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sábado, 30 de outubro de 2021

Tudo o que une petistas e bolsonaristas (e não só no Congresso): no discurso e na retórica também - Daniel Weterman e Thiago Faria (O Estado de S.Paulo)

Interesses corporativos unem PT e bolsonaristas no Congresso

Maior partido de oposição se alinha à base do presidente em votações de projetos que beneficiam classe política e enfraquecem órgãos de controle

Daniel Weterman e Thiago Faria, O Estado de S.Paulo 

30 de outubro de 2021 | 05h00 

https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,interesses-corporativos-unem-pt-e-bolsonaristas-no-congresso,70003884675


BRASÍLIA — A votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que aumenta o poder do Congresso sobre o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), na semana passada, contou na Câmara com uma inusitada união entre o PT, maior partido da oposição, e aliados do presidente Jair Bolsonaro. Embora a proposta tenha sido rejeitada, não foi a primeira vez que os adversários se juntaram para apoiar medidas que beneficiam políticos e enfraquecem órgãos de controle. Levantamento da consultoria Inteligov, feito a pedido do Estadão, mostra que os petistas se alinharam ao líder do governo em uma a cada dez votações nominais, desde 2019. 

Houve um casamento de interesses, por exemplo, no projeto que afrouxou a Lei de Improbidade Administrativa, sancionado nesta semana por Bolsonaro. O texto aprovado foi o do relator, Carlos Zarattini (PT-SP), com apoio do líder do governo, Ricardo Barros (Progressistas-PR), nome do Centrão. Os 52 deputados do PT foram a favor da medida, que dificulta a punição de políticos ao exigir a comprovação de “dolo específico”, ou seja, a intenção de cometer irregularidade. 

O PT e o governo também se aliaram quando estavam em jogo interesses partidários. Foi assim nas votações do novo Código Eleitoral, que fragiliza a fiscalização das contas de partidos; da proposta que permitia a volta das coligações – barrada no Senado –; e da que retoma a propaganda das legendas no rádio e na TV. Nos três casos, o PT votou 100% fechado com a orientação do Planalto. 

O levantamento da Inteligov indica que esta situação ocorreu em 349 das 3.672 votações nominais realizadas na Câmara e no Senado desde que Bolsonaro tomou posse, em 2019. O cálculo leva em conta votações de projetos, PECs, medidas provisórias e requerimentos do Legislativo, como pedidos para retirar uma proposta da pauta. 

‘Sobrevivência’. Para o cientista político Leandro Consentino, professor do Insper, há nessas alianças um instinto de sobrevivência da classe política. “No caso da PEC do CNMP e da Lei de Improbidade, há uma agenda de blindagem. O governo e o PT têm, hoje, claramente uma agenda contra esse tipo de medida, em que pese já terem ambos levantado a bandeira contra a corrupção.” 

“Todos estão olhando para o próprio umbigo e as bases eleitorais exigem recursos. Não há preocupação com a transparência”, disse o analista do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) Neuriberg Dias

Nos últimos anos, o Congresso aumentou as emendas parlamentares e passou a destinar recursos diretamente para Estados e municípios. Trata-se das chamadas “emendas cheque em branco”. O modelo foi criado a partir de uma PEC da presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), mas encontrou maior adesão na base do governo. Em 2021, sete em cada dez deputados que usaram essas emendas votaram com o governo em 70% das ocasiões, apontou a Inteligov.  

‘Política’. “Esses são temas da política, não se trata de oposição e situação. Na Lei de Improbidade, temos o abuso do MP sobre o julgamento de pessoas que, por questões apenas administrativas, são retiradas da vida política. Outra questão é a vida do povo, e aí o Bolsonaro está fora da democracia”, disse o líder do PT na Câmara, Bohn Gass (RS). 

Mesmo na pauta econômica, porém, houve convergências, como na reforma do Imposto de Renda. A bancada petista votou em peso para aprovar a medida, que, além de reduzir impostos de empresas, cria uma cobrança sobre lucros e dividendos. 

