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domingo, 12 de janeiro de 2014

Nao existe inseguranca alimentar; existe incompetencia de governos - Roberto Rodrigues

O ex-ministro Roberto Rodrigues, um dos melhores, talvez o melhor do primeiro governo Lula (que não o merecia, pois tinha um outro ministério, dito do Desenvolvimento Agrário, dominado pelo MST, que era a própria anti-agricultura), escreve um artigo que leva por título "Segurança Alimentar", e vai publicado nesse jornaleco digital que é uma contradição nos termos: Carta Capital, mas é contra o capital.
A suposição é a de que existam preocupações com a segurança alimentar, no Brasil ou no mundo.
Pois bem, todo o seu artigo é uma prova cabal de que não existe insegurança alimentar: apenas falta de investimentos e incompetência na distribuição.
Qualquer governo decente, e minimamente competente, pode importar alimentos se por acaso houver alguma quebra de safra, por algum motivo qualquer.
Ninguém, repito NINGUÉM, está condenado a passar fome, hoje em dia, em qualquer canto do universo, por falta de alimento. Se existem pessoas sem comida, é porque não dispõem de recursos para comprar alimentos -- mas esse é um problema de renda, não da produção de alimentos -- ou porque o governo não consegue fazer chegar os alimentos em zonas recuadas.
Pois bem, conviria que ele trocasse o título do artigo, para algo como:
Como o Brasil e os EUA poderão alimentar toda a população excedentária do mundo nas próximas décadas.
É disso que se trata.
Paulo Roberto de Almeida 


Segurança alimentar
Por Roberto Rodrigues
Carta Capital, 06/01/2014

Produção Há uma série de reformas necessárias para aumentar a podutividade da agropecuária

Um dos temas mais debatidos no mundo inteiro é o da segurança alimentar. Todo dia cientistas, políticos, técnicos, empresários, estudiosos e curiosos se debruçam sobre a expectativa de que, em 2050, seremos 9 bilhões de habitantes no planeta, exigindo uma produção de alimentos 70% maior do que a atual para a fome não aumentar. Mas a demanda dos alimentos segue a crescer acima da oferta, seja por a renda per capita aumentar mais nos países onde se expande mais a população, seja por falta de políticas públicas globais ou nacionais em favor de maior produção, seja por adversidades climáticas nos países produtores, seja porque 2050 ainda está muito longe...

Ao pensar nisso, a OCDE e a FAO lançaram um sério estudo há pouco mais de um ano, avaliando o que acontecerá em 2020, "amanhã". E concluíram que até lá, isto é, em dez anos, a oferta global de alimentos tem de aumentar 20%. E que, para isso, o Brasil precisa incrementar sua oferta em 40%. Por três motivos.

O primeiro é a nossa excelente Tecnologia tropical: nos últimos 20 anos, a áreaplantada com grãos no País cresceu 40%, enquanto a produção aumentou 220%. Novas Tecnologias permitiram maior produtividade por hectare plantado. Hoje cultivamos 52 milhões de hectares com todos os grãos. Tivéssemos a mesma produtividade de 20 anos atrás, seriam necessários mais 66 milhões de hectares para colher a safra deste ano. Em outras palavras, foram preservados 66 milhões de hectares de florestas ou cerrados, e isso não é promessa ou sonho: está feito.

Mais ainda: se tivéssemos hoje a mesma produtividade de cana-de-açúcar do começo do Pro-Àlcool, precisaríamos de mais 6 milhões de hectares de canaviais, além dos 8 milhões hoje cultivados, para produzir a safra atual. Assim, só com grãos e cana preservamos 72 milhões de hectares, número idêntico à área total cultivada no Brasil com todas as culturas, e que representa apenas 8,5% do território nacional. Ademais, o etanol da cana emite apenas 12% do gás carbônico emitido pela gasolina, mitigando o aquecimento global.

Fica claro que nossa agricultura é altamente sustentável, e o mundo sabe disso.

