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segunda-feira, 20 de dezembro de 2021

Uma entrevista (não concedida) a revista A Granja sobre a política agrícola europeia, em 2001, e a postura brasileira

"Descobri" mais um texto inédito em meus arquivos. Como o assunto permanece de atualidade, permito-me divulgar agora seu teor: 

836. “O Brasil e o Comércio Agrícola Mundial”, Washington, 5 dezembro 2001, 9 p. Elementos de informação para eventual entrevista à revista A Granja (agranja.com), de Porto Alegre, não concedida por motivo de restrições à expressão livre do pensamento por parte do Itamaraty (“lei da mordaça”). 


O Brasil e o Comércio Agrícola Mundial

 

Paulo Roberto de Almeida

Washington, 5/12/2001

 

1.     Primeiramente, gostaria que o Sr. fizesse uma análise do agronegócio brasileiro sob a ótica de seu livro Os Primeiros Anos do Século XXI: Relações Internacionais Contemporâneas. (discorrer sobre esse enfoque) 

No início do século XXI, o agronegócio internacional não tem mais nada a ver com a concepção tradicional das atividades rurais ou agrícolas, tais como descritas pelos economistas fisiocratas do século XVIII e conhecidas durante grande parte do século XIX e XX. O agronegócio hoje representa o que se poderia chamar de “grane indústria” e talvez ele seja ainda mais do que isso, pois se trata de um complexo de atividades que engloba a mobilização de insumos altamente especializados no setor propriamente produtivo, mas que mobiliza também serviços qualificados de organização e distribuição do chamado novo terciário (pesquisa e desenvolvimento, assistência técnica, mercados futuros, marketing), ademais dos serviços mais tradicionais (transportes, comunicações, publicidade), que, tomados em sua totalidade nada ficam a dever às mais sofisticadas atividades produtivas da atualidade (na informática ou na biotecnologia, por exemplo, aos quais ele aliás faz apelo).

O agronegócio brasileiro está seguindo plenamente essas tendências internacionais e, em função de nossa excepcional dotação de fatores e capacidade gerencial e espírito moderno dos agricultores brasileiros, deve converter-se num dos setores de ponta da economia brasileiro, sendo já responsável por uma das principais fontes de geração de renda e inovação tecnológica. 

 

2.     Nesse mundo globalizado, quais as expectativas e desafios do agribusiness nacional nesse ano que se inicia (2002)?  

Continuar incessantemente a marcha da contínua qualificação técnica do aparato produtivo, vincular-se de maneira estreita aos sistemas de informação e comercialização no plano mundial e desenvolver nossos próprios vetores de “poder” no campo do agribusiness internacional, o que significa capacidade de influenciar as tendências do mercado e antecipar-se às suas transformações. Isto significa superar as fronteiras exclusivamente nacionais do agronegócio e continuar no sentido de uma inserção cada vez mais dinâmica na economia internacional. O Brasil tem todas as condições para ser o que se chama de “major player” nos mercados agrícolas internacionais e não devemos renunciar a esse papel 

 

3.     Na sua opinião, o Brasil é competitivo na área agrícola?

Plenamente, ainda que diversos fatores restritivos ainda atuem negativamente em nossa inserção competitiva. Esses fatores podem ser intrínsecos (como a necessidade de continuar fazendo progressos em termos de pesquisa agrícola, biotecnológica, de incorporação de técnicas informatizadas na organização produtiva e de comercialização), mas são também e principalmente de natureza extrínseca à atividade propriamente agrícola. Esses problemas estão em grande medida associados ao chamado “custo Brasil”, estando vinculados a uma estrutura tributária ineficiente ou anticompetitiva, custos elevados nos setores de transportes e armazenagem, e sobretudo no que se refere ao custo do capital, isto é, recursos financeiros para produção e comercialização (que são ainda bastante elevados no Brasil, comparativamente a outros países).

Não devemos, contudo, cair na “facilidade” dos programas subvencionados para a produção ou comercialização externa dos produtos do agronegócio. Trata-se de um custo que a sociedade brasileira claramente não pode suportar e que, ademais, vai no sentido contrário ao das tendências internacionais, que caminham para a eliminação desses fatores distorcivos do comércio internacional e do próprio processo de formação de preços no plano interno.

 

4.     O que nos falta, falando em mercado internacional, é puramente posicionamento político e/ou marketing?

Ambos, mas cada um deve ser apreciado à sua justa medida. O marketing depende apenas de nós, de nosso esforço interno, da capacidade de nossos líderes empresariais e da incorporação de know-how que nossos jovens agricultores podem e devem aprender tanto dentro como fora do País e colocar a serviço do agronegócio nacional.

O posicionamento político no plano externo é bem mais complicado, pois estamos em face de competidores poderosos – como são os Estados Unidos e a União Européia – que mobilizam recursos imensos para proteger de maneira escandalosa, quase obcena, seus setores agrícolas, ao mesmo tempo em que concedem generosos subsídios à produção interna e às exportações.

 

5.     Podemos afirmar que o protecionismo agrícola, dos Estados Unidos e da Europa, é o nosso principal obstáculo em relação ao comércio exterior?

Ele é certamente um obstáculo poderoso, mas devemos considerar igualmente barreiras técnicas (normas e regulações fito e zoosanitárias) que podem ser utilizadas de maneira indevida, bem como o próprio complexo financeiro-mercadológico dos mercados externos de commodities e outros produtos processados de origem agrícola. As medidas de apoio interno são provavelmente ainda mais danosas do que o protecionismo estrito senso. Mas certamente que devemos combater com toda a força o protecionismo dos países mais avançados. 

 

6.     Como podemos nos armar e articular para derrubar estas barreiras impostas pelos ditos países ricos?

Realizando articulações entre grupos de países, construindo alianças com parceiros ostentando interesses similares, mas sendo também extremamente vocais em todo e qualquer encontro internacional: não podemos deixar passar uma ocasião sequer de protestar, reivindicar, reclamar, expor os fatos, mostrar a crueza dos números relativos a subsídios maciços ou denunciar a arbitrariedade de determinadas “normas técnicas”. A toda e qualquer viagem no exterior, a toda e qualquer visita de dirigente estrangeiro neste país devemos mostrar nossa realidade: uma economia agrícola pujante, que se vê injustamente já obstaculizada por barreiras e subsídios ilegais e imorais nos países desenvolvidos.

 

7.     A ALCA e a OMC podem ser um caminho real e concreto para o governo brasileiro abrir novos mercados para o nosso produto?

A Alca no plano regional, a OMC no plano multilateral, certamente podem constituir vias concretas de abertura de mercados para os produtos brasileiros, assim como de criação de novas oportunidades de projeção estratégica internacional. O agronegócio brasileiro não pode mais ser pensado apenas em escala nacional, ele deve projetar-se externamente e constituir marcas e redes de distribuição no plano internacional. Esta é a condição de seu crescimento contínuo.

 

8.     No seu ponto de vista, acordos internacionais realmente serão eficientes para a economia brasileira ou nunca deixaremos de atender totalmente as ‘normas’ dos países ricos?

Os acordos internacionais são basicamente normas reguladoras de acesso a mercados e de imposição de regras de concorrência. Eles são a única garantia de que o comércio exterior não será obstaculizado por regras arbitrárias e protecionistas impostas pelos mais poderosos. Devemos tornar-nos negociadores internacionais mais eficientes, com a incorporação de economistas agrícolas e de representantes dos produtores em todas as delegações de interesse regional e multilateral que comparecem em foros negociadores.

 

9.     Quando se trata de mercado internacional porque toda e qualquer negociação é tão complicada?

Estamos falando de um número muito grande de países, ostentando níveis diversos de desenvolvimento, com estruturas econômicas e produtivas desiguais e sobretudo com instituições políticas e sociais respondendo a diferentes prioridades. No caso da agricultura, ela ainda desperta sentimentos e reações que não são os mesmos dos fatores associados à indústria ou serviços tradicionais, daí o número elevado de disposições especiais que regulam esse setor nos diferentes países que participam do mercado internacional. Devemos, portanto, esforçar-nos para demonstrar que não existe, na atualidade, riscos de ruptura alimentar e que a agricultura deve ser tratada como uma atividade como qualquer outra, submetida às regras sadias da concorrência e aberta aos talentos e competitividade.

