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sexta-feira, 5 de julho de 2013

"O projeto do PT e' retrogrado" - Andre Lara Resende

O mal-estar contemporâneo

Por André Lara Resende
Valor Econômico, 5/07/2013

O projeto do PT no governo revelou-se flagrantemente retrógrado. É essencialmente a volta do nacional-desenvolvimentismo.

Nenhuma liderança soube captar e expressar o mal-estar contemporâneo. Este é provavelmente o seu elemento novo: a internet viabiliza a mobilização antes que surjam as lideranças

Na tentativa de interpretar o protesto das ruas nas grandes cidades brasileiras, há uma natural tentação de fazer um paralelo com os movimentos similares nos países avançados, sobretudo da Europa, mas também nos EUA - Occupy Wall Street - assim como com os da chamada Primavera Árabe. As condições objetivas são, contudo, muito distintas. A Primavera Árabe é um fenômeno de países totalitários, onde não há representação democrática. Não é o caso do Brasil. Na Europa, sobretudo nos países mediterrâneos periféricos mais atingidos pelos efeitos da crise financeira de 2008, houve uma drástica piora das condições de vida. O desemprego, especialmente entre os jovens, subiu para níveis dramáticos. Mais uma vez, não é o caso do Brasil.
Nem os críticos mais radicais ousariam argumentar que o Brasil de hoje não se enquadra nos moldes das democracias representativas do século XX. Podem-se culpar os desacertos da política econômica nos últimos seis anos. Embora devam ficar mais evidentes daqui para a frente, os efeitos negativos da incompetência da política econômica só muito recentemente se fizeram sentir. Fato é que, desde a estabilização do processo inflacionário crônico, houve grandes avanços nas condições econômicas de vida dos brasileiros. Nos últimos 20 anos, houve ganho substancial de renda entre os mais pobres. Ao contrário do que ocorreu em outras partes do mundo, até mesmo nos países avançados, a distribuição de renda melhorou. O desemprego está em seu mínimo histórico.
É verdade que a inflação, especialmente a de alimentos, que se faz sentir mais intensamente pelos assalariados, está em alta. Por mais consciente que se seja em relação aos riscos, políticos e econômicos, da inflação, é difícil atribuir à inflação o papel de catalisadora do movimento das ruas nas últimas semanas. Só agora a taxa de inflação superou o teto da banda - excessivamente generosa, é verdade - da meta do Banco Central.
Os dois elementos tradicionais da insatisfação popular - dificuldades econômicas e falta de representação democrática - definitivamente não estão presentes no Brasil de hoje. Inflação, desemprego, autoritarismo e falta de liberdade de expressão não podem ser invocados para explicar a explosão popular. O fenômeno é, portanto, novo. Procurar interpretá-lo de acordo com os cânones do passado parece-me o caminho certo para não o compreender.
O movimento de maio de 1968 na França tem sido lembrado diante das manifestações das últimas semanas. O paralelo se justifica, pois maio de 68 é o paradigma do movimento sem causas claras nem objetivos bem definidos, uma combustão espontânea surpreendente, que ocorre em condições políticas e econômicas relativamente favoráveis. Movimento que, uma vez detonado, canaliza um sentimento de frustração difusa - um "malaise"- com o estado das coisas, com tudo e todos, com a vida em geral.
A novidade mais evidente em relação a maio de 68 na França é a internet e as redes sociais. Embora não tivesse expressão clara na vida pública francesa, a insatisfação difusa poderia ter sido diagnosticada, ao menos entre os universitários parisienses. No Brasil de hoje, a irritação difusa podia ser claramente percebida na internet e nas redes sociais. O movimento pelo passe livre fez com que este mal-estar transbordasse do virtual para a realidade das ruas. Tanto os universitários franceses de 68, quanto os internautas do Brasil de hoje, não representam exatamente o que se poderia chamar de as massas ou o povão, mas funcionam igualmente como sensores e catalisadores de frustrações comuns.
Quais as causas do mal-estar difuso no Brasil de hoje, que transbordou da internet para a realidade e levou a população às ruas?
Parecem ter dois eixos principais. O primeiro, e mais evidente, é uma crise de representação. A sociedade não se reconhece nos poderes constituídos - Executivo, Legislativo e Judiciário - em todas suas esferas. O segundo é que o projeto do Estado brasileiro não corresponde mais aos anseios da população. O projeto do Estado, e não do governo, é importante que se note, pois a questão transcende governos e oposições. Este hiato entre o projeto do Estado e a sociedade explica em grande parte a crise de representação.
O Estado brasileiro mantém-se preso a um projeto cuja formulação é do início da segunda metade do século passado. Um projeto que combina uma rede de proteção social com a industrialização forçada. A rede de proteção social inspirou-se nas reformas das economias capitalistas da Europa, entre as duas Grandes Guerras, reforçadas após a crise dos anos 1930. Foi introduzida no Brasil por Getúlio Vargas, para a organização do mercado de trabalho, baseado no modelo da Itália de Mussolini. A industrialização forçada através da substituição de importações, introduzida por Juscelino Kubitschek nos anos 1950, e reforçada pelo regime militar nos anos 1970, tem raízes mais autóctones. Suas origens intelectuais são o desenvolvimentismo latino-americano dos anos 1950, que defendia a ação direta do Estado, como empresário e planejador, para acelerar a industrialização.
Não nos interessa aqui fazer a análise crítica do projeto desenvolvimentista que, com altos e baixos, aos trancos e barrancos, cumpriu seu papel e levou o país às portas da modernidade neste início de século. Basta ressaltar que o desenvolvimentismo, em seus dois pilares - a industrialização forçada e a rede de proteção social - dependem da capacidade do Estado de extrair recursos da sociedade. Recursos que devem ser utilizados para financiar o investimento público e os benefícios da proteção social.
Diante da baixa taxa de poupança do setor privado e da precariedade da estrutura tributária do Estado, a inflação transferiu os recursos da sociedade para o Estado, até que nos anos 1980 viesse a se tornar completamente disfuncional. Com a inflação estabilizada, a partir do início dos anos 1990, o Estado se reorganizou para arrecadar por via fiscal também os recursos que extraía através do imposto inflacionário. A carga fiscal passou de menos de 15% da renda nacional, no início dos anos 1950, para em torno de 25%, nas décadas de 1970 a 90, até saltar para os atuais 36%, depois da estabilização da inflação. O Brasil tem hoje uma carga tributária comparável, ou mesmo superior, à das economias mais avançadas.
Apesar de extrair da sociedade mais de um terço da renda nacional, o Estado perdeu a capacidade de realizar seu projeto. Não o consegue entregar porque, apesar de arrecadar 36% da renda nacional, investe menos de 7% do que arrecada, ou seja, menos de 3% da renda nacional. Para onde vão os outros 93% dos quase 40% da renda que extrai da sociedade? Parte, para a rede de proteção e assistência social, que se expandiu muito além do mercado de trabalho organizado, mas, sobretudo, para sua própria operação. O Estado brasileiro tornou-se um sorvedouro de recursos, cujo principal objetivo é financiar a si mesmo. Os sinais dessa situação estão tão evidentes, que não é preciso conhecer e analisar os números. O Executivo, com 39 ministérios ausentes e inoperantes; o Legislativo, do qual só se tem más notícias e frustrações; o Judiciário pomposo e exasperadoramente lento.
O Estado foi também incapaz de perceber que seu projeto não corresponde mais ao que deseja a sociedade. O modelo desenvolvimentista do século passado tinha dois pilares. Primeiro, a convicção de que a industrialização era o único caminho para escapar do subdesenvolvimento. Países de economia primário-exportadora nunca poderiam almejar alcançar o estágio de desenvolvimento das economias industrializadas. Segundo, a convicção de que o capitalismo moderno exige a intervenção do Estado em três dimensões: para estabilizar as crises cíclicas das economias de mercado; para prover uma rede de proteção social; e, no caso dos países subdesenvolvidos, para liderar o processo de industrialização acelerada. As duas primeiras dimensões da ação do Estado são parte do consenso formado depois da crise dos anos 1930. A terceira decorre do sucesso do planejamento central soviético em transformar uma economia agrária, semifeudal, numa potência industrial em poucas décadas. A proteção tarifária do mercado interno, com o objetivo de proteger a indústria nascente e promover a substituição de importações, completava o cardápio com um toque de nacionalismo.
O nacional- desenvolvimentismo, fermentado nos anos 1950, teve sua primeira formulação como plano de ação do governo na proposta de Roberto Simonsen. Embora sempre combatido pelos defensores mais radicais do liberalismo econômico, como Eugênio Gudin, autor de famosa polêmica com Roberto Simonsen, e posteriormente por Roberto Campos, foi adotado tanto pela esquerda, como pela direita. Seu período de maior sucesso foi justamente o do "milagre econômico" do regime militar.
Na década de 1980, a inflação se acelera e se torna definitivamente disfuncional. As sucessivas e fracassadas tentativas de estabilização passam a dominar o cenário econômico. Com a estabilização do real, a partir da segunda metade da década de 1990, ainda com algum constrangimento em reconhecer que o nacional-desenvolvimentismo já não fazia sentido num mundo integrado pela globalização, o país parecia estar em busca de novos rumos. A vitória do PT foi, sem dúvida, parte da expressão desse anseio de mudança.
Nos dois primeiros anos do governo Lula, a política econômica foi essencialmente pautada pela necessidade de acalmar os mercados financeiros, sempre conservadores, assustados com a perspectiva de uma virada radical à esquerda. A partir daí, o PT passou a pôr em prática o seu projeto. Um projeto muito diferente do que defendia enquanto oposição. O projeto do PT no governo, frustrando as expectativas dos que esperavam mudanças, muito mais do que o aparente continuísmo dos primeiros anos do governo Lula, revelou-se flagrantemente retrógrado. É essencialmente a volta do nacional-desenvolvimentismo, inspirado no período em este que foi mais bem-sucedido: durante regime militar. A crise internacional de 2008 serviu para que o governo abandonasse o temor de desagradar aos mercados financeiros e, sob pretexto de fazer política macroeconômica anticíclica, promovesse definitivamente a volta do nacional-desenvolvimentismo estatal.
O PT acrescentou dois elementos novos em relação ao projeto nacional-desenvolvimentista do regime militar: a ampliação da rede de proteção social, com o Bolsa Família, e o loteamento do Estado. A ampliação da rede de proteção social se justifica, tanto como uma inciativa capaz de romper o impasse da pobreza absoluta, em que, apesar dos avanços da economia, grande parte da população brasileira se via aprisionada, quanto como forma de manter um mínimo de coerência com seu discurso histórico. Já a lógica por trás do loteamento do Estado é puramente pragmática. Ao contrário do regime militar, que não precisava de alianças difusas, o PT utilizou o loteamento do Estado, em todas suas instâncias, como moeda de troca para compor uma ampla base de sustentação. Sem nenhum pudor ideológico, juntou o sindicalismo de suas raízes com o fisiologismo do que já foi chamado de Centrão, atualmente representado principalmente pelo PMDB, no qual se encontra toda sorte de homens públicos, que, independentemente de suas origens, perderam suas convicções ao longo da estrada e hoje são essencialmente cínicos.
Há ainda um terceiro elemento do projeto de poder do PT. Trata-se da eleição de uma parte do empresariado como aliada estratégica. Tais aliados têm acesso privilegiado ao crédito favorecido dos bancos públicos e, sobretudo, à boa vontade do governo, para crescerem, absorverem empresas em dificuldades, consolidarem suas posições oligopolísticas no mercado interno e se aventurarem internacionalmente como "campeões nacionais".
A combinação de um projeto anacrônico com o loteamento do Estado entre o sindicalismo e o fisiologismo político, ao contrário do pretendido, levou à sobrevalorização cambial e à desindustrialização. Só foi possível sustentar um crescimento econômico medíocre enquanto durou a alta dos preços dos produtos primários, puxados pela demanda da China. A ineficiência do Estado nas suas funções básicas - segurança, infraestrutura, saúde e educação - agravou-se significativamente. Ineficiência realçada pela redução da pobreza absoluta na população, que aumentou a demanda por serviços de qualidade.
A insatisfação difusa dos protestos pode vir a ser catalizadora de uma mudança profunda de rumo, que abra o caminho para um novo desenvolvimento 

