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segunda-feira, 14 de março de 2022

As loucuras e paranoias amazônicas dos militares brasileiros - Marcelo Godoy (OESP)

 Transcrevo a partir de postagens de Carmen Licia Palazzo:

"Sempre comentei que essa visão dos militares era absurda. O Villas Bôas a essas alturas poderia se privar de passar vexame. É o que eu acho, SIM, e não é de agora."

Carmen Lícia Palazzo


"Villas Bôas usa canção antifascista para provocar Macron às vésperas de eleição

General faz publicação sobre a Amazônia em meio à campanha eleitoral francesa; bolsonaristas se identificam com a extremista de direita Marine Le Pen

Marcelo Godoy

O Estado de S.Paulo, 14 de março de 2022 | 10h43

Ex-comandante do Exército, o general Eduardo Villas Bôas tuitou no dia 11 de março a seguinte frase: "O que espera Macron na Amazônia". Em seguida, postou um vídeo em que militares brasileiros – guerreiros de selva – cantam uma versão verde-oliva da música Bella Ciao, o famoso canto partigiano nascido durante a 2.ª Guerra, nos Apeninos Modenenses, região onde lutou a Força Expedicionária Brasileira. 

A canção da resistência italiana conta a história de um jovem que acorda pela manhã, encontra o invasor nazista e decide seguir os guerrilheiros. Ele diz à sua amada, que, se morrer, deve ser enterrado num alto de montanha ao lado de uma flor para que digam os que passarem por ali: "essa é flor do partigiano, morto pela liberdade". A versão verde-oliva fala dos guerreiros de selva que devem pegar suas armas para "se for preciso, matar ou morrer pela Nação e liberdade". 

O paralelo entre os partigiani e a estratégia de defesa para a Amazônia é evidente. Os militares brasileiros – sobretudo os do Exército – dedicaram-se a desenvolver uma teoria de defesa para a região em grande parte baseada na percepção de que as principais ameaças ao Brasil estão no hemisfério Norte. Os pesquisadores Celso Castro e Adriana Marques acrescentam um ponto nessa equação ao associarem "a crescente importância simbólica da batalha de Guararapes para o Exército à percepção institucional de que a Amazônia é alvo da cobiça internacional e deve ser defendida".

Assim, se a campanha de Guararapes, com suas emboscadas, "remete implicitamente à doutrina de resistência que foi desenvolvida pelo Exército na década de 1990", a música dos partigiani tem o mesmo papel simbólico, ainda que a memória oficial da FEB, como escreveu Teresa Isenburg, em sua obra O Brasil na Segunda Guerra Mundial, tenha quase apagado da história o papel dos guerrilheiros italianos que lutaram ao seu lado. Para quem já esqueceu, 69 mil deles – liberais, socialistas, democratas-cristãos e comunistas – morreram na luta contra os nazi-fascistas; outros 62 mil desapareceram no conflito. 

Foi a Divisão Modena/Armando, chefiada por Mario Ricci, que libertou a cidade de Porretta Terme, localidade que serviu depois de quartel-general para a FEB. Ricci, o Comandante Armando, era um comunista veterano da guerra civil espanhola. Sua unidade foi enquadrada no 5.º Exército Americano e acabou reconhecida como força beligerante. Bella Ciao é desde então canção presente em toda comemoração do 25 de abril, o Dia da Libertação da Itália.

O general Villas Bôas comandou na Amazônia. É dado a polêmicas no Twitter. Em 2018, teve Lula e a impunidade como alvo. Fez coro em 2019 com Jair Bolsonaro, escalando a crise com a França, quando Emmanuel Macron sugeriu um status internacional para a floresta diante do recorde de queimadas registrado no primeiro ano do governo do capitão. Agora, resolve voltar à carga contra o francês, no momento em que Macron se prepara para disputar o primeiro turno da eleição presidencial, em 10 de abril. 

O francês tem sua reeleição praticamente garantida. Sua popularidade cresce nas pesquisas desde a invasão da Ucrânia, levada a cabo por Vladimir Putin, um aliado de Bolsonaro. Enquanto isso, a candidata in pectore do bolsonarismo na França – Marine Le Pen – patina e luta para se desvencilhar da incômoda proximidade com o líder russo. Diante de tudo isso, o que faz Villas Bôas? Tuíta. O general parece ter predileção por períodos eleitorais para lançar suas declarações polêmicas.

Emmanuel Macron, França

A França mantém com o Brasil uma fronteira terrestre de 730 quilômetros, próxima da foz do Amazonas. Na Guiana, está estacionado, desde 1973, o 3.º Regimento Estrangeiro de Infantaria (3.º REI), que protege a base de lançadores de foguetes em Kourou. É tropa especializada em guerra na selva. O Estado brasileiro mantém acordos militares com os franceses, como o projeto para a construção de quatro submarinos da classe Scorpène para a Marinha. Trata-se, portanto, de países aliados. 

Em vez de se prestar a fazer provocações que servem apenas para excitar a base bolsonarista nas redes sociais, generais do Planalto, como Villas Bôas, contribuiriam mais para o País se lembrassem que as principais características dos conflitos de hoje são a letalidade seletiva e efetiva, o maior alcance e a precisão das armas e a robotização do campo de batalha. Para não falar das ações no espaço cibernético, do domínio aéreo e espacial e de conflitos nas áreas urbanas, como a Rússia mostra na Ucrânia. O Raymond Aron de Pensar a Guerra, Clausewitz, explica mais o momento atual do que David Galula, com seu Contrainsurreição, Teoria e Prática. 

Há perguntas sobre dissuasão de ameaças extrarregionais que um tuíte não responde. Os Comandos Militares da Amazônia e do Norte são dotados de capacidade dissuasória convencional, segundo o conceito estratégico A2/AD – antiacesso e negação de área – usado pelas maiores potências militares do planeta? O Brasil tem em suas Forças de Prontidão (FORPRON) brigadas de emprego estratégico e geral. Mas apenas duas das seis brigadas de infantaria de selva fazem parte desse sistema. É necessário acrescentar outras? Os comandos da Amazônia têm defesa antiaérea de média e grande altura? Vão receber no futuro os mísseis AV-TM 300? 

Submarino Riachuelo

De origem francesa, o Riachuelo, de 75 metros, 2.200 toneladas, é alto como um prédio de quatro andares e tem grande poder de fogo; primeiro de uma frota de quatro novos submarinos da Marinha do Brasil, foi ao mar pela primeira vez em dezembro de 2018 

A Defesa do Brasil não precisa de provocações tolas aos seus aliados, mas de um debate que explique à população por que o País tem 80 mil homens em sua Marinha e menos da metade dos navios e submarinos do Reino Unido, que mantém 35 mil homens na Armada de Sua Majestade. É preciso discutir a qualidade, onde e como são gastos os recursos do Ministério da Defesa. Assim como reconhecer que a melhor dissuasão que o Brasil pode ter é se livrar da política ambiental negacionista, que se acumplicia com criminosos florestais, garimpeiros ilegais e oportunistas em busca de botim nas terras indígenas.

Em vez disso, o bolsonarismo cria o fantasma do porta-aviões Charles de Gaulle para espantá-lo com um tuíte. Macron se torna o símbolo de uma tal Nova Ordem Mundial, que reuniria degenerados, apóstolos do politicamente correto, ateus, gays, feministas, ambientalistas, intelectuais, jornalistas, liberais, comunistas e... George Soros. A extrema direita é assim: trata Putin como aliado, o homem que vende armas a Nicolás Maduro e bombardeia a Ucrânia, mas vota contra a securitização do meio ambiente na ONU. Quem sabe se um dia vai achar 'cool' invadir a Guiana? Jânio quis o mesmo em agosto de 1961; a renúncia nos poupou dessa aventura."

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"Mais um artigo que se relaciona com o anterior, que postei. Vale MUITO a leitura."(CLP)

"O que a Ucrânia e Putin têm a ver com a Amazônia e Bolsonaro

Presidente brasileiro viu na discussão sobre a securitização das mudanças climáticas uma ameaça ao seu governo; resolução defendida por EUA, Reino Unido e França foi vetada pela Rússia

Marcelo Godoy

O Estado de S.Paulo, 07 de março de 2022

Caro leitor, 

o presidente Jair Bolsonaro acredita que "alguns chefes de Estado muito conhecidos" querem discutir a soberania da Amazônia. Ele repete um velho hábito da extrema direita: criar fantasmas para assustar o País e passar a acreditar em suas criaturas. É por isso que Bolsonaro se disse grato a Vladimir Putin. Não só pelo russo ser um modelo para a extrema direita europeia – da francesa Marine Le Pen ao italiano Matteo Salvini, ao menos até a invasão da Ucrânia–, mas também pelo voto daquele país na sessão, de 13 de dezembro de 2021, do Conselho de Segurança da ONU. 

