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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

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domingo, 5 de janeiro de 2014

Teoria do capital bibliográfico - Paulo Roberto de Almeida

Um texto antigo, mas sobre o qual "escorreguei", literalmente (revisando antigas listas de trabalhos, para colocar em ordem alguns extraviados), mas que ainda possui seu valor metodológico, uma vez que não mudei, fundamentalmente, de procedimentos, salvo agregar mais leituras online e em aparelhos eletrônicos.
Paulo Roberto de Almeida

Teoria do capital bibliográfico
Teses marxianas sobre relações de leitura e modo de redação

Paulo Roberto de Almeida

Arriscando-me a decepcionar alguns amigos – que por vezes me advertem que eu acabo escrevendo mais rápido do que eles conseguem ler minha produção – confesso que não tenho nenhuma receita particular sobre como e o quê fazer para ler bastante, digerir o máximo de informação possível e depois destilar esses insumos acumulados no conta-gotas da produção ensaística de pequeno porte ou no torrencial mais forte da elaboração livresca. Ou talvez eu tenha, sim, mas não sei se isso conforma um método muito efetivo ou aplicável em outros casos de atração pelos livros e pela arte da “escrevinhação”. Vejamos em todo caso o meu “modo peculiar de produção”.
No começo era a acumulação primitiva, como diria Marx, no meu caso uma carga concentrada de leituras estendendo-se ao longo de uma vida feita com os livros, pelos livros e para os livros. Depois da acumulação primitiva de leituras, veio a aplicação consciente de um modo de produção redacional que já passou por várias etapas históricas de desenvolvimento das forças produtivas: da redação manual em cadernos escolares até o capital fixo dos computadores e sistemas digitais de processamento de dados. As relações sociais de produção de meus artigos e livros foram alterando-se desde o ancien régime da máquina de escrever até o ultra-capitalismo informático, com o emprego das mais diversas técnicas, mas inevitavelmente resultando na mais-valia das resenhas críticas, dos ensaios analíticos e do alto valor agregado dos livros e compilações de trabalhos diversos. Tudo com um certo sentido de urgência e uma ponta de sentimento de atraso histórico, já que tenho sempre a impressão que estou atrasado na elaboração de algum trabalho planejado mentalmente ou iniciado algum tempo atrás.
Um primeiro método, mas talvez isso seja um vício, ou (numa versão mais amena) um pecado original, se situa na compulsão da leitura, no meu caso adquirida ainda antes de aprender a ler de verdade. Com efeito, frequento bibliotecas desde minha fase pré-alfabetizada e continuo a entreter esta atração fatal – a gentle madness, já disse um cultor passional de livros – por livrarias e bibliotecas em quaisquer circunstâncias, mesmo desconhecendo, em alguns casos longínquos, a língua em que estavam escritos aqueles obscuros objetos de desejo. Difícil ficar indiferente ao charme discreto dos livros.
A outra técnica consiste em ler sempre, continuamente, em qualquer tempo e lugar, sob chuva ou sob sol (literalmente), no inverno e no verão, andando ou dirigindo – o que não recomendo, sinceramente, pois que já bati, levemente, no parachoque adiante –, comendo ou bebendo e até, se possível, tomando banho (mas os únicos livros impermeáveis que conheço são feitos para bebês). Os audio-books poderiam suprir algumas dessas lacunas de leitura, mas ainda não encontrei Economia e Sociedade de Weber em formato cassette. É uma técnica provada e eficaz, mas ela pode trazer alguns problemas em contextos intensamente relacionais – familiares, por exemplo – ou mesmo na intimidade do casal: os cônjuges geralmente se irritam com o terceiro ou quarto “han-han, hum-hum” repetido. Para a santa paz do casal, recomendo uma companhia também livresca, bibliófila e leitora contumaz, mas a conjugação dos horários de dedicação compulsiva depende da capacidade de resistência do outro leitor voraz mas sonolento.
Trata-se apenas, como visto até aqui, das condições primárias e essenciais ao modo escrevinhador de produção, pois em algum momento se necessita transmutar – aufheben, diriam os hegelianos – a acumulação primitiva de leitura em mercadorias com valor de uso e, mais importante, valor de troca. Antes do produto final, vêm os meios de produção, tão ou mais importantes do que o capital inicial.
Borracha e lápis podem ser a base de tudo, mas ainda assim é preciso o suporte físico das idéias, a modesta folha de papel. Nos tempos da brilhantina, quando o computador fazia parte dos livros e filmes de ficção científica, um simples caderno escolar, desses de espiral, costumava dar conta do recado, mas eu sempre apreciei aqueles em formato brochura, suscetíveis de receber uma capa anódina e, providência prática, uma lombada com o tema indicativo de seu conteúdo (sociologia, história, antropologia, marxismo etc). Para as situações transitórias e incertas, ou seja deslocamentos e esperas repentinas, eu recomendo um caderninho de bolso, desses que você saca da “algibeira” (como diria Machado de Assis) para anotar rapidamente alguma nova idéia maluca ou o título de um livro encontrado por acaso. Em toda e qualquer circunstância, porém, eu costumo carregar um desses caderninhos, que saco do bolso da camisa quando me dedico ao meu esporte regular e preferido, a leitura em livrarias…