Pautas comuns

Emendas

Petistas e governistas votaram juntos no projeto que determinou a execução obrigatória de emendas parlamentares de bancada, ampliando o poder de deputados e senadores sobre o Orçamento. 

Improbidade administrativa

Também se alinharam na análise do projeto que afrouxou a Lei de Improbidade Administrativa, dificultando a punição a políticos. 

Coligações 

A proposta que previa a volta das coligações nas eleições para o Legislativo, prática proibida com o intuito de reduzir o número de legendas no País, uniu petistas e parlamentares governistas. 

Código Eleitoral

O novo Código Eleitoral, que prevê regras mais brandas para o uso de recursos públicos por partidos, reduz a fiscalização e tira poderes da Justiça Eleitoral, teve apoio tanto do PT quanto de parlamentares bolsonaristas. 

Ministério Público

Os adversários votaram juntos na proposta que mudava a composição do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e aumentava a influência do Congresso no órgão, responsável por fiscalizar a atuação de procuradores. 

Propaganda 

Projeto que retoma a propaganda gratuita de partidos políticos no rádio e na TV, suspensa em 2017 após a aprovação do Fundo Eleitoral, obteve votos de petistas e de parlamentares governistas.


sábado, 8 de maio de 2021

Gente: o que será que houve? - Paulo Roberto de Almeida

 Gente: o que será que houve?

Paulo Roberto de Almeida


Estou achando os nossos colegas bolsomínions destes nossos espaços inacreditavelmente silenciosos. 

O que será que aconteceu com eles? 

Antes, qualquer palavrinha torta contra o “mito”, lá vinha uma enxurrada de impropérios, daqueles bem escabrosos, os preferidos pelo guru presidencial.

Ficaram magoados conosco, nós que somos os antibolsonaristas?

Retiraram os batalhões? Desistiram? Combateremos sozinhos? Pena!

Desculpem qualquer coisa: não queriamos ofender, chamar vocês de burros, idiotas, essas coisas; era tudo defesa da democracia, vcs sabem, aquela coisa inventada pelos gregos lá atrás (mas sem mulheres e escravos), e que foi sendo aperfeiçoada aos poucos, ao longo dos séculos. A coisa ia indo mais ou menos bem, mas, de vez em quando, chega um maluco e põe tudo a perder.

Era o bom combate, mas estamos ficando sozinhos na arena: eles agora preferem manifestar sozinhos, aos domingos, quando chamados pelo capitão e sua tropa de aloprados. 

De repente pararam de me xingar, como se eu, justo eu, tivesse parado de atacar suas ideias malucas. 

Estou quase ficando sem matéria prima para escrever alguns livros de ocasião: nos últimos dois anos e meio aquele menino maluquinho alçado à condição de chanceler acidental me forneceu abundante material para minhas reflexões e escritos; agora está ficando mais raro. 

Vai voltar? Não é que eu esteja pedindo, pois tenho coisas mais importantes para fazer, e estava sendo desviado para essa obrigação moral de me opor aos destruidores de nossas instituições, em especial no âmbito da diplomacia.

Se alguém tiver notícias dos maluquetes favor avisar...

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 8/05/2021

sábado, 8 de junho de 2019

O povo bolsonarista: anti-iluminismo que descamba para o fascismo - Claudia Antunes (Epoca)

Bolsonaristas expulsam da 'nação' quem não faz parte de seu 'povo'

É um pensamento que ultrapassa a ala dita olavista do governo, como ficou patente em uma entrevista que o general Augusto Heleno deu recentemente