Loteado e inadimplente em suas funções essenciais, enquanto absorvia parcela cada vez maior da renda nacional para sua própria operação, o Estado passou a ser visto como um ilegítimo expropriador de recursos. Não apenas incapaz de devolver à sociedade o mínimo que dele se espera, mas também um criador de dificuldades. A combinação de uma excessiva regulamentação de todas as esferas da vida, com a truculência e a arrogância de seus agentes, consolidou o estranhamento da sociedade. Em todas as suas esferas, o Estado deixou de ser percebido como um aliado, representativo e prestador de serviço. Passou a ser visto como um insaciável expropriador, cujo único objetivo é criar vantagens para os que dele fazem parte, enquanto impõe dificuldades e cria obrigações para o resto da população. O contraste da realidade com o ufanismo da propaganda oficial só agravou o estranhamento e consolidou o divórcio entre a população e os que deveriam ser seus representantes e servidores.
A insatisfação com a democracia representativa não é um fenômeno exclusivamente brasileiro. As razões dessa insatisfação ainda não estão claras, mas é possível que o modelo de representação democrática, constituído há dois séculos para sociedades menores e mais homogêneas, tenha deixado de cumprir seu papel num mundo interligado de 7 bilhões de pessoas, e precise ser revisto. O debate público deslocou-se das esferas tradicionais da política para a internet e as redes sociais. Ameaçada pelo crescimento da internet e habituada ao seu papel de agente da política tradicional, a mídia não percebeu que o debate havia se deslocado.
No caso brasileiro, perplexa com sua aparente falta de repercussão e pressionada financeiramente pela competição da internet, uma parte da mídia desistiu do jornalismo de interesse público e passou a fazer um jornalismo de puro entretenimento. Mesmo os que resistiram, cederam, em maior ou menor escala, à lógica dos escândalos. Foram incapazes de compreender a razão da sua falta de repercussão, pois não se deram conta de que o público e o debate haviam se deslocado para a internet. Surpreendida pelo movimento de protestos, num primeiro momento, a mídia não foi capaz de avaliar a extensão da insatisfação. Transformou-se ela própria em alvo da irritação popular. Em seguida, aderiu sem convencer, sempre a reboque do debate e da mobilização através da internet. A favor da mídia, diga-se que ninguém foi capaz de captar a insatisfação latente antes da eclosão do movimento das ruas. As pesquisas apontavam, até muito recentemente, grande apoio à presidente da República, considerada praticamente imbatível, até mesmo por seus eventuais adversários nas próximas eleições. Nenhuma liderança soube captar e expressar o mal-estar contemporâneo. Este é provavelmente o seu elemento novo: a internet viabiliza a mobilização antes que surjam as lideranças. Tanto as possibilidades como os riscos são novos.
O projeto nacional-desenvolvimentista combina o consumismo das economias capitalistas avançadas com o produtivismo soviético. Ambos pressupõem que o crescimento material é o objetivo final da atividade humana. Aí está a essência de seu caráter anacrônico. Os avanços da informática permitiram a coleta de um volume extraordinário de evidências sobre a psicologia e os componentes do bem-estar. A relação entre renda e bem-estar só é claramente positiva até um nível relativamente baixo de renda, capaz de atender às necessidades básicas da vida. A partir daí, o aumento do bem-estar está associado ao que se pode chamar de qualidade de vida, cujos elementos fundamentais são o tempo com a família e os amigos, o sentido de comunidade e confiança nos concidadãos, a saúde e a ausência de estresse emocional.
Os estudos da moderna psicologia comprovam aquilo que de uma forma ou de outra, mais ou menos conscientemente, intuímos todos: nossa insaciabilidade de bens materiais advém do fato de que o bem-estar que nos trazem é efêmero. Para manter a sensação de bem-estar, precisamos de mais e novas aquisições. O consumismo material tem elementos parecidos com o do uso de substâncias entorpecentes que causam dependência física e psicológica.
No mundo todo, a população parece já ter intuído a exaustão do modelo consumista do século XX, mas ainda não encontrou nas esferas da política tradicional a capacidade de participar da formulação das alternativas. Apegada a fórmulas feitas, a política continua pautada pelos temas e objetivos de um mundo que não corresponde mais à realidade de hoje. As grandes propostas totalizantes já não fazem sentido. O nacionalismo, a obsessão com o crescimento material, a ênfase no consumo supérfluo, os grandes embates ideológicos, temas que dominaram a política nos últimos dois séculos, perderam importância. Hoje, o que importa são questões concretas, relativas ao cotidiano, questões de eficiência administrativa para garantir a qualidade de vida.
É significativo que os protestos no Brasil tenham começado com a reivindicação do passe livre nos transportes públicos urbanos. A questão da mobilidade nas grandes metrópoles é paradigmática da exaustão do modelo produtivista-consumista. A indústria automobilística foi o pilar da industrialização desenvolvimentista e o automóvel o símbolo supremo da aspiração consumista. O inferno do trânsito nas grandes cidades, que se agrava quanto mais bem-sucedido é o projeto desenvolvimentista, é a expressão máxima da completa inviabilidade de prosseguir sem uma revisão profunda de objetivos. Ao que parece, a sociedade intuiu a falência do projeto do século passado antes que o Estado e aqueles que deveriam representá-la - governo e oposição, Executivo, Legislativo e imprensa - tenham se dado conta de que hoje trabalham com objetivos anacrônicos.
A insatisfação difusa dos protestos pode vir a ser catalizadora de uma mudança profunda de rumo, que abra o caminho para um novo desenvolvimento, não mais baseado exclusivamente no crescimento do consumo material, mas na qualidade de vida. Para isso, é preciso que surjam lideranças capazes de exprimir, formular e executar o novo desenvolvimento.
André Lara Resende é economista. Este texto será apresentado na Festa Literária de Paraty (Flip), em debate com o filósofo Marcos Nobre, que ocorre neste sábado.