 

10.  Qual é o peso, a participação, atual da agricultura brasileira lá fora?

Bastante importante em diversos mercados setoriais, mas ainda pouco relevante em termos de definição do equilíbrio de mercados globais, por falta de condições financeiras, pela ausência de multinacionais brasileiras no setor etc. O panorama está mudando e certamente nossa “hegemonia” setorial (no complexo soja, por exemplo) poderá vir a constituir uma poderosa alavanca de participação brasileira nos mercados agrícolas mundiais.

 

11.  Qual a sua análise sobre os efeitos do custo Brasil nas exportações brasileiras?

Extremamente danoso de forma geral, mas mais importante no setor industrial do que para a área agrícola que, ainda assim, consegue ser competitiva, graças a uma boa dotação de fatores e à capacidade superior de nossos homens de negócios do “campo”. Na verdade, o custo Brasil depende inteiramente de nós mesmos e, portanto, pode ser resolvido com base num consenso político em torno das reformas necessárias.

 

12.  E a crise da Argentina, de que maneira poderá refletir no mercado agrícola brasileiro?

Trata-se de uma influência marginal, já que ambos os países são ofertantes e bons competidores em diversos setores do agribusiness mundial. A Argentina certamente conseguirá superar seus atuais problemas de competitividade e o Brasil, corrigido o custo Brasil, também tem todas as condições de ser, como já é em parte, uma grande potência agrícola internacional.

 

13.  O Mercosul está cada vez mais perdendo espaço e força?

Não, ele atravessa uma crise temporária que não deriva de seus fundamentos ou mecanismos internos. Trata-se de uma crise dos países membros, não do próprio Mercosul. Uma vez superada essa crise, ele voltará a desempenhar um papel importantíssimo na estratégia brasileira de inserção internacional.

 

14.  Existe futuro para o bloco econômico do Sul tendo em vista a crise da Argentina, nosso principal parceiro comercial?

Certamente, estou plenamente confiante em que a crise será superada e que o Mercosul voltará a representar um fator estratégico na capacidade externa de barganha, sobretudo na área do agronegócio. A Argentina continuará sendo um dos principais parceiros comerciais do Brasil qualquer que seja o destino ou evolução ulterior do Mercosul.

 

15.  É recente no Brasil a tomada de decisões que desafiam as grandes potências, como a da quebra de patentes dos remédios do coquetel anti-aids  e  a imposição da inclusão do agronegócio nas negociações da ALCA. Estamos abandonando a cultura da submissão?

Não quebramos nenhuma patente ainda, mas apenas indicamos que estaríamos dispostos a coibir o abuso de poder econômico na área patentária, eventualmente utilizando o mecanismo do licenciamento compulsório. Certamente que na última conferência ministerial da OMC, em Doha, fomos um dos mais ativos participantes, como aliás já tinha sido o caso em ocasiões anteriores. Desta vez, ocorreu uma combinação de fatores favoráveis, entre eles uma coordenação adequada no plano interno e externo, o dinamismo dos nossos negociadores, o que permitiu alcançar resultados altamente satisfatórios… em termos de “promessas”. Não nos iludamos, porém, os grandes combates ainda estão por vir e não será fácil lograrmos alcançar nossos objetivos em termos de resultados negociadores.

Nunca houve submissão na diplomacia econômica brasileira, mas havia a percepção de que podíamos ser mais ativos. Esse ativismo tornou-se mais transparente nos últimos meses e anos. Cabe destacar o papel da diplomacia presidencial, mas igualmente a alta qualidade profissional, intelectual, e a competência técnica de nossos negociadores, tanto do Itamaraty, como dos ministérios setoriais. A mobilização da chamada sociedade civil também foi importante para alcançarmos uma “massa crítica” que nos fez defender de maneira tenaz nossos objetivos negociais.

 

quarta-feira, 11 de novembro de 2020

Webinar Joe Biden e o Agronegócio Brasileiro - Insper (19/11, 18hs)

Evento  Joe Biden e o Agronegócio Brasileiro

Webinar, 19/11/2020 - 18h00

A confirmação da eleição de Joe Biden nos EUA traz grandes impactos para o futuro do agronegócio brasileiro, das relações dos EUA e do Brasil com a China e de questões ligadas ao desmatamento na Amazônia e à mudança do clima, temas que foram destacados na campanha do novo presidente. Está em pauta também a retomada de sistemas multilaterais baseados em regras comuns na área de comércio, saúde pública, clima, finanças e outros, além de novas formas de diálogo com a China.

Insper Agro Global juntamente com o Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI) promove o webinar Joe Biden e o Agronegócio Brasileiro. O encontro faz parte do Ciclo de Debates Insper Agro Global 2020, patrocinado pelo Itaú-BBA.

Para esse debate, convidamos Alexandre Mendonça de Barros, Sócio-consultor da MB Agro, Chris Garman, Diretor de Américas do Eurasia Group, Monica de Bolle, membro do conselho consultivo internacional do CEBRI e professora da Johns Hopkins University, e Roberta Braga, Vice Diretora de América Latina do Atlantic Council. A abertura institucional e mediação será conduzida por Julia Dias Leite, Diretora-presidente do CEBRI, e Marcos Jank, Insper Agro Global e Núcleo Agro do Cebri.

Webinars Insper – O Insper acredita que informação de qualidade, baseada em evidência, é fundamental para tomada de decisão e para o enfrentamento aos desafios impostos pela chegada do novo coronavírus. Neste sentido, a escola promove uma série de eventos on-line, gratuitos, para divulgar conteúdos relevantes como panorama econômico, aspectos trabalhistas, ferramentas jurídicas aplicáveis, desafios para startups, liderança e gestão de equipes remotas, gestão do capital de giro em tempos de crise, impactos nas cadeias de suprimento e o impacto do novo coronavírus em empresas familiares. Confira a programação completa e assista, na íntegra, aos eventos que já passaram pelo nosso canal!

https://www.insper.edu.br/agenda-de-eventos/joe-biden-agronegocio-brasileiro/ 

 

terça-feira, 1 de setembro de 2020

Superávit comercial, a despeito de queda nos volumes; agricultura salvou a lavoura (OESP)


Balança comercial registra superávit de US$ 6,6 bilhões no melhor mês de agosto em 32 anos
Apesar da alta, tanto a média diária das importações quando das exportações caíram na comparação com 2019; agricultura foi o setor com os melhores resultados no mês
Idiana Tomazelli, O Estado de S.Paulo
01 de setembro de 2020 | 16h51

BRASÍLIA - Com uma queda nas importações devido à pandemia da covid-19, a balança comercial brasileira registrou um superávit recorde em agosto. As exportações superaram as importações em US$ 6,609 bilhões, o maior resultado para o mês na série iniciada em 1989, ou seja, é o maior superávit em 32 anos. 
O superávit acontece quando as exportações superam as importações. Quando ocorre o contrário, é registrado déficit comercial. No ano, resultado positivo já soma US$ 36,594 bilhões.
O dado de agosto ficou dentro do intervalo das projeções de analistas consultados pelo Projeções Broadcast, que previam saldo positivo de US$ 3 bilhões a US$ 11,497 bilhões. A mediana indicava superávit de US$ 6,80 bilhões em agosto.
Apesar do recorde, tanto as exportações quanto as importações registraram quedas na média diária em comparação a agosto de 2019. As compras vindas do exterior, porém, desabaram em maior magnitude, o que fez a balança pender para o lado positivo.
Em valores absolutos, as exportações somaram US$ 17,741 bilhões em agosto, enquanto as importações ficaram em US$ 11,133 bilhões.
A média diária das importações caiu 25,1% em relação a agosto do ano passado, com tombo de 59,5% na indústria extrativa e queda de 23,8% na indústria de transformação. A média diária de importações da agropecuária caiu 0,8%, sempre na comparação com agosto de 2019.
Já no caso das exportações, a queda foi de 5,5%, puxada por indústria extrativa (-15,4%) e indústria de transformação (-7,7%). A agricultura teve alta de 14,6% na média diária. O mês de agosto de 2019 teve um dia útil a mais, observou o Ministério da Economia.
No oitavo mês de 2019, o saldo positivo da balança havia ficado em US$ 4,1 bilhões. O Ministério da Economia divulgou ainda os superávits de US$ 1,75 bilhão na 4ª semana de agosto (24 a 30) e de US$ 73 milhões na 5ª semana (31).