Revista Época, 8/06/2019

É frequente na retórica de autoridades do governo Bolsonaro a pretensão de falar e agir em nome do “povo”. Os olavistas do governo, como o chanceler Ernesto Araújo, estão entre os que mais batem nessa tecla em suas declarações.
No dia da manifestação pró-Bolsonaro ocorrida no final de maio, por exemplo, Araújo escreveu no Twitter: “O Brasil caminha rumo ao exercício do poder pelo povo. Rumo a desfazer as amarras que sempre ataram o povo: amarras políticas, econômicas e também amarras ideológicas e culturais do politicamente correto e do marxismo de contrabando”.
Na retórica do governo Bolsonaro, uma parte do povo — às vezes chamada de “os homens de bem” — é tomada por sua totalidade, mesmo quando se sabe que, até no universo dos brasileiros que votaram no presidente, o “povo” do tuíte de Araújo é uma fração do todo. Em relação a várias iniciativas do governo, como a liberalização da posse e do porte de armas, as pesquisas mostram que uma maioria até mais ampla do que o conjunto dos cidadãos que não votaram em Bolsonaro discorda de suas posições .
Como em tudo que faz parte da ideologia bolsonarista, não há nada de original nisso. Em uma entrevista imperdível ao repórter André Duchiade, do “Globo”, o historiador israelense Zeev Sternhell, especialista no pensamento anti-iluminista, lembrou que há duas concepções de nação.
Os iluministas — que se insurgiram contra a junção de fé e poder e desenvolveram a ideia da igualdade dos homens e dos direitos humanos —, definiram a nação simplesmente como  um “conjunto de pessoas que vivem em um determinado território delimitado por certas fronteiras e obedecem ao mesmo governo”. A nação, disse Sternhell, “é vista com uma comunidade de cidadãos, que podem definir os seus próprios destinos”.
Na concepção anti-iluminista, que no século XX deu origem ao fascismo, a nação é vista como um corpo orgânico, “onde os indivíduos não têm interesses antagonísticos entre si”, explicou o historiador.  Segundo essa tradição, as pessoas, presas a culturas nacionais atávicas, não têm autonomia de decisão e compõem uma massa homogênea, cuja função é servir o Estado.
Os bolsonaristas demonstram que compartilham dessa concepção quando põem para fora da nação todos os que não consideram que fazem parte do seu “povo”. É um pensamento que ultrapassa a ala dita olavista do governo, como ficou patente na entrevista que o general Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional, deu recentemente ao jornal “Valor”.
Ao comparar os protestos estudantis contra os cortes no ensino superior à manifestação pró-Bolsonaro, Heleno expulsou da sua nação particular os milhares de jovens —  muito mais diversos na sua cor e origem social do que os estudantes de 1968 — que saem às ruas porque veem sua esperança de futuro pela educação decepada por um governo obcecado pelo sexo alheio e por instrumentos de morte, sejam eles as armas propriamente ou volantes de carro.
“Uma das coisas que ficaram demonstradas na manifestação [a favor de Bolsonaro] é que existe uma grande parcela do povo brasileiro que foi para a rua com a bandeira do Brasil. Na manifestação dos estudantes havia pouquíssimas bandeiras do Brasil. Isso para mim é um absurdo, é fruto de toda essa doutrinação ideológica que foi feita nos últimos 20 anos. Então, nossos jovens não têm o país na cabeça”, disse Heleno, dias depois de Bolsonaro chamar os estudantes de “idiotas inúteis”.
O presidente  — secundado por um de seus ministros mais influentes  — transformou uma multidão diversa em uma turba de “doutrinados” por supostos alienígenas, sem capacidade de pensamento próprio, sem autonomia. Nada surpreendente para quem, em um banquete para Steve Bannon e Olavo de Carvalho na embaixada brasileira em Washington, em março, pronunciou a fala definidora do seu mandato: “Eu sempre sonhei em libertar o Brasil da ideologia nefasta de esquerda (...). O Brasil não é um terreno aberto onde nós pretendemos construir coisas para o nosso povo. Nós temos é que desconstruir muita coisa. Desfazer muita coisa. Para depois nós começarmos a fazer”.

quarta-feira, 10 de abril de 2019

Apex: a casa dos horrores sob os bolsonetes e olavistas, com a conivencia do chanceler acidental