Adquirida a matéria-prima da informação, ainda assim é preciso dar uma forma precisa ao produto da manufatura, obra do cérebro e da inspiração mental – e de alguma transpiração física, também –, uma vez que a mais valia final é sempre o feliz resultado da conjugação de algum tipo de insumo bruto e da atividade humana criadora. Tenho por hábito isolar um determinado problema e ficar pensando nele no trajeto para o trabalho ou de volta para casa, selecionando hipóteses, teses e antíteses, que depois serão combinadas numa síntese final mais ou menos acabada. Digo “mais ou menos”, porque mantenho dezenas, se não centenas, de trabalhos inacabados, de artigos semi-acabados e de projeto de livros, antes em simples notas em folhas de papel (jogadas em alguma pasta amarelada pelo tempo), hoje em arquivos digitais, dúzias e dúzias de “working files” que esperam acabamento algum dia. Isso não tem nenhuma importância, pois o que vale é unir o capital acumulado com a centelha – iskra, para os bolcheviques – da interpretação criadora, de molde a extrair a mercadoria valiosa do trabalho materializado.
O trabalho propriamente ideológico da produção intelectual é o que mais consome energia, impossível, todavia, de ser mensurada na escala monetária do capital circulante, pois que pertencente ao reino dos bens intangíveis e das criações do espírito. Muito fosfato, como diziam antigamente nossas avós, é consumido nessa atividade muito pouco primitiva de agregação de valor ao futuro objeto manufaturado (ele sempre o é, mesmo quando resultando da produção digital). A mais valia intelectual é sempre única e original e independe do estado de desenvolvimento das forças produtivas ou das relações sociais de produção; num certo sentido, trata-se de uma atividade transhistórica ou ahistórica, sem qualquer alusão a começo, meio ou fim (pouco adaptável a uma teoria materialista da história).
Conjugadas, de um lado, as técnicas e os materiais de produção (insumos e bens de capital) e, de outro, a mais valia intelectual, eis que surge como da cabeça de Minerva o produto final desse processo produtivo, pronto para ser consumido em sua forma inicial ou transformada (artigo ocasional, livro comercializado por algum capitalista editorial, que ainda vai auferir a maior parte dos lucros da operação, ficando o verdadeiro autor apenas com as glórias remuneradoras tão somente do ego e do espírito). Se o autor, como no meu caso, possui seu próprio canal de distribuição artesanal (neste caso o meu website www.pralmeida.org), ele escapa de transferir renda para o referido capitalista. Se no entanto pretende alcançar o circuito tradicional das livrarias pequeno-burguesas, tem de submeter-se a ser expropriado de parte (uma boa parte) de seus rendimentos pelo editor-capitalista, numa típica situação de “exploração do homem pelo homem”. Ele também pode participar de alguma cooperativa de produção, caso no qual terá de submeter-se às regras do coletivo popular, mas pode preferir um sistema auto-gestionário mais restrito, geralmente explorando a mão-de-obra de amigos e familiares (trabalho não pago).
No meu próprio caso, a maior parte de minha produção não é mercantilizada, podendo mesmo ser objeto de apropriações indevidas por parte de estudantes preguiçosos que se eximem de fazer pesquisa e vêm pilhar minha mais valia intelectual num processo de incorporação anárquica que parte do princípio de que “a propriedade é um roubo”. Trata-se de uma “filosofia miserável”, como poderia afirmar Monsieur Proudhon, ao que os adeptos do marxismo lassaliano poderiam retrucar: “de cada um segundo sua capacidade, a cada um segundo sua necessidade”.
Muito bonito na teoria, mas pouco eficiente na prática, pois a continuidade dessa apropriação de bens de uso (e de troca) sem a garantia do devido retorno dos direitos de propriedade intelectual pode resultar no esgotamento do processo produtivo associado a essa organização social, gerando esclerose e declínio, como ocorreu aliás na trajetória dos socialismos realmente existentes ao longo do século XX.
Quanto aos autores, como eu mesmo, que poderiam viver de seu trabalho intelectual mas dele não derivam sustento para si mesmo e suas famílias, fora de uma relação de assalariamento quase servil, eles só têm um caminho a adotar: grilhões precisam ser rompidos no esforço contínuo de liberação do homem e de sua capacidade espiritual. Eles serão rompidos, pois não há mais nada a perder. Autores de todo o mundo, uní-vos na defesa de vossos direitos. Viva o pensamento livre e sobretudo sua expressão material.

