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sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Eleicoes 2014: o que os liberais podem esperar delas? Talvez pouco... - Paulo Roberto de Almeida

Nota preliminar, importante: Não me classifico como liberal, ou como qualquer outra coisa. Acho que todo rótulo, toda definição sintética, todo e qualquer tipo de classificação conceitual, sobretudo em matérias políticas ou econômica, são necessariamente redutores, quando não simplistas.
Certamente que, tendo vindo do marxismo estatizante, e evoluido com base na simples racionalidade instrumental, nas leituras e nas experiências de vida -- sobretudo depois de ter conhecido TODOS, sublinho todos, os capitalismos realmente existentes, avançados ou atrasados, e todos os socialismos, reais, surreais e esquizofrênicos -- hoje eu sou muito mais liberal em matéria econômica do que era em minha juventude, quando aderia (pelas leituras universitárias, obviamente) às soluções simplistas do socialismo igualitário e estatizante, e reconheço que os mercados livres podem fazer muito mais pela prosperidade dos povos e nações do que os regimes fortemente centralizados.
Mesmo aceitando que algumas soluções podem ter de ser inevitavelmente estatais -- provavelmente em matéria de educação e saúde, mas ainda aqui combinadas a soluções de mercado -- acredito que o Estado deva funcionar o mais possível em condições de competição market-like, ou seja, com abertura e transparência, custo-benefício, preços e retornos aferíveis.
Tendo feito esta longa introdução ao texto abaixo, vou postá-lo, alertando que preparei, preventivamente à pergunta efetuada pelos Estudantes pela Liberdade, como um guia pessoal de conduta, e um esclarecimento preventivo quanto ao próximo pleito.
Ou seja, não espero, e não esperem, muito dele.
As eleições NÃO vão dar o que o Brasil precisa, que seria uma reforma completa de seus fundamentos econômicos, administrativos, educacionais, culturais.
Mas, elas podem pelo menos nos ajudar a AFASTAR o que não serve, e eu digo imediatamente, o que NÃO nos serve: uma máfia totalitária, corrupta e mentirosa, instalada no poder, explorando a ingenuidade dos pobres e a conivência dos espertos e dos muito ricos.
Se ela permitir pelo menos isso, já será um ganho...
Paulo Roberto de Almeida


O que os liberais podem esperar das eleições de 2014?

