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quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

Democracia mantém a economia nos trilhos desde o Real, diz Persio Arida - entrevista (Valor)

Democracia mantém a economia nos trilhos desde o Real, diz Arida

Estabilidade perdura mesmo com políticas pouco responsáveis, afirma economista

Lu Aiko Otta/ Valor Econômico/27 de fevereiro de 2004

Com um ou outro momento preocupante, a estabilização de preços possibilitada pelo Plano Real perdura há 30 anos. Isso ocorre a despeito de políticas pouco responsáveis ocasionalmente adotadas no país, sobretudo nos anos anteriores às eleições.

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A força que mantém a economia nos trilhos é a democracia, na visão de Pérsio Arida - que, junto com André Lara Resende, foi autor do paper que deu origem ao Real, o chamado "Plano Larida". A estabilidade de preços tornou-se um bem da sociedade brasileira e os políticos que ousam ameaçá-la são punidos nas urnas, explica ele nesta entrevista ao Valor.

Arida também faz uma comparação entre o Real e os seis planos de estabilização fracassados.

Avaliando os dias de hoje, ele considera que o tripé macroeconômico implantado com o Real (câmbio flutuante, taxa de juros voltada a combater a inflação e superávit primário) está "um pouco manco", por causa dos recentes resultados negativos nas contas federais. No entanto, confia que o problema será resolvido. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Valor: Qual a importância da Unidade Real de Valor (URV)?

Pérsio Arida: A URV teve extraordinária importância porque foi o que possibilitou que o Plano Real fizesse uma transição relativamente suave de uma inflação muito alta, que beirava 30% ao mês, para uma inflação muito baixa. Mas o papel dela se esgotou nessa transição.

Valor: E qual a importância do Plano Real?

Arida: Eu acho que se desdobra em dois aspectos. Primeiro, foi um impulso inicial para uma série de reformas modernizantes. Ao longo dos oito anos seguintes, que foi o período do presidente Fernando Henrique Cardoso, acabaram os monopólios na exploração do petróleo e telecomunicações, foi aprovada Lei de Responsabilidade Fiscal, o novo regramento para concessões, a criação de agências reguladoras, as grandes privatizações. Tudo isso aconteceu naquele período. As bases de funcionamento do Brasil moderno, do ponto de vista econômico, foram plantadas durante os oito anos que se seguiram ao Plano Real. E sempre com a justificativa, correta, de que o Real, se não fosse acompanhado de reformas modernizantes, poderia ser posto a risco.

Valor: E o segundo significado?

Arida: É reforçar a autoestima do país. Mostra que quando há uma liderança política que entenda da natureza dos problemas e um bom time técnico, o Brasil faz coisas que não se imaginava serem possíveis. O Real é um plano que nunca havia sido feito antes, inteiramente original. E a liderança do Fernando Henrique também foi única. Era um político - portanto, capaz de conversar bem com o Senado, com a Câmara. Era um bom comunicador em termos de opinião pública e também era um intelectual, o que possibilitou que ele entendesse a dinâmica cio Plano Real, que não é simples, é revolucionária.

Valor: Qual a importância da Unidade Real de Valor (URV)?

Pérsio Arida: A URV teve extraordinária importância porque foi o que possibilitou que o Plano Real fizesse uma transição relativamente suave de uma inflação muito alta, que beirava 30% ao mês, para uma inflação muito baixa. Mas o papel dela se esgotou nessa transição.

Valor: E qual a importância do Plano Real?

Arida: Eu acho que se desdobra em dois aspectos. Primeiro, foi um impulso inicial para uma série de reformas modernizantes. Ao longo dos oito anos seguintes, que foi o período do presidente Fernando Henrique Cardoso, acabaram os monopólios na exploração do petróleo e telecomunicações, foi aprovada Lei de Responsabilidade Fiscal, o novo regramento para concessões, a criação de agências reguladoras, as grandes privatizações. Tudo isso aconteceu naquele período. As bases de funcionamento do Brasil moderno, do ponto de vista econômico, foram plantadas durante os oito anos que se seguiram ao Plano Real. E sempre com a justificativa, correta, de que o Real, se não fosse acompanhado de reformas modernizantes, poderia ser posto a risco.

Valor: E o segundo significado?

Arida: É reforçar a autoestima do país. Mostra que quando há uma liderança política que entenda da natureza dos problemas e um bom time técnico, o Brasil faz coisas que não se imaginava serem possíveis. O Real é um plano que nunca havia sido feito antes, inteiramente original. E a liderança do Fernando Henrique também foi única. Era um político - portanto, capaz de conversar bem com o Senado, com a Câmara. Era um bom comunicador em termos de opinião pública e também era um intelectual, o que possibilitou que ele entendesse a dinâmica cio Plano Real, que não é simples, é revolucionária.

Valor: O Real deu certo depois de seis tentativas fracassadas de estabilização da economia. Por quê?

Arida: Eu acho que tem uma diferença importante entre o primeiro plano [Cruzado, 1986], os planos seguintes e o último plano, o Real. O Plano Cruzado, que era um congelamento temporário de preços e salários, foi anunciado de surpresa e foi desvirtuado politicamente, porque deveria ter sido acompanhado por uma redução do déficit público, uma política monetária restritiva, mas na verdade nada disso pôde ser feito, porque tinha eleições à frente, em outubro. Foi um plano que teve uma popularidade instantânea, até porque vinha do sistema democrático.

Valor: Como assim?