E não só a agricultura. Nos últimos 20 anos, nossa produção de carnes explodiu: 90% em bovina, 238% em suína e 458% em aves, reduzindo a área de pastagem, que tem sido substituída por soja, cana e florestas plantadas. Temos 7 milhões de hectares de florestas plantadas. E, é sempre bom lembrar, 61% do nosso território é coberto com florestas nativas do tempo de Adão e Eva. AEuropa tem menos de 1%.

Outras Tecnologias têm sido incorporadas, como as do Plano ABC (agricultura de baixo carbono), lançado pelo governo brasileiro e que dará ainda maior sustentabilidade à atividade, com programas super importantes, entre eles a integração Lavoura--Pecuária-Floresta, o plantio direto, a recuperação de pastagens degradadas, a fixação biológica de nitrogênio ao solo, o plantio de mais florestas.

O segundo fator que justifica a expectativa da OCDE é a disponibilidade de terras. Além de a agricultura ocupar apenas 8,5% da área total do País, a pecuária toma outros 20%. Estudos indicam que ao menos mais 85 milhões de hectares servem para a agricultura, o que assombra nossos concorrentes de fora, pois já somos os maiores exportadores de açúcar, do complexo soja, de suco de laranja, de carne bovina e de frangos, e de café. Que dirá, pensam eles, se ocuparmos toda essa área vocacionada para o setor rural. E tratam de criar todas as dificuldades nas organizações mundiais de comércio, em que defendem subsídios e outras formas de proteção a seus produtores, inibindo a abertura comercial que nos permitiria crescer.

Não é para menos. Em 2002, as exportações do agro brasileiro somaram 25 bilhões de dólares. Dez anos depois, em 2012, chegaram a 96 bilhões. Em 2013, ultrapassaremos os 100 bilhões de dólares. Mais ainda: o saldo comercial do setor tem crescido sistematicamente e chega a 79 bilhões de dólares em 2012, enquanto o saldo total do País foi de 19 bilhões. Em 2013, o saldo agro deverá superar 85 bilhões, ante 2 bilhões do total. Isso significa que o agronegócio tem salvado a balança comercial, sistematicamente. Bom lembrar ainda que ele representa 23% do PIB e gera mais de um terço de todos os empregos formais.

Infelizmente, daqueles 87 milhões de hectares potencialmente agricultáveis, pouco mais de 15 milhões poderão ser hoje incorporados à área plantada. O resto está fechado à atividade por legislações existentes: são parques nacionais, estaduais e municipais, terras para indígenas, para quilombolas, reservas legais e áreas de preservação permanente, entre outras.

E, por último, o terceiro fator a justificar a expectativa da OCDE/FAO de crescimento de 40% na oferta de alimentos até 2020 é a alta qualidade de nossos produtores rurais. Jovens e bem preparados tecnicamente, eles usam instrumentos cada vez mais modernos de gestão comercial, financeira, fiscal e tributária, de recursos humanos e ambiental. Estão ligados em tempo real às informações de mercado ou de clima, tomando decisões acertadas sobre o que, como e quando produzir, levando o País a sucessivos recordes de produção.

E é também verdade que planos de governo bem estruturados no setor de crédito rural, na área de mecanização (o Moderfrota permitiu a recomposição da frota motomecanizada, completamente sucateada há pouco mais de dez anos) e os programas de suporte à agricultura familiar, têm sido relevantes nesses avanços.

Tudo isso nos leva à pergunta imediata: podemos então crescer os tais 40% imaginados?

Temos potencial para isso e até mais. Recente trabalho publicado pelo Departamento do Agronegócio da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Deagro-Fiesp), feito em parceria coma MBAgro, o Outlook2023, mostra esse potencial.

Segundo o estudo, a área de grãos, incluindo soja,milho, algodão (base pluma), arroz, feijão e trigo, deve crescer 18%, de 52 milhões de hectares em 2013 para 61,2 milhões em 2023, enquanto a produção aumentará 30%. Isso mostra que a forte expansão será por ganhos de produtividade, que deve ter um crescimento médio de 10% no período, resultando na preservação de mais 6,3 milhões de hectares. Já as pastagens passam a ocupar uma área cada vez mais restrita, liberando para a agricultura um total de 4,9 milhões de hectares e chegando, em 2023, a 177 milhões de hectares. A área agrícola, portanto, crescerá essencialmente sobre as pastagens, exigindo da pecuária de corte umsalto em termos de produtividade para assegurar a oferta brasileira.

