Thatcher foi um exemplo de tenacidade e de magnetismo.
Apesar de ter escolhido o caminho mais árduo, aquele cujos custos políticos eram os mais elevados, para pôr em marcha os planos de transformação que tinha para o Reino Unido, conseguiu promover a vitória do Partido Conservador em três eleições consecutivas.
Governou o país de 1979 a 1990, uma época permeada por grandes crises externas e mudanças geopolíticas marcantes. A lista vai desde o longo período estagflacionário proveniente dos choques do petróleo, os anos de crescimento baixo e inflação elevada que sobrevieram dos eventos no Oriente Médio na década de 70, até a abertura da União Soviética e a derrubada do Muro de Berlim, culminando na extinção da liga metálica que encobria os países do Leste Europeu, a Cortina de Ferro.
Ao longo desses anos, Thatcher manteve inabalada a convicção na eficiência dos mercados, na necessidade de tornar mais flexíveis as leis trabalhistas do país e de promover as indústrias mais competitivas, deixando que as demais caíssem no esquecimento e desaparecessem gradualmente.
Até sua ascensão ao posto máximo do governo, o Reino Unido enfrentava um período de ruidosa decadência econômica, imortalizada nas imagens das greves sucessivas dos carvoeiros e de outros trabalhadores, e dos aguerridos protestos promovidos pelos sindicatos, que ditavam os rumos do país e o desmoralizavam mundialmente.
A degradação econômica e política que caracterizara os anos do pós-guerra chegou ao auge em meados da década de 70.  Quando Thatcher assumiu o poder, em 1979, a economia britânica crescia menos de 3% ao ano e enfrentava uma inflação de nada menos do que 13%.
Três anos antes, em 1976, o país recorrera ao FMI devido às crescentes dificuldades para reequilibrar as contas públicas e financiar o rombo no balanço de pagamentos. Passados dez anos depois de ela ter assumido a liderança política, o Reino Unido crescia 5% e alcançara a estabilidade de preços: em 1988, a inflação foi de 4,9%. Quem dera fosse esse o atual desempenho da economia brasileira...
A intolerância de Margaret Thatcher com a ineficiência desmantelou os grupos de interesse que emperravam a modernização e o aumento da competitividade do país. A primeira-ministra foi responsável por um dos mais ambiciosos e abrangentes planos de privatização de que se tem notícia, opôs-se ferrenhamente aos sindicatos e deu prioridade a setores em que o Reino Unido já possuía nítidas vantagens comparativas, como o polo financeiro sediado na City de Londres.
O que mais assombra ao relembrar as conquistas da Dama de Ferro é a profundidade das reformas que ela promoveu em tão pouco tempo. Dez anos. Em uma década, o Reino Unido foi da decadência à revitalização, reconquistando o espaço perdido na economia global e na geopolítica.
Hoje, o Reino Unido só não está emaranhado no torvelinho da crise do euro por causa de Thatcher e de sua inabalável determinação. “No, no, no”, bradou em meio às discussões no Parlamento sobre os planos de maior integração com a Europa. Por ironia do destino, a obstinação em evitar que a ilha se amalgamasse ao continente foi uma das razões para sua renúncia em novembro de 1990.
Pagar para ver
“Não sou uma política de consenso. Sou uma política de convicção” (“I am not a consensus politician, I am a conviction politician”). Não há, no mundo de hoje, políticos como Margaret Thatcher. Trata-se de uma época de políticos não ferrosos, de políticos excessivamente maleáveis. São políticos de consenso. O problema é que épocas de crise, ou de graves sequelas de crises, são incompatíveis com o consenso. O consenso não resiste ao fogo da polarização e do impasse político.
Exemplos abundam. Vejam os Estados Unidos, amarrados a um corte automático de gastos públicos nas áreas sociais devido à incapacidade de seus políticos de chegar a um consenso.
Vejam a Europa, onde muitos países já trocaram de governo por causa da falta de consenso. Alguns, inclusive, estão sem governo por esse motivo, como a Itália. Vejam o euro, à deriva em meio ao dissenso que prevalece entre os líderes dos países-membros do acordo de moeda única. O consenso se esvai na fumaça ardente das tensões.
Em todos esses casos, chamam a atenção não só a falta de consenso mas também a ausência de convicção. Não há líderes convictos, líderes com visão e determinação para transformar seus países, para levar a cabo as reformas que precisam fazer para tirar as economias do vórtice recessivo, do desemprego e da atividade moribunda. Ninguém quer pagar para ver. Margaret Thatcher, por mais polêmica que fosse, pagou para ver.
Aqui no Brasil, parece que queremos pagar para ver. Contudo, queremos pagar para ver o que não deveria ser visto. Enrijecemos as leis trabalhistas do país, indexamos o salário mínimo permitindo que o rendimento médio do trabalhador cresça acima da produtividade da economia, dificultamos os investimentos em infraestrutura por meio de políticas econômicas desconjuntadas e do excesso de intervencionismo do governo, criamos novas estatais.
O Estado brasileiro cresce desordenadamente, seja por meio da carga tributária elevada, seja por meio dos gastos que não param de subir ou do crédito público em demasia. Desmantelamos as agências regulatórias, revertendo os ganhos de eficiência conquistados em áreas como telecomunicações, em setores estratégicos como óleo e gás e de energia elétrica.
Deixamos que o excesso de burocracia prejudique o setor privado e impeça a retomada do investimento, sem o qual não sairemos da armadilha do baixo crescimento. Flertamos abertamente com a inflação. Nosso receituário é o inverso do implantado pela Dama de Ferro. É o receituário do latão, do material que amassa com facilidade, que oxida.
Nossa presidente é uma política de convicção. Nesse caso, antes fosse uma política de consenso.