Paulo Roberto de Almeida
Washington, 13 de junho de 2003

domingo, 10 de novembro de 2013

Lei de Murphy para bibliotecas caoticas (como a minha...)

Uma lei de Murphy, que na verdade foi inventada por mim, tal como aplicada a minhas estantes caóticas, numa biblioteca inteiramente desorganizada:

Só conseguimos encontrar algum livro de que necessitamos quando já não mais o estamos procurando.

Derivações:
Se encontrou, é porque não precisa dele no momento.
Se precisa dele, não há nenhuma chance de encontrá-lo.

Conclusão:
Esta lei de Murphy não permite nenhuma exceção à regra fundamental, justamente por isso se trata de uma lei de Murphy, por certo adaptada à minha situação.

Mas, é uma lei universal dos leitores caóticos, como eu por exemplo...
Paulo Roberto de Almeida

terça-feira, 25 de junho de 2013

Esse saudavel habito da leitura, esse vicio incuravel, que nos consome... - Coisas de Nina

Pesco, num blog alinhado com afinidades eletivas, o material que vai abaixo, que por acaso também pescou no meu blog algumas frases soltas em reposta (ultra rápida) a um perguntador.
Como gostamos das mesmas coisas, de livros e de ler, vale o intercâmbio recíproco:

Assuntos de Nina

Faz parte de mim

Olá!!

Dando uma pausa em assuntos políticos (risos), irei explicitar um hábito diário em minha vida que só me impulsiona a construir e construir e construir. Vamos lá? Me acompanha?!

Já me referi sobre este assunto aqui no blog (se quiser conferir, clique aqui), mas volto a tocar nesse mesmo assunto porque, nessa semana que passou, li no blog de um contato umas dicas que ele passou para quem quiser adotar esse hábito de ler. Muito me interessou - Claro!! - e resolvi, então, compartilhar com vocês.

Mas primeiro quero esclarecer que a leitura é parte essencial em minha vida. Mas não digo a leitura somente para estudos (que são importantes, também), mas as literaturas nacionais e estrangeiras e história que são meus preferidos. Eu gosto tanto de ler, que quando me perguntam qual o livro que estou lendo, tenho que passar uma lista. Pois não é somente um que leio, mas vários. E confesso a você que - às vezes - não dou conta de tanta leitura e acabo tendo que pausar algumas horas para me organizar novamente.