As exportações de grãos aumentarão 61% em volume, as do complexo sucroal-cooleiro crescerão 21% e as de café, 19%, até 2023. Já as exportações de carnes devem crescer 23%. Em suma, ofertar mais 40% é factível.

Naturalmente, isso vai depender de políticas públicas. Aliás, uma política para o desenvolvimento sustentável do agro está pronta no Mapa, construída nas Câmaras Setoriais daquele ministério, nas quais o público e o privado se somaram por vários anos. O problema é implantar esse plano, pois os instrumentos estão dispersos entre vários outros ministérios, agências e empresas públicas federais e estaduais.

Precisamos mesmoéde uma estratégia de Estado para o agronegócio, que considere a questão da logística e da inf raestrutu-ra, maior gargalo para o setor, e que começa a sair do papel com as concessões de rodovias, ferrovias, portos e aeroportos. Para ficar adequada, todavia, ao menos mais cinco anos serão necessários, o que significa ainda um longo tormento aos produtores das regiões mais distantes.

Outro tema importante é a política comercial. Cerca de 40% do comércio mundial de alimentos ocorre em acordos bilaterais ou áreas de livre comércio e o Brasil não tem avançado nisso. Há em andamento um projeto de acordo bilateral entre os Estados Unidos e aUnião Européia, para os quais vai uma terça parte de tudo que exportamos do agro. Se esse acordo acontecer, as tarifas entre eles diminuirão e fatalmente perderemos mercados. Temos de fazer acordos com eles e com outros grandes compradores, inclusive em busca de abertura comercial para exportarmos produtos com maior valor agregado e não apenas commodities.

Política de renda é também essencial, especialmente para os pequenos produtores. O seguro rural, existente desde 2003, cobre apenas 6% da área agricultada, insignificante. E fundamental avançar célere nesse assunto, assim como na modernização do crédito rural.

Legislações precisam ser reformadas, como a trabalhista, a ambiental, a tributária e fiscal, a de armazenagem, a de defesa sanitária e outras muitas que inibem saltos maiores do agro. Uma nova molécula de defensivos agrícolas demora até sete anos para ser aprovada, enquanto, nos países desenvolvidos, demora um ano ou pouco mais. Com isso, não avançamos mais no quesito sustentabilidade.


Em resumo, esse magnífico setor pode contribuir bastante para o progresso brasileiro, gerando empregos, renda e excedentes exportáveis. Mas para isso precisamos de uma estratégia ampla, que, uma vez montada, permitirá ao Brasil ser o campeão mundial da segurança alimentar, base indispensável para a conquista definitiva da paz universal.

segunda-feira, 4 de junho de 2012

E os agricultores que nao tem barba? - Roberto Rodrigues

Apenas uma maneira de dizer. O artigo do ex-ministro da Agricultura do primeiro governo Lula -- o único ministro decente, ou seja, docente, que se podia localizar naquele governo -- faz um retrato dos dilemas atuais do setor agrícola. Ele só não diz que os investimentos no setor, nos últimos anos, cresceram mais para quem não produz (sob a responsabilidade do ministério-inimigo do (Sub)Desenvolvimento Agrário), do que para os agricultores de mercado.
Vale conferir...
Paulo Roberto de Almeida