Novamente, onde Margareth Thatcher errou economicamente - ainda Murray Rothbard

Grato ao amigo, e leitor deste blog, Eduardo, do Rio, pelo envio deste artigo retirado do Mises Brasil, mas de 1991.
Paulo Roberto de Almeida 

Adeus à Dama de Ferro
Mises Brasil, segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012
Artigo publicado em fevereiro de 1991
MAGGIE copy-2.jpgA saída de madame Thatcher do governo britânico se deu de maneira bastante condizente com todo o seu reinado: barulhento em termos de retórica ("a Dama de Ferro jamais renunciará"), mas ínfimo em termos de ações genuinamente concretas (a Dama de Ferro rapidamente saiu de cena).
Margaret Thatcher ascendeu estrondosamente ao posto de primeira-ministra da Grã-Bretanha em 1979 com a promessa de desestatizar a economia, implementar um livre mercado, acabar com os déficits e com a inflação monetária.  Suas realizações, no entanto, são outra história, e possuem pontos positivos e negativos.
Do lado positivo, é fato que sua retórica realmente devolveu respeitabilidade às ideias pró-livre mercado na Grã-Bretanha após meio século de crescente estatismo, e é certamente gratificante ver os estimados indivíduos do Institute of Economic Affairs em Londres se tornarem o mais reputado instituto econômico britânico.  Também deve ser creditado à era Thatcher o fato de o Partido Trabalhista ter se movido mais para a direita e ter majoritariamente abandonado suas ideias esquerdistas malucas, além do fato de a Grã-Bretanha ter decisivamente abandonado sua psicose pós-Depressão de que o desemprego jamais deve ficar acima de 1%.
Houve também um considerável volume de desestatizações e privatizações, inclusive a venda de moradias públicas para seus respectivos inquilinos, o que fez com que eleitores que tradicionalmente votavam no Partido Trabalhista se convertessem em ferrenhos proprietários eleitores do Partido Conservador.  Outro sucesso da ministra foi o de ter quebrado o até então inquebrantável poder dos poderosos sindicatos britânicos.
Infelizmente, estes pontos positivos do histórico econômico de Thatcher são mais do que contrabalançados pelo desolador fato de que o estado britânico chega ao fim da era Thatcher sendo um fardo parasítico ainda maior sobre a economia britânica e a sociedade do que era quando ela assumiu o poder.  Por exemplo, ela jamais ousou tocar na vaca-sagrada da medicina socializada, o National Health Service.  Os déficits continuaram altos, e a inflação monetária e a inflação de preços estão atualmente em dois dígitos.  Apesar de toda retórica thatcherista em prol do monetarismo, seu sucesso no combate à inflação foi moderado e efêmero, e acabou sendo totalmente revertido já no final de seu governo: a expansão monetária, a inflação, os déficits e todo o desemprego por eles gerados estão em níveis alarmantes.  Madame Thatcher deixou o poder, após onze anos, em meio a uma infame recessão inflacionária: inflação de preços em 11% e desemprego em 9%.  Em suma, o histórico macroeconômico de Thatcher foi abismal.
Como explicar resultados tão desastrosos para um regime supostamente pró-livre mercado?  Não é difícil.  Os thatcheristas são "burkeanos" e não "leninistas de direita".  Sendo assim, em vez de uma abordagem obstinada, radical e abolicionista para se chegar à liberdade econômica, eles preferiram se entregar às glórias do gradualismo e da moderação.  Isso pôde ser comprovado logo nos primeiros anos do governo.  Em vez de uma política monetária rígida, em vez da total interrupção da expansão monetária para acabar de vez com a inflação crescente, optou-se por uma contenção monetária bem mais gradual.  E qual foi o resultado deste gradualismo na política monetária?  O gradualismo gerou uma crônica recessão, o que era inevitável, mas não foi restritivo o suficiente para acabar com a inflação ou para revigorar a economia.  Logo, teve-se o pior dos mundos: recessão, desemprego e inflação de preços.  E tal cenário perdurou até aproximadamente 1985, quando estes indicadores melhoraram.  Mas o bom momento, obviamente, gerou novos afrouxamentos na política monetária, de modo que, já em 1990, todos eles estavam novamente tão ruins quanto no início do governo.