Paulo Roberto de Almeida


Numa visão preliminar em torno das propostas apresentadas até aqui pelas três principais candidaturas (ou seja, as viáveis), a resposta mais realista seria esta: nada, ou muito pouco. Com efeito, todos os candidatos prometem aprofundar, manter, reforçar os existentes, e iniciar novos programas com benefícios sociais para todos e cada um. Todos prometem combater a inflação – uma preocupação que voltou a assombrar os brasileiros nos últimos três anos, pelo menos – e dizem querer garantir investimentos e empregos, sempre com a mão visível (já bastante pesada) do Estado como o principal indutor dessas políticas. Em outros termos, nada que possa entusiasmar os partidários de menos Estado e mais mercados, como devem ser os liberais, não é mesmo?
Vistos de perto, porém, os programas e as propostas desses candidatos possuem matizes entre si, sobretudo em suas declarações e entrevistas sobre temas específicos da agenda econômica. Com exceção da candidata governista, que promete manter as mesmas políticas de benefícios sociais – o que deixa supor que as mesmas ferramentas usadas até aqui continuarão a ser mobilizadas num eventual segundo mandato, talvez com as mesmas consequências, de menos crescimento e mais inflação – a candidata “sustentável” e o candidato socialdemocrata podem corrigir os equívocos mais nefastos dos atuais proponentes da “nova matriz econômica” (o que seria isso?), cujo efeito mais importante, na verdade, foi mais intervencionismo governamental, com cada vez menor eficácia. A razão principal parece residir num erro de diagnóstico dos keynesianos de botequim encarregados dessa política: eles acreditam que o principal problema da economia brasileira seja a insuficiência da demanda – e lá vão eles com nova expansão do crédito ao consumidor, que deve provocar mais inflação – quando os conselheiros econômicos da oposição acreditam que ele esteja na insuficiência da oferta, ou seja, a falta de investimentos (o que, aliás, é notório para quem quer que olhe os números).
A última novidade criada pela candidata governista foi prometer criar um novo tipo de crédito, para bicicletas, com o quê todos sairão felizes com a “bike” comprada em “dez vezes sem juros”. Os gênios governamentais se esquecem de que foram eles mesmos que criaram o problema, ao aumentar as tarifas de importação sobre as bicicletas chinesas que estavam sendo vendidas no mercado brasileiro, a preços bem mais em conta do que as equivalentes nacionais (mas isso vale para tudo, pois todos sabem que, em função da voracidade do ogro fiscal, o “custo Brasil” se torna cada vez mais pesado para todos os produtores brasileiros). Ou seja, o governo tornou as “bikes” nacionais e estrangeiras mais caras pelo seu protecionismo comercial desenfreado e agora quer endividar ainda mais os pobres consumidores brasileiros com oferta de mais crédito para comprar produtos que poderiam ser mais baratos, seja sem impostos de importação tão elevados, seja mantendo a esquizofrenia econômica do “custo Brasil”.
Liberais verdadeiros prometeriam abertura comercial, não é mesmo? Mas os dois candidatos de oposição prometem apenas “rever o Mercosul” e negociar tratados comerciais com os principais parceiros do Brasil. O que isso quer dizer? Pouco, ou quase nada. A liberalização comercial e a abertura aos investimentos do início dos anos 1990 fez mais para a competitividade e a melhoria da oferta interna de bens industriais do que todas as políticas comerciais e industriais de décadas passadas, mas elas foram breves e, sobretudo, se esgotaram com o “soberanismo econômico” dos governos lulo-petistas, que na verdade conseguiram reprimarizar as exportações brasileiras e reduzir o peso da indústria na composição do PIB. Liberais verdadeiros fariam políticas setoriais válidas para todos, não os remendos e puxadinhos que caracterizaram as improvisações econômicas dos companheiros no poder. Esse keynesianismo rústico só nos conduziu a impasses e a uma situação deplorável, quando comparada aos países que crescem.