A irresponsabilidade fiscal do Tesouro - Mansueto Almeida

Tesouro explica a (ir)responsabilidade fiscal

Meu repórter favorito em temas fiscais, Ribamar Oliveira, fez uma excelente entrevista hoje no VALOR com o Secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin. A conclusão que tiro da entrevista é que o secretario acha normal as sucessivas emissões de divida pública para emprestar ao bancos públicos (BNDES e CEF), como também acha normal que, simultaneamente, o bancos recolham mais dividendos ao Tesouro, pois os bancos não estão sendo capitalizados por meio divida. A expansão da divida é apenas uma simples operação de empréstimo de longo-prazo.
O tom da entrevista deixa muito claro que o secretario acho tudo isso normal e, assim, a tendência desse tipo de operação é continuar. Acontece que o custo desse tipo de operação, mesmo que o governo tente esconder (assunto de outro post) começa a aparecer na rigidez da queda da taxa de juros implícita da Dívida Líquida do Setor Público. Vamos explicar cuidadosamente porque emissões de divida bruta que não afetam a divida liquida do setor púbico é um problema. Vamos assumir que a dívida bruta do setor público seja de R$ 1.000.
Primeiro exemplo: divida bruta igual à divida liquida: Vamos supor que o governo faça uma emissão de R$ 100 para gastar e pague juros de 8% ao ano para levantar o dinheiro no mercado. Apenas com essas operação, a divida bruta e liquida cresceram em R$ 100. Como a divida bruta do governo é igual a líquida e vamos supor por simplicidade que todos os títulos sejam negociados por Selic, os juros total da divida bruta será de: 8% * (R$ 1000+ R$ 100) = R$ 88. Como Divida bruta e liquida são iguais as taxa de juros da divida bruta (Selic) e a taxa de juros implícita da dívida líquida serão iguais.
Segundo exemplo: divida bruta diferente da divida liquida: Vamos supor agora que um certo Secretário do Tesouro tem a seguinte ideia. Por que não aumentamos a divida bruta e emprestamos para nosso banco público estatal para ele subsidiar várias coisas? Assim, não precisaremos colocar a conta dos nossos subsídios no item “equalização de taxa de juros” que é uma despesa primária e, assim reduziria o nosso esforço fiscal (superávit primário). O secretario rapidamente convence todo mundo afinal, ele “quer o bem para o país” e as pessoas não estão preparadas para entender as discussões técnicas.
Assim, o governo faz algo diferente. Faz a mesma emissão de títulos para levantar R$ 100 a um custo Selic de 8% ao ano e, em seguida, empresta para o banco público o valor total a um juros de 4% ao ano. Aqui começa o problema. A dívida bruta neste caso aumenta como no caso anterior em R$ 100. Assim, os juros que incidem sobre a divida bruta com a nova emissão será o mesmo do caso anterior = 8% * (R$ 1000+ R$ 100) = R$ 88.
Mas agora a Divida Liquida não se alterou por que a nova emissão de R$ 100 foi emprestada ao Banco de Desenvolvimento. No entanto, como o governo recebe uma taxa de juros pelo empréstimo ao seu banco de desenvolvimento menor (4% ao ano) do que aquela que paga para levantar recursos no mercado (8%) essa operação tem um custo financeiro que afeta a taxa de juros implícita da Dívida Liquida do Setor Público (DLSP). Neste caso:
Juros sobre a Divida Bruta = 8% * (R$ 1000+ R$ 100) = R$ 88. (a)
Juros que o Tesouro recebe do Banco de Desenvolv. = 4% * (R$ 100) = R$ 4 (b)
Juros Líquidos = (a) – (b) = R$ 84
Aqui começa a complicação. Como a DLSP é a mesma que antes R$ 1.000 (a nova emissão de títulos foi, integralmente, emprestada ao banco de desenvolvimento), antes da emissão os juros sobre a divida bruta e liquida era de 8%*R$ 1.000 = R$ 80. Agora para a mesma DLSP de R$ 1.000, o juros implícitos são de R$ 84 que, dividido pelo estoque da Divida Liquida de R$ 1.000, equivale a uma taxa de 8,4% ao ano que é maior que a taxa de 8% (Selic) que corrige a divida Bruta. Imaginem agora várias operações sucessivas desse tipo como o governo vem fazendo desde 2008.
Terceiro Exemplo: Expansão do modelo e o caso do Brasil. Assim, qualquer operação que não afeta a Dívida Liquida do Setor Público (DLSP) mas que cria um passivo – novas emissões de títulos- que paga uma taxa de juros maior do que aquela que o governo recebe pelo seu ativo-empréstimos p/ seu Banco de Desenvolvimento ou aplicação em reservas- faz com que o custo da Div. Liquida do Setor Público fique elevado e seja pouco sensível à queda da Selic.
No caso do Brasil, como mostro a seguir, essa diferença é gritante porque hoje temos uma DLSP de 35% do PIB e uma divida bruta de 60% do PIB (ou de 68% do PIB pelo critério FMI). O Brasil aumentou muito a diferença entre divida bruta e liquida porque aumentou fortemente o saldo de reservas internacionais e fez várias operações de empréstimo para BNDES e CEF; claro que a grande maioria para BNDES. O resultado dessas operações no custo da dívida que o nosso Secretário do Tesouro Nacional acha normal são os dois gráficos abaixo.
Taxa de Juros SELIC – % ao ano – 2002-2012
SELIC
Taxa de Juros Implicita da Dívida Líquida do Setor Público – % aa – 2002-2012
TXIMPLICITA
Fonte: Banco Central
Apesar de mais de uma década de esforço fiscal com elevado superávit primário, a taxa de juros implícita da DLSP hoje é a mesma de 2002, 15% ao ano, enquanto a Selic no período foi reduzida de 25% para 7% aa. Na minha modesta opinião, uma economia na qual o secretário do Tesouro Nacional acha isso normal é motivo para preocupação. O Brasil vai continuar pagando uma conta monstruosa de juros porque o governo acha normal aumentar a divida para financiar o crescimento – algo que não tem paralelo para países com o nosso nível de desenvolvimento.
Assim, fica difícil acreditar em responsabilidade fiscal de um governo no qual o secretário acredita que o maior endividamento é o “missing link of economic development”. Boa sorte, secretário!

terça-feira, 16 de outubro de 2012

Colonia soberana e altiva: ainda bem...

Da coluna diária do jornalista Políbio Braga, 16/10/2012


Governos do PT fazem o País regredir aos tempos do Brasil Colônia

O editor recebeu nesta terça-feira da Confederação Nacional das Indústrias, CNI, um amplo estudo sobre a deterioração das exportações brasileiras nas relações de troca com os Estados Unidos. O norte-americanos foram nossos principais parceiros durante décadas e só recentemente cederam a liderança para a China.