Livro que indico.
Esses dias mesmo, escrevi em uma rede social que "Quanto mais busco conhecer a História da Humanidade, mais sinto desejo de construir meu futuro no meu hoje." E esse conhecimento é através da leitura.
Quando vou a um passeio ou faço uma viagem, me pego pensando "já estive nesse lugar". Mas não é uma questão de ter tido outra vida ou já ter passado por aquele lugar. Lembro-me de algo que já li sobre e das informações que me veio como um insight.

Eu acredito que todo bom leitor sempre recebe a indagação que meu colega leitor e blogueiro recebeu em seu blog:

"Pode nos explicar como estudar sistematicamente? Porque como podemos observar para o senhor deu muito certo! Técnicas? "

A resposta do Sr. Paulo Roberto de Almeida foi excelente, na minha opinião:

Primeiro: ler o tempo todo, repito, o tempo todo. [bons livros, entenda-se]
Segundo: tornar-se um rato de biblioteca, literalmente, mas pode ser de livrarias e sebos, também.
Terceiro: anotar, sublinhar, resumir o que se aprende.
Quarto: escrever o resultado, depois de alguma reflexão.
Quinto: repetir tudo isso, o tempo todo, continuamente, sem parar.
Sexto: não cansar de fazer isso, mas ter prazer em fazê-lo.

E o sétimo passo, depende só de você. Certamente existem particularidades que cada leitor deve adotar. Pois além de existir técnicas, cada leitor é diferente um do outro.

Outra coisa que gostaria de citar é que quem lê mais, escreve e dialoga melhor. Por isso disse, lá no início da postagem, que a leitura me impulsiona a construir e construir e construir. A leitura, particularmente, me faz aprender, reaprender e assim vai. Um universo novo se constrói a cada leitura que faço.

Caro leitor, quer fazer a educação, mesmo a ensinada em sua casa, funcionar? Pratique a leitura. Assim formaremos cidadãos críticos e não formadores de opinião.
Quanto a esse pensamento sobre "formadores de opinião", aconselho a ler um texto escrito pelo ator e humorista Fábio Porchat, para o Estadão. Confira! Vale a pena.

Para finalizar e sem mais delongas, ler faz parte da vida. Sem ler, você não será somente analfabeto, será só mais um nas estatísticas.

Meu abraço e muito obrigada.

domingo, 23 de junho de 2013

A formula magica da felicidade, testada e comprovada - Paulo Roberto de Almeida

Não, não se trata da felicidade no amor, a realização da riqueza pessoal, ou o sucesso profissional (mas pode até ser).
Alguém me pergunta isto:

Anônimo deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Duas imagens, duas atitudes: com meu inteiro apoio...":

Pode nos explicar como estudar sistematicamente? Porque como podemos observar para o senhor deu muito certo! Técnicas? 

Minha resposta:

Primeiro: ler o tempo todo, repito, o tempo todo. [bons livros, entenda-se]
Segundo; tornar-se um rato de biblioteca, literalmente, mas pode ser de livrarias e sebos, também.
Terceiro: anotar, sublinhar, resumir o que se aprende.
Quarto: escrever o resultado, depois de alguma reflexão.
Quinto: repetir tudo isso, o tempo todo, continuamente, sem parar.
Sexto: não cansar de fazer isso, mas ter prazer em fazê-lo.

Voilà!
Paulo Roberto de Almeida

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

"Um pais se faz com homens e livros"; Livros??!! Onde estao???

Pode ser que a frase de Monteiro Lobato, cunhada (creio) em meados da década dos 20, pretendesse apenas vender livros de sua recém criada Companhia Editora Nacional. Pode ser que ele fosse sincero.
Em todo caso, é um fato que pessoas que leem conseguem ter melhor desempenho didático do que aquelas que não leem. Ainda assim, professores, que deveriam supostamente concentrar sua atenção no lado didático da atividade, leem muito pouco, como indica esta pesquisa. Pode ser também que seja por falta de dinheiro, ou seja, salário reduzido, mas o que não se compreende é por que o MEC não tem um programa de distribuição de livros para os professores primários.
Incompreensível, de fato...
Paulo Roberto de Almeida 