Revista Piauí, 10 abril 2019

Foi atender o telefone e voltou demitido

Embaixador diz que Apex era “jardim de infância” sob influência de Eduardo Bolsonaro

Consuelo Dieguez, jornalista

Mario Vilalva, embaixador demitido da Apex
Pouco antes de ser exonerado da presidência da Apex, a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimento, por volta das quatro da tarde dessa terça-feira, dia 9, o embaixador Mario Vilalva disse à piauí, durante uma conversa telefônica, que estava “administrando um jardim de infância”. O principal alvo de sua crítica era a empresária Letícia Catelani, ou Letícia Catel, como é conhecida nas redes sociais bolsonaristas, diretora de Negócios da agência, que o embaixador considera uma pessoa “infantil e despreparada para o cargo”.  Catel, de 30 anos, é muito próxima do deputado Eduardo Bolsonaro, filho caçula do presidente Jair Bolsonaro, e, segundo o embaixador Vilalva, é também “protegida” do chanceler Ernesto Araújo. No momento em que fazia as acusações contra Catel, Vilalva interrompeu a conversa para me dizer que precisava atender a uma ligação de urgência. Logo em seguida, sua assessoria me informou que ele deixara o prédio da Apex, pois havia sido exonerado pelo chanceler Ernesto Araújo.
São muitas as críticas de Vilalva a Catel. Ele a acusa de paralisar todos os negócios da agência e de bloquear todos os projetos, causando enorme prejuízo às empresas brasileiras. Além do despreparo para lidar com questões fundamentais da promoção de comércio exterior, ele se queixava do comportamento dela. Para Vilalva, além de não saber trabalhar em equipe, Catel era indisciplinada e boicotava o trabalho da agência, atrapalhando os negócios. O embaixador citou um episódio que lhe incomodou sobremaneira: após uma reunião com Catel e com o diretor de Gestão Corporativa, Márcio Coimbra, também indicação de Bolsonaro filho, ficou acertado que, no dia seguinte, eles assinariam um contrato com a empresa Terroir para a contratação dos irmãos Campana, dois dos mais incensados designers brasileiros, para ser a atração principal do estande brasileiro na feira de móveis e design de Milão. Ele esperou por ela durante toda a manhã e Catel não apareceu. Também não lhe deu qualquer satisfação. Quando, finalmente, conseguiu contatá-la, ela informou que estava fora da agência, tratando de outros interesses, e que ele lhe mandasse o contrato para assinar por um portador. “Era lógico que eu não ia fazer isso”, me disse o embaixador, irritado e acometido de uma tosse intermitente. “O contrato tinha que ser assinado na agência, diante de testemunhas, que é a forma profissional de se fazer isso.” No dia seguinte, começaram a ser publicadas notas afirmando que a tal empresa tinha sido citada na operação Lava-Jato.
Vilalva não se conforma. Ele está seguro de que a nota foi plantada por Catel, amiga de Filipe Martins, assessor internacional de Jair Bolsonaro, para colocar sua reputação em dúvida. “Todas as vezes que falamos desse contrato, jamais foi levantada qualquer suspeita sobre a empresa. Por que então, no dia seguinte, começam a pipocar essas notas?”, questionou.  “E, se ela sabia da tal citação, por que não me informou?”, continuou, indignado, acometido de novo ataque de tosse.
Esse, porém, segundo ele, foi apenas um dos inúmeros problemas que ela causava na agência. Um dos projetos de grande importância para os negócios brasileiros é com o Sindicato da Indústria Audiovisual de São Paulo, o Siasp, responsável pela divulgação do cinema brasileiro no exterior. A agência tem uma parceira com o sindicato desde 2006 para ajudar a promover o cinema nacional, o que tem trazido um retorno importante para o país. Além da mostra em festivais, o projeto ajuda na venda de filmes brasileiros lá fora, atrai investimentos externos para o cinema nacional. Como diretora de Negócios, Letícia Catel paralisou o projeto e não deu qualquer satisfação sobre o porquê de tal decisão. “Ela é desrespeitosa e ineficiente”, queixou-se o embaixador.
A confusão não parou por aí. Vilalva assumiu a agência após o chanceler ter demitido seu antecessor, Alecssandro Carreiro, também indicado por Eduardo Bolsonaro. Carreiro, um quadro do PSL, além de não ter qualquer familiaridade com o comércio exterior, não falava inglês e jamais viajara ao exterior, afora ser também desafeto de Catel. Ao tomar posse, Vilalva convidou a ex-diretora de Negócios Marcia Nejaim, profissional concursada e experiente, para ser sua chefe de gabinete. A nomeação de Nejain, porém, foi barrada pelo ministro Ernesto Araújo. O embaixador Vilalva tem uma explicação. “O chanceler não queria que ninguém fizesse sombra à sua protegida.” Mais grave ainda, segundo o embaixador, era que Catel, além de inexperiente, colocou vários gerentes de sua confiança que não se comunicavam com o restante da agência. Chegou até a nomear um integrante do PSL, que sequer tinha curso superior, pré-requisito para trabalhar na Apex. “Eu chamei a atenção dela para o fato, mas ela ignorou”, me disse. “Era um absurdo contratarmos uma pessoa sem curso superior, o que, além de ferir os estatutos da agência era um desrespeito com os concursados, muitos dos quais têm doutorado e pós-doutorado”.