Arida: A inflação foi de 12% a 200% ao ano sem que não tivesse nenhum plano de estabilização, porque estávamos na ditadura. Num governo democrático, quem consegue estabilizar preços será bem-sucedido nas umas. O Cruzado foi extraordinariamente popular, mas acabou virando um plano eleitoreiro, que falhou como plano, mas ficou como possibilidade no imaginário coletivo. Se olharmos os vários planos subsequentes até o Real, foram sempre motivados pela ideia de fazer um Cruzado que desse certo. Cruzado tinha gatilho salarial, vamos tirar o gatilho salarial. O Cruzado tinha liquidez excessiva, vamos tirar a liquidez excessiva. O Cruzado tinha taxa de juros baixas, vamos fazer plano de taxas juro muito altas. Juros altos foram o foco do Plano Verão, tirar a liquidez excessiva, o foco do plano Collor. Cada plano ia sendo feito buscando corrigir o que deu errado no Cruzado. Acontece que a partir do Cruzado houve uma dinâmica de preços muito diferente da que prevalecia antes.

Valor: O que aconteceu?

Arida: Antes, a dinâmica de preço era assim: se não acontecesse nada, a inflação deste mês era mais ou menos a inflação do mês anterior. Depois do Plano Cruzado, passou-se a uma dinâmica de expectativas. Todo mundo sabia que o Cruzado era popular. Os empresários também sabiam e achavam que era questão de tempo até haver outro plano semelhante. Então, começavam a subir os seus preços para que, quando esses fossem congelados, tivessem um lucro acumulado que lhes permitisse passar bem pelo congelamento. Fomos assim de congelamento em congelamento, quase como profecias que se autorrealizavam. Depois da última tentativa de ajuste dessa forma, que foi o Plano Collor 2, o país se cansou. Ficou claro que não iria haver um outro congelamento de preços, e nós, no Plano Real, deixamos isso muito claro o tempo todo. Então, essa dinâmica expectacional desapareceu, o que criou as condições para fazer o Plano Real.

Valor: O sucesso, depois de tantos fracassos. 

Arida: Sem dúvida. Mas não podemos ter uma visão ingênua sobre o sucesso. O sucesso de um plano de estabilização não pode ser julgado por três ou seis meses, mas por um período prolongado. O Real passou por vários momentos de risco. Por exemplo, a flutuação cambial em 1999, o déficit público crescente na época lulista. Mas passou bem por esses momentos.

Valor: Como resistiu?

Arida: Eu acho que o segredo aqui, de novo, é a dinâmica democrática. Uma estabilidade de preços é um valor do povo brasileiro. O governante sabe que, se der inflação, ele estará politicamente morto. Então, os políticos, toda vez que a inflação ameaça subir, deixam de lado os planos, digamos, eleitoreiros ou populistas, e tratam de fazer o necessário para combater a inflação. Isso faz com que exista, devido às eleições, um sistema de pressão sobre a casta política. O Brasil entrou em uma outra fase com a independência do Banco Central, mas, se olharmos historicamente, o Banco Central, desde o Plano Real, foi, de fato, independente, exceto por um ou outro momento. É mais um aspecto que mostra que os governantes sabiam que, se interferissem no Banco Central e a taxa de inflação subisse, seria muito oneroso politicamente.

Valor: É possível dizer que o Plano Real está consolidado?

Arida: Eu diria que, com o sistema democrático em funcionamento, existe o incentivo para os políticos manterem a inflação baixa. Então, eu hoje não vejo uma ameaça ao Real, porque o Banco Central é independente, e os políticos, se por algum motivo houver erros ou desvios de política econômica, vão tratar de fazer as correções necessárias até mesmo por autossobrevivência. É claro que sempre há o risco dos ciclos eleitorais, do governante fazer políticas irresponsáveis no ano da eleição porque a inflação demora um pouco para subir e, quando estiver mais alta, ele já estará eleito. Esse risco, como eu falei, tende a se autocorrigir: se o governo gastar demais no seu último ano para se reeleger, vai ter que gastar de menos no ano seguinte, porque se não a inflação o prejudicará, politicamente falando.

Valor: O sr. mencionou um conjunto de reformas que foram feitas no governo Fernando Henrique. Como avalia o quadro hoje?

Arida: O governo Fernando Henrique, ainda que não na partida, conseguiu implementar o chamado tripé macroeconômico, que é câmbio flutuante, taxa de juros voltada para combater a inflação e superávit fiscal. Nos primeiros anos lulistas, o tripé foi mantido. Mas depois, gradativamente, o superávit fiscal foi minguando. Hoje, temos déficit. O tripé está um pouco manco, porque tem dois pés no lugar, e o terceiro, mais ou menos. Mas eu creio que isso vai ser corrigido.

 

segunda-feira, 13 de julho de 2020

‘Brasil virou pária do investimento internacional’ - Entrevista Persio Arida

‘Brasil virou pária do investimento internacional’
Para economista, governo Bolsonaro tem feito uma “política ambiental horrenda, na contramão do mundo”
Entrevista com Persio Arida, economista
Adriana Fernandes, O Estado de S. Paulo
12 de julho de 2020 | 05h00