Menos da metade dos professores de escolas públicas leem no tempo livre
Agência Brasil, 5/02/2013
 
A pesquisa foi realizada pelo QEdu: Aprendizado em Foco, uma parceria entre a Meritt e a Fundação Lemann
Um cabo de vassoura que era capaz de falar e sentir era o protagonista do primeiro livro lido pela então adolescente Denise Pazito. Hoje, professora e pedagoga no Espírito Santo, ela fala da experiência em seu blog. "O livro foi indicado pela escola. Provavelmente, eu estava no 4° ou 5° ano. Ele se chamava Memórias de um Cabo de Vassoura e o seu autor era Orígenes Lessa. Professora inspirada a minha. Acertou na mosca. Uma história encantadora. Me encantou pelo mundo das letras."

Mas assim como são capazes de encantar, os professores têm em suas mãos o poder de desencantar, não por intenção, às vezes por desconhecimento. Uma pesquisa feita pelo QEdu: Aprendizado em Foco, uma parceria entre a Meritt e a Fundação Lemann., organização sem fins lucrativos voltada para educação, mostra que menos da metade dos professores das escolas públicas brasileiras tem o hábito de ler no tempo livre.

Baseado nas respostas dadas aos questionários socioeconômicos da Prova Brasil 2011, aplicados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), e divulgados em agosto do ano passado, o levantamento do QEdu mostra que dos 225.348 professores que responderam à questão, 101.933 (45%) leem sempre ou quase sempre, 46.748 (21%) o fazem eventualmente e 76.667 (34%), nunca ou quase nunca.

No caso de Denise, a leitura levou essa prática para as salas de aula, no entanto, muitos brasileiros terminam o ensino básico sem ler um livro inteiro. Para além da falta do hábito de leitura, a questão pode estar ligada a infraestrutura.

"O número de professores que não leem é chocante, mas isso pode estar ligado ao acesso. É preciso lembrar que faltam bibliotecas e que um livro é caro. Um professor de educação básica ganha em média 40% menos que um profissional de ensino superior. Acho que faltam políticas de incentivo. Não acredito que seja apenas desinteresse", diz a diretora executiva do movimento Todos pela Educação, Priscila Cruz.

Um levantamento divulgado em janeiro pelo movimento mostra que o Brasil precisa construir 128 mil bibliotecas escolares em sete anos para cumprir uma lei federal que vigora desde 2010. Segundo a pesquisa, faltam 128 mil bibliotecas no país. Para sanar esse déficit até 2020, deveriam ser erguidos 39 espaços por dia, em unidades de ensino públicas e particulares. Atualmente, a deficiência é maior nas escolas públicas (113.269), o que obrigaria a construção de 34 unidades por dia até 2020.

Para Priscila, uma possível solução seriam os livros digitais. O Programa Nacional de Formação Continuada em Tecnologia Educacional (ProInfo Integrado) do Ministério da Educação distribui equipamentos tecnológicos nas escolas e oferece conteúdos e recursos multimídia.

Além disso, o governo facilita o acesso aos conteúdos por meio da distribuição de tablets, tanto para professores quanto para estudantes. No ano passado, o MEC transferiu R$ 117 milhões para 24 estados e o Distrito Federal para a compra de 382.317 tablets, destinados inicialmente a professores do ensino médio.

Sobre o acesso digital, os dados do levantamento do QEdu mostram que 68% dos professores (148.910) que responderam à pergunta usam computador em sala de aula. O estado com a maior porcentagem é Mato Grosso do Sul: 95% dos professores disseram que usam o equipamento. O Maranhão é o estado com a menor porcentagem (50,5%) de professores fazem o uso do computador. É lá também onde se constatou a maior porcentagem de escolas onde não há computadores: 38,3%. Estão no Sudeste, no entanto, as maiores porcentagens dos professores que acreditam não ser necessário o uso de computador nas salas: Minas Gerais (16%), Rio de Janeiro (15,4%) e São Paulo (15%).
O responsável pelo estudo, o coordenador de Projetos da Fundação Lemann, Ernesto Martins, diz que o país ainda tem problemas estruturais que dificultam o acesso a tecnologias. "Existem muitos desafios no país ligados a problemas de infraestrutura. Não apenas de acesso às máquinas, mas de acesso à internet, à qualidade dos sinais", disse.
Ao recepcionar o professor norte-americano, o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, ressaltou a importância dos meios digitais: "O conteúdo ao qual o filho dos mais ricos tem acesso pode ser dado aos menos servidos de educação. Queremos tornar a educação não algo escasso, mas um direito humano que todas as pessoas possam ter", disse.