Naquele dia, o vice-embaixador da Rússia nas Nações Unidas, Dmitry Polyanskiy, vetou uma resolução proposta pela Irlanda e pelo Níger, que contava com os apoio dos EUA, do Reino Unido e da França. Diante da ameaça global representada pelas mudanças climáticas, os países ocidentais queriam que o tema fosse securitizado, ou seja, passasse a ser tratado não só nos fóruns ambientais, mas também no conselho. O argumento era simples: eventos extremos, secas, inundações e outras catástrofes afetam a paz e a guerra entre as nações e a segurança de territórios e de populações. 

Preocupada em ver sua expansão na região do Ártico ser barrada em razão dos efeitos que traria para o mundo, a Rússia, por meio de seu diplomata, afirmou que achava "contraproducente incluir o componente climático nos mandatos de manutenção da paz e missões políticas especiais": "A avaliação dos riscos relacionados ao clima, a condução das análises e as medidas como resposta devem ser feitas em fóruns especializados".

Esses fóruns têm a sua legitimidade constantemente atacada por Bolsonaro. Candidato à Presidência, cogitou seguir o exemplo de seu guru, Donald Trump, e retirar o Brasil do Acordo de Paris. Mas uma coisa é ter saliva para criticar o Acordo, outra seria ter pólvora para enfrentar uma resolução do Conselho de Segurança. O capitão vê por trás das ONGs e dos ecologistas a ação de potências estrangeiras e dos progressistas do Ocidente. Eis a sua lógica. Ela é igual à de Putin. Mas o russo tem maioria no Parlamento. E força para fechar as organizações e botar na cadeia – ou no cemitério – a oposição. 

É verdade que Emmanuel Macron defendeu a discussão sobre um estatuto internacional da floresta. É também verdade que alguns  acadêmicos viram na ação de madeireiros criminosos, apoiados em uma política ambiental inconsequente, um atentando à responsabilidade de proteger um bioma, cuja destruição ameaçaria a segurança da humanidade. E, quando se fala em responsabilidade de proteção em organismos como o Conselho de Segurança, abre-se o caminho para sanções ao país ou aos grupos de um futuro eixo do mal climático. 

Para além de sua ética do potássio, de esconder com o biombo de uma suposta razão econômica – a dependência do Brasil de fertilizantes russos – suas simpatias pelo presidente Putin, Bolsonaro vê no amigo russo um aliado para seguir sua política ambiental, responsável pelo maior nível de desmatamento da Amazônia em dez anos. Governa-se com ideologia. É ela que vê a proteção do meio ambiente como um atentado à soberania da Nação, em vez de enxergar na sustentabilidade e na economia verde uma oportunidade de desenvolvimento, com sua promessa de riqueza para o País. 

O Brasil perdeu a revolução industrial. Decidiu manter a escravidão por quase todo o século 19 em vez de apostar no trabalho assalariado. Escolheu-se o atraso em vez da indústria em nome de uma soberania em desacordo com a humanidade, que não interessava ao País, mas somente a uns poucos que patrocinavam a cena infame do tráfico negreiro e do estalar do chicote que nos embrutecia a alma. O atraso se manifesta ainda assim agora. 

Em vez de incentivar a exploração do potássio em São Gotardo (MG), onde a empresa responsável diz ter reservas suficientes para abastecer o País pelos próximos 60 anos, Bolsonaro usou a crise na Ucrânia para defender outro ponto de sua ideologia: a liberação de mineração nas terras indígenas. Candidato em 2018, o capitão dizia não se importar de ser chamado de capitão Custer, uma referência ao militar americano que travou uma guerra inglória contra os Sioux. No mesmo dia em que retomava sua velha ideia, a mineradora divulgava em Minas que ia dobrar a produção de siltito glauconítico, rocha de cor esverdeada usada há 200 anos nos EUA como fertilizante potássico, mas desconhecida no Brasil.

Isso acontece porque o presidente tem para a Amazônia uma lógica de séculos passados – a ocupação e a integração –, dos tempos em que a rapina se confundia com a empresa colonial. Mas não se deve tratar a autoridade do governo sobre a floresta como a de um imperador, acima das leis e de qualquer responsabilização republicana. Se alguém não sabe a razão disso, pode-se compreender com um exemplo: o dono de um apartamento não pode incendiá-lo, pois, ao fazê-lo, coloca em risco a vida de todos no prédio.

Para ter mãos livres na Amazônia, Bolsonaro sabe que não pode depender nem mesmo de Putin. Em sua live do dia 3 de março, disse: "A Amazônia é nossa e sua soberania não pode ser relativizada. A melhor maneira de não ter sua soberania relativizada é ter Forças Armadas cada vez mais capazes para inibir uma possível agressão ou uma possível interferência externa".  Tem razão. Mas então a a Marinha do Brasil, por exemplo, não poderia ter 80 mil homens, mais que o dobro da Armada britânica, com menos da metade de navios e submarinos do Reino Unido. 

Há muito existe entre os militares brasileiros um sentimento de desconfiança sobre as intenções de nações desenvolvidas a respeito da Amazônia. E uma preocupação enorme com a sua proteção. É, por exemplo, em razão da análise da característica da região que o Brasil não assinou a convenção internacional que baniu as bombas de fragmentação. Para os militares, essa munição – que os russos despejaram na Síria e agora são acusados de fazer o mesmo na Ucrânia – violaria o direito humanitário internacional apenas se usada em áreas urbanas, onde seus efeitos não distinguiriam alvos civis de militares, o que não seria o caso da floresta.  

Mas não é rearmando um País ou mudando o perfil de seus gastos com Defesa – hoje altamente comprometidos com os pagamentos de salários, aposentadorias e pensões – que se afastará a ameaça ligada à securitização do meio ambiente. Não será muito menos escondendo dados sobre desmatamento que o Brasil combaterá suas vulnerabilidades nos fóruns internacionais. O País, como disse ao Estadão o coronel do Exército e especialista em geopolítica Paulo Gomes Filho, precisa ter "uma posição madura": "Não podemos negar as mudanças climáticas. Elas podem ser instrumentalizadas contra nossos interesses e servir ao protecionismo agrícola? Podem. É uma realidade. Mas elas também têm efeitos que devem ser combatidos".


Amazônia

Sobrevoo mostra imagem de região entre Sinop e Brasnorte, no Estado do Mato Grosso. O Brasil vem sendo pressionado internacionalmente para reduzir os indicadores de desmatamento da floresta amazônica

Eis o problema do governo. Bolsonaro e os que o cercam negam a realidade do clima e expõem o Brasil à reação internacional. Depois, o capitão sai mundo afora em busca de "apoios". E os encontra na comunidade de extremistas internacionais da qual faz parte. Nela estão déspotas africanos, árabes e europeus, populistas reacionários e todo tipo de ultraconservador capaz de invadir o Capitólio. A extrema direita virou um movimento internacional. Ela quer ter mãos livres para construir um mundo segundo sua ideologia. Putin entende Bolsonaro. Afinal, ele também quer ter as mãos livres no que pensa ser o seu pedaço do planeta."


quinta-feira, 16 de janeiro de 2020

Militares em operações de peace-keeping e funções de Estado - Paulo Roberto de Almeida

Para atender a consulta de pesquisador acadêmico, elaborei uma quantas repostas a suas perguntas, que entendo possam interessar a um número mais vasto de estudiosos da área.


Pesquisa sobre participação de militares do Brasil em operações de Peace Keeping


Paulo Roberto de Almeida
Repostas a questionário submetido por pesquisador acadêmico sobre operações de paz da ONU e participação de militares do Brasil nessas missões.


DADOS DO ENTREVISTADO

1.          Por favor, informe a sua profissão, idade e local de nascimento?

PRA: (...)

Somente militares

2.              Quando o senhor ingressou nas Forças Armadas? O que motivou essa decisão? Existiam militares na sua família?

PRA: Não aplicável.

3.              Por favor, caracterize o contexto social e político à época que o senhor ingressou nas Forças Armadas.

PRA: Não aplicável.

4.              O senhor ocupou ou ocupa algum cargo na administração do governo de Jair Bolsonaro? Caso positivo, descreva o contexto da sua nomeação para desempenhar tal função.

PRA: Nenhum cargo no governo atual; Serviu durante a Administração Temer como Diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais da Fundação Alexandre de Gusmão, vinculada ao Ministério das Relações Exteriores. Exonerado sob a atual administração do Itamaraty; sem qualquer cargo no MRE ou no governo.

5.              O senhor participou de uma operação de paz? Caso positivo, indique o período e qual a função desempenhada.

PRA: Jamais.

CRENÇAS E VALORES

6.         Segundo pesquisas de opinião como o Latinobarómetro, as Forças Armadas são a segunda instituição na qual a população brasileira mais confia (58%), após a Igreja (73%). Esses números contrastam com a baixa confiança no governo (7%), no Congresso (12%) e nos partidos políticos (6%). Como o senhor justifica esses números contrastantes?