Para o economista  Persio Arida, presidente tem feito uma “política ambiental horrenda”  
Foto: FOTO: HÉLVIO ROMERO/ESTADAO

política ambiental do governo Bolsonaro transformou o Brasil em pária do investimento internacional e poderá trazer sérios problemas econômicos para o País, avalia o ex-presidente do Banco Central (BC), Persio Arida. Um dos signatários da carta de ex-ministros da Fazenda e do BC em defesa de uma retomada econômica “verde”, que será lançada no dia 14, Arida observa que o presidente tem feito uma “política ambiental horrenda” e na contramão do mundo.
Um dos formuladores do Plano Real, Arida avalia, em entrevista ao Estadão, a resposta do governo à pandemia da covid-19, fala sobre as prioridades para a retomada econômica e responde à crítica recente do ministro da Economia, Paulo Guedes, ao programa de controle da inflação que completa esse ano 26 anos: “Ressentimento e inveja são assuntos para divã de psicanalista.”
Veja abaixo os principais trechos da entrevista:
O sr. assinou uma carta de ex-presidentes dos BC e de ministros da Fazenda com alertas para o risco da política ambiental do governo Bolsonaro. O problema se agigantou para a economia?
Meu primeiro artigo sobre o tema, chamado Pensando a Destruição da Natureza, tem quase 40 anos. Ignorar os efeitos do aquecimento global é praticar roleta-russa seguidas vezes porque nós somos parte da natureza. Diferentemente da covid-19, o processo de degradação do meio ambiente é uma catástrofe em câmera lenta. O que mudou subitamente de um ano e meio para cá foi a postura governamental. As queimadas e o desmatamento da Amazônia, com a desconstrução dos controles ambientais, mostram um governo na contramão do mundo e da história. O governo Bolsonaro fez do Brasil um pária do investimento internacional.
O governo insiste na tese que é pressão geopolítica por interesses comerciais do agronegócio.
É uma tese errada. O agronegócio brasileiro não precisa desmatar para ser competitivo. Entidades internacionais e países mais avançados nos pressionam porque a preservação do meio ambiente é um problema global. Eles estão certos, mas nós devemos cobrar deles o respeito aos objetivos de emissão de gases poluentes.

Quais os riscos do isolamento do Brasil por conta da política ambiental de Bolsonaro?
O investimento corporativo no mundo todo é crescentemente orientado pela preocupação com o meio ambiente e as desigualdades sociais. É uma política horrenda com o meio ambiente e extremamente prejudicial à economia.
O governo Bolsonaro vai reagir à pressão com mudanças efetivas na política atual?
Eu nada espero desse governo. Que dizer de um governo que desrespeita a ciência, se mostra incapaz de coordenar uma política nacional de saúde, incapaz de escolher um ministro da Educação que mereça esse nome ou elogie um secretário da Cultura nazista.
No início da pandemia, o senhor escreveu, em um artigo, que nenhuma sociedade tolera seguir com a vida econômica como se nada estivesse acontecendo, enquanto pessoas morrem na fila de espera do hospital. Passados quatro meses, como avalia o resultado do caminho que o governo tomou no combate à pandemia, com a justificativa de preservar a economia?
A tese de que é necessário escolher entre economia e saúde é mais uma tese errada. Quem controla a epidemia mais cedo e com mais determinação se sai melhor do ponto de vista da economia também.
Como avalia a resposta do ministro Paulo Guedes no enfrentamento dos efeitos da pandemia sobre a economia?
Evoluímos muito desde que o ministro disse que, com R$ 5 bilhões, o problema da saúde seria resolvido. Mas a implementação foi falha. Boa parte do dinheiro da saúde não saiu do papel. Os programas de apoio às empresas não funcionaram ou ficaram aquém do necessário. No caso das pessoas físicas, o auxílio de R$ 600 foi mal focalizado. Numa reencarnação da Dilma, o governo deu o monopólio da distribuição do auxílio à Caixa. Obviamente, para se apropriar politicamente dos R$ 600, mas também para a Caixa conseguir ter um amplo cadastro digital de clientes e ficar um pouco mais competitiva. Inacreditável. Em contraste, o Banco Central foi muito rápido e eficaz em aumentar a liquidez na economia. E está tocando bem a agenda de reduzir o spread bancário e aumentar a competição no setor financeiro.
Cresceu a pressão para mudanças no teto de gastos. Ele deve mudar no pós-covid para ajudar na retomada?
teto de gastos deve ser mantido após a epidemia. O que não devemos fazer é aumentar impostos. A carga tributária já é muito alta e nossa história mostra que aumentos de impostos acabam abrindo espaço para um novo round de gastos. Da década de 90 para cá, a carga tributária foi de 23% para 33% do PIB e o déficit é maior agora do que era antes.

O que é prioridade na agenda para a retomada?
Uma coisa é a recuperação cíclica que sempre acontece, até porque não há recessão que dure para sempre, outra coisa é a mudança estrutural no patamar de crescimento. Para sair de forma sustentada do patamar de 1% a 2% ao ano, temos de abrir a economia, fazer uma reforma administrativa para dar eficiência à máquina pública, privatizar para valer, aprovar a reforma tributária e melhorar o aprendizado nas escolas públicas. Nada disso avançou no governo Bolsonaro. Com o fim do bônus demográfico, temos de aumentar a produtividade para crescer.
O que acha do “Renda Brasil” que o governo quer implementar para substituir o Bolsa Família?
Um dos poucos legados positivos da epidemia foi colocar o tema da renda mínima universal na agenda política. Há ótimas propostas já prontas. Infelizmente não há como gastar mais do que já gastamos, mas unificar e focalizar melhor vários dos programas sociais existentes é um passo importante para reduzir a pobreza. O risco é a apropriação política da renda mínima para fins eleitorais.
O ministro Paulo Guedes criticou o Plano Real ao afirmar que, se ele se fosse tão extraordinário, o PSDB não teria perdido quatro eleições. Como um dos formuladores do Plano, como recebeu essa declaração?
Ressentimento e inveja são assuntos para divã de psicanalista. O plano foi de um extraordinário sucesso. O presidente Fernando Henrique foi eleito duas vezes no primeiro turno. Na esteira do plano, foram aprovadas as bases de funcionamento do Brasil moderno: Lei de Responsabilidade Fiscal, tripé macroeconômico, montagem das agências regulatórias, as grandes privatizações, o alongamento da dívida do Tesouro etc. A lição que fica é que, quando há uma liderança política capaz de unir o País em torno de uma visão de futuro, capaz de criar uma base parlamentar sólida e montar uma boa equipe, é possível mudar o Brasil. 