Houve realmente uma redução nas alíquotas mais altas do imposto de renda, mas isto foi imediatamente mais do que compensado por um aumento ainda maior no VAT (imposto sobre o valor agregado, essencialmente um imposto sobre vendas).  Desta maneira, os pequenos ganhos obtidos pelos grupos de mais alta renda foram mais do que contrabalançados por um aumento do fardo sobre os pobres e a classe média.  Se os esquerdistas quisessem inventar um bicho-papão de direita, eles dificilmente fariam um trabalho mais exitoso e com resultados mais desastrosos para a causa da liberdade econômica.
Para coroar tudo, não nos esqueçamos de sua monumental e decisiva gafe: substituir os impostos municipais sobre propriedade por um imposto único e de igual valor por pessoa (o chamado "poll tax").  Na Inglaterra, o governo central possui autoridade sobre os governos municipais, muitos dos quais são administrados por trabalhistas esquerdistas fanáticos por gastanças.  Este imposto único por pessoa, que substituiria os impostos municipais sobre propriedade, foi criado com a intenção de reprimir a gastança descontrolada dos governos locais.
Porém, em vez de reduzir drasticamente o volume de tributação imposta pelos municípios, algo sobre o qual Thatcher tinha total autoridade, ela simplesmente não impôs limite algum, e deixou que os gastos e demais impostos municipais ficassem a cargo das assembléias municipais.  Logo, aconteceu exatamente aquilo que poderia ter sido previsto de antemão: estas assembléias, Trabalhistas e Conservadoras, agora sem as receitas do imposto sobre propriedade, elevaram seus outros impostos substancialmente, de modo que o cidadão britânico comum se viu obrigado a pagar aproximadamente um terço a mais em impostos.  Enquanto os governos locais aumentavam seus gastos e seus impostos, o imposto único seguiu mordendo furiosamente a renda dos pobres e da classe média.  Ato contínuo, e como era de se esperar, os governos locais simplesmente, e de maneira muito efetiva, jogaram a culpa pelos altos impostos sobre o governo Thatcher.  Não é de se surpreender que tenham ocorrido violentos protestos nas ruas de Londres em março de 1990.  O que é realmente intrigante é que as manifestações não tenham sido muito severas.
Ademais, em meio a todas estas manobras, os thatcheristas se esqueceram de um ponto essencial a respeito do imposto único por cabeça: para ele ser implantado, todos os outros impostos têm de ser drasticamente reduzidos, de modo que até o mais pobre dos mais pobres possa pagá-los.  Suponha, por exemplo, que nossos atuais impostos federais fossem repentinamente unificados sob a forma de um imposto único por cabeça, mas de modo a manter a mesma receita de antes.  Isso significaria que o cidadão médio, e particularmente o cidadão de baixa renda, repentinamente teria de pagar uma quantia enormemente maior de impostos por ano — aproximadamente $5.000.  Logo, o grande charme da tributação única por cabeça é que ela necessariamente forçaria o governo a reduzir drasticamente seus níveis de tributação e de gastos.  Assim, se o governo instituísse, por exemplo, um imposto universal e igual de $10 por ano, confinando suas receitas totais à magnífica soma de $2 bilhões anuais, todos nós viveríamos perfeitamente bem com este novo imposto.
Agora, implantar o imposto único por cabeça no lugar do antigo imposto sobre propriedade, e permitir que ele seja elevado, é uma insanidade política e econômica, e Madame Thatcher recebeu a punição adequada por este erro egrégio.
Por que então o governo Thatcher, ao implantar seu imposto único, não decretou que os governos municipais reduzissem drasticamente suas alíquotas de impostos para cada cidadão?  Se fizesse isso, as massas certamente teriam recebido com prazer o imposto único em vez de tê-lo combatido vigorosamente.  A resposta thatcherista é que, se fizesse isso, o governo central teria então de se responsabilizar pelo financiamento de determinadas atividades fornecidas pelos governos locais, como educação, o que, por sua vez, faria com que o governo central tivesse de elevar seus impostos — ou incorresse em maiores déficits.
Mas esta resposta simplesmente empurra a análise um passo adiante: por que então o governo Thatcher não estava preparado para cortar seus próprios gastos, já substancialmente inchados?  Claramente, a resposta é que os thatcheristas jamais acreditaram genuinamente em sua própria retórica.  Ou isso, ou eles não tiveram a coragem de levantar a questão.  Por esta e por várias outras razões, os gastos e as receitas do governo britânico chegaram ao fim do governo Thatcher sendo mais fartos do que nunca.