. Os dados são comuns ao conjunto das vendas brasileiras para o exterior - para qualquer País.

. Qual o principal prejuízo?

- Entre 2003 e 2011, as exportações de manufaturados (produtos industrializados) caíram de 77,2% da pauta de exportações para apenas 45,3%.

. Foi uma queda de 32% no período.

. É uma relação recorrente de todo o comércio bilateral global brasileiro.

. O Brasil regrediu durante os governos Lula e Dilma Rousseff, privilegiando a exportação de produtos sem valor agregado, primários, tal como aconteceu desde os tempos da dominação de Portugal.

. O cenário é de Brasil Colônia.

. É claro que a pauta não é mais dominada pelo pau-brasil, ouro e cana-de-açúcar, porque agora são óleos brutos de petróleo, soja, milho e carvão.

. Não saem mais aviões, aparelhos transmissores e sequer calçados. Em 2003, 9 dos 15 maiores exportadores para os EUA eram do setor industrial (Embraer, Nokia, Volkswagen, Motorola, Aracruz, Embraco), número que agora caiu para apenas quatro.

. Um dos principais parceiros comerciais do Brasil, os Estados Unidos passaram a ganhar muito com as trocas. No ano passado, o Brasil comprou US$ 18,8 bilhões em produtos manufaturados, mas as vendas desses produtos para os EUA somaram apenas US$ 11,7  bilhões.

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Retrocede Brasil (7): Marx 10 x Hayek 1 (nas academias, claro...)

Outro dia fui dar aulas numa universidade pública, o que já não faço mais há algum tempo (no máximo concedo participar de algumas bancas de mestrado ou doutorado, se as teses são suficientemente interessantes).
Quando me convidam para aulas regulares, digo que estou muito bem onde estou atualmente.
E é verdade: garagem coberta, ambiente tranquilo, café expresso ou capuccino à vontade, limpeza ambiente (os alunos dispõem de banheiros limpos, por exemplo), todas as salas equipadas com computador e projetor, silêncio e tranquilidade, enfim, as bibliotecas não são como as dos campii americanos, mas está bastante bem assim.
Na tal de universidade pública precisei encomendar expressamente os equipamentos de auxílio, tive de deixar o carro no sol, temeroso de que algum assaltante mal acostumado com o ambiente "laxista" das universidades públicas m'o levasse no meio da aula, e o barulho era garantido: não apenas dos alunos continuamente falando algo no corredor, mas também dos professores nas salas ao lado, sem qualquer isolamento acústico. Não tinha ar condicionado, obviamente, assim que as janelas precisavam ficar abertas. Duas vezes no meio da aula, passou a caravana da máfia sindical pregando não sei qual protesto contra a precarização da universidade e reclamando a efetivação de terceirizados (talvez sem concurso, isso não pude perceber).
Não creio que aceite mais convites assim; prefiro ficar na minha particular.
Enfim, esta introdução para dizer que, a exemplo das academias ocidentais, o marxismo também é muito difundido entre nós, e talvez até mais.
Coloquei Marx dez a um contra Hayek no título, mas acho que exagerei: deve ser 20 a 0,5, no máximo.
E ainda se fosse Marx, estaria bem, o problema é que não é, e sim uma vulgata mal resumida de alguns autores ignorantes que só conhecem Marx de orelha.
O Brasil retrocede, entre outros motivos, por causa disso mesmo: as pessoas não leram Marx, e sobretudo não refletiram sobre o que ele falou e não confrontaram seus dizeres com a realidade.
Vamos ver o que a respeitável Economist tem a dizer sobre a economia marxista, acadêmica...
Paulo Roberto de Almeida

Marx's intellectual legacy
Marx after communism

The Economist, December 19th, 2002

As a system of government, communism is dead or dying. As a system of ideas, its future looks secure

WHEN Soviet communism fell apart towards the end of the 20th century, nobody could say that it had failed on a technicality. A more comprehensive or ignominious collapse—moral, material and intellectual—would be difficult to imagine. Communism had tyrannised and impoverished its subjects, and slaughtered them in the tens of millions. For decades past, in the Soviet Union and its satellite countries, any allusion to the avowed aims of communist doctrine—equality, freedom from exploitation, true justice—had provoked only bitter laughter. Finally, when the monuments were torn down, statues of Karl Marx were defaced as contemptuously as those of Lenin and Stalin. Communism was repudiated as theory and as practice; its champions were cast aside, intellectual founders and sociopathic rulers alike.

People in the West, their judgment not impaired by having lived in the system Marx inspired, mostly came to a more dispassionate view. Marx had been misunderstood, they tended to feel. The communism of Eastern Europe and the Soviet Union was a perversion of his thought. What happened in those benighted lands would have appalled Marx as much as it appals us. It has no bearing on the validity of his ideas.

Indeed, it is suggested, Marx was right about a good many things—about a lot of what is wrong with capitalism, for instance, about globalisation and international markets, about the business cycle, about the way economics shapes ideas. Marx was prescient; that word keeps coming up. By all means discard communism as practised in the Soviet Union and Eastern Europe (and China, North Korea, Cuba and in fact wherever it has been practised). But please don't discard Marx.

Give the man his due
There seems little risk of it. In 1999 the BBC conducted a series of polls, asking people to name the greatest men and women of the millennium. In October of that year, within a few weeks of the tenth anniversary of the dismantling of the Berlin Wall, the BBC declared the people's choice for “greatest thinker”. It was Karl Marx. Einstein was runner-up, Newton and Darwin third and fourth, respectively. “Although dictatorships throughout the 20th century have distorted [Marx's] original ideas,” the state-financed broadcaster noted, “his work as a philosopher, social scientist, historian and a revolutionary is respected by academics today.” Concerning the second point, at least, the BBC was correct: Marx is still accorded respect.

As a field of scholarship in its own right, admittedly, Marxist political and economic theory is past its peak. By now, presumably, most of the things that Marx meant, or really meant, or probably meant, or might conceivably have meant, have been posited and adequately (though far from conclusively) debated. But a slackening of activity amid the staggeringly voluminous primary sources is not the best measure of Marx's enduring intellectual influence.

Books on Marx aimed at undergraduates and non-specialists continue to sell steadily in Western Europe and the United States. And new ones keep coming. For instance, Verso has just published, to warm reviews, “Marx's Revenge” by Meghnad Desai, a professor of economics at the London School of Economics. Mr Desai argues that Marx was misunderstood and that the great man was right about far more than he is given credit for. In August, Oxford University Press published “Why Read Marx Today?” by Jonathan Wolff. It too is an engaging read. The author, a professor at University College London, is a particularly skilful elucidator of political philosophy. In his book, he argues that Marx was misunderstood and that the great man was right about far more than he is given credit for.

The newly released memoirs of Eric Hobsbawm, the celebrated historian, lifelong Marxist and unrepentant member of the Communist Party for as long as it survived, also deserve mention. The reviews were mixed, in fact, but rarely less than respectful, finding much to admire in the author's unwavering intellectual commitment. Mr Hobsbawm argues...well, he argues that Marx was misunderstood and that the great man was right about far more than he is given credit for.

Adam Smith, one might say, stands in relation to liberal capitalism, a comparatively successful economic order, roughly where Marx stands in relation to socialism. Searches on Amazon.com and other booksellers indicate that titles in print about Marx outnumber books about Adam Smith by a factor of between five and ten. A hard day's browsing of undergraduate reading-lists suggests that, in economics faculties, Smith is way out in front—interesting, given that Marx saw himself as an economist first and foremost. Elsewhere in the social sciences and humanities, the reverse is true. Smith is rarely seen, as you might expect, though in fact there is far more in Smith than just economics; whereas from Marx and his expositors and disciples it seems there is no escape. It is the breadth of Marx's continuing influence, especially as contrasted with his strange irrelevance to modern economics, that is so arresting.

How is one to explain this? What, if anything, remains valuable in Marx's writings? This is not a straightforward question, given that he evidently had such difficulty making himself understood.

Yes, Marx was a Marxist
When he wanted to be, Marx was a compelling writer, punching out first-rate epigrams at a reckless pace. The closing sentences of “The Communist Manifesto” (1848) are rightly celebrated: “The workers have nothing to lose but their chains. They have a world to gain. Workers of the world, unite.” He also had an enviable flair for hysterical invective. At one point in “Capital” (1867-94), he famously defines the subject of his enquiry as “dead labour, that, vampire-like, only lives by sucking living labour, and lives the more, the more labour it sucks.” That is not only unforgettable but actually very apt, if you believe Marx's theory of value. He could express himself brilliantly when he chose to.