Barbas de molho


* Roberto Rodrigues
Folha de S.Paulo, 4/06/2012
Com o dólar a R$ 2 a agricultura ganha ou perde?
De maneira geral ganha, porque boa parte de nossa produção rural -a de exportação- tem seus preços estabelecidos em dólar. Ora, como o produtor brasileiro recebe em reais, quanto mais valorizado o dólar, tanto mais reais ele receberá por unidade produzida. Em outras palavras, ganha mais.
Mas há um risco embutido nessa questão: os agricultores estão, exatamente neste momento, comprando seus Link no Glossário insumos para o plantio da safra de verão.
Grande parte deles é importada, e os preços já subiram em dólar, como é o caso das matérias-primas para fertilizantes. Portanto, os custos de produção vão aumentar.
Qual é o risco? É comprar insumos com o dólar valorizado e vender a produção com o real valorizado: isso seria ruim, provocaria o descasamento da renda -como já aconteceu outras vezes no passado-, levando ao endividamento os produtores que estiverem muito alavancados.
Felizmente, a situação das dívidas rurais hoje é muito menor do que em anos anteriores, como em 2004, por exemplo, quando aconteceu um movimento parecido com esse. Os últimos três anos permitiram certa capitalização do campo, e os produtores estão usando mais capital próprio e menos crédito.
Mas mesmo que os preços em dólar não caiam muito e o dólar não desvalorize, a tendência para a safra 2012/2013 é de redução das margens em relação aos últimos anos.
A isso se soma outra incerteza: a crise europeia. Ela está durando mais do que se imaginava há alguns meses e se agravando em outros países além da Grécia. Com isso, especuladores caíram fora do mercado agrícola e trataram de procurar outros ativos de menor risco, como o próprio dólar. E este também se valoriza com isso.
Mas pior será se a crise atingir a economia de países emergentes, causando retração do comércio e queda da demanda por alimentos. Não é muito provável que isso aconteça, mas é possível. E, se acontecer, os preços das Link no Glossário commodities agrícolas cairão de verdade, em dólar, logicamente, e isso teria reflexos negativos na renda rural de produtores do mundo todo, inclusive aqui.
É bem verdade que os preços estão em patamares tão acima das médias históricas que precisam cair bastante para voltar a níveis que não cubram os custos de produção no Brasil.
Dessa forma, os riscos não são muito grandes. Mas o nível de incerteza é tanto neste mundo conturbado, a agricultura é por si mesma uma atividade tão arriscada que pode acontecer uma conjunção de fatores negativos, do tipo:
1) Os custos de produção sobem devido ao dólar valorizado;
2) O dólar desvaloriza na hora de vender a safra;
3) Os preços globais caem em dólar por causa da crise europeia aprofundada, reduzindo o consumo e a demanda por Link no Glossário commodities agrícolas em geral.
Seria muito azar se isso tudo acontecesse, de modo que a probabilidade dessa conjunção é pequena. E seguramente não teremos La Niña na próxima safra. E como o nível de endividamento não é mais o que foi no passado, o setor está bem mais capitalizado.
Juntando tudo, não há razão para ser pessimista, ainda.
Mas que as margens vão diminuir, vão. Então, também não há razão para nenhuma euforia.
É tempo de cautela e caldo de galinha, de não dar o passo maior que a perna, de não fazer muita onda.
Ou, como se fala na roça: é tempo de botar as barbas de molho.
Até porque, os vetos colocados no projeto da Câmara dos Deputados sobre o Link no Glossário Código Florestal -e mais a medida provisória editada para completar a legislação pertinente ao tema- criaram alguma incerteza a mais.
A medida provisória já está em vigor, mas poderá ser alterada ainda neste ano no Congresso, uma mecânica legislativa complexa.
Mas, eventualmente, a legislação definitiva pode até demorar um pouco mais, sem falar em outras possibilidades já aventadas, como Adin, mandado de segurança etc.
Mais molho para as barbas...
Roberto Rodrigues, 69, é embaixador especial da Link no Glossário FAO para o cooperativismo, coordenador do Centro de Agronegócio da FGV e professor de Economia Rural da Unesp - Jaboticabal. Escreve aos sábados, a cada 14 dias, nesta coluna. rr.ceres@uol.com.br

domingo, 15 de agosto de 2010

Commodities: previsoes por quem entende do assunto

Alta sustentada?
Roberto Rodrigues
Folha de S. Paulo, Sábado, 14 de agosto de 2010

Há razões para justificar o aumento das commodities, mas não há garantia de que os preços se sustentem