O fato, me disse Vilalva, era que, diante dessa insubordinação, ele estava apagando incêndios provocados pelos dois diretores, ao invés de tratar do assunto de fundamental importância para a agência, a promoção de negócios. Uma situação que lhe causou grande constrangimento foi o comportamento de Catel durante a visita de uma delegação de deputados do PSL à China. Convidada pelo governo chinês para conhecer as novidades tecnológicas chinesas, que competem com a tecnologias americanas, a delegação foi alvo de uma cruzada furiosa de Olavo de Carvalho, que acusou os parlamentares de serem comunistas infiltrados no PSL. A briga esquentou, e Catel ficou ao lado de Carvalho, postando em seu Twitter vários textos e imagens ridicularizando os parlamentares. “Veja se isso é coisa de uma diretora de Negócios da Apex fazer”, reclamou Vilalva.
O resultado de tanta briga é que a agência, com orçamento de 795 milhões de reais ao ano para promover os negócios brasileiros, estava paralisada. Isso gerou uma série de queixas dos empresários de vários setores. A agência é fundamental para promover, principalmente, as exportações de empresas de menor porte, que não têm cacife para participar de feiras internacionais e de fazer contatos com importadores. Os projetos visam justamente atender a esta turma e vinham mostrando bons resultados, principalmente no governo Temer, quando a agência foi ocupada pelo embaixador Roberto Jaguaribe. Ela tem sido fundamental para incrementar negócios nas áreas de tecnologia, têxteis, cerâmica, cinema e outros setores da economia brasileira.
Diante da insubordinação dos dois diretores, Vilalva decidiu contratar o general Roberto Escoto, que já chefiou missões internacionais, para botar ordem no seu “jardim de infância”, enquanto ele tentava tocar os negócios. Não funcionou. Percebendo que poderia ter que se subordinar às decisões do presidente da Apex, Catel pediu ao ministro das Relações Exteriores que mudasse o estatuto da agência. O que foi feito. Sem o conhecimento de Vilalva, Araújo protocolou um novo estatuto num cartório de Brasília estabelecendo que os diretores de Negócios e de Gestão corporativa não teriam que se subordinar ao presidente da entidade. E mais. Pelo documento, ficou acertado que o novo estatuto teria que ser aprovado pelo conselho deliberativo da Apex, formado por cinco representantes do setor público e quatro do setor privado, sem fixar data para que o estatuto seja  examinado. Ou seja, os dois diretores podem se manter infinitamente nessa situação de independência em relação à presidência da Apex. “Eles são livres e sem restrição para fazer as loucuras que quiserem”, protestou o embaixador.
Depois disso, as relações entre Vilalva com os dois diretores ficaram insustentáveis. “A Letícia é protegida do chancelar. Faz o que quer aqui. É uma relação pessoal que não conseguimos entender”, me disse um antigo funcionário da agência, inconformado com a situação. No começo dessa semana, embaixador deu várias entrevistas à imprensa, onde não poupou o chanceler. Chamou Ernesto Araújo, entre outras coisas, de desleal, por não o ter comunicado do novo estatuto, do qual ele tomou conhecimento através a imprensa, vinte e cinco dias após ter sido protocolado no cartório.
No fim da tarde dessa terça-feira, o Itamaraty soltou nota justificando a demissão de Vilalva.  Na nota, o ministério afirma que o “ministro das Relações Exteriores, embaixador Ernesto Araújo anuncia a exoneração do embaixador Mario Vilalva da presidência da Apex”, como parte do “processo de dinamização e modernização do sistema de promoção comercial brasileiro.” O ministro, diz a nota, agradece a colaboração do embaixador. O Itamaraty não respondeu, contudo, as acusações relatadas à piauí pelo embaixador. Procurada, Letícia Catel também não se manifestou.
A Apex tem sido alvo de confusão desde antes da posse de Araújo. Ele teve um embate com o ministro da Economia, Paulo Guedes, que queria levar a agência para o seu ministério, sob a alegação de que a promoção comercial tem muito mais a ver com a economia do que com o Itamaraty. Araújo bateu pé e conseguiu do presidente Bolsonaro a garantia de que agência continuaria onde estava. Para boa parte dos empresários e de integrantes de ministérios preocupados em promover as vendas de produtos brasileiros, como o da Agricultura e o de Desenvolvimento, parece cada vez mais claro que seria muito melhor para o comércio exterior brasileiro que a agência deixasse o “jardim de infância” e fosse para a sala dos adultos.