Revisão
As novas projeções do governo para a balança comercial, que devem ser anunciadas no início de outubro, podem apontar quedas menores nas exportações e importações, disse hoje o subsecretário de Inteligência e Estatísticas de Comércio Exterior do Ministério da Economia, Herlon Brandão.
No início de julho, o governo anunciou uma estimativa de saldo positivo da balança em US$ 55,4 bilhões, um aumento de 15,2% em relação ao superávit de 2019. Porém, os cálculos apontavam que o resultado seria fruto de quedas de 10% nas exportações e de 17% nas importações.
Segundo Brandão, nos primeiros oito meses do ano houve uma queda menor das exportações e importações do que o inicialmente projetado. “Temos notado comportamento da exportação muito robusto, com volumes crescendo e batendo recordes”, disse.
No acumulado do ano, a queda na média diária de exportações foi de 6,6%, enquanto o recuo nas importações foi de 12,3%, sempre na comparação com igual período de 2019. O saldo até agora é positivo em US$ 36,594 bilhões.
“É possível que os resultados, as quedas de importação e exportação, sejam menores que projetamos”, afirmou o subsecretário.
Segundo ele, o governo fará as revisões ao longo do mês de setembro para divulgar no fim do terceiro trimestre.


sábado, 21 de dezembro de 2019

Agronegócio - crescimento, geopolítica e fortes emoções - Marcos Jank (OESP)

Agronegócio - crescimento, geopolítica e fortes emoções

Jornal “O Estado de S. Paulo”, Opinião, 21/12/2019.

Marcos S. Jank (*)

Nossas perspectivas são extraordinárias, apesar do endosso dos EUA e China ao “comércio administrado” no agronegócio.

A vida dos leitores de bola de cristal está cada vez mais complicada. No caso do agronegócio, a confluência de uma guerra comercial entre os Estados Unidos e a China, uma terrível epidemia de peste suína africana na Ásia, a retomada de pesadas taxações sobre as exportações no novo governo argentino e, fechando o ano, o anúncio de um mega-acordo EUA-China jogaram por terra as profecias e os cenários dos oráculos dos últimos três anos.

Definitivamente, entramos numa nova “era das incertezas”, marcada por volatilidades, rupturas e o retorno brutal da geopolítica no comércio mundial.

Assim que assumiu, em 2017, Donald Trump decidiu taxar a entrada de produtos chineses nos EUA e a China retaliou fazendo o mesmo contra a entrada de produtos americanos. Por isso o Brasil foi beneficiado com importações crescentes da China no agronegócio, que favoreceram principalmente nossa soja.

De 2016 a 2018 as exportações agrícolas do Brasil para a China saltaram de US$ 21 bilhões para US$ 35 bilhões, enquanto as dos americanos caíram de US$ 25 bilhões para só US$ 13 bilhões. O Brasil tornou-se o maior produtor e exportador de soja do mundo e a China adquire 80% da nossa exportação.

Em meados de 2018 uma epidemia de peste suína atingiu a China e vários países do Sudeste Asiático. Os produtores venderam seus animais no mercado antes de serem obrigados a enterrá-los, incluindo suas matrizes. A China responde por metade da produção mundial de suínos.

O volume perdido de suínos na China é maior que todo o mercado mundial de carne porcina. Isso fez a China reduzir em 12% (11 milhões de toneladas) suas importações de soja, usada basicamente para produzir rações de aves e suínos. Perdemos na soja, mas estamos exportando mais carnes bovinas, suínas e de aves para o gigante asiático. Os produtores brasileiros de carne comemoram, mas os consumidores reclamam dos preços mais altos no mercado interno. A China levará pelo menos três anos para se recuperar do desastre da peste suína.

A boa notícia é que vai haver uma mudança forçada no modelo de produção de suínos na China, substituindo a criação de fundo de quintal por granjas modernas e controladas, onde os animais são menos susceptíveis a doenças. Como a produção comercial em granjas consome mais ração – leia-se muito mais soja e milho –, no longo prazo isso beneficia o Brasil e outros fornecedores.

O último capítulo dessa série de surpresas deu-se na semana passada, com o intempestivo anúncio de Trump de que os EUA e a China teriam fechado a primeira fase de um acordo histórico que pretende acabar com a guerra comercial. Segundo o que foi divulgado, as exportações agro dos EUA para a China saltariam de US$ 14 bilhões para US$ 56 bilhões em apenas dois anos, um aumento enorme. É pouco provável que essa meta seja cumprida, até porque os agricultores americanos acabam de perder quase 50 milhões de toneladas de grãos numa safra marcada por problemas sucessivos de excesso de chuva e frio. O tal acordo agrícola parece ser apenas Trump jogando para a plateia interna em ano pré-eleitoral, no caso, os agricultores do Meio-Oeste americano.

Mas se o acordo se concretizar em algum momento, o montante ali previsto certamente impactará negativamente as nossas exportações de soja, algodão e carnes para a China. Os EUA são, de longe, nosso maior concorrente no mercado mundial.

Por isso se torna fundamental verificar se esse acordo propõe apenas a volta da normalidade competitiva, dentro das regras do mercado, ou se serão criados mecanismos “privilegiados” de comércio entre China e EUA, como, por exemplo, compras dirigidas realizadas por tradings estatais chinesas. É preciso analisar também se o acordo será compatível com as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC), recentemente debilitada pela recusa dos EUA de nomear juízes para o seu Órgão de Apelação.

Em resumo, entramos numa era sombria dominada pela geopolítica e pelo “comércio administrado”, com o endosso das duas maiores economias do planeta. Mas ainda assim acredito que nossas perspectivas continuam sendo extraordinárias no agro. Se a China substituir as compras do Brasil em favor dos EUA, isso fatalmente nos abrirá espaço em outros mercados importantes do Sul e Sudeste da Ásia e do Oriente Médio, por conta do aumento de renda da pujante classe média asiática. Isso sem contar o potencial de longo prazo da África e da Índia, com o seu imenso crescimento populacional.

Minha tese é que ninguém segura o Brasil nas commodities que não dependem tanto de políticas governamentais (aqui e no exterior), como soja, milho, algodão e celulose, em que a oferta e a demanda se ajustam mais facilmente via mercado.

O maior exemplo desse ajuste é a incrível expansão da oferta de milho e algodão na segunda safra, plantada logo após a soja no mesmo ano agrícola, que já cobre 14 milhões de hectares no País. Ela nos levou ao segundo lugar nas exportações dessas duas commodities em 2019, assustando os EUA, país que ocupa a primeira posição no ranking mundial. 

Em 2019 o milho vai superar a secular indústria de cana-de-açúcar no ranking dos principais produtos exportados pelo Brasil. E o algodão vem um pouco mais atrás, voando baixo. Isso sem contar a turbinada que virá com os investimentos que estão sendo feitos na logística de transporte do País e o grande potencial da integração lavoura-pecuária que ainda temos.

Por outro lado, produtos como açúcar, etanol e carnes demandam esforços consistentes de acesso aos mercados e políticas públicas específicas aqui dentro para conseguirem crescer no exterior.

Em suma, no agronegócio vivemos tempos de grande potencial de crescimento da demanda mundial e de expansão sustentável da oferta no País. Mas são tempos turbulentos e imprevisíveis, marcados por crises frequentes, instabilidades geopolíticas e guerra comercial. E tempos turbulentos exigem estratégia, organização e liderança.

sexta-feira, 13 de setembro de 2019

Os desafios globais do agronegócio - Marcos Jank

Amigos,
Segue abaixo artigo publicado hoje no jornal Valor Econômico.

Aproveito para informá-los sobre o lançamento do Insper Agro Global, o novo centro de estudos estratégicos, desenho de políticas e formação de pessoas que vai analisar os grandes vetores de transformação e a dinâmica da inserção internacional do Brasil no agronegócio mundial.
Para saber mais:

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Os desafios globais do agronegócio

Jornal “Valor Econômico”, Opinião, 13/09/2019

Marcos S. Jank (*)

Temas relacionados com saúde, sanidade, sustentabilidade e geopolítica vão dominar a demanda global por alimentos.