terça-feira, 9 de abril de 2019

Livres, Conselho Academico: Persio Arida, Paulo Roberto de Almeida e outros

Livres se reinventa em 2019 após problemas com PSL de Bolsonaro

O Livres é um movimento liberal, suprapartidário que desenvolve lideranças, políticas públicas e projetos de impacto social para ampliar a liberdade individual no Brasil. A organização surge em 2016 dentro do PSL, a partir de um acordo com a direção do partido para promover uma renovação interna, mas rompe com a legenda ao ver o acordo ser quebrado, em janeiro de 2018, para abrigar a candidatura de Bolsonaro à presidência. “Esbarramos nos entraves do sistema e tivemos que nos reinventar”, diz Paulo Gontijo, presidente do Livres. 
O movimento inicia 2019 com força total. A “bancada da liberdade” formada no ano passado é composta por 15 mandatários – entre vereadores, deputados estaduais, federais, um senador e um prefeito -, e o conselho acadêmico é de peso. 
Elena Landau, Leandro Piquet, Persio Arida, Paes de Barros, Samuel Pessôa, Sandra Rios e Paulo Roberto de Almeida são membros. 
A ideia é promover engajamento cívico e desenvolvimento de lideranças, projetos de impacto social e propostas de políticas públicas para aumentar a liberdade individual no Brasil. Com mais de 2 mil associados entre todas as regiões do país, o Livres possui 15 mandatários associados (1 senador, 3 deputados federais, 5 deputados estaduais, 1 prefeito e 5 vereadores). Constituído formalmente como associação civil sem fins lucrativos desde 2018, o movimento nasceu em janeiro de 2016 como uma tendência partidária incubada no PSL com o propósito de renovar o partido, mas deixou a sigla por divergir da entrada do então pré-candidato à presidência Jair Bolsonaro.

Uma iniciativa do Livres este ano foi celebrar nas redes e na imprensa os 25 anos do Plano Real. Além de ter entrevistado personalidades como Persio Arida, Fernando Henrique Cardoso e Gustavo Franco, os coordenadores do movimento estão resgatando todos os jornais e revistas da época, para catalogarem as manchetes e fazerem uma linha do tempo. “Essa ação começou dia 28 de fevereiro e vai até dia 1º de julho, pois vamos relembrar toda tramitação da URV até o Real, como foi há 25 anos”, afirma Mano Ferreira, Diretor de Comunicação e responsável pelo projeto.

Atualmente o Livres conta com mais de 2 mil associados, divididos em 27 núcleos por todo país. Cada associado contribui mensalmente com pelo menos R$ 24,90, o que dá acesso a área exclusiva com fórum de discussão, onde as pessoas debatem ideias e trocam experiências de políticas públicas de diferentes regiões do país.

O grupo também prepara para os próximos meses o lançamento de uma plataforma de educação a distância, com cursos sobre liberalismo e políticas públicas. Para quem não pode pagar, há previsão de uma modalidade social de associação com apadrinhamento às cegas, onde outros associados pagam o valor equivalente à mensalidade, mas sem saber diretamente quem é o associado beneficiado, para evitar instrumentalização ou o chamado curral eleitoral.

O Conselho Acadêmico da organização agrega profissionais e especialistas de diversas áreas, que estão à disposição dos mandatários, líderes e associados, além de produzirem material acadêmico e servirem de consultores de políticas públicas para a organização.

Há dois anos o Livres era um grupo de jovens incubado dentro PSL, partido do atual presidente da república. Além da presidência de 12 diretórios estaduais, conselho de ética e da fundação, o grupo trabalhava pela renovação interna da legenda. Elaborou uma carta compromisso, iniciou o desenvolvimento de um programa partidário, fez código de ética e compliance, modelo de governança, estatuto, entre outras ações.

Entretanto, em janeiro de 2018 o PSL abriu mão de todos os compromissos firmados com o movimento para abrigar a candidatura do hoje presidente Jair Bolsonaro, que até então estava sem partido. “O projeto ‘Bolsonaro’ ia contra tudo o que defendíamos ali dentro, na economia e nos costumes”, conta Gontijo.
Foi então que no início do ano passado, o Livres teve que se reinventar para seguir com seu propósito de renovação política, liberdade, democracia e igualdade de oportunidades no país.
O Livres define-se como um movimento liberal por inteiro. “Defendemos pautas como responsabilidade fiscal, liberdade econômica e nos costumes, mas estaríamos sendo ingênuos se ignorássemos o complexo cenário social em que vivemos, sobretudo em um país como o Brasil”, diz Gontijo.
O grupo defende o diálogo contra os radicalismos de esquerda e direita, sempre pautado na ideia de que cada pessoa deve ser dona de sua própria vida e que o dever do Estado é ajudar os que mais precisam a conseguirem andar com as suas próprias pernas.

segunda-feira, 19 de março de 2018

Persio Arida: reformas imediatamente depois da posse (OESP)

Reformas e privatizações devem ser feitas já no 1º ano de governo, diz Arida

Pressa é necessária, segundo ele, para evitar o ‘inevitável desgaste político’ dos anos seguintes