PRA: A pesquisa, obviamente, tem problemas metodológicos e pode não refletir exatamente o pensamento dos diferentes estratos da população, inclusive do ponto de vista do contexto local ou regional, em relação a essas instituições maiores da sociedade. Não existe “uma Igreja” que receba tal grau de adesão do conjunto da população, mas diferentes segmentos religiosos, amplamente difundidos na população, e deve existir alguma variação nas percepções em função do tipo de crença organizada. As Forças Armadas já tiveram uma percepção negativa, mas voltaram a ocupar posição positiva nas percepções devido a seu atual profissionalismo, dedicação às causas nacionais e aparente não envolvimento na gestão deficiente da vida pública, cujos problemas são atribuídos, com razão, ao governo, ao Congresso e aos partidos políticos. De fato, se consolidou no país uma casta de políticos profissionais voltados mais para o interesse próprio, da mais humilde Câmara de Vereadores ao poderoso Senado da República, que transmitem ao conjunto da população essa noção de corrupção, de vantagens indevidas, mas que ao mesmo tempo não destrói a percepção de que é pelo Estado que os problemas locais, reais (saúde, educação, segurança, emprego, moradia), precisam ser resolvidos.

7.          Atualmente, é desejável a intervenção dos militares na política? Quais as habilidades desenvolvidas, através do ensino militar, que podem ser empregadas nesse meio?

PRA: Militares não deveriam se envolver na política, embora enquanto instituição as FFAA podem participar das políticas de Estado, via Conselhos de Governo e similares. O papel das FFAA na formação de pessoal, em vista das imensas deficiências do sistema de ensino público, é essencial, ainda que elas depois percam parte desse pessoal qualificado para o setor privado dados os baixos soldos da maior parte dos quadros de carreira nas FFAA. Pode-se considerar que elas participam da qualificação de capital humano extremamente importante para a boa gestão da coisa pública, e poderiam ser mais envolvidas em políticas setoriais nas quais essa capacitação seria bem vinda (pesquisa avançada em áreas sensíveis, tecnologias de ponta, etc.).

8.         Na sua opinião, a intervenção dos militares na política fortalece ou debilita a democracia?

PRA: Isso depende muito do quadro geral da política e dos papeis respectivos das diferentes elites que podem fornecer quadros para o exercício de cargos públicos. Pelas características corporativas das FFAA elas poderiam ter, teoricamente, uma função agregadora da sociedade em vista de grandes objetivos nacionais, o que não impede que, sendo o braço armado da nação, possam ser envolvidas na política para cumprir objetivos setoriais ou de caráter específico a determinada força política ou econômica dominante. Também depende do contexto ideológico geral existente no mundo, do papel de certas ideias e sua influência nos movimentos políticos. As crises econômicas e políticas do início do século XX, as grandes disputas ideológicas, levaram as FFAA bem mais para o lado do corporativismo e dos fascismos do que do lado do socialismo ou comunismo, em todo caso, uma adesão a sistemas autoritários de Governo, que levaram o Brasil para o lado de sistemas não democráticos no plano político e da administração pública. Na atualidade, as FFAA estão sinceramente comprometidas com uma visão democrática do Brasil e do mundo, mas isso também tem a ver com o sistema internacional e a afirmação de valores democráticos na sociedade brasileira.

9.         O politólogo americano brasilianista Alfred Stepan, na obra que se tornou célebre na literatura “Os militares na política: as mudanças de padrões na vida brasileira”, publicada inicialmente em 1975, caracterizou a atuação dos militares brasileiros entre 1930 e 1964 como um poder moderador, visto a sua intervenção em sucessivas ocasiões (1930, 1945, 1954 e 1964) como aliados aos interesses de diferentes grupos políticos. Comente sobre a atualidade desse conceito para descrever a participação de militares no governo de Jair Bolsonaro.

PRA: Costumo distinguir entre intervenções de militares na política e intervenções das FFAA na política, ou seja, a atuação coordenada das forças militares no sistema político, em momento de crise sistêmica, à diferença do envolvimento de militares individualmente ou até em grupo (mas não como instituição) no jogo político, em aliança com partidos, movimentos ou personalidades da vida pública. As intervenções das FFAA são mais raras e, em minha opinião, se restringem a apenas três episódios da vida política brasileira, e não começa com o episódio que muitos historiadores consideram o marco original dessa interação: o golpe da República, ou seja, a derrocada da monarquia e inauguração do novo regime político. Tanto 1889 e os dois primeiros presidentes militares, quanto as revoltas da Armada nos anos 1890, a eleição do Marechal Hermes, as muitas revoltas tenentistas dos anos 1920 são meras intervenções de militares na política, não da instituição enquanto tal. A primeira intervenção das FFAA na política foi, em minha visão, o afastamento de Washington Luís da presidência, em outubro de 1930, para evitar uma guerra não desejada pela cúpula do Exército (a famosa batalha de Itararé, que não ocorreu), em aliança com a Marinha. Voltam as intervenções de militares na política – tanto na direita, quanto na esquerda – nos anos 1930, mas nem o golpe de 1937 nem o Estado Novo têm a ver com a “intervenção das FFAA” na política: elas foram usadas pelo caudilho Vargas para os seus objetivos personalistas. A segunda intervenção das FFAA na política se refere ao afastamento do ditador em outubro de 1945, porque ele justamente estava interferindo no jogo político das eleições previstas para o final do ano.
Ocorreram muitas e novas intervenções de militares na política nacional durante toda a década de 1950 e sobretudo no início dos anos 1960, mas não considero que tenham sido intervenções das FFAA, a não ser marginalmente, como no veto à assunção de João Goulart, vice-presidente de Jânio Quadros, como presidente, em agosto-setembro de 1961: o conflito foi “resolvido” no âmbito do próprio sistema político, com a emenda parlamentarista de setembro desse ano. Nem 1964 pode ser classificado como uma pura intervenção das FFAA na política brasileira: tratou-se de uma grave crise político-militar que tomou a forma de um “golpe”, mas apenas a pedido e sob a pressão de forças políticas que disputavam o poder na ocasião. A partir do “golpe civil-militar”, aí sim, as FFAA passaram a assumir a responsabilidade direta pelo poder político, mais o Exército do que as duas outras forças, o que criou uma situação inédita na vida nacional: não uma simples intervenção de militares ou das FFAA na política, mas a assunção das FFAA pela direta responsabilidade pelo sistema político, ainda que militares disputaram entre si diferentes visões de como deveria ser conduzido o processo. Não havia muito consenso entre as diferentes tendências das FFAA, ou melhor, de militares individuais tentando atuar como políticos num cenário altamente contraditório.
A terceira, e até aqui a última intervenção das FFAA na política se deu não exatamente no “golpe dentro do golpe” do AI-5, mas mais exatamente no veto interposto ao vice-presidente Pedro Aleixo como substituto legal do presidente Costa e Silva, por ocasião de seu acidente vascular-cerebral, em agosto de 1969. Foi uma decisão consensual das FFAA, no contexto de ameaças ao regime (guerrilhas, atentados, oposição civil, etc.) e na desestruturação do sistema político civil, assim como foi consensual uma certa “tutela” das FFAA sobre o processo de transição, tanto em 1979, quanto em 1984-85, na redemocratização. O que se seguiu foi um longo desengajamento das FFAA e de militares individuais da política brasileira, só ocorrendo, ocasionalmente, por meio dos clubes militares, quando “generais de pijama” se manifestavam episodicamente em torno de determinadas questões, inclusive na questão da defasagem dos soldos, que foi o que abriu caminho para a ascensão política de um militar do “baixo clero” no Legislativo.
Os governo de Fernando Collor e FHC representaram mais uma etapa no processo de afastamento dos militares da política, no primeiro caso pelo controle das iniciativas de setores das FFAA na área nuclear, nos segundo com a criação do Ministério da Defesa, destinado, precisamente, a institucionalizar esse afastamento. Em momentos de crise da política brasileira, como por ocasião do impeachment de 2016, militares individualmente, eventualmente um ou outro comandante, interpretando algum “consenso virtual” das FFAA, exerceram uma ou outra forma de “intervenção soft” na política, delimitando certas soluções a alguns impasses no sistema político ou no âmbito do Judiciário. Foi o que ocorreu com os “twits” do comandante do Exército nessas oportunidades.
No governo Bolsonaro, pode estar acontecendo um envolvimento maior das FFAA e de militares individualmente na política na política e no governo, mas não de forma estratégica ou planejada, e sim em função de uma fase não convencional da política brasileira. Talvez seja um estilo de participação não intervencionista, algo como um tipo de “maçonaria militar” em defesa da democracia, das instituições, da estabilidade do governo num momento de polarização da luta política, mas em todo caso é o mais “próximo” que temos de intervenções das FFAA ou de militares na política, como não tínhamos tido desde o governo Collor. 
Não creio que se possa caracterizar como um “novo padrão de intervenção” de militares ou das FFAA na política, pois o governo Bolsonaro não responde a nenhuma outra experiência, civil ou militar, que o Brasil tenha tido nos seus 140 anos de República, ou mesmo nos quase dois séculos de Estado-nação independente. Creio que este governo, assim como a participação de militares no governo, fará parte de um parêntese, ou de um nicho específico na nossa história política, sem qualquer comparação com experiências precedentes, e arrisco até ulteriores. Não creio, tampouco, que os conceitos e as práticas observadas por Alfred Stepan nos anos 1960 se apliquem ao Brasil do presente. As FFAA evoluíram num sentido profissionalizante, os militares se tornaram mais preparados, mais educados no sentido lato, mais capacitados no plano profissional, e também mais democráticos no terreno de suas ideias políticas. 