Crescimento da produtividade, tecnologias tropicais, competição em escala global, produtores motivados e migração interna explicam o indiscutível êxito do agronegócio brasileiro. Sem grandes esforços ou apoio de acordos internacionais de relevância para o setor, em menos de 20 anos quintuplicamos as nossas exportações nesse setor, atingindo US$ 102 bilhões para mais de 200 países.

Mas a moleza acabou. No passado, importadores vinham buscar nossas commodities nos portos brasileiros porque oferecíamos volumes crescentes a preços competitivos. Mas os próximos 20 anos não serão tão fáceis. A guerra hegemônica EUA-China vai ser longa e penosa para o mundo, podendo ajudar ou prejudicar o Brasil em função dos dois elefantes estarem brigando ou dançando.

Nesses tempos turbulentos, tudo indica que a demanda será dirigida pela geopolítica do “comércio administrado”, e não pelas vantagens comparativas à la David Ricardo. Ocorre que a demanda potencial do mundo é praticamente infinita, mas apenas uma pequena parte dela é acessível para as nossas exportações por conta de inúmeras barreiras tarifárias e não-tarifárias - técnicas, sanitárias, burocráticas, etc.

Em um momento que a geopolítica retorna com vigor, nosso primeiro desafio será construir demandas consistentes para nossos produtos. Temos de mapear nossos interesses de curto e longo prazo nas principais macrorregiões do mundo emergente. O holofote de hoje está no Leste e Sudeste da Ásia e no Oriente Médio, regiões que somam 2,6 bilhões de habitantes e 54% das exportações brasileiras no agro. Porém o nosso futuro está depositado no Sul da Ásia (leia-se o subcontinente indiano) e na África - na soma, 3 bilhões de habitantes em rápido crescimento demográfico, mas que hoje respondem por apenas 12% das nossas exportações.

Temos de aprender a lidar com a China, esse nosso casamento inevitável de longo prazo, que demanda um relacionamento estratégico e equilibrado que gere maior diversificação e valor adicionado no comércio. Os chineses já respondem por um terço das nossas exportações do agro, porém altamente concentradas na soja em grãos.

Ao mesmo tempo, com prudência e equidistância, temos de intensificar e dar um novo rumo para as relações com os Estados Unidos, perdidas após duas décadas de desconfianças mútuas. No agro, os EUA são nosso maior concorrente, mas também um dos importadores mais promissores e sofisticados do planeta (mais de US$ 180 bilhões em importações agro, crescendo cerca de 7% ao ano), ao lado da China (US$ 178 bilhões em importações, crescendo cerca de 12% ao ano) e da União Europeia, com crescimento de 4% ao ano. Mas para os EUA exportamos apenas US$ 7 bilhões no agronegócio, quatro vezes menos que a nossa exportação de soja em grão para a China. Há muito por fazer!

Finalmente temos de avançar com o projeto de abertura comercial brasileira, ao mesmo tempo que retomamos as negociações comerciais que ampliariam, mesmo que tardiamente, a nossa integração das cadeias de valor do planeta.

Nosso segundo grande desafio global decorre das ações e repercussões das nossas políticas em três grandes áreas do agro: Saúde, Sanidade e Sustentabilidade, que chamaremos de 3S. Os maiores problemas de saúde e nutrição são a combinação perversa da falta de alimentos (820 milhões passam fome no mundo) com a má nutrição - 2,1 bilhões de pessoas com obesidade e doenças crônicas. Na sanidade vemos a eclosão de graves doenças e o desafio da eficiência do sistema sanitário. Na sustentabilidade os temas mais importantes para o Brasil são uso da terra e de insumos, desmatamento, clima e biodiversidade.

Nas últimas semanas o mundo inteiro comenta as queimadas que estão ocorrendo na região amazônica. Queimadas ilegais nessa época seca do ano não são fato novo e decorrem basicamente de pobreza e da ilegalidade, numa região que abriga imensas florestas e 20 milhões de habitantes com baixa renda e pouco controle. Mas a percepção de quem lê o mundo por meio de redes sociais é que o Brasil perdeu o controle e o maior culpado seria a agricultura moderna, o que é falso. Décadas de esforço de redução de desmatamento, ganhos de produtividade e a vigência de uma das leis florestais mais rigorosas do mundo não impediram a rápida destruição de imagem que está ocorrendo neste momento, com riscos de afetar o comércio e as negociações internacionais do agro.

Ao mesmo tempo, o açúcar é atacado pelos seus danos potenciais à saúde, gerando uma discussão em escala global que propõe de rotulagens a taxações explícitas. A pecuária bovina é apontada entre as principais causadoras das mudanças climáticas, em função do uso da terra e da eructação dos ruminantes. Doenças como gripe aviária e peste suína africana afetaram vastas regiões do hemisfério oriental e da América do Norte, provocando queda de consumo. Críticas ao uso de defensivos, antibióticos e transgênicos tornaram-se lugar-comum nos países mais ricos.

Não cabe neste texto discutir o quanto de verdade, inverdade ou exagero existe em cada exemplo acima. Num mundo digital e profundamente interconectado, o país que ocupa a terceira posição entre os maiores exportadores agrícolas do planeta precisa gerenciar as percepções que se formam sobre a sua pauta exportadora, sejam elas verdadeiras ou não.

No tema da geopolítica dos alimentos é fundamental construir visões estratégicas de longo prazo com base em estudos detalhados e montar uma estrutura de negociação em cada frente relevante.

Quanto à percepção sobre os 3S (Saúde, Sanidade e Sustentabilidade) é necessário contar com bons dados, presença qualificada e uma sólida estratégia de representação e diálogo no exterior.

Esses foram os principais fatores que motivaram a criação do Insper Agro Global, um centro que analisará temas complexos da agenda internacional do agronegócio desenvolvendo estudos estratégicos, debates qualificados, apoio no desenho de políticas e formação de pessoas.

Alguns dizem que o Brasil é o melhor produtor do planeta. Outros dizem que é o mais injustiçado, porque fez muito e pouca gente acredita. Certamente somos mais temidos do que admirados. Mas reputação não é o que achamos de nós mesmos, mas sim o que nossos parceiros e interlocutores pensam da gente, mesmo que altamente influenciados por mídias sociais.

Comparando com outros grandes exportadores, nossa maior falha não está nas políticas e ações de campo, mas sim na nossa incapacidade de se fazer presente no exterior, ouvindo, entendendo e dialogando com nossos clientes e consumidores nas diferentes regiões que atuamos.

O ponto de partida é uma melhor capacidade de coordenação do governo, setor privado, pesquisa e sociedade civil no Brasil. Se antes falávamos em oferta e produtividade, hoje é preciso pensar em demanda dirigida pela geopolítica e pelas múltiplas percepções dos nossos clientes, sejam elas verídicas ou não.

terça-feira, 4 de junho de 2019

Itamaraty usa dados errados para defender agronegócio - Observatório do Clima

Ao final, matéria sobre a postura do chanceler brasileiro: 


Observatório do Clima, 03 - junho - 2019
Itamaraty usa dados errados para defender agro brasileiro
Agromitômetro analisa nota preparada pela chancelaria para subsidiar diplomatas no exterior e detecta distorções, falácias, erros factuais e referências elogiosas a políticas que o governo Bolsonaro está desmontando
·        
O chanceler Ernesto Araújo nega o aquecimento da Terra

DO OC – O Ministério das Relações Exteriores preparou uma nota contendo informações sobre desmatamento e agronegócio. O objetivo é subsidiar diplomatas que precisam responder aos crescentes questionamentos feitos no exterior à política ambiental do governo Bolsonaro.