O Estado de S. Paulo, 18/03/2018

Coordenador do programa econômico que Geraldo Alckmin (PSDB) vai encampar como candidato à presidência da República, Persio Arida afirma que o tucano, uma vez eleito, vai tocar nos primeiros meses de governo um pacote com privatizações e as reformas do Estado, da Previdência e tributária. Explica que a pressa é necessária para tirar vantagem do capital político conquistado nas urnas. 
Arida diz que não haverá aumento da carga tributária, mas é preciso tornar a cobrança de impostos mais simples e socialmente justa. “Não faz sentido, num país como o nosso, dar benefício fiscal aos mais ricos”, disse ao Estado, em sua primeira entrevista como integrante da equipe do tucano. 
Um dos formuladores do Real, Arida afirmou que não é preciso um plano específico para conter o déficit público, mas determinação do governo para aplicar as regras que já existem. Segundo ele, a principal preocupação deve ser garantir a retomada. “Sem crescimento não há solução”, disse Arida, ex-presidente do BNDES e do Banco Central e, até 2017, sócio do banco BTG. 
O economista afirma que a campanha de Geraldo Alckmin buscará o caminho do “centro democrático” tanto no campo econômico quando no dos costumes. Segundo ele, o tucano manterá a disposição de defender temas impopulares, como a reforma da Previdência, e não cederá a apelos populistas na área da segurança. “A aposta é que há um eleitorado maduro no Brasil”, disse. 
A conversa com Persio Arida abre a série de entrevistas que o Estado passa a publicar com economistas que terão influência no debate eleitoral sobre a agenda de prioridades no campo econômico e o modelo de desenvolvimento que o País deve perseguir.  
O sr. já foi banqueiro, ocupou cargos no governo, é reconhecido como economista. Por que entrar numa campanha agora?
A vida corporativa e a puramente acadêmica são capítulos encerrados. A preocupação pública está viva em mim. Quero contribuir. Gosto do Alckmin e nos aproximamos depois que saí do BTG, no ano passado. Decidi aceitar o desafio de coordenar o programa. Tenho enorme preocupação. Essas eleições serão críticas. 
Por quê?
Uma escolha errada pode comprometer a recuperação que estamos vivendo. Sem crescimento, não há solução. Numa crise como essa, é natural que parte da população queira um salvador, alguém que venha do nada e resolva tudo. O Brasil está diante de dois riscos: ter uma esquerda retrógrada estatizante, com a noção de que esse ou aquele setor são estratégicos, o que é uma ideia claramente atrasada, ou ter uma direita populista e obscurantista.  
O que é a direita populista que o sr. diz ver como risco ao País?
Populista ao dizer que se resolve o problema da segurança dando armas a todos. Sabe o que acontecerá? O aumento de crimes passionais, de mortes por briga no trânsito. Imagine disputas de torcidas de futebol com pessoas armadas. A realidade não cansa de comprovar que, para todo problema complexo, há uma solução simples – e errada. São Paulo reduziu homicídios impondo o estatuto do desarmamento. 
E por que o sr. classifica como uma direita obscurantista?
Nos costumes. Nosso caminho não é negar a natureza plural da sociedade brasileira. O Brasil tem de respeitar os direitos humanos. É assim que o País foi construído e tem de continuar sendo. O desafio é escapar dos extremos e ter um centro democrático. 
Alckmin não chega a 10% nas pesquisas, já foi apelidado de picolé de chuchu. Ele possui as características para angariar apoio a esse projeto de centro?
Que atributos queremos num presidente? Tem de ser alguém sereno, com capacidade de negociação política. Quem assumir vai lidar com um Congresso tão fragmentado quanto o de hoje. Tem de ter experiência administrativa. Aprender no exercício da presidência é custoso demais para o País. Não tenho dúvida de que Alckmin será o melhor presidente para o Brasil. Sobre a história do picolé de chuchu, temos de lembrar que ele ganhou no primeiro turno na última eleição para governador. As pessoas votaram nele. E votarão agora. 
O sr. já começou a elaborar o programa? Já tem equipe?
Ainda não há equipe. Nesta fase, meu papel é filtrar boas ideias e, para isso, estou conversando com várias pessoas, mas não vou citar nomes. Teremos um documento básico, com as melhores ideias e diretrizes. Depois entraremos em outra fase, com advogados e especialistas, para preparar normas, decretos, projetos de lei e de emenda constitucional. Esses documentos têm de estar prontos antes de Alckmin tomar posse.  
Tem de haver pressa?
Haverá uma janela de oportunidade extraordinária no Brasil, que é a legitimidade de uma eleição presidencial. Isso dura seis meses, um ano. Depois, há o inevitável desgaste político. É importante ter tudo pronto antes da posse para não perder tempo. É possível aprovar as reformas da Previdência e tributária. As privatizações têm de começar no primeiro dia. Tem de aproveitar essa janela. A sociedade está madura.  
Qual deve ser o plano para domar o déficit público? 
No fiscal, não faltam regras. Teto de gastos, a regra de ouro, a lei de responsabilidade fiscal. Fiz a conta e há mais de dez restrições fiscais diferentes. E cá estamos com 75% de dívida sobre o PIB – sem contar os precatórios. O problema fiscal no Brasil é de administração. Há teto para salários. O que fizeram? Começaram a dar gratificações. A cultura brasileira do jeitinho, que nos leva a reinterpretar termos quando a regra fica restritiva, mostra claramente que, se o governante não tiver determinação, não adianta. 
Qual será a principal ideia do plano Alckmin para a economia?
São três pilares: produtividade, responsabilidade fiscal e igualdade de oportunidades. Em produtividade, incluo abertura comercial, simplificação, desburocratização e reforma tributária. Infelizmente, não estamos em condição de reduzir a carga tributária. Mas temos de aprender com o passado e não aumentar imposto.  
Mesmo com esse déficit?
Não pode aumentar. O Brasil tinha 20% de carga tributária sobre o PIB. Hoje tem 32% com déficit público maior. Quando se eleva a arrecadação, a dinâmica política te conduz, cedo ou tarde, para aumentar gasto. É preciso resistir à tentação de aumentar imposto. O que se pode fazer é tornar essa carga tributária compatível com ganho de produtividade e socialmente mais justa.  
Como fazer isso?
Suprimindo impostos de intermediação. IPI, ICMS, ISS, PIS/Cofins. Acaba com tudo isso, transforma num imposto sobre valor adicionado, reparte a receita. Você ganha em eficiência e transparência. Quando se puder ver que há no leite 20%, 25% de imposto, virá a revolta. E isso será positivo. O sistema político precisa de pressão. Nossa carga tributária é injusta porque ela recai sobre os pobres. 
Os ricos têm de pagar mais?
Não faz sentido algum, num país socialmente injusto como o nosso, dar benefícios fiscais para os segmentos mais ricos da população. Benesses como um instrumento com isenção tributária, como LCI e LCA, por exemplo. Tornar a alíquota socialmente mais justa é muito bom. A reforma tributária tem também o lado da justiça social.  
As desonerações acabariam num eventual governo Alckmin?
Estamos num nível de desoneração fiscal sem precedentes. Precisa voltar à normalidade. As isenções tributárias eram da ordem de 1,5% do PIB. Agora estamos em 4,5% do PIB. É dinheiro que poderia ir para saúde, educação, segurança e está sendo dado para o mundo corporativo. Vale a pena? É extraordinário que tenha acontecido isso sem qualquer avaliação. Gestão pública, tal como a gestão privada, se faz com metas, indicadores e meritocracia. O papel do Estado é dar segurança jurídica, garantir condições para florescer crédito, assegurar competição. A inteligência para assegurar o crescimento não está no Estado intervencionista, que dá isenção, subsídio e decide qual indústria será beneficiada. 
Os mais ricos devem contribuir para usar a rede pública?
O debate não é se os ricos devem ser cobrados. O problema dos ricos é pagar mais imposto. O que tem de se fazer é reformar o Estado.  
Reformar como?
É uma tarefa enorme e difícil, que envolve meritocracia do setor público, medir e ter objetivos em programas sociais e econômicos. O Brasil foi de um extremo, onde não havia estabilidade, o que gerava abusos e perseguições, para uma situação em que todo mundo tem estabilidade. Não pode. Estou convicto de que dá para sustentar essa trajetória e ter um crescimento elevado. Alguém tem de oferecer emprego e não será o Estado.  
Como o sr. vê a agenda da direita no campo econômico?
Não sei muito bem o que é a agenda da direita na economia. Sei a agenda do Paulo Guedes (economista que coordena o programa do deputado Jair Bolsonaro). Ele defende o sistema de capitalização na Previdência. Nada contra a ideia. Mas é inexequível. Hoje temos déficit. Se partir para a capitalização, os mais favorecidos param de contribuir para a Previdência e o buraco aumenta. Outro ponto: se você diz que vai privatizar tudo, vai brigar com todos os lados ao mesmo tempo e não vai privatizar nada. Você tem de elencar quais são as prioridades.  
Não dá para privatizar tudo ao mesmo tempo. Mas o que é possível fazer?
A direção é clara: o Estado tem de deixar de ser empresário. O que as pessoas querem hoje e o que Brasil precisa é de uma economia dinâmica. Para isso, não precisa de estatal. 
Privatização, reformar a Previdência e a estrutura do Estado são temas impopulares. Alckmin manterá essas posições? Não vai amarelar na campanha?
Não vai. Previdência: São Paulo fez. Quem entra no serviço público tem teto de aposentadoria de R$ 5 mil. Ele que contribua para previdência complementar. Privatização: ele está terminando agora a montagem da holding da Sabesp para privatização. Alckmin não fará concessões populistas. Defenderá o estatuto do desarmamento. A aposta é que há um eleitorado maduro no Brasil. Tenho convicção de que as posições serão mantidas. 