RELAÇÃO ENTRE PEACEKEEPERS E A POLÍTICA

10.       A participação de militares na política brasileira não é uma novidade. Em vários períodos históricos, como 1930, 1945, 1954 e 1964, isso ocorreu. Por outro lado, a participação de ex-peacekeepers em funções governamentais é um fenômeno recente. Nos últimos anos, tem havido uma forte participação de ex-peacekeepers, sobretudo daqueles que estiveram na Minustah no Haiti, em funções governamentais. Como o senhor explica o incremento dessa participação?

PRA: Trata-se de uma evolução natural e saudável, esse envolvimento das FFAA e de militares em operações de paz da ONU, uma vez que os militares não tiveram, depois da FEB e do envolvimento na Segunda Guerra Mundial, nenhum conflito direto – ou seja, envolvendo o Brasil – ou indireto, envolvendo guerra interestatal na região. Sempre atuamos, desde a guerra do Chaco, no sentido do apaziguamento militar e da mediação diplomática de conflitos. A primeira operação real, fora, das missões da ONU, foi a intervenção na guerra civil na República Dominicana, em 1965, a pedido dos EUA, mas ainda assim “legalizada” por um mandato da OEA. Todas as demais operações foram sempre respondendo a demandas da ONU (desde Suez, em 1957) ou por interesse direto de natureza política (Minustah, no Haiti). Mas evitamos a guerra da Coreia (autorizada pelo CSNU), o Congo belga (idem), o Vietnã (sob demanda americana) e outras missões ou operações que mesmo autorizadas não correspondiam ao interesse nacional. 
Quanto à participação de ex-peacekeepers em funções governamentais, não creio que seja uma prática corrente ou constante, tendo ocorrido justamente agora no governo Bolsonaro em função da atitude acima classificada de “maçonaria militar”, ou uma espécie de “tutela” de alguns militares (não das FFAA, de modo consensual), sobre a candidatura e depois o governo do atual presidente. Não me parece que a participação de militares em missões da ONU os habilite necessariamente ao exercício de atividades no âmbito do Executivo, e tais ocorrências devem ser consideradas ad hoc, ou caso a caso.

11.       Em outros países sul-americanos que tem enviado tropas para as missões de paz da ONU, como o Chile, a Argentina e o Uruguai, essa participação, não foi registrada. Na sua opinião, por que o Brasil é um caso excepcional?

PRA: Não creio que o Brasil represente um caso excepcional, e tal se deve unicamente pelo fato de que a candidatura do capitão-político representou um momento especial da política brasileira e do relacionamento entre quadros das FFAA com esse personagem, que, aliás, nunca foi considerado positivamente no âmbito das FFAA, ao contrário. Trata-se, a meu ver, de experiência não destinada a criar novos padrões de conduta ou relacionamento entre militares e o sistema político. Diga-se de passagem que as FFAA sempre foram bastante “legalistas”, no sentido em que se distanciaram da tradição caudilhesca dos países hispânicos, e buscaram se cercar de conselheiros jurídicos e de atos institucionais para legitimar suas intervenções no jogo político.

12.       O fato de ex-peacekeepers desenvolverem expertise em funções relacionadas à segurança pública promove a superioridade dos mesmos sobre os civis na gestão política?

PRA: Não creio, embora isso possa se dar em função das característica específicas dessas missões. No Haiti, por exemplo, o cenário era quase o mesmo que se desvenda no Brasil, ou seja, missão mais de natureza policial e de natureza de segurança civil, do que de interposição entre bandos armados disputando o poder político, como pode ser o caso no Congo ou em outras missões. O que, sim, ocorreu a partir do Haiti é que as FFAA se mostraram mais tolerantes com missões de “segurança pública”, o que antes elas não aceitavam, assim como não aceitavam as sugestões do governo dos EUA e de militares americanos no sentido de se engajarem mais na luta contra o narcotráfico, o que elas diziam não ser função das FFAA e sim das forças policiais (à exceção de certos pontos de controle nas fronteiras, sobretudo amazônicas). Pode ser que com esse envolvimento, militares se tenham tornado mais capacitados em tarefas de segurança pública, e que possam, a partir daí, exercer funções pertinentes no governo, mas não creio que haja, no caso, uma relação direta, e numa ampla interface, com missões de paz da ONU.

13.       A participação de ex-peecekeepers em funções políticas de alto escalão pode ter algum impacto sobre as relações civis-militares no Brasil?

PRA: Sim, provavelmente, tanto na esfera propriamente governamental, no Executivo (federal ou estaduais), quanto no plano diplomático ou das relações exteriores do país. Considero tal possibilidade como altamente positiva, tanto para o governo quanto para as FFAA e os militares individualmente, que se tornam assim plenamente integrados às funções de Estado, à margem de suas atribuições normais ou constitucionais.

14.       A participação de ex-peacekeepers na política brasileira contemporânea estaria relacionada ao fato de os mesmos serem tecnocratas, ou seja, funcionários com alta expertise técnica e capacidade de articulação política?

PRA: Não creio que o termo “tecnocrata” seja apropriado, pois que o tecnocrata é um funcionário dedicado a planejamento e execução de tarefas administrativas, ao passo que o peacekeeper segue instruções precisas, de caráter militar, ou civil-militar, em situações de tensão política, guerra civil, conflitos bélicos, erosão de instituições do Estado ou coisas similares, ao passo que o tecnocrata trabalha em condições “normais”, digamos assim, de exercício de funções públicas.
Ainda que a ONU e suas agências estejam envolvidas numa super-burocracia, altamente contaminada pela política de poder e de influência dos Estados, o peacekeeper tem uma atribuição precisa, de manutenção da paz e da segurança, num cenário que pode ser imprevisível, o que o distingue das funções repetitivas, altamente burocráticas, de um funcionário público ou agente do Estado situado na tecnocracia “pacífica” de um Estado normalmente constituído. Tampouco creio que a expertise adquirida nas missões de paz os habilite para uma tecnocracia normal, e essa função de “articulação política” pode existir, ou não, dependendo do tipo de missão de paz no qual eles estão envolvidos. Algumas dessas missões são puramente de terreno, de observação, de interposição, e de controle de contingentes armados, de deslocamento de pessoal civil, ao passo que no governo estamos falando basicamente de papeis e outros burocratas. Chefes de missões de paz podem sim ter de articular com dirigentes locais, políticos civis ou mesmos chefes de contingentes militares, mas a missão é sempre circunscrita por instruções que têm muito pouco a ver com a atividade burocrática normal de um Estado. Eles até poderão emergir dessas missões bem mais capacitados, no plano intelectual ou técnico, mas essa hipótese é um pouco aleatória.

 Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 16 de janeiro de 2020

domingo, 2 de junho de 2019

Militares apreensivos com o governo - O Globo

O GLOBO ONLINE

Moderados e apreensivos: o que pensam os generais que trabalham bem perto do presidente Jair Bolsonaro

Militares do Alto Comando do Exército são os moderados e apreensivos do governo 
Ao pé do ouvido: O presidente Jair Bolsonaro durante cerimônia militar no Rio de Janeiro, ouve o general Luiz Eduardo Ramos Baptista Pereira, do Comando Militar do Sudeste: graduados temem arriscar conquistas desde a redemocratização Foto: Fernando Souza / AFP
Ao pé do ouvido: O presidente Jair Bolsonaro durante cerimônia militar no Rio de Janeiro, ouve o general Luiz Eduardo Ramos Baptista Pereira, do Comando Militar do Sudeste: graduados temem arriscar conquistas desde a redemocratização Foto: Fernando Souza / AFP