A candidata “sustentável” surpreendeu a todos prometendo um “independência” para o Banco Central, o que foi julgado uma heresia perigosa pela candidata governista, que com toda a má-fé de que são capazes marqueteiros desonestos alertou que isso iria tirar comida dos pratos dos brasileiros. Não considerando a mentira deslavada, o que isso teria a ver com uma orientação liberal na economia? Também muito pouco, a menos que a candidata também prometesse que juros e câmbio iriam ser determinados essencialmente pelas forças de mercado, mais do que por considerações de governo. Ou seja, um banco central independente – mas comprometido com resultados que devem ser fixados por um Conselho Monetário também independente, com prestação regular de contas ao Congresso – pode, eventualmente, atuar mais energicamente no combate à inflação, e na defesa do poder de compra da moeda, como é o seu dever, do que um que ache que crescimento e emprego são objetivos das autoridades monetárias, e não do próprio governo, com políticas fiscais e setoriais adequadas.
O candidato socialdemocrata, por sua vez, já anunciou quem seria o seu ministro da Fazenda, o mesmo que estabilizou o real em 1999, que reequilibrou as contas externas em 2000, e que preparou as condições para a retomada do crescimento logo após, perspectiva perturbada porém pela crise argentina, pelos problemas energéticos, logo em seguida, e pela própria campanha eleitoral de 2002, quando as ameaças de “mudar tudo” levaram o dólar e a inflação para as alturas e deram um tombo enorme nos títulos da dívida externa brasileira. Trata-se de uma boa escolha, mas o candidato a ministro das finanças é realista, e sabe que não poderá fazer um “choque liberal” na economia, pois as condições não estão dadas para que o Brasil se torne, rapidamente, um “país normal” no cenário internacional. Sim, um país que vive à base de “dez vezes sem juros”, no qual o governo arrecada 38% do PIB, gasta 41% e investe menos de 2% não pode ser considerado um país normal.
Não existem, assim, condições objetivas para uma transição liberal no Brasil atual, embora se deva reconhecer que os dois candidatos oposicionistas prometem ser infinitamente mais “liberais” do que os keynesianos de botequim que hoje presidem aos rumos da economia brasileira (com os resultados à vista de todos). Uma coisa é certa: liberais terão bem mais espaços em governos conduzidos por um ou outro oposicionista do que a continuidade da gestão incompetente atual (aliás, com um ministro demitido).
A única coisa segura no cenário político atual no Brasil é que continuaremos com políticas econômicas intervencionistas, algumas mais distributivas do que outras, mais produtivistas, mas existem poucas chances de que uma agenda liberal venha a guiar os próximos dirigentes, capaz de aproximar o Brasil dos países maior sucesso no contexto internacional. Para que o Brasil tenha políticas econômicas liberais seria preciso que tivéssemos empresários verdadeiramente adeptos da competição de mercado (e não drogados nos subsídios e na proteção do Estado) e que estadistas com visão de futuro propusessem programas partidários comprometidos com uma nova fase de abertura aos investimentos e de liberalização comercial, para que os “espíritos animais” dos empresários pudessem empurrar o Brasil para um processo de crescimento sustentado, com distribuição social feita essencialmente mediante mecanismos do próprio mercado, em lugar das irracionalidades estatais da atualidade. 
Paulo Roberto de Almeida
Hartford, 28 de setembro de 2014