segunda-feira, 15 de julho de 2013

O Brasil em baixo crescimento estrutural: Persio Arida (Entrevista Estadao)

Em 2005 eu já comentava que o Brasil estava perfeitamente preparado para NÃO crescer, e aparentemente fui desmentido por vários anos de bonança chinesa. Agora que ela está acabando, os fatores que eu indicava neste artigo:

“Uma verdade inconveniente (ou sobre a impossibilidade de o Brasil crescer 5% ao ano)”, Brasília, 12 novembro 2006, 6 p. Disponível no site pessoal, link: www.pralmeida.org/05DocsPRA/1682VerdadeInconvTabs.pdf. Postado no blog Diplomatizzando (http://diplomatizzando.blogspot.com/2006/11/637-uma-verdade-inconveniente_11.html#links). Publicado em Via Política (Porto Alegre; 12.11; link: http://www.viapolitica.com.br/diplomatizando_view.php?id_diplomatizando=15) e, com pequenos ajustes de forma e o subtítulo “(ou: por que o Brasil não cresce 5% ao ano...)”, em Espaço Acadêmico (ano 6, nº 67, dezembro 2006; ISSN: 1519-6186; link: http://www.espacoacademico.com.br/067/67pra.htm). 

se revelam plenamente válidos. Difícil ser profeta fora do prazo.
Em todo caso, leiam a entrevista do economista Persio Arida ao Estadão deste domingo, 14/07/2013.
Paulo Roberto de Almeida

Pibinho 2013: Para economista Persio Arida, crescimento do PIB ficará em torno de 1,8%

Minúsculo: PIB deve fechar abaixo de 2% e envergonhar o Governo

'O BRASIL PRECISA DE MENOS INTERVENCIONISMO'
Economista defende mudança radical na condução da política econômica 

O economista Persio Arida, um dos mais respeitados do País, defende uma guinada radical na condução da economia e faz uma proposta para arrepiar os desenvolvimentistas: "Uma política mais decididamente liberal e menos intervencionista, mais pró-mercado". Diz que um país como Brasil, que cobra impostos como se fosse a Inglaterra, mas não investe quase nada como contrapartida, "está fazendo algo de muito errado". E mais: acha que o País perdeu seu potencial de crescimento.