BRASÍLIA E RIO - Um general do Alto Comando do Exército, grupo que mantém interlocução direta e constante com o presidente da República, transmitiu a Jair Bolsonaro nos últimos dias um pensamento que representa o estado de espírito atual de militares que estão perto do poder:
— Jair, serenidade. Você não precisa de radicais.
Na cabeça dos generais que ajudam a sustentar o governo Bolsonaro — incluindo aqueles, já na reserva, que ocupam cargos de primeiro e segundo escalões — o temor de uma radicalização caminha ao lado da preocupação de que a responsabilidade por tropeços do presidente recaia nos ombros e nas insígnias das Forças Armadas.
Arriscar o processo que fez as Forças Armadas saírem de um período repressivo, de grande desgaste na opinião pública, para a virada das últimas três décadas, quando retomou respeito e reconhecimento por parcela expressiva da população, é uma angústia crucial.
Integrados ao governo em grau sem precedentes desde a redemocratização, militares de alta patente ouvidos pelo GLOBO procuram apresentar uma mentalidade distante dos tempos da ditadura militar, época em que muitos se tornaram oficiais do Exército, Marinha ou Aeronáutica. A preocupação em mapear “inimigos” internos ou externos, uma constante no início de suas carreiras, hoje é adormecida.
Generais do alto comando contam que, em sua formação, foram “muito impactados por valores democráticos”, uma vez que passaram pelo processo de distensão e abertura na fase final da ditadura militar.
Os oficiais do círculo próximo a Bolsonaro abraçam uma tentativa de livrar o Exército de “estereótipos negativos”, em suas palavras. Um general do Alto Comando que conversou com O GLOBO em condição de anonimato, por exemplo, foi taxativo: avaliou que a ditadura cometeu “barbaridades” na repressão aos opositores:
— Pagamos um preço muito alto com a ditadura. É uma palhaçada falar em intervenção militar, como ouvimos em alguns protestos. Chega a ser ofensivo.
As trocas de cargos no Ministério da Educação (MEC), que levaram à exoneração de diversos militares no seio do governo, não figuram sozinhos na lista de preocupações dos generais. Estão ombro a ombro com temores mais amplos, como a política armamentista do presidente — cabe ao Exército fiscalizar a venda de armas —, os riscos envolvendo a Amazônia, considerada uma reserva natural estratégica, e até a determinação de que os quartéis celebrassem os 55 anos do golpe militar.
Sobre as armas, a preocupação central está na flexibilização do porte, desejada — e decretada — pelo presidente.
— Para porte, aí sim, é preciso ser perito na coisa. Há preocupação sobre uma proliferação negativa de armas – diz um outro general ouvido pela reportagem, que também pediu anonimato.
Como ficariam as Forças Armadas se recebessem a pecha de instituição que autorizou e controlou a disseminação de armas de fogo se as consequências não saírem como o esperado nos planos do presidente? São questionamentos como esse que permeiam os mais graduados.
— A gente torce para dar certo — afirmou um general ao GLOBO. — Senão vamos ouvir: “Os militares não disseram sempre que são os salvadores da pátria?”
Dois assuntos neste primeiro semestre de governo incomodaram em cheio os militares de alta patente: o episódio do “golden shower”, quando Bolsonaro compartilhou em sua conta no Twitter uma prática sexual a céu aberto, gravada no carnaval de rua em São Paulo — algo impensável para um militar graduado —, e a dubiedade em relação ao ideólogo de direita Olavo de Carvalho, que atacou, com xingamentos, os militares do governo. O compromisso com a “arrumação da casa” de uma instituição que representa o Estado e voltou ao governo após seu período mais desgastante é prejudicado.
Em geral, um militar leva de 30 a 40 anos para ascender até o último grau da hierarquia. A maioria dos principais generais do atual governo e dos que compõem o Alto Comando do Exército se formou nas turmas do fim da década de 1970 e do início da década de 1980 da Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), em Resende, no Sul Fluminense.
O próprio Bolsonaro, egresso da turma de 1977, conviveu com certo grau de intensidade com vários desses generais. O comandante do Exército, general Edson Leal Pujol, é da mesma turma. O porta-voz Otávio Rêgo Barros é de 1981. Enquanto Bolsonaro deixou os quadros da ativa ainda na década de 1980, recém-alçado a capitão, alguns de seus contemporâneos seguiram em formação.
— Suas carreiras foram feitas em um ambiente crescente de profissionalização e de processo de “arrumação da casa”, quando houve de fato um esforço para reverter a politização anterior, do regime militar — afirma o antropólogo Piero Leirner, da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar).

Aprendizado com missões

Se a década de 1940 ficou marcada, para o Exército Brasileiro, pelo envio de tropas para a Segunda Guerra Mundial, a partir dos anos 1990 se tornou recorrente a participação brasileira em missões de paz da ONU. O Brasil tinha 1,3 mil oficiais no exterior há quatro anos, com atuação principalmente em países africanos e no Haiti, cuja missão foi comandada por três dos atuais ministros de Bolsonaro: Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), Carlos Alberto Santos Cruz (Secretaria de Governo) e Floriano Peixoto (Secretaria-Geral).
— A maioria dos generais da atualidade já colocou a boina azul (usada em missões da ONU). É diferente do oficial que era general no regime militar. Era uma época de Guerra Fria, dos atos institucionais. Nem se pensava em mulher no Exército, por exemplo — analisa o general Eduardo José Barbosa, atual presidente do Clube Militar.
A experiência das missões de estabilização de países, que são diferentes de conflitos abertos que ocorrem guerras, é um aspecto que contribui para o perfil moderado dos oficiais que participam diretamente do governo.


Generais da atualidade têm formação 'híbrida' entre ditadura e democracia, diz cientista político

Para Mauricio Santoro, transição é fundamental para compreender generais do presente; Institutos militares adaptam tradição a particularidades da nova geração 
Oficiais do Exército na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), em Resende Foto: Marcelo Régua / Agência O Globo
Oficiais do Exército na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), em Resende Foto: Marcelo Régua / Agência O Globo

RIO - Os atuais generais são “híbridos” entre a formação da ditadura e os aprendizados do período democrático. Durante sua formação na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), nas décadas de 1970 e 1980, noções de geopolítica e História eram fortemente influenciadas pelo alinhamento do Brasil ao bloco liderado pelos EUA naGuerra Fria. A sequência da formação, no período de reabertura pós-ditadura, já foi marcada por maior integração à sociedade civil e um afastamento da vida política no início dos anos de 1990.
Para o cientista político Mauricio Santoro, que já ministrou cursos e palestras em institutos militares como a Aman, a Escola Superior de Guerra (ESG) e a Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (Eceme), a formação “híbrida” é fundamental para compreender a cabeça dos generais do presente. Embora ainda veja dificuldades no grupo em fazer uma autocrítica da ditadura, Santoro destaca que o pensamento dos generais não é formado apenas na caserna.
A bagagem internacional, por exemplo, é um dos fatores que os diferencia do passado. Desde a década de 1990, a participação em missões internacionais de paz se tornou uma maneira de os generais apresentarem seu trabalho à sociedade e tentarem remover estereótipos ligados à ditadura.
— O ministro Santos Cruz (Secretaria de Governo) é um exemplo raríssimo de oficial que comandou duas missões de paz, no Haiti e no Congo. Isso significa uma abertura de horizontes, de visão de mundo. O (vice-presidente, Hamilton) Mourão fala inglês e espanhol fluentemente, consegue se sentar com representantes estrangeiros. Isso é incomum no Brasil. Na nossa elite política, quantos têm uma formação tão cosmopolita quanto essa? — questiona Santoro.

Bagagem internacional

Atualmente, a Aman estimula o intercâmbio com militares estrangeiros e conta com 45 cadetes de 16 nações consideradas amigas, como Vietnã, Guatemala e Senegal.
— O que não muda, desde as origens da Aman, são os valores que formamos nos cadetes: lealdade, verdade, responsabilidade e probidade — pontua o general Gustavo Henrique Dutra de Menezes, atual comandante da Aman. — Os cursos da carreira militar vão fornecendo diferentes conhecimentos técnicos e profissionais, mas o amálgama do líder dado aqui segue o mesmo.
O caminho para se tornar um general quatro estrelas, mais alta patente militar, passa obrigatoriamente por instituições como a Aman e a Eceme, que aumentaram a abertura a professores civis nos últimos anos. O currículo atual da Aman, por exemplo, tem cadeiras como Filosofia, Direito Internacional, Cálculo e Estatística no início da formação. Em média, segundo Dutra, cada turma com cerca de 400 cadetes deve produzir quatro desses generais no futuro.
Santoro, professor da Uerj, foi um dos responsáveis pela criação da cadeira de Relações Internacionais na Aman, no fim da última década. Professores deste departamento na Universidade Federal Fluminense (UFF) também dão aulas nas Agulhas Negras.
Já a ESG se tornou, na avaliação de Santoro, uma espécie de think tank que integra civis e militares, afastando-se do papel de núcleo duro da formação de coronéis e generais da ditadura. Ele pondera que a convivência com civis, ainda recente, tem consequências incertas. Mas a nova geração de militares tende a ser influenciada por novos ares.
— Pelo que ouço dos militares, a formação em outras épocas era muito menos técnica, cuidadosa. Hoje você tem uma preocupação grande, por exemplo, com o bem-estar do cadete, desde a alimentação até a parte psicológica. E o ensino, em geral, está no nível daquele dado numa universidade pública.
Ao dissecar as etapas de formação militar, o comandante da Aman compara sua função à de um reitor universitário com foco na graduação. Cita cursos como o da Eceme, último passo antes do generalato, como níveis de uma carreira acadêmica. E afirma que a forma de educar os atuais cadetes mistura a tradição militar com as particularidades da geração Y, os millennials, jovens de até 25 anos mergulhados na internet.