Os preços agrícolas tiveram forte alta nos mercados globais nas últimas semanas. Dois dos maiores especialistas na área, Alexandre Mendonça de Barros e André Pessoa, acreditam que existem fundamentos para isso.
A Rússia foi afetada pela maior seca em 150 anos, o que provocou uma forte queda na produção e na oferta de trigo naquele país, bem como em outros do Leste Europeu e também na Austrália.
Com isso, os preços do trigo subiram, puxando os da soja, do milho e do arroz, seja porque esses produtos são alternativos à alimentação humana, seja para a fabricação de rações. É preciso lembrar que 70% do trigo mundial é produzido no hemisfério Norte. Por outro lado, estamos vivendo uma onda do La Niña, fenômeno meteorológico que traz seca ao hemisfério Sul, notadamente Argentina, Paraguai e Estados do sul brasileiro. A última vez que isso aconteceu com gravidade foi em 2005, com violenta quebra nas produções de soja e de milho do Rio Grande do Sul, principalmente.
Essa expectativa, somada à redução da safra russa, já sinaliza eventual queda na oferta de grãos. Por outro lado, os estoques mundiais de soja estão acima da média, mas os dos Estados Unidos estão baixos. Como esse país é o maior supridor de soja da China neste momento, as atenções estão concentradas na safra americana: ainda é cedo para saber a produção de lá, mas há uma possibilidade de quebra também.
Outro fator da elevação dos preços é a desvalorização do dólar, ainda rescaldo da crise financeira: é um pouco da ressaca retardada dos bilhões de dólares injetados nos bancos centrais. Com essa perda de valor, os gestores financeiros dos fundos se defendem apostando nas commodities agrícolas, dadas as questões referidas, de uma possível oferta menor com demanda aquecida, especialmente nos países em desenvolvimento.
No entanto, não existe nenhuma certeza de que a escassez se concretize. Até meados de setembro teremos clareza dos dados, porque a safra americana estará consolidada. Mesmo assim, os preços atuais oferecem uma oportunidade aos produtores brasileiros de se posicionarem, pelo menos sobre parte da safra futura. Os preços do açúcar, do café e da laranja estão também subindo, mas agora por razões estruturais mais sólidas.
No caso do açúcar, o inverno seco deste ano levará a uma quebra da safra de cana no Sudeste e no Centro-Oeste do Brasil, com consequências na produção de 2011, com a má brotação das socas. Serão dois anos consecutivos de safras menores do que se esperava no começo de 2010.
Esse fato já evidente é ampliado pelo recorrente problema de logística para a exportação do açúcar: dezenas de navios ficam ao largo do porto de Santos esperando semanas para serem carregados, pagando um demurrage que encarece ainda mais os preços do produto.
O café, depois de anos de preços aviltados, abaixo do custo (mesma situação da laranja) finalmente teve alta, devido à falta de cafés finos e de estoques mundiais menores.
Mas a recuperação de preços do café e da laranja não é suficiente para cobrir as perdas de anos anteriores. E, se o La Niña afetar o Sudeste durante a florada de outubro, aí a safra do ano que vem será pequena, e os preços serão ainda mais remuneradores para quem produzir bem. A valorização dos grãos (trigo, soja, milho) ainda não chegou nas proteínas animais, mas, se persistir a alta, chegará também, inflando os custos de produção, com reflexos nos preços finais das carnes bovina, suína e de frango, além do leite.
Em suma, há razões concretas para justificar o aumento dos preços das commodities, e essas razões são potencializadas pela especulação dos fundos que se defendem da perda do valor da moeda dólar. Mas não há, até agora, garantia de que os atuais valores acima da média histórica sejam sustentados.
Assim mesmo, essa alta pode ajudar o produtor brasileiro, já informado das condições do Plano de Safra, a definir o que e quanto deverá plantar, inclusive com hedge de parte da produção futura.

ROBERTO RODRIGUES, 67, coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, presidente do Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp e professor do Departamento de Economia Rural da Unesp -Jaboticabal, foi ministro da Agricultura (governo Lula). Escreve aos sábados, a cada 15 dias, nesta coluna.