segunda-feira, 1 de abril de 2019

Steve Bannon, um dos gurus dos bolsonaristas - Ishaan Tharoor (WP)

Exposing the town crier of the West’s far right

Ishaan Tharoor
The Washington Post, April 1st, 2019

(Jabin Botsford/The Washington Post)</p>
(Jabin Botsford/The Washington Post)

Though Stephen K. Bannon left his White House post as President Trump’s chief strategist more than a year and a half ago, the shadow he casts over Western politics has hardly faded. The former investment banker and executive chairman of far-right Breitbart News became one of the leading ideologues of Trumpism — building a creed that allied American nativism with the language of European far-right nationalism — and helped push Trump toward his improbable electoral victory in 2016. In the months after palace intrigues forced him out of the West Wing, Bannon remained close to figures within the administration and even closer to the world of journalists who report on it.
Bannon extended his brand as both populist soothsayer and rabble-rouser across the Atlantic, offering support to a constellation of far-right, ultranationalist and anti-immigrant parties across Europe. His listening tours and speeches last year in Britain, France, Italy, Hungary and elsewhere attracted large numbers of mainstream journalists, whose stories placed Bannon at the heart of a far-right insurgency that seeks to blow up the status quo in European parliamentary elections this May.
“This populist-nationalist revolt is a worldwide phenomenon,’’ Bannon told Bloomberg News last December, adding that the upcoming elections were a “historic moment.” 
Bannon, indeed, seems to be in a constant search for “historic” dramas, and ways to locate himself within them. Enter “The Brink,” a new and already critically acclaimed documentary in theaters across the United States that tracks his activities in the year after his exit from the White House. In it, we hear Bannon grandiosely quote Abraham Lincoln as his enemies loomed around him. We watch him scribble in the margins of a newspaper column a crude diagram charting the “triple threat” posed — for reasons only Bannon can divine — by an axis of China, Turkey and Iran. And we listen to him rage against the West’s liberals, who he declares are content “to manage the decline” of their civilization.
We also see Bannon guzzle copious amounts of energy drinks, snarl at complacent assistants, and, on numerous occasions, exhibit an almost disarmingly charming penchant for self-deprecation. The fly-on-the-wall approach of Alison Klayman, the film’s director, offers a rarely seen portrait of the man once dubbed by Time magazine as the “great manipulator” — and one that happens to rather adroitly dispel the myth of his political genius.
“I think the image that emerges of him is a much more human one, but certainly not soft and cuddly,” Klayman told Today’s WorldView. She said her efforts to go “behind the curtain” show how Bannon’s agenda is “in some ways more convoluted” than it is sometimes framed in the mainstream media, spurred both by his personal desire for attention and the imperatives of his wealthy backers. It’s why, Klayman added, “I think some people see him as an opportunist.” 
Take, for example, Bannon’s insistence that his politics center on “economic nationalism” — a populist message about protecting the working class and curbing the excesses of globalization. In a stump speech before Republican donors, Bannon uses this line to dismiss the accusations of racism and bigotry often leveled against him, Trump and the right-wing nationalist base whose support they need.