Infelizmente, o thatcherismo é muito similar ao reaganismo: retórica livre-mercadista mascarando um conteúdo estatizante.  Exceto pelas privatizações, o fardo estatal aumentou sob Thatcher.  Os gastos absolutos e a porcentagem das receitas tributárias em relação ao PIB aumentaram durante seu regime, e a inflação monetária nunca foi contida.  Compreensivelmente, o descontentamento básico com o governo aumentou, e o aumento dos impostos locais permitidos pelo "poll tax" foi apenas a gota d'água. 
Parece-me claro que um critério mínimo para que um regime receba a alcunha de "pró-livre mercado" seja o fato de ele cortar seus gastos totais, cortar impostos em geral e, consequentemente, reduzir suas receitas.  Além disso, é imprescindível que ele interrompa decisivamente sua própria criação inflacionária de dinheiro.  Mesmo por este certamente muito modesto padrão de medida, a administração Thatcher passou longe de ser digna de tal alcunha.  Por isso, Madame Thatcher mereceu seu destino final.
No entanto, há uma área da macroeconomia da qual certamente temos de lamentar a saída de Thatcher: ela era a única voz contra a criação de um Banco Central Europeu emitindo uma nova e única moeda europeia. [Veja sua reação à jocosa proposta de ela ser a presidente do BCE].  Infelizmente, e especialmente desde a demissão de seu conselheiro econômico, o monetarista Sir Alan Walters, Madame Thatcher não conseguiu apresentar um argumento convincente contra esta vindoura nova ordem mundial, limitando-se apenas a fazer sua oposição utilizando termos esquisitos, raivosos e fanfarrões, como 'a glória nacional britânica contra a subordinação à "Europa"'.  Ela, portanto, passou a ser vista apenas como uma tacanha obstrucionista antieuropeia contrária a uma aparentemente iluminada e beneficente "Europa unida".
O problema presente em praticamente todas as análises da Comunidade Europeia é a típica fusão que fazem entre estado e sociedade.  Socialmente e economicamente, à medida que, em teoria, a nova Europa será uma vasta área de livre comércio e livre investimento de capitais, esta nova ordem será benéfica: irá expandir a divisão do trabalho, a produtividade, e o padrão de vida de todas as nações participantes.  Mas, infelizmente, a essência da nova Europa não será sua área de livre comércio, mas sim uma monstruosa nova burocracia estatal, sediada em Estrasburgo e Bruxelas, a qual irá controlar, regular e "igualar" as alíquotas de impostos em todos os países, coercivamente impondo a elevação dos impostos naqueles países que possuem uma carga tributária mais baixa.
E o pior aspecto desta Europa unificada é exatamente aquela área na qual Madame Thatcher centrou sua artilharia: a moeda e o sistema bancário.  Embora os monetaristas estejam completamente errados em preferir uma Europa (ou um mundo) guiada por diferentes tipos de dinheiro de papel fragmentados em nível nacional em vez de um padrão-ouro internacional, eles estão corretos em alertar sobre os perigos deste novo esquema.  Pois o problema é que a nova moeda, obviamente, não será o ouro — que é uma moeda produzida no mercado e pelo mercado —, mas sim uma única moeda de papel, fiduciária e de curso forçado.  De modo que o resultado deste esquema neokeynesiano será um dinheiro fiduciário inerentemente inflacionista, cuja emissão será controlada monopolisticamente pelo Banco Central Europeu — isto é, por um novo governo regional.
Este arranjo, por sua vez, irá facilitar ainda mais para que os Bancos Centrais dos EUA, da Grã-Bretanha e do Japão colaborem e atuem coordenadamente com o novo Banco Central Europeu, e assim conduzam o mundo rapidamente para aquele velho sonho de Keynes: um Banco Central Mundial emitindo uma única moeda de papel, de aceitação obrigatória para todos os países.  E assim estaremos definitivamente sem ter para onde fugir, com o dinheiro e a macroeconomia mundial estando totalmente à mercê de uma inflação em escala mundial, controlada centralmente por iluminados e autoproclamados mestres keynesianos.
É de se lamentar que Margaret Thatcher não tenha sabido articular sua oposição à nova ordem monetária europeia em tais termos.  É de se lamentar também que sua retórica pró-livre mercado não tenha sido efetivamente colocada em prática.  No final, a história julgará corretamente seu governo e seus feitos.
Murray N. Rothbard (1926-1995) foi um decano da Escola Austríaca e o fundador do moderno libertarianismo. Também foi o vice-presidente acadêmico do Ludwig von Mises Institute e do Center for Libertarian Studies.