Permissões na academia

Tatuagens tribais são cada vez mais comuns nas academias militares, assim como alguns brincos, maquiagem e esmalte de unhas para as mulheres, que tiveram em 2018 sua primeira turma na academia. A febre dos smartphones também é visível entre os cadetes, até nos momentos que antecedem a marcha diária no pátio.
— As gerações atuais pensam no imediato, e nós precisamos criar uma identidade de longo prazo com a instituição militar. Esse é o desafio. Se nós não evoluirmos de acordo com a maneira que a sociedade evolui, vamos perder o bonde da história — afirma Dutra.

domingo, 3 de março de 2019

O fracasso das elites politicas no Brasil trouxe a volta dos militares ao governo - Estadao

A matéria é importante, mas apenas enquanto reflete uma realidade. 
O governo, o Estado, as instituições estão sendo lotados com militares de carreira, da ativa e da reserva.
Eu, pessoalmente, insuspeito de qualquer simpatia pelos militares – passei sete anos em autoexílio durante a ditadura militar – recebo com muita satisfação essa situação nova.
As FFAA no Brasil atual são a corporação mais preparada, a mais democrática, a mais confiável de que possa dispor o país para tentar encaminhar seus mais graves problemas. 
Não será fácil, pois entre eles não temos grandes economistas, ou grandes cientistas políticos. Mas temos grandes "tecnocratas", devotados às causas nacionais, extremamente bem preparados do ponto de vista técnico, e em princípio os mais honestos mandarins do Estado.
Vamos observar o seu desempenho, avaliar sua gestão, e ser absolutamente honestos quanto aos resultados: aplaudiremos as medidas corretas, apontaremos o que acharmos indevido ou equivocado, e distribuiremos notas finais quanto ao desempenho. Por enquanto eles estão com MS, vamos ver se sobem a SS, ou se caem a MM, ou menos.
Estarei atento...
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 3 de março de 2019


Militarização atinge 2º e 3º escalões do governo Bolsonaro
Após a indicação para o comando de oito ministérios, presidente expande presença de integrantes das Forças Armadas; já são pelo menos 103 em diversos postos
Tânia Monteiro, Adriana Ferraz, Carla Bridi, Matheus Lara e Tulio Kruse, O Estado de S.Paulo, 03 de março de 2019

O governo de Jair Bolsonaro vai ampliar a militarização na máquina pública federal, com a entrega para a Marinha de postos de comando nas superintendências de portos, no Ibama e no Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMbio). Após a nomeação para ministérios importantes, os militares agora são chamados a ocupar também cargos no segundo e terceiro escalões. Veja aqui o mapa completo de onde estão os militares no governo.
Trata-se de uma nova fase do movimento crescente de escolha de oficiais da reserva das Forças Armadas para posições estratégicas e setores historicamente envolvidos em denúncias de corrupção. Levantamento feito pelo Estado contabiliza pelo menos 103 militares na lista dos cargos comissionados de ministérios, bancos federais, autarquias, institutos e estatais, entre elas a Petrobrás.

Militarização atinge 2º e 3º escalões do governo Bolsonaro
Militarização atinge 2º e 3º escalões do governo Bolsonaro  Foto: Fábio Motta/Estadão

Segundo analistas, fatores como o desgaste da classe política e uma estrutura partidária ainda frágil do presidente Jair Bolsonaro permitem o avanço dos militares na burocracia federal. 
Na última semana, foram escolhidos os almirantes da reserva da Marinha Francisco Antônio Laranjeiras e Elis Triedler Öberg para comandarem os portos do Rio de Janeiro e do Rio Grande do Norte, respectivamente. Para o cargo de diretor-presidente da Companhia Docas de São Paulo, que controla o Porto de Santos, o governo nomeou o engenheiro naval civil Casemiro Tércio Carvalho. Ele, no entanto, terá a seu lado um militar da Marinha para “sanear” o órgão e acabar com “entraves” burocráticos. 
Em defesa desse movimento do governo, um oficial do Alto Comando das Forças Armadas disse que a escolha de militares para cargos de confiança tem por objetivo conferir credibilidade aos postos com base em “um modo eficiente de administrar”, com “zelo pelo dinheiro público”. Deputados que procuram o governo para pedir cargos nos Estados relatam que recebem de ministros um pedido: “Você tem um militar para indicar?”
 Estudioso da relação entre as Forças Armadas e a sociedade brasileira, o cientista político Eliézer Rizzo de Oliveira afirmou que a participação de dezenas de militares em um governo eleito democraticamente é uma situação inédita no Brasil. E é resultado, segundo ele, da combinação entre a descrença que abateu a classe política e a inexperiência administrativa do novo presidente.
“É natural que ele queira se apoiar em pessoas da área dele e que respondam a essa espécie de ‘regime civil com governo verde-oliva’ que se instaurou no poder e tomou conta da máquina pública”, afirmou.
Ainda assim, para Oliveira, o movimento atual não pode ser comparado a um aparelhamento da máquina pública, a exemplo do que ocorreu nos governos do PT. A intenção agora, diz, não seria a preservação do poder sindical ou partidário, mas a gestão do governo. “O risco, neste caso, é o desprestígio das Forças Armadas em caso de insucesso.”
“Falar em aparelhamento me parece prematuro. O partido do presidente não possui uma estrutura orgânica e coesa. Há escassez de quadros. E, como o presidente não quer nomear gente apadrinhada pelo sistema político, é legitimo, nesse contexto, se servir de profissionais oriundos das Forças Armadas”, afirmou o cientista político Hussein Kalout, que atuou no governo de Michel Temer.
As nomeações nos portos aumentaram a presença militar na pasta da Infraestrutura. Até agora, o ministro Tarcísio Gomes de Freitas, um ex-capitão do Exército, nomeou dez militares da reserva, incluindo a chefia do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). Com histórico de irregularidades e denúncias de corrupção, o órgão foi entregue ao general Antonio Leite dos Santos Filho.
Desde a redemocratização nos anos 1980, a área portuária sempre foi controlada pelo MDB. O ex-presidente Michel Temer enfrenta acusação por ter editado um decreto que teria beneficiado uma empresa no Porto de Santos. Ele nega.
Do quadro de reservas da Marinha também sairá o novo superintendente do Ibama no Rio de Janeiro. O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, escolheu o almirante Alexandre Dias para a vaga. O maior número de militares está no Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações – 13 no total. O ministro Marcos Pontes se cercou de brigadeiros no seu gabinete e também escolheu nomes da reserva da Aeronáutica para chefiar as secretarias de Políticas Digitais e de Tecnologias Aplicadas.
Os militares abocanharam ainda cargos em pastas sem conexão com a caserna. No Turismo, o ex-deputado Marcelo Álvaro Antonio, do PSL, foi orientado pelo Planalto a nomear um militar da Marinha para o posto de corregedor e um coronel do Exército para o Departamento de Política e Ações Integradas.
Na gestão Bolsonaro, oficiais terão como desafio gerir áreas que vão além daquelas mais associadas a eles, como infraestrutura, ciência, tecnologia, mineração e energia. Terão, por exemplo, de administrar de uma estatal responsável por prestar serviços médicos ao Conselho Nacional de Educação, órgão que atua na formulação e avaliação da política educacional. 
Na prática, a lógica dos quartéis será testada no serviço público na atual administração federal.

Ministros 'convocam' oficiais da reserva
Como não dispõem de um banco de dados de servidores para ocupar os cargos de confiança, entre eles os chamados DAS (Direção e Assessoramento Superior), a solução inicial encontrada pelo governo foi buscar militares na reserva das Forças Armadas. “Quando precisamos substituir inúmeras pessoas e trazer gente confiável, com capacidade técnica, carreira ilibada é muito difícil”, afirmou o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. 
Outra razão para a escolha dos militares, segundo o ministro, é a dificuldade de atrair profissionais da iniciativa privada, com a mesma qualificação, dispostos a receber salários que variam de R$ 2,7 mil e R$ 16,9 mil, valores considerados baixos em comparação aos pagos em cargos de direção. 
Os militares da reserva já têm um salário base e, no caso de voltarem a trabalhar, recebem apenas uma complementação salarial. “É bom pra eles e é bom pra nós”, observou Salles.
O ministro nega que os militares estejam loteando o governo. “Somos nós que pedimos as indicações e que eles venham. Não são eles se impondo”, afirmou. “Há uma gama enorme de cargos de confiança, muito mal preenchidos, muitos deles aparelhados, ou com grau de comportamento questionável.” 
O número poderá ser ampliado com a aprovação da reforma da Previdência. Como revelou o Estado, o texto permite aos militares da reserva exercerem atividades civis em qualquer órgão, mediante gratificação ou abono. Hoje, só podem ser aproveitados em funções militares ou ocupar cargos de confiança, o que limita o remanejamento.
Se as mudanças forem aprovadas, eles poderão exercer funções na administração federal sem ter de passar por concurso público. Isso aumentaria ainda mais o contingente de militares dentro do governo – além do presidente Bolsonaro e do vice-presidente Hamilton Mourão, há também oito ministros com formação militar. Uma fonte da ala militar confirma que existe no governo a intenção de ampliar o aproveitamento desse contingente de mais de 150 mil reservistas. 
O governo não fecha as portas para os civis, mas busca neste grupo características que enxerga nos militares, como conduta ética e capacidade técnica. “Preenchendo os requisitos não tenho problema em receber indicações de governador, deputado, senador”, disse o ministro do Meio Ambiente. Em dezembro, a Justiça condenou Salles por improbidade administrativa quando foi secretário estadual de São Paulo. O ministro nega as acusações. 
Em recente entrevista ao Estado, o general Carlos Alberto dos Santos Cruz, ministro-chefe da Secretaria de Governo, disse ser contra dividir o governo entre civis e militares. “A sociedade quer que você governe para ela de maneira limpa, sem corrupção e que entregue o benefício no serviço público que ela precisa. Quem está dirigindo, para ela não interessa. Interessa a prestação do serviço público de qualidade e de maneira honesta”, observou. 
Para o ministro, “a sociedade aceita perfeitamente bem” a presença dos militares no governo. “Quem faz essa discriminação é alguém interessado politicamente em fazer. Se a gente evitar viver aqueles dez anos de escândalos diários é isso o que o pessoal quer. A sociedade quer um governo limpo, transparente”, disse.