But, after months of following Bannon on trips in private jets and private fundraising sessions with billionaires, Klayman concluded that Bannon’s economic populism “is a little bit of a branding exercise.” In his meetings with patrons and far-right politicians, Klayman said, Bannon “is not talking about how we make policies that bring back manufacturing jobs. But he is talking about birthrates and how to win elections by talking about religion.” 
In a drive through London, we see him roll his eyes in despair when informed that a particular street has “flipped” to mostly Arab businesses. He notes with glee that left-wing populists such as Britain’s Jeremy Corbyn or Sen. Bernie Sanders (I-Vt.) in the United States don’t grandstand about immigration — a refusal he believes will limit their appeal among working-class voters. In lavish hotel dining rooms, Bannon and a motley crew of European far-right politicians grouse over the alien menace of Islam and growing Muslim populations in their countries.
It’s difficult to ignore the more disturbing echoes of Bannon’s ideologyin the aftermath of the slaughter carried out by a white supremacist, animated by similar concerns, in Christchurch, New Zealand, last month. “These aren’t siloed biases,” said Klayman, referring to the hatred felt by the Christchurch shooter. “There’s a worldview that makes it all fit together.” 
Klayman’s first major entry into the world of documentary cinema was “Ai Weiwei: Never Sorry,” a 2012 feature film on the Chinese dissident artist, who has since been forced to flee his native country. In subsequent work, he has sought to draw attention to the plight of refugees and migrants around the world. While Ai is intent on “honoring human dignity,” Klayman said, Bannon “is very expressly not concerned with that.”
"He goes around and talks about making people’s lives better, but you know it’s only about certain people’s lives, while he ignores the suffering of others,” she said.
The film also shows the limits of Bannon’s powers. We watch him endure three demoralizing setbacks: The failed Senate campaign of controversial Republican candidate Roy Moore in Alabama; the landslide defeats that hit the Republican Party in the House in midterms last year; and the ultimate sputtering of his attempt to lead a continental far-right coalition in Europe.
Still, Bannon is hardly one to give up, and journalists continue to chase after him on both sides of the Atlantic. Last week, CNN’s Anderson Cooper interviewed him for the majority of his one-hour prime-time show. In Rome, Bannon admitted at an event that Europe’s nationalists “don’t need me,” but still prophesied their victory and emphasized his commitment to their struggle.
In one pivotal scene in “The Brink,” Bannon lectures Klayman on how the Democrats’ insistence on “identity politics” will give the Republicans victory. But when challenged by Klayman, who argues that his messaging centers wholly on “identity” politics and tribal outrage, he smirks, and quips that such bad faith would make his work — in this instance, a pro-Trump film he was previewing to journalists — just “propaganda.”
“What would Leni Riefenstahl do?” he then asks Klayman, referring to the chief filmmaking propagandist of the Nazi era. “How would Leni cut that scene?” It’s a chilling moment, not least because it’s not totally clear that he’s joking.