sábado, 13 de abril de 2013

Direita e esquerda no Brasil - Carlos Alberto Sardenberg

O grande problema deste artigo é que ele acredita que FHC representou a direita no Brasil e e que ele implementou um programa liberal, quando a única coisa que fez FHC foi estabilizar a economia, o que já é uma enorme missão, e aplicar um programa social-democrata, ou seja, distributivista, ainda que moderado. FHC esteve muito longe de um programa realmente liberal.

A falta que nos faz uma boa direita
Carlos Alberto Sardenberg
O Globo, 11/04/2013

Vou falar francamente: uma Thatcher, hoje, seria perfeita para o Brasil. Mas uma Thatcher em grande estilo: líder de partido, ganhando eleições com uma agenda liberal. Seria bom até para modernizar a cultura esquerdista amplamente dominante no país. Isso aconteceu na Inglaterra e, nos 80 e 90, em boa parte do mundo, inclusive no Brasil. Precisava acontecer de novo.

A longa administração conservadora de Margaret Thatcher fez o trabalho, digamos, sujo de demitir funcionários excedentes, cortar gastos públicos, controlar o poder dos sindicatos de empresas estatais (e depois privatizá-las), além de desregulamentar a economia, reformar a legislação trabalhista e reduzir a pesada burocracia do Estado.

Depois de um início custoso, com greves e desemprego em alta, funcionou. Com investimentos privados, o país voltou a crescer e gerar emprego e renda. Não por acaso, Thatcher ganhou três eleições seguidas.

Quando veio o desgaste até normal da administração conservadora, o serviço principal estava feito, a quebra do imenso, custoso e já ineficiente Estado do Bem-Estar. Aí veio Tony Blair com a suave conversa do “Novo trabalhismo”: retomada dos investimentos públicos em educação, saúde e segurança, mas em uma economia livre, aberta e competitiva.

Os eleitores foram trocando, conforme a ocasião. Elegeram o Partido Trabalhista no pós-guerra, que instalou o Estado do Bem-Estar, depois fartaram-se dos excessos desse modelo, que estatizava tudo de grande que via pela frente, como disse Churchill, e finalmente entregaram o poder para Thatcher desmontar tudo. E aí devolveram o governo à esquerda, mas uma esquerda reeducada.