A receita de Arida prega que o governo faça tudo ao contrário do que fez até agora: corte seus gastos, acabe com os subsídios a empresas privadas, segure os bancos públicos na concessão de crédito, procure acordos comerciais com os Estados Unidos, Europa e Ásia e esqueça o Mercosul.

Sócio do banco BTG Pactual, um dos pais do Plano Real (que estabilizou a economia em 1994) e estrela do governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, Arida fez oposição ao regime militar e foi preso nos anos 70. Aos 61 anos, diz ter ficado entusiasmado com as manifestações de junho, que acompanhou pelo noticiário e ao vivo da janela de seu escritório na Avenida Brigadeiro Faria Lima, em São Paulo, palco de uma das passeatas. "Confesso que, dado o meu passado, fiquei com muita vontade de descer. Mas acabei achando que passei da idade para isso."

A seguir, os principais trechos da entrevista:


O dólar disparou, a economia está parando e a inflação continua alta. A economia desandou?

O Brasil enfrenta uma conjuntura internacional adversa, provocada pela desaceleração da China e pela normalização da taxa de juros dos Estados Unidos. O freio de arrumação chinês tem consequências na demanda por commodities, portanto, afeta os países emergentes. A economia americana, por sua vez, está em franca recuperação e a taxa de juros de longo prazo já está subindo. É natural que os capitais refluam para os Estados Unidos. Os efeitos desses movimentos no Brasil foram potencializados por uma economia que já vinha fraquejando há algum tempo. É lamentável constatar isso, mas nossa realidade hoje é de baixo crescimento estrutural. Os sinais são claros.


Quais são esses sinais?

O crescimento da massa salarial perdeu o vigor, a geração de novos empregos é cadente, o crédito em bancos privados como proporção do PIB (Produto Interno Bruto) já está constante há um ano. A expansão de crédito é feita pelos bancos públicos, que obviamente seguem uma orientação governamental. Isso é mais preocupante quando se leva em conta que a política fiscal é expansionista e a taxa de juros estava baixa. Significa que nem dando muito gás a economia está crescendo. 


O que está dando errado?

O potencial de crescimento reflete a situação do País, mas também as políticas macroeconômicas. Acho que o Brasil teria muito a se beneficiar de uma menor intervenção estatal na economia, de uma redução dramática do volume de subsídios às empresas, de uma contração fiscal. Ou seja, da redução do tamanho do Estado, tirando menos impostos da sociedade e gastando menos. A abertura comercial também ajudaria muito. Claro que há entraves diplomáticos, tem Mercosul etc. Mas acho que fazer acordos de livre comércio com os parceiros comerciais que importam, que são Estados Unidos, Europa e Ásia, seria mais produtivo do que insistir no caminho do Mercosul. 


Isso é o contrário do que vem acontecendo...

É o contrário da tendência dos últimos anos, com certeza. Mas é um caminho que o Brasil precisa percorrer. Pense nas manifestações de junho. Longe de mim querer simplificar esse fenômeno social complexo, mas a tônica foi a demanda por um Estado mais eficiente. Nosso Estado é grande, a começar pela carga tributária, a maior entre os países emergentes. Cobramos impostos como país desenvolvido e entregamos serviços públicos de país subdesenvolvido. 


O sr. chegou a participar das manifestações?

Cheguei a olhar, mas não desci (uma das passeatas passou em frente à sede do BTG, em São Paulo). Confesso que, dado o meu passado, fiquei com muita vontade de descer, mas achei que já tinha passado da idade para isso. Mas, olha, a população brasileira está mais madura para o debate orçamentário do que as pessoas pensam. O debate antes era muito centrado no déficit. Hoje se discute também a qualidade do gasto. Uma coisa é ter um déficit pequeno com o Estado gastando todo seu dinheiro em subsídios. Outra coisa é ter um déficit pequeno com o Estado gastando todo seu dinheiro em infraestrutura. As pessoas estão prestando atenção.


Os críticos do governo defendem a troca da equipe econômica, inclusive do ministro Guido Mantega. O sr. concorda com essa avaliação?

Não cabe a mim avaliar isso. Mas acho que uma política decididamente mais liberal e menos intervencionista, mais pró-mercado, certamente aumentaria nosso potencial de crescimento. Isso passa por uma agenda muito diferente da agenda desenvolvimentista. Por exemplo: o volume de crédito precisa diminuir dramaticamente, os subsídios do Tesouro, a empresas ou setores específicos, têm de diminuir. São coisas que parecem intuitivamente boas, mas na verdade são ruins. 


Como o governo pode lidar ao mesmo tempo com o grito das ruas por mais investimentos, a pressão dos investidores pela redução dos gastos públicos e as eleições do ano que vem?

A pressão da sociedade não é por mais gastos. É por mais investimento em infraestrutura e por melhor eficiência na saúde. O problema no sistema de saúde, assim como na educação, não é que se gaste pouco - é que se gasta mal. Com relação às pressões orçamentárias típicas de anos eleitorais, isso não é só uma sina brasileira, os governos geralmente ampliam gastos nesses períodos. 


Vários investidores se dizem apreensivos com o desarranjo das contas públicas e com o crescente desequilíbrio das contas externas. Corremos o risco de entrar novamente em crise?