domingo, 22 de abril de 2012

Ah, esses museus europeus...

Este post é para deixar encantados os apreciadores da cultura refinada, e também para registrar uns poucos -- foram muitos, dezenas mais do que vão aqui consignados -- museus que frequentamos, eu e Carmen Lícia, neste périplo acadêmico-cultural pela velha Europa. Sim, acadêmico, por um lado, já que estou dando aulas na Sorbonne (mas moderadamente, digamos assim), em de outro lado, aproveitando o tempo livre para percorrer os museus da Europa.
Bem, o post pode também irritar alguns inimigos da cultura, do saber, e dos prazeres culturais -- um já se manifestou aqui, como registrei num post abaixo -- e por isso reincido no crime que cometo de maneira absolutamente consciente, e até provocadora: sou sim amigo da boa cultura, do conhecimento agradável, da sofisticação intelectual. E o faço em pleno trade-off financeiro-intelectual: investir em arte, em livros, em cultura, em novos saberes sempre tem alto grau de retorno, que é o prazer de apreciar um belo quadro, saber um pouco mais de artistas da pluma, do pincel, da pena, do computador, poder degustar um bom prato e um excelente vinho, tudo isso com tempo, sem a pressão do trabalho ou de algum compromisso profissional. 
Bem, mas esse porquinho que vai aí do lado não tem culpa nenhuma nessa história, apenas quis registrar a iguaria num "macelaio" de Bologna, que de certa forma também faz a sua arte, talhando belos pratos que prometem muito e só de contemplar dão água na boca.
Estou sempre pressionado por trabalhos prometidos, com um pipeline mais longo do que seria desejável, o que não impede de largar tudo e percorrer centenas de quilômetros apenas para visitar uma exposição do outro lado do continente. Impossível ficar em apenas um museu, pois as atrações se oferecem a todos e a cada um a cada virada de página de jornais de revistas.
Os museus europeus se completam, obviamente, mas em mais de um sentido. Em vários você tem "buracos", ou seja, obras emprestadas de um a outro, para exposições temáticas ou especializadas num artista. Mais de uma vez visitamos a "casa" de um, transformada em museu, para depois visualizar as obras que "faltavam" em outro museu, a centenas de quilômetros dali. Aliás, já nos aconteceu isso até na China, com peças da Umbria (Museu de Perúgia), que estavam numa exposição em Shanghai sobre os 400 anos da morte de Mateo Ricci (aliás em Beijing, onde ele está enterrado, na Academia Militar, e temos fotos das tumbas dos jesuitas).
Algo do gênero aconteceu, por exemplo, com Van Gogh, depois que visitamos seu ambiente derradeiro de trabalho, em Auvers-Sur-Oise, uma cidadezinha-refúgio de artistas, ao norte de Paris, onde ele pintou o Doutor Gachet, que o tratou e o acolheu muito bem, o albergue onde ele se alojou, e também esta igreja, como sempre interpretada à sua maneira. Soubemos, por esses acasos que acontecem, quando se lê toda a imprensa europeia, que uma grande exposição sobre ele estava quase terminando em Genova. Pronto, bastou isso para desviarmos completamente o roteiro da programada Europa central (Alemanha, Praga, e outras paragens frias por lá), para enveredarmos pela nossa Itália sempre acolhedora e fascinante. 
Valeu a pena, pois não era apenas sobre Van Gogh, e sim sobre vários da mesma época, com Cezanne, Monet, e Renoir (que tínhamos visto, como acima ilustrado, em sua casa de Cagnes-Sur-Mer). Aqui vai o cartaz da mostra, no fabuloso Palazzo Ducale de Genova.
Não foi a única exposição em Genova, obviamente, mas seria impossível relatar tudo o que vimos, inclusive no belo museu marítimo, obra arquitetônica do conhecidíssimo Renzo Piano. O conteúdo é mais do que compensador, aliás absolutamente didático, e quase me sinto um companheiro de Colombo, de Fernão de Magalhães e de outros. Aliás, em Dieppe, fomos ver o Museu La Perouse, que ainda pretendo registrar aqui, quando possível. 