In his “scientific” work, he minted jargon at a befuddling rate
Yet he was also capable of stupefying dullness and impenetrable complexity. Try the opening pages of “Capital” (it picks up later). In his scientific work, as he called it, he minted jargon at a befuddling rate, underlining terms to emphasise their opacity, then changing their meaning at will. Adding to the fog, what Marx believed in 1844 was probably not what he believed in 1874: the only constant was his conviction that what he said at any time was both the absolute truth and fully consistent with what he had said before. And most of the published Marx, including the “Manifesto” and volumes two and three of “Capital”, was edited, co-written or ghost written by Friedrich Engels. For many years, therefore, separating Marx from Engels in what the world understands as “Marx” was an academic industry in itself.

Still, four things seem crucial, and most of the rest follows from these. First, Marx believed that societies follow laws of motion simple and all-encompassing enough to make long-range prediction fruitful. Second, he believed that these laws are exclusively economic in character: what shapes society, the only thing that shapes society, is the “material forces of production”. Third, he believed that these laws must invariably express themselves, until the end of history, as a bitter struggle of class against class. Fourth, he believed that at the end of history, classes and the state (whose sole purpose is to represent the interests of the ruling class) must dissolve to yield a heaven on earth.

Titles in print about Marx outnumber books about Adam Smith by a factor of between five and ten.

From Marx and his expositors, there is no escape
In what ways, then, was Soviet-style communism a deviation from these beliefs, as modern western commentators like to argue? Chiefly, it is said that Russia jumped the gun (forgive the expression). According to Marx's laws of motion, society is supposed to progress from feudalism to capitalism at just that point when feudalism fetters the forces of production, rather than serving them, as it has up to that moment. Later, capitalism gives way in turn to socialism, the dictatorship of the proletariat, and in much the same way—once its productive potential has been fully achieved, so that henceforth its continued existence is an obstacle to material sufficiency rather than a means to it. But Russia went straight from feudalism to socialism. This was too quick. Marx could have told Lenin that it would never work.

Is this really what he would have said? There is no doubt that Lenin saw himself as a true follower of Marx—and he had every reason to. By the end of the 19th century, socialist thought was dividing. Marx's laws of motion were failing. Capitalism still flourished: no sign of the falling rate of profit that would signal its end. The working class was getting the vote. The welfare state was taking shape. Factory conditions were improving and wages were rising well above the floor of subsistence. All this was contrary to Marx's laws.

In response, the left was splitting. On one side were reformers and social democrats who saw that capitalism could be given a human face. On the other were those who believed that Marx's system could be developed and restated, always true to its underlying logic—and, crucially, with its revolutionary as opposed to evolutionary character brought to the fore.

Marx's incapacity for compromise was pathological
Whose side in this would Marx have been on? Revolution or reform? Would he have continued to insist that the vampire be destroyed? Or would he have turned reformer, asking it nicely to suck a bit less blood? The latter seems unlikely. Marx was a scholar, but he was also a fanatic and a revolutionary. His incapacity for compromise (with comrades, let alone opponents) was pathological. And in the preface to the 1882 Russian edition of the “Manifesto”, his last published writing, Marx hoped that a revolution in Russia might become “the signal for a proletarian revolution in the West, so that both complement each other”; if so, Russia, despite its pre-capitalist characteristics, “may serve as the starting-point for a communist development.” Lenin was surely right to believe that he, not those soft-headed bourgeois accommodationists, was true to the master's thought.

Apart from the gulag
Even if Soviet communism was true to Marx's ideas, or tried to be, that would not condemn all of Marx's thinking. He might still have been right about some things, possibly even the main things.

Aspects of his thought do impress. However, his assorted sayings about the reach of the global market—a favourite proof that “Marx was prescient”—are not in fact the best examples. The 19th century was an era of globalisation, and Marx was only one of very many who noticed. The accelerating global integration of the past 30 years merely resumes a trend that was vigorously in place during Marx's lifetime, and which was subsequently interrupted in 1914.

Marx was much more original in envisaging the awesome productive power of capitalism. He saw that capitalism would spur innovation to a hitherto-unimagined degree. He was right that giant corporations would come to dominate the world's industries (though not quite in the way he meant). He rightly underlined the importance of economic cycles (though his accounts of their causes and consequences were wrong).

The central paradox that Marx emphasised—namely, that its own colossal productivity would bring capitalism to its knees, by making socialism followed by communism both materially possible and logically necessary—turned out to be false. Still, Marx could fairly lay claim to having sensed more clearly than others how far capitalism would change the material conditions of the world. And this in turn reflects something else that demands at least a grudging respect: the amazing reach and ambition of his thinking.

On everything that mattered most to Marx himself, he was wrong
But the fact remains that on everything that mattered most to Marx himself, he was wrong. The real power he claimed for his system was predictive, and his main predictions are hopeless failures. Concerning the outlook for capitalism, one can always argue that he was wrong only in his timing: in the end, when capitalism has run its course, he will be proved right. Put in such a form, this argument, like many other apologies for Marx, has the advantage of being impossible to falsify. But that does not make it plausible. The trouble is, it leaves out class. This is a wise omission, because class is an idea which has become blurred to the point of meaninglessness. Class antagonism, though, is indispensable to the Marxist world-view. Without it, even if capitalism succumbs to stagnation or decline, the mechanism for its overthrow is missing.

Class war is the sine qua non of Marx. But the class war, if it ever existed, is over. In western democracies today, who chooses who rules, and for how long? Who tells governments how companies will be regulated? Who in the end owns the companies? Workers for hire—the proletariat. And this is because of, not despite, the things Marx most deplored: private property, liberal political rights and the market. Where it mattered most, Marx could not have been more wrong.

Right in principle
Yet Marxist thinking retains great influence far beyond the dwindling number who proclaim themselves to be Marxists. The labour theory of value and the rest of Marx's economic apparatus may be so much intellectual scrap, but many of his assumptions, analytical traits and habits of thought are widespread in western academia and beyond.

The core idea that economic structure determines everything has been especially pernicious. According to this view, the right to private property, for instance, exists only because it serves bourgeois relations of production. The same can be said for every other right or civil liberty one finds in society. The idea that such rights have a deeper moral underpinning is an illusion. Morality itself is an illusion, just another weapon of the ruling class. (As Gyorgy Lukacs put it, “Communist ethics makes it the highest duty to act wickedly...This is the greatest sacrifice revolution asks from us.”) Human agency is null: we are mere dupes of “the system”, until we repudiate it outright.

What goes for ethics also goes for history, literature, the rest of the humanities and the social sciences. The “late Marxist” sees them all, as traditionally understood, not as subjects for disinterested intellectual inquiry but as forms of social control. Never ask what a painter, playwright, architect or philosopher thought he was doing. You know before you even glance at his work what he was really doing: shoring up the ruling class. This mindset has made deep inroads—most notoriously in literary studies, but not just there—in university departments and on campuses across Western Europe and especially in the United States. The result is a withering away not of the state but of opportunities for intelligent conversation and of confidence that young people might receive a decent liberal education.

Marxist thinking is also deeply Utopian—another influential trait. The “Communist Manifesto”, despite the title, was not a programme for government: it was a programme for gaining power, or rather for watching knowledgeably as power fell into one's hands. That is, it was a commentary on the defects and dynamics of capitalism. Nowhere in the “Manifesto”, or anywhere else in his writings, did Marx take the trouble to describe how the communism he predicted and advocated would actually work.

Marx's theory of cattle
He did once say this much: “In communist society, where nobody has one exclusive sphere of activity...society regulates the general production and thus makes it possible for me to do one thing today and another tomorrow, to hunt in the morning, fish in the afternoon, rear cattle in the evening, criticise after dinner, just as I have in mind, without ever becoming hunter, herdsman or critic.” Whether cattle would be content to be reared only in the evening, or just as people had in mind, is one of many questions one would wish to see treated at greater length. But this cartoon is almost all Marx ever said about communism in practice. The rest has to be deduced, as an absence of things he deplored about capitalism: inequality, exploitation, alienation, private property and so forth.