A nota, à qual o OC teve acesso, tenta vender a sustentabilidade do agronegócio brasileiro usando uma série de dados errados, distorções e meias-verdades. Além disso, várias das políticas às quais o documento se refere, que supostamente afiançariam a sustentabilidade da produção brasileira, vêm sendo abandonadas ou ativamente desconstruídas pelo governo de Jair Bolsonaro. Um exemplo são as políticas de clima, que a nota canta em prosa e verso, mas que o chanceler Ernesto Araújo acusa de serem uma armação globalista e o ministro Ricardo Salles, do Meio Ambiente, considera “secundárias”.
O desmonte das instituições ambientais brasileiras pelo novo governo foi denunciado por oito dos nove ex-ministros do Meio Ambiente vivos e será objeto de apuração pelo TCU (Tribunal de Contas da União), que acatou um pedido do Ministério Público na semana passada. Governos estrangeiros, investidores e organismos multilaterais vêm demonstrando preocupação. No fim de abril, 607 cientistas europeus e duas organizações indígenas pediram numa carta na revista Science que a União Europeia condicione qualquer acordo comercial com o Mercosul ao cumprimento de uma série de salvaguardas socioambientais.
Vários dos dados usados pelo Itamaraty já haviam sido checados pelo OC neste vídeo. Nesta edição do Agromitômetro, reproduzimos a nota da chancelaria (em itálico) e comentamos seus pontos problemáticos.
Leia a seguir.
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Informação sobre desmatamento
Na qualidade de reconhecida potência ambiental, com as maiores reservas de florestas tropicais, recursos genéticos e água potável do mundo, o País conseguiu, nas últimas décadas, conciliar políticas ambientais eficazes com uma pujante produção agrícola, o que lhe permitiu converter-se em parceiro comercial imprescindível para a segurança alimentar do planeta. O compromisso do Brasil com a conservação e o uso sustentável do meio ambiente coaduna-se plenamente com o direito ao desenvolvimento, fundamental para a geração de empregos e de renda no País, reconhecido no princípio 3 da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de 1992, além de perpassar toda a Agenda 2030 sobre Desenvolvimento Sustentável.
Atualmente, cerca de 66,3% do território brasileiro são dedicados à proteção e preservação da vegetação nativa (unidades de conservação, terras indígenas,assentamentos rurais, quilombolas, áreas militares, reserva legal nos imóveis rurais e terras devolutas)…
MENTIRA: 67% do território brasileiro está coberto com vegetação nativa. Isso é muito, muito diferente de estar “dedicado à proteção e preservação”. O Itamaraty põe na conta áreas de produção familiar, como terras quilombolas e assentamentos, áreas onde múltiplos usos (inclusive agricultura e mineração) são permitidos, como APAs (Áreas de Proteção Ambiental), terras atualmente com floresta mas que podem ser legalmente desmatadas em propriedades privadas e áreas devolutas – terras públicas sem destinação formal, concentradas na Amazônia. Mesmo que a abordagem fosse correta, dados do Projeto MapBiomas mostram que a proteção efetiva é bem menor: se computarmos o que tem se mantido preservado nos últimos 30 anos, é menos de 50%.
…proporção muito superior à da maioria dos países. 
MEIA-VERDADE: Há pelo menos 20 países que mantêm mais floresta como proporção do território que o Brasil, segundo dados do Banco Mundial que podem ser consultados neste link. A lista inclui o Suriname (98%), o Japão (68%), a Suécia (69%), a Finlândia (73%) e o Congo (67%).
Apenas 30,2% (257.002.000 hectares) das terras brasileiras são de uso agropecuário: 8% de pastagens nativas, 13,2% de pastagens plantadas, 7,8% de lavouras e 1,2% de florestas plantadas. O restante, 3,5% do território nacional, é ocupado por cidades, infraestrutura e outros.
MEIA-VERDADE: Segundo o cruzamento das bases de dados do Projeto MapBiomas e do Atlas da Agropecuária Brasileira, o Brasil tem 245 milhões de hectares em uso agropecuário, o que dá 29% do país – um pouco menos até do que sugerem os dados da nota do Itamaraty. Essa cifra sobe para 34% do território (295 milhões de hectares) quando se consideram os campos naturais no Pampa e no Pantanal, que podem ser usados para pastoreio. É uma cifra próxima da média mundial, que é de 37%. Cidades, água e infraestrutura cobrem cerca de 5% do país. O Brasil é o quarto maior produtor agrícola do planeta e tem a terceira área sob cultivo, atrás apenas de China e Estados Unidos – países mais extensos e mais populosos que o Brasil. A área agrícola per capita é maior no Brasil (1,17 hectare por habitante) do que nestes dois países (0,34 ha/habitante e 1 ha/habitante, respectivamente). A área agrícola do Brasil equivale a 1,5 vez a área agrícola de todos os países da Europa somados.
A título de comparação, os Estados Unidos utilizam 74,3% do seu território para a
agropecuária, 5,8% são ocupados por cidades e infraestrutura e 19,9% são dedicados à proteção e preservação da vegetação nativa. A produção agrícola dos países da União Europeia ocupa entre 45% e 65%; da China, 17,7%; e da Índia, 60,5%.
FALACIOSO: O documento do Itamaraty usa dois pesos e duas medidas para comparar o Brasil a outros países. Computa, por exemplo, as florestas nativas manejadas nos Estados Unidos na categoria “uso agropecuário”, enquanto as florestas nativas manejadas ou passíveis de manejo no Brasil, como as Florestas Nacionais, são consideradas “área de preservação”. Segundo dados do Departamento de Agricultura dos EUA, que podem ser consultados aqui, os EUA têm 61% do território sob áreas privadas para agropecuária e outros usos, mas 66% de áreas naturais e de vegetação nativa, quase tanto quanto o Brasil, e 30% do país está sob proteção (12% integral e 18% sob uso sustentável). Nos EUA, a área de cobertura florestal corresponde a 74% do que existia em 1850. Embora haja menos floresta lá do que aqui, a proporção de florestas mantidas lá é maior do que aqui. Pesquisadores da UFMG esmiuçaram a comparação.
Dessa forma, diferentemente do que se possa sugerir, o Brasil é um dos poucos países com capacidade concomitante para produzir e conservar, e sua experiência, suas lições e seus desafios informam a elaboração de políticas sustentáveis em outros países. Contribuem para o alcance desse difícil equilíbrio políticas ambientais especificamente voltadas para a conservação e o manejo sustentável de florestas, com forte participação do setor privado e com o emprego de tecnologias de ponta que permitem produção agropecuária de precisão com sustentabilidade.
O Código Florestal (Lei 12.651/2012) estabelece normas gerais sobre a proteção da vegetação nativa, incluindo Áreas de Preservação Permanente (APPs), e institui, entre outros, áreas de uso restrito e Reservas Legais dentro de propriedades rurais privadas, que variam de 20% (Mata Atlântica) a 80% (Amazônia) da propriedade. Com o Código Florestal, é possível fazer uma distinção entre “desmatamento legal”, que permite o desenvolvimento da agricultura, e “desmatamento ilegal”, que deve ser combatido nas Reservas Legais, nas APPs e nas áreas de proteção (unidades de conservação, terras indígenas), por meio de políticas de comando-e-controle, incluindo monitoramento, fiscalização e combate de vetores econômicos e pressões sociais que contribuem para possíveis devastações.
VERDADE, MAS…Com a anuência do governo Bolsonaro, a bancada ruralista no Congresso está tentando desmontar o Código Florestal. Uma Medida Provisória (867/2018) que trata da regulamentação de um dispositivo específico do código, o Programa de Regularização Ambiental (PRA), recebeu mais de 30 emendas na Câmara que desfiguram a aplicação da lei. A mais polêmica delas permite anistiar desmatamentos numa área equivalente à de Portugal ao alterar o entendimento sobre o percentual de proteção da reserva legal das propriedades. O projeto foi aprovado na Câmara e barrado no Senado, o que fará a MP perder a validade. Mas o presidente Bolsonaro disse nesta semana que editaria uma nova MP sobre o mesmo tema. O filho mais velho do presidente, Flávio, senador pelo PSL do Rio de Janeiro, foi além: propôs um projeto de lei que simplesmente extingue a reserva legal, o que legalizaria todo o desmatamento no Brasil.
O Código Florestal brasileiro permitiu o mais completo mapeamento florestal já realizado com a implantação do Cadastro Ambiental Rural (CAR). Trata-se de sistema inovador que permite o cruzamento de dados informados pelos proprietários rurais e dados de satélites sobre a cobertura florestal das propriedades. 
Segundo dados recentes do CAR, existem no País: 231.779.278 hectares de unidades de conservação (federais e estaduais), equivalentes a 27% do território nacional; e 117.057.916 hectares de terras indígenas em 600 unidades, ou seja, 13,7% das terras brasileiras. 
A combinação da extensão das unidades de conservação com a das terras indígenas resulta num total de 348.837.194 hectares de áreas consideradas “protegidas” segundo parâmetros das Nações Unidas, ou seja, 41% do País, equivalente à superfície de pelo menos 15 países europeus. Esse percentual é muito superior ao de países agroexportadores concorrentes do Brasil, como Austrália (que protege 19,2% do seu território), os Estados Unidos (13%) e o Canadá (9,7%).
MENTIRA: O CAR, que é autodeclaratório, não é fonte de dados de unidades de conservação e terras indígenas. O Cadastro Nacional de Unidades de Conservação aponta a existência de 158 milhões de hectares de UCs continentais no Brasil sendo que 18% apresentam sobreposições entre si. Além disso 11,4 milhões de hectares das áreas protegidas são sobreposição de Terras Indígenas e Unidades de Conservação.