Um excelente exemplo de ubiquidade está e presente em Monet, aqui apenas relembrado pelo seu jardim de Giverny, a oeste de Paris. Sua casa também foi transformada em museu, e o jardim, com as pontes "japonesas" nos étangs floridos, foi preservado quase como se ele estivesse ali, vigiando o trabalho dos jardineiros que cuidaram dessa arte "vegetal", enquanto ele cuidava de telas e pincéis, em sua casa-atelier. Monet está em todas as partes na Europa, e até no Brasil (no museu de Arte de SP, por exemplo).
Hoje tudo pode ser visto pelo Arts Project do Google, que permite "penetrar" na tela de perto, mas sempre é uma surpresa chegar perto do original e tentar descobrir como trabalhava aquele artista, como eram feitos aqueles minúsculos pontinhos de tinta que, no conjunto se convertem em telas fascinantes.

Vamos em frente. Já conhecíamos muitos dos museus que estamos visitando pela segunda ou terceira vez, o Louvre incontáveis vezes, mas sempre aparece um novo, ou uma nova exposição (como a de Artemísia, no Maillol, por exemplo).
Uma surpresa agradável, neste caminho através da Suíça, vindos da Itália, foi descobrir o artista completo que era Herman Hesse, o criador de obras literárias universais, das quais eu li poucas, como Sidharta, O Lobo da Estepe, ou Demian, entre muitas outras. Foram todas as suas obras literárias, ou no papel, que acabaram lhe concedendo o Nobel de Literatura em 1946, como retratado abaixo.
Mas pouco conhecíamos, ou raramente tínhamos ouvido falar, do Hesse pintor, geralmente de seu próprio ambiente. Pois o Herman Hesse estava presente em dois cenários, complementares, com obras intercambiadas ou selecionadas dentre coleções particulares, o que é sempre magnífico, pois raramente se tem a oportunidade de ver de perto o que está fora dos museus oficiais.
Na casa em que ele morou em Montagnola, perto de Lugano, estão muitos livros, manuscritos, objetos pessoais e, também, muitas aquarelas, como esta que ele pintou a partir da vista que tinha de sua casa no alto da "colina de ouro". Ali mesmo, na praça, comemos num restaurante local, a excelente comida suíça de sempre. 
Como fazer, então, para descobrir ainda mais coisas de Herman Hesse? Só descobrindo por acaso, ou indo de um museu a outro.
Por sorte nossa, assim como fomos ao último dia do Van Gogh em Veneza, e ao último dia dos arquivos do Vaticano, no museu Capitolino, em Roma, conseguimos encaixar uma visita ao Herman Hesse pintor no Kunstmuseum de Berna, onde pinturas similares estavam expostas, mas basicamente a partir de coleções particulares (como era o caso também de muitos Brueghel em Como).
A pintura ao lado, retrata o Ticino suíço, mas não poderia estar na sua casa de Montagnola, pois foi adquirida por alguém (nenhum dos proprietários particulares teve seu  nome revelado, provavelmente por razões de segurança, mas talvez também por razões fiscais ou de herança...).
Quando residiu em Berna, Herman Hesse foi acometido de depressão, no curso da primeira guerra mundial, quando começou a pintar. 
Foi lá também que escreveu Demian, publicado com o nom de plume de Emil Sinclair, em 1917, como revela esta capa da primeira edição, pelo seu editor alemão. Hesse ainda era muito inseguro quando escreveu esse romance, quase autobiográfico.
Dá vontade de ler novamente. 
Aliás, para não me deixar sem companhia de "bolso" -- sim, além de meus Moleskines de bolso, um médio e um pequeno, sempre tenho um livrinho de bolso. Antes era um Kant no Paraíso, que deixei em Paris; depois foi o Erasmus, de Stefan Zweig -- acabei adequirindo, na casa de Montagnola, uma edição italiana de vários escritos de Hesse sobre livros e leituras: Una biblioteca della letteratura universale (Milano: Adelphi Edizione, 1979), que já está um pouco amassado de tanto andar no meu bolso, em todas as partes...
O resto fica para outra ocasião...