domingo, 10 de março de 2019

A crise entre olavistas e militares - Alon Feuerwerker

O que é a contradição entre ‘o olavismo’ e ‘os militares’, diz Alon Feuerwerker

Polarização inicial tende a ser interna
Poder precisa tirar elementos radicais
Olavo de Carvalho é um dos mentores de propostas do integrantes do governo Bolsonaro, como o chanceler Ernesto Araújo Reprodução/Youtube
10.mar.2019 (domingo) - 5h50

É erro político acreditar que alguém conseguirá tutelar um presidente da República recém-instalado e com a popularidade essencialmente preservada. Outro equívoco é imaginar que o presidente, por isso, pode fazer o que dá na telha. Ele decide, mas dentro de limites definidos, em última instância, pela correlação de forças no governo, nos demais poderes e na sociedade.
Costumam levar vantagem nas disputas internas do poder os núcleos mais organizados, disciplinados e dotados de clareza estratégica. E, sempre, mais conectados aos grupos de pressão social influentes. Outro detalhe: é comum a polarização em início de governo ser intestina ao próprio governo. Pois a oposição não carrega expectativa de poder.
O que acontece na administração Bolsonaro? Quadros provenientes das Forças Armadas estão, no popular, comendo pelas beiradas e ganhando espaço. “Os militares” vai propositalmente entre aspas no título desta análise. Não há no Planalto um “Partido Militar” atuando com comando centralizado e hierarquia, paralelamente ao presidente da República.
O bolsonarismo enxerga-se como uma revolução. E toda revolução costuma trazer duas tendências, que em certo momento entram em choque mortal: 1) a revolução precisa e quer expandir-se e 2) o novo poder, para consolidar-se e governar, precisa expurgar seus elementos mais “radicais”. E alguma hora precisa fazer a velha superestrutura trabalhar para o novo status quo.
A crise entre o “olavismo” e “os militares” é indicação de que a 2ª tendência vai aos poucos prevalecendo sobre a 1ª, e o processo nunca é linear ou indolor. Mas costuma ser irreversível. Num paralelo histórico que talvez desagrade ao bolsonarismo, este parece estar transitando da “revolução permanente” para o “bolsonarismo num só país”.
Não é casual que o choque mais visível e agudo apareça na política externa. O governo precisa decidir se a prioridade é 1) alinhar-se a –ou seguir a diretriz de– uma “internacional trumpista” ou 2) adotar para valer a linha de “o Brasil primeiro”. E isso vem sendo exposto na crise venezuelana. Como já vinha dando as caras em demais temas externos.
O desfecho ideal para o bolsonarismo na Venezuela seria uma “Revolução dos Cravos” de sinal trocado. A cúpula militar degolar o governo bolivariano sem derramamento de sangue, e promover rapidamente a transição pacífica para um regime constitucional alinhado ao “Ocidente”. Mas a coisa não parece estar tão à mão, ainda que cautela analítica em situações voláteis seja bom.
Mas, se tal saída não rolar, até onde o Brasil está disposto a ir na colaboração com o “regime change” em Caracas? A questão, de ordem prática, talvez seja o foco mais emblemático da tensão entre as duas tendências. Que algumas vezes é explicada como oposição entre alas “adulta” e “infantil”, ou “racional” e “irracional”. São descrições insuficientes.
Uns parecem acreditar que a sobrevivência do bolsonarismo depende centralmente de livrar a América do Sul de qualquer núcleo de poder relacionado aos partidos do Foro de São Paulo. Outros talvez achem que é melhor cuidar de consolidar o poder por aqui mesmo, a arriscar um conflito de consequências políticas, regionais e internas, potencialmente desestabilizadoras.
As duas correntes têm argumentos. A favor da 2ª, há duas coisas que governos precisam pensar muitas vezes antes de fazer: convocar um plebiscito e começar uma guerra. #FicaaDica.