Já entre nós, quando o eleitorado comprou a ideia de que era preciso desmontar o Estado excessivo e abrir a economia, porque só produzíamos carroças protegidas, acabou elegendo Fernando Collor, cuja agenda correta para o momento não resistiu ao caixa de PC. E terminou que a agenda liberal caiu no colo de Fernando Henrique.

FHC não liderou um movimento dentro de seu partido e junto aos aliados para construir uma agenda comum de reformas. Para dizer francamente, pelo menos no começo, foi tudo no vai da valsa. As trapalhadas seguidas de Itamar Franco acabaram jogando o Ministério da Fazenda no colo de FHC. Aí valeram a sabedoria e aguda percepção política do professor, que definiu logo o inimigo imediato ─ a superinflação – e escalou a equipe certa para atacá-lo.

Então, foi na sequência: para consolidar o combate à inflação, era preciso controlar o déficit das contas públicas, para o que eram necessárias as reformas, incluídas as privatizações. A agenda liberal se impôs no calor dos acontecimentos.

Daí as dificuldades de implementação. Não foi como na Inglaterra, com propostas bem definidas.. Aqui, FHC, vindo da esquerda, eleito com base nas novíssimas notas de um real, precisou construir essa agenda momento a momento. Excetuada a equipe econômica, quase ninguém entre seus colaboradores e seguidores estava preparado para a missão. Tratava-se de uma elite intelectual criada nas ideias socialistas e social-democratas, que viu ruir o Muro de Berlim e alcançou o poder em um mundo em que só existia capitalismo ─ e numa fase de liberalismo à americana ou “thatcherista”.

Além dessa turma, havia os velhos políticos, todos acostumados a viver em torno do Estado, fonte de nomeações, privilégios e bons negócios. Visto assim, a gente até se espanta de ver quanto o governo FHC avançou na agenda modernizadora.

Mas, é claro, não terminou o serviço. E parte desse serviço, eis outra peça do destino, ficou para o governo Lula. É a origem de nossos problemas atuais, o eleitorado se cansou de uma agenda liberal antes que ela tivesse sido completada. E elegeu um governo propondo mudar tudo para a esquerda, mas topando com os entraves causados justamente pela não conclusão da agenda liberal.

Daí o Lula do primeiro mandato. Manteve as bases macroeconômicas de FHC e ainda avançou em reformas micro claramente liberais e pró-negócios, sem reestatizações. De certo modo, os dois governos acabaram bem parecidos: construir alianças a meio do caminho para implementar reformas difíceis.

Depois, mais seguro, Lula parou com as reformas e começou a voltar para a agenda da velha esquerda estatizante, movimento agora claramente tomado pela presidente Dilma ─ e com os velhos políticos Estado-dependentes.

Tudo considerado, eis o que sempre nos faltou: uma boa direita, moderna, capaz de ganhar uma eleição com uma agenda liberal e implementá-la rigorosamente. E depois abrir espaço para uma boa esquerda, também moderna, que se eleja para fazer o seu serviço, que é gastar com educação, saúde e segurança. Mas gastar com eficiência e sem atrapalhar a economia privada.

sexta-feira, 12 de abril de 2013

Margareth Thatcher e o euro - Jorge Costa

In memoriam: Thatcher, o euro e a devastação  
Jorge Costa, Jornalista
Negócios on-line, 12 Abril 2013

Margaret Thatcher sobe ao poder em 1979 e anuncia: "Não sou um político de consensos, sou de convicções". Depois foram 12 anos de demonstração do que isso queria dizer, com uma intensidade e consistência talvez sem paralelo. Uma estadista cuja principal marca era o rigor doutrinário? Não só. O que fez dela o ser memorável que agora lembramos foi também o seu extremo pragmatismo, isto é, uma agudíssima capacidade de compreender a realidade e agir em consequência. Os termos parecem antitéticos. Salvo se estivermos perante Margaret Thatcher: uma estadista excepcional.
Ser pragmático quer dizer que também se pode perder em toda alinha. Basta que o entendimento da realidade, com a noção dos perigos que ela comporta, esteja em choque com o dos pares e, além disso, se conserve pela verdade e as fronteiras do inegociável mais cuidado do que amor pelo poder. Thatcher foi a primeira vítima do euro. Por ele não perdeu a alma nem o juízo. Mas perdeu o controlo do partido conservador e acabou por sair.