Paulo Roberto de Almeida 
(Basileia, 23/04/2012)

terça-feira, 8 de março de 2011

Reflexões ao Léu, 5: Livros e leituras... - Paulo Roberto de Almeida

Reflexões ao Léu, 5: Livros e leituras...
Paulo Roberto de Almeida

Quantos livros já fui, estou sendo, serei capaz de ler nesta minha curta vida de leitor desorganizado? Devo confessar que comecei tarde, apenas aos sete anos, e perdi algum tempo de minhas ecléticas leituras da atualidade concentrado demais no marxismo-leninismo. Que fazer? Já fui guevarista, marxista-leninista, social-democrata radical, antes de virar este anarquista literário que me parece bem...
Mas, voltemos: quantos livros eu poderei computar em minha contabilidade de leituras responsáveis? Sinceramente não sei, e sempre me indago sobre se é possível um balanço desse tipo, tantos são os livros que lemos de relance, que começamos e deixamos, que largamos no meio do caminho por desinteresse, que perdemos, que nos roubam (ah, esses amigos infiéis!), que tropeçamos neles numa biblioteca ou livraria...

Segundo cálculos que nos oferece meu amigo o embaixador Francisco Seixas da Costa, atualmente em Paris depois de ter passado por Brasília, a conta é limitada: talvez pouco mais de seis mil livros. Sacrebleu! Só isso?
Escreve ele num dos posts de seu saborosíssimo blog Duas ou três coisas...:

“... se alguém, entre os 15 e os 75 anos (as idades são flexíveis, mas trata-se de uma média de 60 anos de leitura), tiver lido, com regularidade, dois livros por semana, sabem quantos livros leria no final? 6.240 livros!”
Um outro especialista consultado por ele, calculava que “o número máximo real não pode mesmo passar dos cinco mil livros lidos, em toda uma vida. E, para isso, teria de ser um excelente e regular leitor.”
(“Os Livros e as Vidas”, 4/03/2011)

Extremamente preocupantes esses cálculos, pois isto significa que eu estarei deixando de fora pelo menos outros cinco ou seis mil livros, que estão esperando seja em minha biblioteca particular, seja naquelas que frequento mais assiduamente, ou nas livrarias e casas de amigos (sim, de vez em quando aproveito uma visita para remexer em bibliotecas alheias).
Que tragédia! Quantos livros eu deixarei de ler, quanta coisa perdida para sempre?! (Nessas horas eu tendo a me aproximar da teoria da reencarnação, desde que algum ente supremo da mesma “seita” me garantisse que eu voltaria como bibliotecário, do contrário estaria sumariamente demitido.)
Calculo, por cima, que para terminar os livros da minha biblioteca e os que passeiam por aí, interessantes, eu necessitarei ainda de uns 15 ou 20 anos, isso se ler dois ou três por semana, como recomendaria o embaixador e seu amigo leitor.

Bem, talvez não fosse exagerado, mas isso me lembra uma historieta com Winston Churchill, quando lhe perguntaram sobre as razões de seu sucesso.
“Conservação de energia”, disse ele. “Nunca fique de pé, quando puder ficar sentado. E nunca fique sentado quando puder ficar deitado”.

Acho que Churchill tinha razão: vou logo deitar na rede e retomar os quatro ou cinco livros que tenho espalhados pela casa...

Brasília, 8 de Março de 2011