A soma de todas as unidades de conservação continentais, incluindo a categoria APA, muito permissiva (80% do território do Distrito Federal está numa APA, por exemplo), e de todas as terras indígenas (que, de fato, representam 14% do território), perfaz 259 milhões de hectares, cerca de 30% do território nacional – não 41%, como a nota do Itamaraty. É um número não muito distante da média mundial, 25%, e menor do que o de países da América do Sul, como Bolívia e Venezuela (mais de 40% cada um) e de países desenvolvidos, como Alemanha (38%) e Grécia (35%). Além disso, as áreas protegidas estão mal distribuídas no país: a maior parte delas está na Amazônia, região que responde por apenas 10% da produção agropecuária. Retirando a Amazônia, apenas 5% do país – que concentra 90% da produção – está sob alguma forma de proteção.
Além do Código Florestal, existem diversas políticas agrícolas e ambientais que promovem o desenvolvimento de práticas sustentáveis e a conservação de florestas, incluindo o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento e Queimadas na Amazônia – PPCDAm , o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento e Queimadas no Cerrado –PPCerrado, para citar alguns. Existem, igualmente, diversas iniciativas de compromisso ambiental do setor privado, as quais serão descritas a seguir.
VERDADE ANTES DE BOLSONARO: O novo governo extinguiu a secretaria responsável pelo PPCDAm e pelo PPCerrado no Ministério do Meio Ambiente e até agora não disse se e como os planos terão continuidade. Não há mais nenhum órgão encarregado de formular as políticas de combate ao desmatamento – o ministro do Meio Ambiente já afirmou que o Ibama bastaria para cuidar disso. O mesmo ministro também lançou um ataque sem precedentes ao Sistema Nacional de Unidades de Conservação, anunciando a revisão de todas as 334 Unidades de Conservação Federais, que segundo ele foram criadas “sem critério” apesar de contarem com estudos técnicos específicos para a sua criação. Várias poderão ser reduzidas ou até desfeitas.
Participação do setor privado
No que diz respeito à agropecuária, a Lei 12.651/2012 impõe ao agricultor nacional a obrigação de manter um percentual de sua área com floresta ou outra vegetação nativa (Reserva Legal), às suas expensas, inclusive tributárias, sem recebimento de qualquer compensação pecuniária por isso. 
FALACIOSO: O Itamaraty dá a entender que os proprietários rurais deveriam receber dinheiro por cumprir a lei. Por essa lógica, então, nas cidades os proprietários de imóveis deveriam receber compensação para cumprir obrigações legais como manter recuo para calçada, observar o espaçamento entre imóveis ou manter áreas permeáveis, ou motoristas deveriam ser compensados por se ater aos limites de velocidade sem poder acelerar até o limite de seus veículos. Pela mesma moeda, os serviços ambientais prestados pelas florestas brasileiras em áreas públicas à agricultura, como manutenção do regime de chuvas, polinização e ciclagem de nutrientes do solo, avaliados em até US$ 700 por hectare por ano, deveriam ser em parte pagos pelos produtores, que os recebem como um subsídio hoje. Por fim as áreas destinadas a área de preservação permanente (APP) e reserva legal (RL) podem ser excluídas do cálculo do ITR (Imposto Territorial Rural), o principal encargo tributário incidente sobre a propriedade rural.
Na Amazônia, esse percentual de conservação obrigatório é de 80% da propriedade. Segundo cálculos do Serviço Florestal Brasileiro, cerca de 212.750.000 hectares são Reserva Legal em áreas privadas brasileiras, aproximadamente 25% do território (aproximadamente 100.000.000 dos quais são declarados como vegetação nativa em propriedades privadas, 12% do território brasileiro – uma área pouco inferior aos territórios de França, Espanha e Portugal combinados), enquanto 257.002.000 hectares são de uso agropecuário (30,2% do território). Portanto, em média, para cada 1 hectare plantado/cultivado, o setor privado tem a obrigação por lei de preservar ou recuperar 0,82 hectare de vegetação nativa.
NÃO É BEM ASSIM: Excluindo-se as sobreposições entre si e com terras indígenas e unidades de conservação de domínio público, as áreas privadas cadastradas no Brasil somam cerca de 365 milhões de hectares e possuem pouco menos de 190 milhões de hectares cobertos com vegetação nativa (primária ou secundária). É correto afirmar que para cada hectare ocupado por agropecuária no Brasil existe 0,74 hectare de vegetação nativa em propriedades privadas – não necessariamente protegidos, como mostram as taxas anuais de desmatamento no Brasil. Sem considerar a Amazônia, que responde por 10% da produção agropecuária brasileira, esse índice cai para 0,64. As áreas de reserva legal das propriedades privadas podem ser utilizadas para produção florestal, como acontece já em escala tanto na Amazônia quanto na caatinga.
Além da instituição das Reservas Legais, contribui para a proteção das florestas brasileiras o desenvolvimento da pesquisa agropecuária de ponta nas últimas décadas, com empresas como a Embrapa à frente, bem como o avanço de tecnologias que aumentaram a produtividade, contribuindo para intensificar a produção e evitar a incorporação de novas áreas à exploração agrícola. Esses avanços tecnológicos
permitiram que, nos últimos 40 anos, o crescimento da produção de grãos quintuplicasse, ao passo que a área ocupada pelas plantações permanece praticamente
estável.
MEIA-VERDADE: O desenvolvimento da pesquisa agropecuária tem sido a chave para o salto de produtividade da agricultura brasileira, que de fato poupou terras: de 1991 até 2017, a produção de grãos cresceu 312%, enquanto a área plantada cresceu 61%, sendo que parte importante da agricultura cresceu sobre áreas de pastagem. A área ocupada não “permaneceu estável”, como alega o Itamaraty, mas trata-se de um caso de sucesso. Quando se observa a área total ocupada pela agropecuária no Brasil, ela cresceu quase 40% entre 1985 e 2017. Isso decorre principalmente do fato de a pecuária permanecer com índices de produtividade média muito baixos. Segundo o projeto TerraClass, do Inpe e da Embrapa, 63% de toda a área desmatada na Amazônia dos anos 1980 até hoje está ocupada por pastagens em sua grande maioria de baixa produtividade.
À luz do que precede, é correto afirmar que os produtos agrícolas que são produzidos no País comportam a forte contrapartida de serviços ecossistêmicos prestados pela área conservada na Reserva Legal em cada propriedade. Devem ser reconhecidos como commodities que contribuem para a manutenção da biodiversidade, para a proteção de fontes de água potável e para a estabilidade do clima mundial.
MEIA-VERDADE: Embora parte do agronegócio, em especial entre os exportadores de grãos e celulose, venha cumprindo a legislação trabalhista e ambiental, com certificação e rastreabilidade, isso ainda está longe de ser a regra no setor. O Brasil ainda é o país que mais desmata no mundo em termos absolutos: são cerca de 15 mil quilômetros quadrados por ano. As reservas legais vêm sendo desmatadas: propriedades privadas perderam 20% da vegetação nativa nos últimos 30 anos, enquanto as áreas protegidas perderam 0,5%. Cerca de 70% das emissões brasileiras de gases de efeito estufa vêm da atividade agropecuária, seja diretamente, pelo metano emitido pelo rebanho bovino, seja indiretamente, pelo desmatamento. O Brasil é o sétimo maior emissor de gases de efeito estufa do planeta – seu agronegócio, se fosse um país, seria o oitavo maior emissor do mundo, à frente do Japão.
Atualmente, o Brasil concorre nas exportações de grãos com países desenvolvidos como os EstadosUnidos e a Austrália, mantendo grande parte de seu território intacto.
No que se refere à produção de soja, está vigente desde 2006 a Moratória Brasileira da Soja, iniciativa originalmente liderada pelo setor privado. 
MENTIRA: A moratória da soja começou devido a uma iniciativa do Greenpeace, que em 2006 denunciou que a soja que alimentava os frangos do McDonald’s vinha de desmatamento ilegal na Amazônia. O setor privado aderiu com relutância, por pressão dos compradores estrangeiros.
A iniciativa alcançou resultados consistentes, como a contenção a apenas 2% da expansão da produção de soja em áreas de desmatamento ilegal desde 2008. Iniciativa similar no Cerrado ficou conhecida como o “Manifesto do Cerrado”.
VERDADE, MAS…: A moratória de fato foi um sucesso, apesar de ter quase implodido várias vezes. Tentativas de expandi-la ao cerrado têm enfrentado resistência do setor privado.
Com relação à sustentabilidade da pecuária, responsável por cerca de 65% das áreas desmatadas da Amazônia, tem obtido êxito o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) da Carne, implementado pelo Ministério Público Federal juntamente com frigoríficos. Atualmente, cinco estados da região amazônica estão contemplados no TAC.
MEIA-VERDADE: Como o nome indica, o TAC da carne não foi uma iniciativa do setor e sim um acordo feito com o Ministério Público para evitar que as empresas voltassem a delinquir e garantir que continuassem recebendo crédito rural. O TAC foi um importante primeiro passo na regularização da pecuária na Amazônia, mas o setor continua sendo o principal responsável pelo desmatamento na Amazônia– que vem aumentando desde 2012 após oito anos com tendência de queda.
Quanto ao setor florestal privado, segundo dados da IBA, estima-se que, para cada hectare de floresta plantada no Brasil, o setor privado conserva 0,7 hectare de vegetação nativa. Atualmente, o setor de florestas plantadas possui um total de 7.84 milhões dehectares. Estima-se que, até 2030, o setor alcance 2 milhões de hectares de novas áreas de plantio florestal comercial, baseado na intensificação sustentável e na adoção de boas práticas de manejo. O crescimento do setor florestal privado deve ser considerado importante para a conservação ambiental no Brasil.
VERDADE: O setor de florestas plantadas tem o melhor desempenho de sustentabilidade de todo agronegócio brasileiro. Se todo o agronegócio brasileiro tivesse a performance em sustentabilidade do setor de florestas plantadas, seguramente o Brasil teria a produção rural mais sustentável do mundo.