segunda-feira, 14 de julho de 2014

Fukuyama: 25 anos de Fim da Historia, e a democracia liberal de mercado ainda nao foi superada...

...e nem será dentro de em breve, pelo menos não enquanto alguns grandes atores -- Rússia, China -- e outros menores -- ditaduras atrasadas em alguns pontos do Sul, caudilhos ridículos na América Latina -- não se converterem plenamente às formas liberais de governança, o que só quer dizer uma coisa: democracias de mercado.
Mesmo que seus atuais ditadores não queiram, o processo vai acabar se impondo, pela força das demandas de seus próprios povos. Isso é inevitável e só depende do tempo e da educação política dos setores médios nesses países.
Permito-me relembrar que escrevi um texto, aos 20 anos da tese de Fukuyama, cuja referência e link aqui seguem:

O “Fim da História”, de Fukuyama, vinte anos depois: o que ficou?, por Paulo Roberto de Almeida, in: Meridiano 47, n.114, janeiro de 2010

Por enquanto fiquem com esta entrevista concedida por ele à Deutsche Welle, que me foi enviada por um leitor habitual deste blog.
Paulo Roberto de Almeida

HISTÓRIA

"Ainda tenho razão", afirma Francis Fukuyama, filósofo do "fim da história"

Cientista político americano, autor de "O fim da história", vê democracia liberal como ápice da evolução sociocultural. Em entrevista à DW, defende a teoria lançada há 25 anos e rebate noção de uma nova Guerra Fria.
Em 1989, o cientista político e economista americano Francis Fukuyama publicava seu famoso artigoO fim da história? na revista The National Interest. Nele, argumentava que a difusão mundial das democracias liberais e do livre capitalismo de mercado possivelmente sinalizavam o fim da evolução sociocultural da humanidade. Três anos mais tarde, ele publicaria o livro O fim da história e o último homem, onde expandia essas ideias.
Decorrido um quarto de século, os pontos de vista de Fukuyama continuam sendo debatidos e criticados. Em entrevista à DW, o filósofo de 61 anos afirma que tais ataques a seu texto são decorrentes de uma interpretação equivocada, e defende suas teses à luz de eventos geopolíticos recentes.
DW: Em 1989, o senhor publicou seu artigo mais conhecido, O fim da história?. Vinte e cinco anos atrás, numerosos críticos diziam: "Esse cara está errado." O senhor sente que foi mal entendido ou admite agora que estava errado?
Francis Fukuyama: Acho que os maiores problemas têm a ver com um mal entendido. O conceito de "fim da história" era a questão: em que rumo a história aponta? Para o comunismo – que era o ponto-de-vista de muitos intelectuais, antes – ou na direção da democracia liberal? E acho que, neste ponto, ainda estou certo.
História, no sentido filosófico, é realmente o desenvolvimento, ou a evolução – ou modernização – de instituições, e a questão é: nas sociedades mais desenvolvidas do mundo, que tipo de instituições são essas?
Acho que está bem claro que qualquer sociedade que pretenda ser moderna ainda precisa ter uma combinação de instituições políticas democráticas com uma economia de mercado. E eu não acho que a China, a Rússia ou qualquer outro concorrente invalidem esse argumento.
O senhor menciona a China e a Rússia. Eu gostaria de conversar sobre a Ucrânia. Onde o senhor nos vê historicamente nesse momento?
Bem, eu acho que a Rússia não se desenvolveu na direção de uma democracia liberal de verdade, e suas ambições territoriais e geopolíticas não desapareceram. Mas no fim das contas, eu acho que o sistema russo é muito fraco, ele depende completamente de preços altos de energia. Mesmo na Rússia ele não é aceito inteiramente como uma forma legítima de governo. Então não é um real competidor.
Quando o senhor vê o presidente russo, Vladimir Putin, na televisão, e vê o comportamento dele, o senhor o considera um bom exemplo para a sua tese de que reconhecimento é um impulsionador importante da história?
Penso que, de diversas maneiras, é isso. Porque ele e muitos outros russos recorrem a um poço de ressentimentos – de que a Rússia não teve reconhecimento, de que foi considerada fraca, de que os seus interesses não foram respeitados pelos países ocidentais durante a ampliação da Otan, e pelas coisas que aconteceram nas décadas de 1990 e 2000. Assim, eu creio que reconhecimento, para ele, é uma questão.
Putin na TV: movido pela necessidade de reconhecimento?
Os políticos ocidentais, americanos ou europeus, deveriam dar atenção, reconhecimento a Putin?
Acho que é tarde demais para isso. Muitos desses problemas foram baseados em decisões tomadas na década de 90, e é impossível desfazê-las. Eu realmente acredito que é preciso tratar a Rússia como um país sério, com seus interesses nacionais próprios. Eles podem não ser os mesmos que os nossos, mas é preciso, de qualquer forma, começar pelo respeito.
Os acontecimentos na Ucrânia parecem ser o início de uma segunda Guerra Fria. Entretanto, no momento há sinais de que ambos os lados estão cedendo. O senhor diria que essa Guerra Fria está suspensa, por enquanto?
A Guerra Fria foi um fenômeno tão diferente! Era um conflito global, um conflito de ideias e a respeito de dois sistemas políticos muito diferentes. Isso agora é uma batalha para restaurar a dignidade dos russos, sem implicações reais fora das áreas da antiga União Soviética. Então, nesse sentido, não é nem um pouco parecido com a Guerra Fria em si.
No tocante a sistemas e governos que funcionem, qual é a sua visão de seu próprio país, os Estados Unidos?
Eu argumento, num próximo livro, que o sistema político americano se deteriorou em muitos aspectos por ter sido seriamente sequestrado por diversos grupos de interesses poderosos. Muitos dos instrumentos de freio e contrapeso (checks and balances), de que nos orgulhamos, resultaram, na prática, no que eu chamo de "vetocracia", ou seja: grupos demais detêm o poder de barrar decisões. Como resultado, o Congresso ficou paralisado, o que eu considero um grande problema para nós.
As instituições democráticas americanas estão em decadência? O que isso significaria para os EUA, como um todo: eles são uma superpotência em retirada?
Não, não vejo a coisa assim, absolutamente, porque na verdade a economia americana está bem de saúde e é, provavelmente, a mais saudável de todas as grandes economias democráticas. Gás de xisto, Silicon Valley: há muitas fontes de crescimento e inovação. Eu apenas acho que o sistema político não vai bem. Mas a sociedade americana é sempre um pouco mais o setor privado do que o setor público.
Voltando a O fim da história, qual é a sua previsão para os próximos 10 ou 20 anos?
Acho que nós estamos passando por um período difícil, em que tanto a Rússia quanto a China se expandem. Mas estou convencido de que é um fenômeno limitado, que, a longo prazo, só existe uma ideia organizadora importante: a ideia de democracia numa economia de mercado. Portanto, a longo prazo, eu continuo otimista.