It is striking that today's militant critics of globalisation, whether declared Marxists or otherwise, proceed in much the same way. They present no worked-out alternative to the present economic order. Instead, they invoke a Utopia free of environmental stress, social injustice and branded sportswear, harking back to a pre-industrial golden age that did not actually exist. Never is this alternative future given clear shape or offered up for examination.

Anti-globalists have inherited plenty from Marx
And anti-globalists have inherited more from Marx besides this. Note the self-righteous anger, the violent rhetoric, the willing resort to actual violence (in response to the “violence” of the other side), the demonisation of big business, the division of the world into exploiters and victims, the contempt for piecemeal reform, the zeal for activism, the impatience with democracy, the disdain for liberal “rights” and “freedoms”, the suspicion of compromise, the presumption of hypocrisy (or childish naivety) in arguments that defend the market order.

Anti-globalism has been aptly described as a secular religion. So is Marxism: a creed complete with prophet, sacred texts and the promise of a heaven shrouded in mystery. Marx was not a scientist, as he claimed. He founded a faith. The economic and political systems he inspired are dead or dying. But his religion is a broad church, and lives on.

Retrocede Brasil (6): ajuste fiscal ilusorio e inexistente (ambos os dois, se me permitem a redundancia)

Simplesmente mentira.
O governo nao fez NENHUM ajuste fiscal.
A redução alegada de despesas se fez com base num orçamento inflado para cima pelos parlamentares, sobre um projeto altamente exagerado do governo, que já previa um crescimento das receitas e despesas maior do que a realidade o permitiria.
Ou seja, o governo anunciou corte de fumaça.
Depois, o governo demorou um mês e meio para detlhar um corte pífio de 50 bilhões de reais, sendo que logo depois ofereceu 55 bilhões ao BNDES, o que é de uma coerência extraordinária.
O governo sofre de transtorno bipolar...
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Paulo Roberto de Almeida

O ajuste fiscal é a melhor arma para o combate à inflação, diz Mantega ao iG
iG, 28/04/2011

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou ao iG que o governo está fazendo um forte ajuste fiscal e essa é uma excelente arma que dispõe para ajudar no combate à inflação.

“A consolidação fiscal, que implica em corte de gastos públicos, é uma excelente arma que o governo dispõe para conter a demanda do Estado e que ajuda no combate à inflação”, disse Mantega, em conversa ontem à tarde, em Brasília.

Mantega disse que o governo não possui só esta arma, do ajuste fiscal, mas diversas outras, como a política monetária.

“O governo está atacando em todas as frentes, em todos os lados, tanto do ponto de vista fiscal como monetário”, afirmou Mantega.

O minstro da Fazenda citou, por exemplo, a cobrança de IOF sobre os empréstimos externos com prazo inferior a 320 dias, o que significa uma entrada menor de crédito externo no País.

A enorme liquidez que existe hoje no mundo, que é provocada principalmente pelo longo período de afrou xamento monetário nos Estados Unidos e que deve persistir por mais tempo, é uma das principais responsáveis pela inflação tanto no Brasil como em todos os países.

Em entrevista ontem, Ben Bernanke, presidente do Fed (Banco Central americano), não deu nenhum sinal de que irá interromper essa política de afrouxamento monetário.

O próprio Mantega reconhece que não virá dos Estados Unidos nenhuma ajuda para o combate à inflação.
“Bernanke tem ajudado o País dele”, diz Mantega.

Na opinião do ministro da Fazenda, se hoje os países emergentes estão convivendo com mais inflação é porque também tem apresentado um crescimento maior do que os países ricos.

Mantega diz que o grande responsável por essa inflação de commodities é essa alta liquidez no mundo inteiro, o que ele chamou de tsunami econômico, em referência a um artigo publicado recentemente no New York Times.

Retrocede Brasil (5): monopolios e obrigatoriedade nos combustiveis

Insondáveis são os desígnios de deus e as escolhas do governo.
Pelo menos no que se refere a combustíveis.
Quando o petróleo aumentou barbaramente, pela primeira vez, o governo brasileiro, em lugar de fazer um ajuste pelos preços e tratar da recomposição da matriz energética como todo mundo, escolheu fazer dívida externa para continuar importando petróleo. Enfim, pode-se até dizer que foi uma medida "racional", pois sobravam petrodólares e as taxas de juros eram inferiores à inflação da OCDE. Deu no que deu: a dívida saltou três vezes e colocou-nos no buraco quando os juros aumentaram acima mesmo dos níveis históricos reais do capitalismo.
Ao mesmo tempo o governo iniciou um alucinante programa de substiuição de combustível, introduzindo o álcool subsidiado na matriz de combustíveis, financiando a despesa com mais inflação, que todos pagamos, mesmo aqueles que não usavam carro a álcool, ou qualquer tipo de automóvel.
Passou, com os prejuízos de sempre: fim de subsídios, virtual desaparecimento dos motores a álcool e real sucateamento de quem tinha carros idem. Passou, mas a conta ficou.
Depois, o governo (não este) fez a coisa certa: liberalizou o setor e o álcool passou a ser ofertado em bases de mercado, assim cada um podia escolher. A tecnologia (de mercado, não do governo) avançou para fornecer motores híbridos, o que me parece muito bem.
Até que veio um governo maluco e se sentiu ecológico bastante para sair patrocinando combustível de cana mundo afora. Never mind que não deveria ser nossa vocação sair plantando cana para fornecer etanol ao mundo inteiro, e que no meio do caminho o mesmo governo resolveu sujar a nossa matriz energética patrocinando uma aventura petrolífera estatal sem pé nem cabeça.
Enfim, o problema não está em diversificar a matriz. O problema está em que este governo, e um pouco todos os governos, são autoritários e intrusivos a ponto de tornar obrigatória qualquer solução que poderia ser encontrada pelo mercado num sistema de regulação aberta, permissiva, voluntária.
Não, assim como o governo decreta o monopólio da Petrobras para isto e mais aquilo, ele decreta quanto álcool se deve agregar à gasolina, etc. Quando a dinãmica do mercado muda, o consumidor fica à mercê dos monopólios setoriais e das regulações compulsórias.
Mas essa ainda é tradicional. Mais estúpida ainda foi a medida do governo que determinou a inclusão do biodiesel no diesel petróleo, em percentuais obrigatórios na escala do tempo, sem JAMAIS ter perguntado se o mercado se adequaria a isto. Ou seja, sem jamais levar em conta preços relativos, base produtiva, etc.
Agregando à estupidez, o governo pretendeu que o biodiesel seria feito de mamonas assassinas, quero dizer, de óleo de mamona feito por famílias de camponeses pobres do Nordeste. Juntar matriz energética com problema social é a coisa mais estúpida que existe, mas este governo é capaz de fazer estupidezes desse tamanho sem jamais se perguntar o que uma coisa tem a ver com a outra.
Deu no que deu: as mamonas assassinas não se materializaram -- e isso depois de muito dinheiro gasto em projetos e fábricas simplesmente inviáveis e o biodiesel é mesmo feito sem nenhuma mamona assassina, só com a prosaica soja.
Pouca gente neste Brasil, menos ainda jornalistas, se pergunta quanto dinheiro nosso foi gasto em projetos estúpidos do governo.
Parece que eles não se corrigem: tornam tudo obrigatório (no petróleo ainda é o caso): o monopólio de fato da Petrobras é responsável em parte pelo atual desabastecimento e alta dos preços.
Pelo menos tornaram mais aberta a obrigatoriedade do álcool anidro na gasolina: não resolve mas amplia as possibilidades de abastecimento. Sempre me surpreenderei com burrices de certos governos.
Paulo Roberto de Almeida

Governo autoriza menos álcool na mistura para gasolina não subir
Martha Beck, Luiza Damé e Monica Tavares
O Globo, 29/04/2011

O governo deu ontem o primeiro passo numa política permanente para garantir o abastecimento de etanol no mercado e minimizar os impactos da entressafra da cana-de-açúcar nos preços dos combustíveis. Uma medida provisória (MP) que será publicada no Diário Oficial dá à Agência Nacional do Petróleo (ANP) o poder de regular os estoques de etanol no país. Além disso, o texto amplia a margem com a qual a equipe econômica pode trabalhar se tiver que mexer na mistura do álcool anidro na gasolina. Esse intervalo, que hoje varia entre 20% a 25%, passou para 18% a 25%.