Três perguntas para Hussein Kalout, cientista político e ex-secretário de Assuntos Estratégicos
1. A oposição atacou os governos do PT por “aparelhar” a máquina pública. Essa critica também vale para o governo Bolsonaro? Existe um “aparelhamento militar” do governo?

O ângulo dessa comparação precisa ser analisado sob um escopo mais abrangente. O PT ficou 13 anos no poder e o governo Bolsonaro está há apenas dois meses no poder. Portanto, a comparação não me parece justa. Falar em aparelhamento me parece prematuro. O partido do presidente não possui uma estrutura orgânica e coesa. Há escassez de quadros. E, como o presidente não quer nomear gente apadrinhada pelo sistema político, é legitimo, nesse contexto, se servir de profissionais oriundos das Forças Armadas, provenientes de algumas das melhores instituições de ensino e pesquisa do País.
A chave dessa equação reside em duas avaliações, uma quantitativa e a outra qualitativa. Primeiro, do universo dos servidores nomeados, qual é a proporção de militares indicados? Não creio que seja assim tão expressivo. E, segundo, as pessoas indicadas possuem a formação, a competência e as qualificações necessárias? Temos que julgar as pessoas pela sua capacidade e pelo seus resultados.

2. Em que medida a indicação dos militares serve ao propósito de recuperar a imagem das Forças Armadas junto à população? 

A instituição Forças Armadas já era bem avaliada pela população antes do presidente Bolsonaro ser eleito. No fundo, é o presidente que está se servindo da competência e do prestígio da instituição. É importante lembrar que de Sarney à Dilma, o sistema político brasileiro tomou a deliberada decisão de enfraquecer a instituição militar tracionando uma falsa narrativa de que isso estava a serviço do fortalecimento da democracia e do estado de direito.
Nos EUA, na Rússia e na China é comum indicar profissionais egressos das forças armadas para posições estratégicas. Nós, no Brasil, precisamos quebrar esse estigma.

3. O sentido de disciplina e pragmatismo dos militares será suficiente para vencer a enorme burocracia que costuma emperrar da máquina pública no Brasil? 

É histórica a dificuldade de ministros de “transformar em realidade” boa parte das suas ordens. O Estado foi capturado pelo corporativismo e pelas corporações sindicais. Enquanto isso não for desmantelado, não há como melhorar a gestão pública.
Melhorar a eficiência da máquina e racionalizar o seu funcionamento requer um esforço coletivo e reformas estruturais. Enquanto o interesse político se sobrepuser aos interesses do Estado, aí não há como materializar nada.


Imagem: https://arte.estadao.com.br/uva/content/drafts/yAnJGQ/15/uploads/MilitaresPresidenciaWEB-col-3.png


Mapa dos militares: onde estão os representantes das Forças Armadas no governo Bolsonaro
Representantes do Exército são maioria no governo. Militarização chega aos cargos de terceiro escalão e órgãos vinculados aos ministérios

PRESIDENTE
Jair Bolsonaro
VICE-PRESIDENTE
Hamilton Mourão
PORTA-VOZ
Otávio Santana do Rêgo Barros
ASSESSOR DO PORTA-VOZ
Coronel Peregrino