O setor de florestas plantadas é responsável pela geração de 508 mil empregos diretos e 3,2 milhões de empregos indiretos. Juntamente com o setor agropecuário, são mais de 20 milhões de empregos diretos e indiretos. Esse número é expressivo, tendo em conta que a população economicamente ativa do Brasil é de aproximadamente 104 milhões de pessoas. O campo é portanto responsável, direta ou indiretamente, por aproximadamente um quinto dos empregos brasileiros e tem potencial para gerar muito mais oportunidades de trabalho.
Florestas e mudança do clima
Atualmente, estão vigentes no País as seguintes normas e compromissos no âmbito das ações de combate à mudança do clima com implicações para o setor florestal:
VERDADE ANTES DE BOLSONARO: As políticas citadas abaixo são de fato importantes e é bom que o Itamaraty reconheça seu valor, porque o governo Bolsonaro tem se dedicado a desmontá-las, uma a uma.
– Política Nacional sobre Mudança do Clima (Lei nº 12.187/2009); com meta de redução de 36,8% a 38,9% das emissões em 2020 em relação à trajetória calculada em 2009, será cumprida graças à estimativa inflada de crescimento anual do PIB (5%). Mas sua principal meta, a redução de 80% no desmatamento da Amazônia, não será cumprida. Para que fosse, seria necessário chegar a 2020 com desmatamento na casa dos 3.900 km2/ano. Estamos em 8.000 km2 em 2018.
– Lei de Proteção da Vegetação Nativa (Lei nº 12.651/2012) – Implementação dos Programas de Regularização Ambiental (PRAs); o Código Florestal está sendo atacado no Congresso pela bancada ruralista e pelo filho do Presidente da República. A implementação do Cadastro Ambiental Rural já foi adiada três vezes e o PRA ainda não foi concluído. Em resumo, não se está recuperando floresta, nem se está cortando crédito de quem não recuperou.
– NDC do Brasil – compromisso de recuperar de 12 milhões de hectares de florestas até 2030 para usos múltiplos, eliminar o desmatamento ilegal no bioma Amazônia até 2030, fortalecer o cumprimento do Código Florestal; há uma confusão na nota sobre o que é a NDC: trata-se da meta de reduzir emissões em 37% até 2025. Para cumpri-la, o governo listou uma série de ações, entre elas restaurar 12 milhões de hectares e zerar o desmatamento ilegal na Amazônia até 2030.
O Brasil até hoje não apresentou um plano de implementação da NDC, nem uma estratégia de longo prazo. Ao contrário, extinguiu a secretaria responsável por isso no MMA e a divisão que negociava o Acordo de Paris no Itamaraty. O chanceler do Brasil é um franco negacionista do clima, que recentemente atribuiu o aquecimento da Terra a “termostatos” (sic) “no asfalto”. Também o é o ministro do Meio Ambiente, que se refere às mudanças climáticas como uma “discussão acadêmica” e já disse que o governo “não será ativo” no debate climático internacional – segundo ele, há problemas mais “tangíveis” para atacar no país.
– Desafio de Bonn e da Política Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa, com a meta de promover a recuperação de 12 milhões de hectares até 2030; 
Não há sequer instância no governo para cuidar da sua implementação.
– Política Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Decreto 8.792, de 23 de janeiro de 2017 e Portaria Interministerial nº 230, de 14 de novembro de 2017) ;
Idem.
– Zoneamento Agrícola de Risco Climático – ZARC;
– Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento e Queimadas na Amazônia – PPCDAm; 
Seu futuro é incerto após a extinção da diretoria que cuidava de sua implementação no MMA. Até hoje o governo não disse o que será feito dele.
– Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento e Queimadas no Cerrado – PPCerrado; 
Idem.
– Plano Setorial de Mitigação e de Adaptação às Mudanças Climáticas para a Consolidação de uma Economia de Baixa Emissão de Carbono na Agricultura – Plano ABC;
Foi mantido no Ministério da Agricultura, mas seus recursos no Plano Safra vêm caindo ano a ano. No ano passado, a linha de crédito do Programa ABC, que implementa o Plano ABC, foi a menor desde a sua criação – menos de 1% do Plano Safra.
– Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima – PNA.
Foi engavetado após a extinção da Secretaria de Mudanças Climáticas do MMA.
O Brasil foi um dos poucos países em desenvolvimento a informar uma Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC), com metas de redução absoluta de emissões de
gases de efeito estufa para o conjunto da economia, no âmbito do Acordo de Paris sob a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. A NDC brasileira
indicou, entre outros, o compromisso de fortalecer políticas e medidas com vistas a alcançar, até 2030, o desmatamento ilegal zero na Amazônia brasileira, a compensação das emissões de gases de efeito estufa provenientes da supressão legal da vegetação, bem como a restauração e o reflorestamento de 12 milhões de hectares de florestas.
VERDADE, MAS…: O atual governo não apenas não fez nenhum movimento no sentido de implementar sua NDC como tem jogado ativamente contra as políticas de controle de desmatamento e o Código Florestal, que formam o pilar da NDC. O ministro do Meio Ambiente, principal responsável pela implementação, sequer acredita em mudanças climáticas causadas por seres humanos.
No que se refere ao período pré-2020, o País antecipou o cumprimento do objetivo das Ações de Mitigação Nacionalmente Apropriadas (NAMAs) quanto à redução de emissões de gases de efeito estufa associada à redução do desmatamento na Amazônia e no Cerrado.
MENTIRA: Quando as metas brasileiras foram anunciadas, antes da conferência de Copenhague (2009), a principal delas era reduzir o desmatamento em 80% na Amazônia. Quando o país registrou a meta na ONU, esses 80% de redução foram “traduzidos” em toneladas de CO2 (564 milhões). O governo vem tentando argumentar que já cumpriu a meta em toneladas de CO2 usando um truque contábil: computar o carbono supostamente “sequestrado” em florestas em propriedades privadas inscritas no Cadastro Ambiental Rural – que, como já vimos, é autodeclaratório. O fato permanece, porém, que o atual nível de desmatamento é mais do que o dobro previsto na meta para 2020.
A meta para o cerrado, que foi calculada sem o monitoramento adequado do desmatamento no bioma e ainda sofreu um expurgo da então ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, já estava cumprida desde antes de ser enunciada.
Ressalte-se que a redução das emissões de gases de efeito estufa provenientes de desmatamento ocorreu simultaneamente ao aumento da produção
agrícola no País.
VERDADE: Isso demonstra que, ao contrário do que afirma o Presidente da República, a conservação ambiental não atrapalha a produção.
Ressalte-se também o REDD+ – instrumento desenvolvido no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) para recompensar financeiramente países em desenvolvimento por seus resultados relacionados a atividades de redução de emissões no setor florestal. No Brasil, a Estratégia Nacional para REDD+ (ENREDD+), estabelecida em 2015, tem como objetivo contribuir para a mitigação da mudança do clima por meio da eliminação do desmatamento ilegal, da recuperação dos ecossistemas florestais e do desenvolvimento de uma economia florestal sustentável de baixo carbono, gerando benefícios econômicos, sociais e ambientais.
VERDADE ANTES DE BOLSONARO: O Decreto 7.959, publicado em abril pelo governo atual, extinguiu a Comissão Nacional de Redd+, responsável pela implementação da Enredd+. Toda a política de Redd+ hoje está no limbo.
O Brasil obteve, após 12 anos de execução do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), seis anos do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento e das Queimadas no Cerrado (PPCerrado) e três anos da ENREDD+, resultados expressivos de redução de emissões provenientes do desmatamento. Perante à UNFCCC, o Brasil já apresentou e teve verificadas mais de 6 bilhões de toneladas de reduções de emissões de CO2 provenientes de desmatamento no bioma Amazônia entre os anos de 2006 e 2015. Esses resultados estão disponíveis para recebimento de pagamentos por resultados de REDD+.
Até o momento, o Brasil recebeu como pagamentos por resultados de REDD+ montante superior a US$ 1,217 bilhão, via Fundo Amazônia, e US$ 38,6 milhões pelo estado do Acre, que totalizaram o pagamento de uma redução de 243,8 milhões de tCO2 de emissões por desmatamento. Esses pagamentos equivalem a cerca de 5% do total de resultados alcançados pelo País.
VERDADE ANTES DE BOLSONARO: O ministro do Meio Ambiente, como amplamente noticiado, empreende um ataque inédito ao Fundo Amazônia: já acusou irregularidades inexistentes nos convênios com ONGs, atacou a equipe gestora, causando a demissão da diretora do fundo, e quer mudar a governança de seu comitê orientador de forma a interferir politicamente na destinação da verba. Também anunciou que pretende usar recursos do fundo para pagar por desapropriações em áreas protegidas, o que afronta diretamente o objetivo da doação e as regras do BNDES.
Recentemente, o País teve aprovado pelo Fundo Verde para o Clima (GCF) a Proposta de Pagamentos Baseados em Resultados de REDD+ Alcançados pelo Brasil no Bioma Amazônia nos anos de 2014 e 2015, o qual atinge US$ 96,4 milhões. Essa proposta foi submetida em resposta à chamada do Programa Piloto para Pagamentos por Resultados de REDD+ do GCF e contém, além de iniciativas de fortalecimento da ENREDD+, programa piloto inovador de incentivos para serviços ambientais na região da Amazônia Legal, em conformidade com os artigos 41 e 58 do Código Florestal do Brasil, com a ENREDD+ e com a NDC do Brasil.
VERDADE ANTES DE BOLSONARO: O diretor responsável por finalizar a negociação com o GCF foi exonerado assim que o Conselho do fundo aprovou o pagamento ao Brasil. Hoje o recurso também está no limbo, à espera da nomeação de quem o opere no governo.
DEMA I – 29.05.2019