Segundo técnicos da área econômica, a ideia no futuro é estabelecer uma regra pela qual o percentual sempre seja reduzido nos primeiros meses de cada ano, quando a oferta do produto cai em razão da entressafra. O novo intervalo torna a calibragem da mistura mais fácil e dá mais margem de manobra ao governo caso os preços do álcool disparem.

No caso da ANP, regular os estoques significará ter mais controle sobre o setor sucroalcooleiro e monitorar indicadores como níveis de produção, estoques e fluxo de comercialização das usinas. A agência será responsável pela comercialização, estocagem, exportação e importação de etanol. Para isso, o etanol ganhou o status de combustível.

Numa ação mais emergencial, o governo também estuda mexer imediatamente na mistura do álcool à gasolina em razão da disparada dos preços do etanol no mercado doméstico, que está pressionando a inflação. Neste caso, no entanto, o martelo ainda não foi batido. Como a entressafra da cana já está chegando ao fim, o etanol tende a cair ao longo das próximas semanas e reduzir as pressões sobre os combustíveis.

— Tudo vai depender do comportamento dos preços — disse um técnico, lembrando que, em alguns dias da semana passada, o álcool chegou a ficar mais caro que a gasolina nas refinarias.

Isso porque, além de estar praticamente sem reserva de etanol, as pequenas distribuidoras tiveram dificuldades de logística para entregar o produto. O comportamento, explicam os técnicos, também foi influenciado pelos feriados da Semana Santa, quando a maioria dos postos elevou pedidos. As distribuidoras, que não dispunham de álcool adicional, subiram preços.

Embora o governo costume alterar a mistura do álcool à gasolina para se preparar para a entressafra, a ação não faz parte de uma política. O ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, disse que tem observado abusos nos preços dos combustíveis no país:

— Há nove anos o preço da gasolina não tem aumento nas refinarias. Mas ela passa pelas distribuidoras, pelos postos, e o mercado é livre para estabelecer os preços.

Retrocede Brasil (4): um Banco Central "bonzinho"

Surpresa: o governo encomendou uma inflação de 10% para você, este ano, caro leitor.
Bem, não é tão surpresa assim.
Desde quando a inflação estava controlada, graças aos esforços do BC, colocando-a abaixo da meta em 2007, o Conselho Monetário Nacional poderia ter recuado as metas de inflação para 2008 e 2009 para patamares mais condizentes com a média internacional, de aproximadamente 3% ao ano (inferior a isso nas economias avançadas e um pouco acima nos países emergentes).
Mas não: a despeito da insistência do presidente do BC, o atual ministro da Fazenda, que já o era naquela época, insistiu em manter a meta de 4,5% por um prazo indefinido (lembro-me, aliás, que ele sempre foi amigo da inflação, achando que uma taxa em torno de 5% era "normal" num país como o Brasil).
Depois, em ano eleitoral, forçaram o BC a manter inalterada a taxa durante dois trimestres seguidos, a despeito da nítida aceleração da atividade econômica, em função do enorme aumento do crédito propiciado pelas políticas do governo em várias áreas, num keynesianismo exacerbado que só se viu por aqui.
Mais recentemente, o BC inventou um tal figura de "medidas macroprudenciais" para não ter de aplicar a velha receita do aumento de juros para combater a inflação.
Deu no que deu: a inflação fugiu ao controle e tudo por culpa do governo: nos últimos anos, a oferta monetária tem se elevado consistentemente muito acima do crescimento do PIB, geralmente o dobro da taxa.
Agora, rompeu-se a confiança dos agentes econômicos, do público em geral, nas políticas do governo.
Aguardem: a inflação vai disparar, e não adianta presidenta (ugh!) e ministros dizerem que não vão tolerar a inflação. Esta sempre vai poder dizer: vocês vão ter de me aguentar!
E nós temos de aguentar ministros incompetentes...
Paulo Roberto de Almeida

Surpresa na Ata do Copom
Editorial - O Estado de S.Paulo
29 de abril de 2011

A inflação sobe, há muita insegurança em relação aos preços, o quadro internacional é incerto e, diante disso, o aumento de juros deverá ser "suficientemente prolongado", segundo a ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada nessa quinta-feira pelo Banco Central (BC). A mensagem é tranquilizadora pelo menos quanto a um ponto: a inflação é reconhecida como um problema preocupante e a autoridade monetária está disposta a elevar os juros até o risco ser controlado. Mas permanece uma dúvida. Segundo o Copom, a situação piorou desde sua reunião anterior, no começo do mês passado. Se esse é o caso, por que a taxa básica subiu apenas 0,25 ponto porcentual, metade da elevação aprovada nas sessões de janeiro e de março?

O aumento de 0,25 ponto foi decidido por 5 votos contra 2. Os diretores vencidos propuseram 0,5 ponto de ajuste. Segundo a ata, a maioria dos membros levou em conta as medidas tomadas anteriormente - elevações de juros e restrições ao crédito. Essas medidas, segundo o julgamento predominante, ainda levariam algum tempo para produzir efeitos sensíveis.

O argumento seria muito razoável, em outras circunstâncias. O efeito de medidas monetárias normalmente só aparece depois de transcorrido algum tempo. Mas o cenário examinado pelos membros do Copom antes da votação continha alguns detalhes especialmente inquietantes. Não houve, desde a reunião anterior, apenas continuação de pressões inflacionárias. Houve uma piora sensível das condições de formação dos preços. A insegurança no quadro internacional foi agravada pela instabilidade no Norte da África e no Oriente Médio. As cotações das commodities continuaram instáveis. A contaminação dos demais preços, no mercado interno, prosseguiu. A demanda no mercado brasileiro continuou - e continua - elevada, pondo em xeque a capacidade de oferta. As medidas tomadas até agora, reconheceram os diretores do BC, foram insuficientes para impedir a expansão do crédito, embora possam ter contido sua velocidade. O nível de ocupação da capacidade instalada continua muito alto nas indústrias - um importante sinal de alerta.

Mesmo com sua linguagem arrevesada, a ata é bastante clara quanto aos motivos de preocupação. Todos os cenários prospectivos - montados pelos técnicos do BC ou por economistas do setor privado - continuam muito ruins. Segundo o texto, o Copom reconhece um "nível de incerteza acima do usual" no ambiente econômico. Além disso, identifica "riscos" para a "concretização de um cenário em que a inflação convirja tempestivamente para o valor central da meta". Ou, traduzindo para linguagem corrente: pelos dados atuais, vai ser muito difícil baixar a inflação para a taxa anual de 4,5% até o fim de 2012.

Em relação às contas públicas, a linguagem é um pouco menos diplomática do que tem sido há vários meses. Segundo a ata, os membros do Copom tomam como pressuposto o alcance das metas fiscais fixadas para este e para o próximo ano, sem ajustes (isto é, sem os descontos usados nos últimos anos para melhorar o resultado). As atas têm registrado normalmente esse pressuposto. É uma espécie de política de boa vizinhança entre o BC e o Ministério da Fazenda. Mas desta vez há alguns acréscimos.

A ata menciona, além da expansão do crédito, os "impulsos fiscais aplicados na economia nos últimos trimestres" como uma das causas da demanda elevada. Além disso, acentua a importância, para a contenção dos preços, da efetiva geração dos superávits primários prometidos pelo Executivo. Há um processo de consolidação fiscal, acrescentam os autores da ata, cautelosamente. Mas o dado importante é o lembrete: o controle da inflação depende também da arrumação das contas do governo.

O quadro apresentado é tao preocupante quanto poderia ser qualquer cenário realista montado por um técnico independente. Além disso, os dirigentes do BC reconhecem, segundo o texto, a gravidade do problema. Falta conferir se agirão de acordo com esse reconhecimento, executando uma política de rigor proporcional à gravidade do desafio.

Retrocede Brasil (3): recuo da defesa zoofitossanitaria

Esses russos bem que podiam temperar a carne com um pouco de vodka, para matar assim todos aqueles bichinhos que insistem em ficar grudados em nossas carnes bovinas tão saudáveis.
Mas, pode ter também o problema dos pesticidas, que não podem ser diluidos em álcool, embora se possa disfarçar o gosto (se o cliente ficar suficientemente bêbado, digamos...)