EXÉRCITO: VErde
AERONÁUTICA: Amarelo
CIVIL: CINZA
MARINHA: AZUL
2º ESCALÃO1º ESCALÃO
Augusto César Barbosa Vareda
Secretaria de governo
José de Castro Barreto Júnior
CHEFE DE GABINETE
SECRETÁRIO
EXECUTIVO ADJUNTO
Carlos Alberto dos Santos Cruz
Alexandre Araújo Mota
MINISTRO
CHEFE DA ASSESSORIA ESPECIAL
Nilson Kazumi Nodiri
ASSESSOR ESPECIAL
Gabinete
de Segurança Institucional
(GSI)
Denis Raimundo de Quadros Soares
ASSESSOR ESPECIAL
Marco Antonio de F. Coutinho
Augusto Heleno
MINISTRO
DIRETOR DE RELAÇÕES POLÍTICO-SOCIAIS
Roberto Severo Ramos
Secretaria-
Geral da Presidência
SECRETÁRIO EXECUTIVO
Lauro Luis Pires da Silva
Floriano Peixoto Vieira
ADJUNTO DA SAE
MINISTRO
Walter Félix Cardoso Junior
ASSESSOR ESPECIAL
Gilberto Barbosa Moreira
Secretaria de
Comunicação da Presidência
Alexandre de Lara
SECRETÁRIO DE IMPRENSA
Denis Raimundo de Quadro Soares
ASSESSOR ESPECIAL
Marco Antonio de Freitas Coutinho
DIRETOR DO DEPARTAMENTO DE RELAÇÕES POLÍTICO-SOCIAIS
Maynard de Santa Rosa
Ministério da Transparência e CGU
SECRETÁRIO DE ASSUNTOS ESTRATÉGICOS
Wagner Rosário
MINISTRO
Mozart de Oliveira Farias
ASSESSORIA DA PRESIDÊNCIA DA CAIXA
Ministério
da Economia
Eduardo
Bacellar
Ferreira
Alfredo Menezes
SUPERINTENDENTE DA SUFRAMA
ÓRGÃOS VINCULADOS À PASTA
PRESIDENTE
DO CONSELHO DE ADMIN. DA PETROBRAS
Carlos Victor Guerra Naguem
Antonino Santos Guerra
GERENTE EXECUTIVO DE INTELIGÊNCIA E SEGURANÇA CORPORATIVA DA PETROBRÁS
DIRETOR DE OPERAÇÕES DA SESPRO
Marcos Perdigão Bernardes
ASSESSOR
Almir Alves Junior
ASSESSOR
José Orlando Ribeiro Cardoso
DIRETOR ADMINISTRATIVO-
FINANCEIRO
Ministério
da Justiça
Guilherme
Teophilo
SECRETARIA DE SEGURANÇA
PÚBLICA
ÓRGÃOS VINCULADOS À PASTA
Freibergue do Nascimento
COORDENADOR-GERAL DE ESTRATÉGIA DA SENASP
Alexandre Oliveira
Fernandes
José Arnon dos Santos Guerra
COORDENADOR-GERAL DE POLÍTICAS DA SENASP
ASSESSOR TÉCNICO
Ministério
da Defesa
Almir Garnier Santos
SECRETÁRIO-GERAL
Fernando Azevedo e Silva
MINISTRO
Edson Leal Pujol
COMANDANTE DO EXÉRCITO
Ilques Barbosa Júnior
COMANDANTE DA MARINHA
Antonio Carlos Moretti
COMANDANTE DA AERONÁUTICA
Eduardo
Miranda Freire
de Melo
Ministério
da Educação
Eduardo Miranda Freire de Melo
SECRETÁRIO-
EXECUTIVO
SECRETÁRIO EXECUTIVO ADJUNTO
ÓRGÃOS VINCULADOS À PASTA
Luiz Tadeu
Vilela
Francisco Mamede de Brito Filho
Eduardo Wallier Vianna
DIRETOR DE PROGRAMA
CHEFE DE GABINETE DO INEP
DIRETOR DE TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO
Paulo Roberto Costa e Silva
Marcos Heleno Guerson de Oliveira Júnior
SECRETÁRIO-EXECUTIVO DO CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO
DIRETOR DE POLÍTICA REGULATÓRIA
Ministério da Saúde
Ayrton Pereira Rippel
CHEFE DE GABINETE ADJUNTO
ÓRGÃOS VINCULADOS À PASTA
Robson Santos da Silva
Oswaldo de Jesus Ferreira
ASSESSOR ESPECIAL
PRESIDENTE DA EMPRESA BRASILEIRA DE SERVIÇOS HOSPITALARES (EBSERH)
Ricardo Roquetti
Paulo Sérgio Sadauskas
DIRETOR DE PROGRAMAS DA SECRETARIA-EXECUTIVA DO MEC
DIRETOR DA ANVISA
Ministério da Infraestrutura
Jamil Megid Júnior
SECRETÁRIO DE TRANSPORTES
TERRESTRES
Evandro da Silva Soares
Tarcísio Gomes
de Freitas
CHEFE DE GABINETE DA
SECRETARIA NACIONAL DE TRANSPORTES TERRESTRE E AQUAVIÁRIO
MINISTRO
ÓRGÃOS VINCULADOS À PASTA
Francisco Antônio de Magalhães Laranjeira
Antônio Leite dos Santos Filho
DIRETOR-GERAL DO DNIT
PRESIDENTE DA COMPANHIA DOCAS DO RIO DE JANEIRO
Washington Gultenberg de M. Luke
GERENTE DE PROJETOS DO DNIT
Elis Treidler Öberg
André Kuhn
CHEFE DE OPERAÇÕES DA COMPANHIA DOCAS RIO GRANDE DO NORTE
DIRETOR EXECUTIVO DO DNIT
André Luiz Fonseca e Silva
DIRETOR DE OPERAÇÕES E SERVIÇOS TÉCNICOS DA INFRAERO
José Roberto Bueno Júnior
CHEFE DE GABINETE
Cláudio Xavier Pereira
COORDENADOR GERAL DE ORÇAMENTO E FINANÇAS
Ministério de Minas e Energia
Helio Mourinho Garcia Júnior
SUBSECRETÁRIO DE PLANEJA- MENTO, ORÇAMENTO E ADMIN.
Bento Costa de Albuquerque Jr.
Almirante Garcia
MINISTRO
ASSESSOR
Capitão de mar e guerra Klein
ÓRGÃOS VINCULADOS À PASTA
ASSESSOR
Eduardo Bacellar
Capitão de mar e guerra Litaiff
PRES. DO CONS. DE ADM. DA PETROBRÁS
Carlos Freire Moreira
ASSESSOR
PRESIDENTE INB
Coronel Alan
Carlos Henrique Silva Seixas
ASSESSOR
PRESIDENTE DA NUCLEP
Hugo Oliveira
ASSESSOR
General Silva e Luna
PRESIDENTE DA NUCLEP
Sérgio Lopes
ASSESSOR
Mauricio Pazini Brandão
Ministério
da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações
SECRETÁRIO DE TECNOLOGIAS APLICADAS
Antonio Franciscangelis
Neto
Marcos Pontes
MINISTRO
SECRETÁRIO DE
PLANEJAMENTO
ÓRGÃOS VINCULADOS À PASTA
Waldemar Barroso Magno Neto
Elifas Gurgel Chaves do
Amaral
PRESIDENTE FINEP
João Miguel Souza Aguiar
SECRETÁRIO DE RADIODIFUSÃO
OUVIDOR DO INCRA
Waldemar Barroso Magno Neto
Carlos Alberto Flora
Baptistucci
PRESIDENTE DO FINEP
Juarez Aparecido de Paula Cunha
Celestino Todesco
PRESIDENTE DOS CORREIOS
SECRETÁRIO-
EXECUTIVO ADJUNTO
CHEFE DE GABINETE
Waldemar Gonçalves Ortunho Jr.
PRESIDENTE DA TELEBRAS
Juarez Aparecido de Paula Cunha
Carlos Freire Moreira
PRESIDENTE CORREIOS
PRESIDENTE INB
Gerson Nogueira Machado de Oliveira
Carlos Henrique Silva Seixas
PRESIDENTE NUCLEP
ASSESSOR ESPECIAL
DO MINISTRO
Rogério Troidl Bonato
DIRETOR DO DEPARTAMENTO
DE SERVIÇOS DE TELECOMUNICAÇÕES
Nader Motta
SECRETÁRIO DE ORÇAMENTO E FINANÇAS
Ministério do Meio Ambiente
ÓRGÃOS VINCULADOS À PASTA
Brigadeiro Camerini
Coronel Mendes
SECRETÁRIO DE BIODIVERSIDADE
(AINDA VAI
ASSUMIR)
CORREGEDOR DO ICMBIO
Coronel Mário
General Eudes
ASSESSOR
CORREGEDOR DO IBAMA
Coronel Mendes
Almirante Dias
CORREGEDOR DO ICMBIO
DIRETOR DO IBAMA NO RIO DE JANEIRO
Coronel Sappi
CORREGEDOR
Coronel Araujo
ASSESSOR
Coronel Maniscalco
Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos
ASSESSOR
Franklinberg
de Freitas
PRESIDENTE DA FUNAI
ÓRGÃOS VINCULADOS À PASTA
Jesus Corrêa
PRESIDENTE DO INCRA
Juarez Aparecido de Paula Cunha
PRESIDENTE DOS CORREIOS
André Luis Vieira
ASSESSOR ESPECIAL DO PRESIDENTE DOS CORREIOS
Ministério da Agricultura
ÓRGÃOS VINCULADOS À PASTA
Jesus Corrêa
PRESIDENTE DO INCRA
Ministério da Cidadania
Marco Aurélio
Vieira
SECRETÁRIO DE ESPORTE
Nilton Carlos
Jacintho Pereira
CORREGEDOR DA SECRETARIA EXECUTIVA ADJUNTA
Ministério do Turismo
Luciano Puchalski
DIRETOR DO DEPARTAMENTO DE POLÍTICA E AÇÕES INTEGRADAS

Dos 22 ministros, veja a qualificação profissional:
EMPRESÁRIO - 1
MILITAR - 8
DIREITO - 5
MEDICINA - 3
ECONOMIA - 2
ENGENHARIA - 2
PROFESSOR - 1
DIPLOMATA - 1
8
Apuração: Adriana Ferraz, Carla Bridi, Matheus Lara, Tânia Monteiro e Tulio Kruse - Infográfico: Gisele Oliveira
Fonte: Governo Federal


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Comentários de leitores: 


Um tio meu, já falecido, era Coronel-Aviador reformado quando FHC assumiu. Ele me disse: "Esse comunista disfarçado vai fazer muito mal para as Forças Armadas." Eu não dei crédito na época. Quando Lula assumiu meu tio disse: "O PT vai perseguir as Forças Armadas por vingança e vão destruir o Brasil." Fiquei assustado achando exagero do velho. Logo criaram a "Comissão da Vingança". Pouco tempo depois ele disse: "Um piloto de elevador no Congresso ganha mais que um piloto de um caça que custa milhões e carrega bombas". Meu velho tio foi um profeta! Alguém contesta?
21 mil pessoas foram indenizadas na comissão da verdade ao custo de 40 bilhões de reais, vem aí a CPI da comissão da verdade. Está entre os indenizados: jornalistas, auto-exilados políticos, falsos perseguidos alinhados ao PT, milicianos de esquerda que assaltavam bancos e explodiam bombas em prédios públicos e todo tipo de escória comunistas.

Quem vcs acham que o presidente deveria indicar para esses cargos? Jornalistas?Ouso dizer que a descrença dos jornalistas se iguala a dos políticos! Faça uma pesquisa como a que foi feita, onde os militares estão entre os mais respeitados pela população! Quando nas passeatas apareciam as faixas Militares Já, não era menção à Ditadura era sim à Probidade, honestidade, Segurança! quem pregou a Ditadura do Proletariado, entre outros, foram jornalistas expoentes hoje, que pegaram em armas. A Democracia precisa da Imprensa Livre. A Imprensa hoje desinforma e cria confusão!


Mais uma reportagem com título tendencioso e depreciativo, hoje o Presidente nomeia pessoas sabidamente qualificadas para a função e é acusado de aparelhamento. Onde estava você ESTADÃO nos anos de PT? Estava hibernando ou mancomunados com o PTismo?


Perfeito o presidente. Sabe que no meio militar não tem santo, tambem tem aqueles que pisam na bola, com a diferença de que uma vez descoberto, dança. O mesmo nao ocorria na era petista. onde o erro era cobrado com promoções. Alguem se lembra de qualquer punição ao pessoal do mst que causaram inumeros danos a propriedades particulares e ate mesmo publicas.


Coloca um militar no SUS, o SUS está distribuindo cartilha para criança acima de dez anos que ensina a criança como se cuidar no caso de gravidez., Como pode falar de gravidez para criança de dez anos? quero militar em todos os órgãos do governo.


Se a intenção era criticar para colocar a população contra,mais uma vez o tiro saiu pela culatra
Perfeito Adilson!

E uma noticia maravilhosa, devia colocar muito mais militares, presidente Bolsonaro realmente está respondendo real anseio do povo, com todos generais, vamos instalar Comissão da Verdade avesso aos petistas, e a guerrilheira vai ver sol nacer quadrado, e mandar no lugar de um soldade e cabo, um batalhão das Forças Armadas na porta do STF para acabar com "reino de deus"


E que continue assim. Brasil avante com honra e respeito às instituições democráticas.


Ok, ótimo!E sobre a volta dos empregos, o que vai ser feito?


Sai o vermelho entra o verde oliva!!! Parabéns Brasil!