Thatcher opunha-se radicalmente à ideia de União Económica e Monetária (UEM). Em entrevista a Robert Lenzner, da Forbes, já retirada, em 1992, explica como Maastricht, ao dar o salto de uma comunidade de mercado para uma união política ameaçaria de morte a democracia inglesa: "Sob Delors, 80% das decisões económicas da Grã-Bretanha serão tomadas em Bruxelas". Nem pensar. A Inglaterra nunca entrou, mas a resistência de Thatcher ao consenso que se começava a formar no país a favor da entrada ditou o fim da sua carreira política.

O que hoje mais nos interessa foi o que aconteceu pouco antes desse fim. No Verão de 1990, recorda Thatcher no primeiro volume das suas autobiografias, "Downing Street Years" (1993), ela ainda acalenta a esperança de convencer os restantes 11 países da CEE do desastre que a todos espera do lado de lá do salto para União Monetária. Explica a John Major, seu ministro das Finanças, acomodatício e favorável a um tratado que contemplasse a possibilidade de cada um decidir entrar ou ficar de fora, que não. "Rejeitei isso. Disse-lhe que seria psicologicamente errado pormo-nos numa atitude mental em que aceitássemos a inevitabilidade do passo em direcção à UEM, em vez de atacarmos o conceito na íntegra". Como? "Tínhamos argumentos que poderiam persuadir tanto alemães – que ficariam preocupados com o enfraquecimento das políticas anti-inflacionárias – como os países mais pobres – a quem se deve dizer que não serão salvos das consequências da moeda única, que devastará, em consequência, as suas economias ineficientes" (realce meu).

É na já referida entrevista, de 92, fresca ainda a tinta do tratado, que Thatcher elabora melhor o que, aparentemente, só para ela era uma evidência: "Todas as taxas de câmbio fixas acabaram por ruir. Estamos em diferentes níveis de desenvolvimento económico. Alguns países, pura e simplesmente não conseguirão estar à altura das exigências de uma moeda única. Esta acabaria por significar subsídios suplementares maciços da nossa parte ou maciços movimentos migratórios deles para os nossos países". Thatcher sabia o que era, e levava a sério, a teoria das zonas monetárias óptimas.

Portugal, duas décadas depois. O diferencial de inflação que a economia portuguesa acumulou, entre 1995 e 2012, em relação à Alemanha traduziu-se numa apreciação de 31,3%. A perda de competitividade expressa nessa tendência díspar dos preços relativos, sem mecanismos de reequilíbrio cambial, devastou literalmente a competitividade externa do país. Endividado para além de todos os limites razoáveis e condenado a uma desvalorização interna alternativa, afunda-se numa depressão, cujas consequências estão ainda longe de estar totalmente materializadas. As maciças transferências do Norte revestem a forma – até ver – de créditos do Bundesbank e pacotes de resgate. A emigração acelera.

Thatcher não convenceu e saiu vencida. Agradeço-lhe quase tudo. Inclusive a coragem de ter lutado até perder. Tenho a certeza de que ainda não percebemos a dimensão da derrota, dela e nossa. A ela desejo-lhe paz. E a nós que não nos percamos no cansaço da aprendizagem pela devastação.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Onde Margareth Thatcher errou, economicamente - Murray Rothbard

Mrs. Thatcher's Poll Tax
by Murray N. Rothbard
The Mises Daily, April 10, 2013
[This article is featured in chapter 62 of Making Economic Sense by Murray Rothbard and originally appeared in the June, 1990 edition of The Free Market]

Riots in the streets; protest against a hated government; cops arresting protesters. A familiar story these days. But suddenly we find that the protests are directed, not against a hated Communist tyranny in Eastern Europe, but against Mrs. Thatcher's regime in Britain, a supposed paragon of liberty and the free market. What's going on here? Are anti-government demonstrators heroic freedom-fighters in Eastern Europe, but only crazed anarchists and alienated punks in the West?

The anti-government riots in London at the end of March were, it must be noted, anti-tax riots, and surely a movement in opposition to taxation can't be all bad. But wasn't the protest movement at bottom an envy-ridden call for soaking the rich, and hostility to the new Thatcher tax a protest against its abstention from egalitarian leveling?

Not really. There is no question that the new Thatcher "community charge" was a bold and fascinating experiment. Local government councils, in many cases havens of the left-wing Labour Party, have been engaging in runaway spending in recent years. As in the case of American local governments, basic local revenue in great Britain has been derived from the property tax ("rates" in Britain) which are levied proportionately on the value of property.