Missão russa mantém restrições a frigoríficos
DCI, 29/04/2011

Depois de ter realizado inspeção em 29 unidades frigoríficas brasileiras produtoras de carne bovina, suína, de aves e de industrializados, a Rússia, um dos maiores mercados compradores das proteínas brasileiras, manteve sua política restritiva com relação às exportações de carnes nacionais. Segundo o Serviço Federal de Fiscalização Veterinária e Fitossanitária da Rússia, Rosselkhoznadzor, por meio de comunicado do dia 19 de abril, nas duas semanas nas quais os peritos estiveram no País (a missão terminou no último dia 18), 13 unidades continuam proibidas de vender à Rússia e aos membros da União Aduaneira (Belarus e Casaquistão); oito unidades foram auditadas pela primeira vez e não foram habilitadas e restrições temporárias foram propostas a todos os locais inspecionados. Em 2010, conforme o serviço russo, eram 27 unidades com restrições temporárias e 14 embargadas. No documento, o serviço veterinário russo fez severas críticas ao sistema de inspeção da qualidade da carne brasileira. "A inspeção mostrou que a qualidade do sistema que assegura a conformidade do processamento da carne brasileira às normas de segurança russa decaiu nos últimos anos", revelou a nota. "A inspeção também mostrou que as matérias-primas e produtos acabados não foram completamente testados nas fábricas para sua conformidade com os padrões russos. (...) Testes de monitoramento do mercúrio, pesticidas, dioxinas e os radionuclídeos não foram testados nas unidades durante os últimos três anos", mencionou.

Retrocede Brasil (2): uma energia teimosa, insiste em ficar ficar cara

Parece que tudo complota contra o Brasil, ou contra o governo. Apenas porque este insiste em taxar excessivamente a energia, fator essencial de produção, essas empresas ingratas resolvem sair do Brasil. Impatrióticas!
Eu olho minha conta de luz e constato que dos 150 reais (aproximadamente) que gasto mensalmente, menos de 50 reais correspondem, propriamente, ao custo da eletricidade, sendo todo o resto distribuido entre distribuição e taxas e impostos diversos.
Deve ser por isso...
Paulo Roberto de Almeida

Energia cara tira indústrias do Brasil
Karla Mendes, de Brasília,
O Estado de S. Paulo, 23/04/2011

Multinacionais reclamam também dos tributos e da concorrência chinesa e preferem investir em outros países, como o Uruguai

O alto custo da energia elétrica, a invasão de produtos chineses e os incentivos tributários concedidos por outros países estão deixando o Brasil em segundo plano na rota de investimentos de empresas multinacionais.

Estudo feito pelo Estado, com fontes do mercado, mostra que fábricas de setores eletrointensivos - em que o custo da energia é um dos principais componentes no preço final do produto, como alumínio, siderurgia, petroquímico e papel e celulose - estão fechando unidades no País ou migrando para outros locais por causa da perda de competitividade no mercado brasileiro.

Nesse contexto, enquadram-se pelo menos sete companhias. A Rio Tinto Alcan está em negociações "avançadas" para instalar a maior fábrica de alumínio do mundo no Paraguai, com investimentos entre US$ 3,5 bilhões e US$ 4 bilhões para produzir 674 mil toneladas de alumínio por ano. A Braskem vai inaugurar unidade de soda cáustica no México e faz prospecção em outros países, como Peru e Estados Unidos.

A Stora Enso, que abrirá em breve fábrica de celulose no Uruguai, admite que, apesar de a produtividade brasileira ser o dobro, essa vantagem é "desperdiçada" pela incidência de impostos. No caso da produção de papel, o preço do produto fabricado no Paraná é mais alto que os similares feitos no exterior.

A siderúrgica Gerdau Usiba, na região metropolitana de Salvador (BA), esteve paralisada por causa do alto custo da energia. A Valesul Alumínio, em Santa Cruz (RJ), também ficou fechada pelo mesmo motivo.

Nesse setor, aliás, a situação é crítica. A Novelis fechou fábrica em Aratu (BA) e, segundo fontes, pode migrar para o Paraguai. A Companhia Brasileira de Alumínio (CBA), do Grupo Votorantim, está prestes a abrir filial em Trinidad e Tobago.

Importação. Nesse segmento, a avalanche de produtos chineses é outra ameaça. A importação de alumínio chinês, que até 2009 ficou num patamar de 17 mil toneladas, saltou para 77 mil toneladas em 2010, que é o nível mínimo projetado para 2011, de acordo com Eduardo Spalding, coordenador da Comissão de Energia da Associação Brasileira do Alumínio (Abal). "A China, daqui a dez anos, vai ter produção de alumínio igual à do resto do mundo todo somado", adverte.

Outra agravante, segundo ele, é a importação de produtos acabados, sem possibilidade de agregar valor à mercadoria no País. Nesse ritmo, avalia Spalding, o Brasil passará da condição de exportador para importador de alumínio em 2012.

"No Brasil, se nada for feito, o risco é de o setor sumir. Temos vários exemplos de países em que a indústria do alumínio fechou em dois anos. Há mais de 25 anos, nenhuma nova fábrica se instala no Brasil. O que tivemos foi expansão das já existentes e, mesmo assim, parou tudo", diz Spalding.

Retrocede Brasil (1): uma geologia perversa, contra o governo

Em algum momento de um passado não muito distante, a propaganda governamental -- sempre desperdiçando nosso dinheiro com coisas inúteis -- cunhou a expressão "Avança Brasil", para identificar um programa que supostamente iria contribuir para a superação de nossas conhecidas deficiências de infraestrutura e outras carências detectáveis a olhos nus (sem qualquer maledicência aqui).
Para que não se acuse este blog de qualquer prevenção contra o atual bloco no poder, saliente-se que o programa era da mais pura extração tucana, ou seja, vinha do ancien régime neoliberal, antes que os gloriosos representantes gramscianos da soberania nacional assumissem o governo e passassem a implementar grandiosos programas de desenvolvimento nacional, trocando a antiga subserviência ao FMI e ao Consenso de Washington por uma defesa consistente das políticas nacionais de crescimento e prosperidade, na nova linha da soberania escancarada.

Pois bem, em paródia ao antigo programa, vou agora criar uma série que chamarei de "Retrocede Brasil", ilustrando, com referências diretas e exemplos práticos, tudo o que acontece neste maravilhoso país, que não avança mais apenas por causa de incontáveis complôs estrangeiros, surpresas do acaso, problemas naturais e outras causas não identificadas mas que nunca tem a vem, jamais, com a ineficiência da máquina administrativa ou as chamadas "falhas de governo". Sempre a culpa é de algum fator externo, uma variável exógena, fora do controle dos nossos preclaros dirigentes, sempre tão cuidadosos com nossos recursos e ativos.

A inflação? Ora, o mundo inteiro tem inflação.
Problemas com obras? Culpe-se a geologia, como evidenciado abaixo.
Vejam bem, se este exemplo inaugural não é genial: a geologia é uma ciência cujo escala de tempo se situa, mais propriamente, em milhões de anos, não em horas ou dias. Ou seja, consistência, ou não, do solo é algo que qualquer geólogo amador, qualquer engenheiro primeiroanista pode constatar quase a olho nú, com base em dados elementares. A tal de "consistência não uniforme do solo" numa obra pública não se formou nos meses (ou anos) que vão do planejamento à execução da obra, mas deve ter sido formada ao longo das centenas de milhares de anos que correspondem à acomodação das camadas geológicas naquele lugar.
O governo pensa que somos idiotas?
O Ministério de Integração Nacional pensa que somos néscios?
Prêmio "Ignorância Estúpida" (desculpem a redundância) para esta "explicação" imbecil do governo.
Paulo Roberto de Almeida

Governo culpa solo por desabamento em obra do PAC
No Estadão Online, 28/04/2011

O Ministério de Integração Nacional distribuiu no final da tarde desta quinta-feira, 28, nota oficial em que explica o desabamento do teto do túnel Cuncas I, que faz parte das obras de transposição do rio São Francisco, entre a Paraíba e o Ceará. De acordo com o governo, a queda do teto se deveu “à consistência não uniforme do solo encontrado naquele ponto”. O túnel integra as obras do PAC no Nordeste.

“Nas escavações de túneis em solo, serviço executado naquele trecho, podem ocorrer imprevistos geológicos que induzem a ruptura de teto, acarretando, assim, o desprendimento da terra. Nesses casos, geralmente é feito o preenchimento do solo da região afetada e, em seguida, retomado o serviço de escavação”.