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Ernesto Araújo critica desinformação sobre meio ambiente

Blog Direito Rural, 4 de junho de 2019

Ministro das Relações Exteriores disse a deputados que o objetivo do governo é elevar a participação agrícola brasileira no comércio mundial de 7% para 10% em dois anos


Agência Câmara Notícias  O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, passou boa parte de seu tempo inicial em debate na Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados contando sobre recentes negociações com a China e com os países árabes, como forma de desfazer a impressão de que haveria uma posição ideológica contra os governos desses países.
Esse era um dos motivos do requerimento de audiência dos deputados Marcon (PT-RS) e Carlos Veras (PT-PB), realizada na comissão nesta quarta-feira (29). Ernesto Araújo elogiou os chineses, afirmando que os brasileiros precisam aprender com eles a negociar.
Ele disse que a guerra comercial entre China e Estados Unidos pode trazer oportunidades para o agronegócio brasileiro.
Araújo também afirmou que há um esforço do Itamaraty para contrapor o que ele chamou de “informações erradas” divulgadas pela imprensa internacional sobre a sustentabilidade ambiental do agronegócio brasileiro. Segundo ele, apenas 30% do nosso território é usado para produção de alimentos. Mais de 60% da vegetação é nativa. O ministro disse que vai mobilizar as embaixadas para divulgar outras informações e trazer novos mercados:
“Estamos tentando implementar na mentalidade de trabalho de toda a diplomacia brasileira no exterior. Isso a gente vê claramente em outros países que são muito presentes em agricultura. Qualquer evento nas embaixadas argentinas tem sempre o vinho e a carne argentina, por exemplo. Temos que ter esse tipo de coisa nas embaixadas brasileiras”, observou.

Mudanças climáticas

Ernesto Araújo disse que o objetivo é elevar a participação agrícola brasileira no comércio mundial de 7% para 10% em dois anos. Outro problema, na opinião do ministro, seria uma versão parcial relacionada à questão das mudanças climáticas, o que estaria justificando medidas comerciais protecionistas:
“E o que se verifica é que basicamente todos os modelos, eles têm – desde o começo dos anos 90 – eles preveem uma curva muito abrupta de aumento de temperatura que não tem se verificado. Em muitos casos, algumas dessas pessoas apontam que não existe uma mudança de clima global, mas várias mudanças de climas locais. O que acontece nesse contexto – e é o que eu procurei apontar um pouco – é às vezes a manipulação política e o uso político desse alarme em relação à temperatura”, disse.
Sobre o Oriente Médio, o ministro disse que as exportações para a região cresceram 18% no primeiro trimestre em relação ao ano passado. Mas o deputado Marcon disse que o governo brasileiro atrapalha ao fazer declarações polêmicas sobre a região. E lembrou comentário de um dos filhos do presidente Jair Bolsonaro sobre o Hamas, que controla a Faixa de Gaza:
“Teria que alguém aqui do agronegócio pudesse tirar os telefones, os microfones da família Bolsonaro porque o senador Flávio Bolsonaro, no seu twitter diz: queremos que vocês se explodam – para os extremistas árabes. O Brasil nunca se meteu com essas guerras. Não vimos nenhuma colocação do ministro sobre essa questão”, observou.

Nova postura

O presidente da Comissão de Agricultura, Fausto Pinato (PP-SP), afirmou, porém, que o próprio ministro Ernesto Araújo teria mostrado uma nova postura na audiência:
“Mas vossa excelência e o próprio presidente também perceberam que estavam indo num caminho errado e estão tentando consertar. Nós vamos olhar para frente. Eu sou um grande entusiasta do governo. Agora eu não sou obrigado a concordar com algumas ideias loucas que não tenham dados técnicos. Se eu tenho um cliente que é o cliente que compra mais, gostando ou não gostando dele, eu tenho que manter uma boa relação”, disse.
Como parte da promoção do Brasil no exterior, Ernesto Araújo disse ainda que o governo está investindo na participação do país em 14 grandes feiras internacionais este ano.
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Fonte: Agência Câmara Notícias, 22/05/2019, 15:55
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Advogado especialista em agronegócio. Sócio da banca Lutero Pereira & Bornelli, com sede em Maringá/PR e filial em Cuiabá/MT. Membro da União Brasileira de Agraristas Universitários (UBAU). Membro do Comitê Europeu de Direito Rural (CEDR). Contato: tobias@direitorural.com.br