Whereas in the United States, conservative economists tend to hail proportionate taxation (especially on incomes) as ideal and "neutral" to the market, the Thatcherites have apparently understood the fallacy of this position. On the market, people do not pay for goods and services in proportion to their incomes. David Rockefeller does not have to pay $1000 for a loaf of bread for which the rest of us pay $1.50. On the contrary, on the market there is a strong tendency for a good to be priced the same throughout the market; one good, one price. It would be far more neutral to the market, indeed, for everyone to pay, not the same tax in proportion to his income, but the same tax as everyone else, period. Everyone's tax should therefore be equal. Furthermore, since democracy is based on the concept of one man or woman, one vote, it would seem no more than fitting to have a principle of one man, one tax. Equal voting, equal taxation.

The concept of an equal tax per head is called the "poll tax," and Mrs. Thatcher decided to bring the local councils to heel by legislating the abolition of the local rates, and their replacement by an equal poll tax per adult, calling it by the euphemism, "community charge." At least on the local level, then, soaking the rich has been replaced by an equal tax.

But there are several deep flaws in the new tax. In the first place, it is still not neutral to the market, since--a crucial difference--market prices are paid voluntarily by the consumer purchasing the good or service, whereas the tax (or "charge") is levied coercively on each person, even if the value of the "service" of government to that person is far less than the charge, or is even negative.

Not only that: but a poll tax is a charge levied on a person's very existence, and the person must often be hunted down at great expense to be forced to pay the tax. Charging a man for his very existence seems to imply that the government owns all of its subjects, body and soul.

The second deep flaw is bound up with the problem of coercion. It is certainly heroic of Mrs. Thatcher to want to scrap the property tax in behalf of an equal tax. But she seems to have missed the major point of the equal tax, one that gives it its unique charm. For the truly great thing about an equal tax is that in order to make it payable, it has to be drastically reduced from the levels before the equality is imposed.

Assume, for example, that our present federal tax was suddenly shifted to become an equal tax for each person. This would mean that the average person, and particularly the low-income person, would suddenly find himself paying enormously more per year in taxes--about $5,000. So that the great charm of equal taxation is that it would necessarily force the government to lower drastically its levels of taxing and spending. Thus, if the U.S. government instituted, say, a universal and equal tax of $10 per year, confining it to the magnificent sum of $2 billion annually, we would all live quite well with the new tax, and no egalitarian would bother about protesting its failure to soak the rich.

But instead of drastically lowering the amount of local taxation, Mrs. Thatcher imposed no such limits, and left the total expenditure and tax levels, as before, to the local councils. These local councils, Conservative as well as Labour, proceeded to raise their tax levels substantially, so that the average British citizen is being forced to pay approximately one-third more in local taxes. No wonder there are riots in the streets! The only puzzle is that the riots aren't more severe.

In short, the great thing about equal taxation is using it as a club to force an enormous lowering of taxes. To increase tax levels after they become equal is absurd: an open invitation for tax evasion and revolution. In Scotland, where the equal tax had already gone into effect, there are no penalties for non-payment and an estimated one-third of citizens have refused to pay. In England, where payment is enforced, the situation is rougher. In either case, it is no wonder that popularity of the Thatcher regime has fallen to an all-time low. The Thatcher people are now talking about placing caps on local tax rates, but capping is scarcely enough: drastic reductions are a political and economic necessity, if the poll tax is to be retained.

Unfortunately, the local tax case is characteristic of the Thatcher regime. Thatcherism is all too similar to Reaganism: free-market rhetoric masking statist content. While Thatcher has engaged in some privatization, the percentage of government spending and taxation to GNP has increased over the course of her regime, and monetary inflation has now led to price inflation. Basic discontent, then, has risen, and the increase in local tax levels has come as the vital last straw. It seems to me that a minimum criterion for a regime receiving the accolade of "pro-free-market" would require it to cut total spending, cut overall tax rates, and revenues, and put a stop to its own inflationary creation of money. Even by this surely modest yardstick, no British or American administration in decades has come close to qualifying.

Murray N. Rothbard (1926–1995) was dean of the Austrian School. He was an economist, economic historian, and libertarian political philosopher. See Murray N. Rothbard's article archives.
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