A combinação de uma conjuntura internacional adversa com o fraco potencial de crescimento do Brasil mais os efeitos da antecipação do calendário político criaram um ambiente de incerteza muito grande. É claro que isso tem um efeito ruim sobre a atividade econômica. Você vê estrangeiros que vendem seus investimentos para repatriar capital, que é uma das forças que levaram o dólar a subir. Está todo mundo mais preocupado com seu emprego, com sua renda, em poupar um pouco mais. Tudo isso diminui a demanda agregada da economia. 


Mas podemos entrar em crise ou não?

Olhando os componentes de demanda agregada, o consumo vai se retrair, o investimento também, gastos de governo ao menos não vão se expandir. Só vão crescer as exportações líquidas, pelo efeito da taxa de câmbio. Será que o ganho das exportações compensará a queda de consumo e investimento? Acho que não, o que significa que o PIB vai crescer menos. É bom lembrar também que houve uma forte subida da taxa de juros. Acho difícil escapar à conclusão de que o Brasil vai crescer ainda menos. 


Muitos analistas entendem que o governo se perdeu na condução da política econômica. O sr. concorda?

Não sei se perdido é o termo correto. Mas certamente ele não teve eficácia nas suas tentativas. Os investimentos em infraestrutura, por exemplo. O governo anunciou as concessões de rodovias, voltou atrás, anunciou de novo, melhorou as condições... Claramente é um processo em que não há sintonia entre o que o governo está fazendo e o que os investidores procuram. Veja as mudanças do quadro regulatório. Algumas delas foram desastradamente implementadas, como no caso de energia elétrica. O efeito sobre os investidores é devastador.


Quanto isso afeta?

É difícil para um investidor estrangeiro achar que o caso da energia elétrica foi um caso isolado e não vai se repetir em outras concessões. Qualquer que tenha sido a intenção original, o efeito é aumentar a incerteza sobre a economia brasileira. É ruim porque o que o Brasil mais precisa hoje é atrair capitais privados para infraestrutura. O País tem duas rotas de crescimento óbvias e ambas requerem mudanças na política estatal: uma é criar condições regulatórias para atrair capital privado para infraestrutura; a outra é diminuir o tamanho do Estado. É preciso ser duro na política fiscal para baixar juros. A gente tem de viabilizar inflação baixa e taxas de juros baixa. Os dois. 


Houve leniência com a inflação?

É fácil analisar depois. Na prática, desde que o sistema de metas foi anunciado, a inflação tem ficado muito mais acima da meta do que abaixo dela. De 1999 para cá, esse é o padrão, o que sugere que o Banco Central dos últimos três presidentes foi menos duro do que poderia ter sido na política monetária. Mas isso não é novo. O novo é a inflação ficar batendo no topo por tanto tempo e o fato de que as expectativas de inflação estão, digamos, desancoradas. Nesse sentido a situação é pior do que antes.


Por quê?

Antes, a inflação subia, mas, no longo prazo, as pessoas achavam que ela ia voltar para a meta. Agora, a inflação subiu e as pessoas não acham que vai voltar. Tão grave quanto ter deixado a inflação chegar no topo foi ter deixado as expectativas decolarem e ficarem desancoradas. Isso vai fazer o trabalho de trazer para a meta muito mais difícil do que poderia ter sido. Aliás, acho que a meta de 4,5% é muito elevada. O ideal seria baixar.


Agora? Para quanto?

Agora, não. Mais para a frente. O ideal seria fixar uma meta mais realista, 3% e agir de forma a efetivamente garanti-la.


Dois anos atrás o sr. foi o primeiro economista de peso a defender a redução dos juros...

Continuo gostando de juros baixos. Mas é preciso avaliar o contexto. Quando a política fiscal é muito expansionista, a taxa de juros tem de ser alta, para manter a inflação sob controle. Ou então é melhor desistir de manter a inflação sob controle - não tem mágica. A maneira de explorar ao máximo o potencial de crescimento da economia brasileira é viabilizar a taxa de juros baixa. Só que não pode ter inflação. 


Mas esse é o problema...

O ponto é que o Brasil precisa reduzir o custo de capital para crescer. Mas como ter taxa de juros e inflação baixas? O segredo é só um. Cortar gastos públicos, diminuir impostos e abrir a economia. Um País como o nosso, que arrecada 36% do PIB, uma taxação inglesa, e investe só 0,5% do PIB, está fazendo algo de muito errado. 


O governo parece convencido disso?

Várias medidas necessárias dependem de vontade política. A mais óbvia é mudar a lei de indexação do salário mínimo. É uma excrescência: o mínimo sobe automaticamente com o PIB, em termos reais. Quem ganha salário mínimo merece ter aumento real, é obvio que sim. Mas o problema não é esse. É que ele é piso para todas as negociações sindicais. A economia funciona como se tivesse choques de salário real e indexa as aposentadorias. Quando o País cresce, o valor real das aposentadorias do setor público cresce também. 


Mas isso é ruim?

O Brasil é o único país que conheço no mundo que dá compulsoriamente aumento real de pensão para aposentados. No fundo, está tirando renda dos segmentos ativos da sociedade e transferindo para os aposentados. Todo mundo tem o direito de se aposentar e ter uma boa renda. Mas ter aumentos reais automaticamente num país carente como o nosso? Reduzir o valor real das aposentadorias seria injusto, mas dar aumento automático também é injusto com os outros que trabalham.


Com que taxa de juros o sr. está trabalhando?

Eu acho que o nível de atividade vai surpreender para baixo, a inflação também, e a taxa de juros vai ter de subir menos do que se imagina. Algo entre 9,5% e 10% no máximo.


O sr. está imaginando uma recessão no Brasil?

Recessão, tecnicamente, tem muitas definições diferentes. Com certeza vamos crescer abaixo de 2%. Algo em torno de 1,8%.