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domingo, 21 de agosto de 2016

Reflexoes por ocasiao de um segundo retorno de um exilio politico - Paulo Roberto de Almeida

Um texto escrito em dois momentos, como explico no Addendum, que coloco aqui encima, pois ele explica o espírito com que foram redigidas estas reflexões.

Addendum em 21 de agosto de 2016:
O texto acima [abaixo], que pode ser facilmente classificado como impressionista – em que pesem suas observações objetivas sobre o momento em que vivíamos então – permaneceu inconcluso em meu computador, aguardando que eu completasse minhas reflexões sobre aquele momento político, um pouco no espírito (mas não na linha) de meus artigos de 1977, quando do retorno do meu primeiro exílio político. Não o terminei, mas isso agora não importa, pois ele apenas marca uma outra etapa de meu itinerário político: o término de um segundo exílio político, que durou o dobro do primeiro, e que foi simplesmente caracterizado pela minha recusa em me dobrar às circunstâncias de um outro momento, essas mesmas que descrevo neste artigo, o fato de o Brasil ter sido dominado por um partido totalitário e mafioso. Parece que acabou. Ufa!
Brasília, 21 de agosto de 2016.


Quatro décadas de luta pela democracia no Brasil
(reflexões por ocasião de um segundo retorno)

Paulo Roberto de Almeida
(texto escrito na perspectiva de minha volta ao Brasil, em meados de 2015)

Em meados de 1977, pouco tempo depois de retornar de um exílio auto-assumido de quase sete anos e meio na Europa, escapando dessa maneira à fase mais repressiva do regime militar brasileiro – e antes mesmo de ingressar na carreira diplomática, o que só ocorreu ao final daquele ano –, eu dava continuidade a meus esforços de interpretação do momento político brasileiro, e de luta contra a ditadura, por meio de dois artigos, um publicado, outro inédito, que tentavam colocar em ordem minhas próprias reflexões sobre o momento político então vivido pelo Brasil. Eram tempos de recrudescimento da luta pela redemocratização, que iria desembocar na anistia a ser finalmente concedida em 1979 aos militantes políticos de oposição, exilados voluntária ou involuntariamente em diversos momentos do regime de exceção.
Não importa muito, agora, o que eu exatamente escrevi a respeito do “Momento Político Brasileiro” – este foi o título das minhas notas sobre a conjuntura política, publicadas sob um nom de plume numa pequena revista da esquerda acadêmica de São Paulo, mais de um ano depois que tinham sido redigidas, e quando a conjuntura, obviamente, já não era a mesma – e de outras notas opinativas até hoje inéditas sobre a “crise política brasileira” – que eram reflexões adicionais sobre a conjuntura política depois do “pacote” de abril de 1977, quando o regime ainda pensava controlar suas forças de apoio no Congresso.
Ambos trabalhos, típicos representantes daquele pensamento da esquerda acadêmica que eu então partilhava, vinham carregados de conceitos marxistas e de outras banalidades pretensamente intelectuais e tinham como objetivo congregar os esforços daqueles que lutavam contra a ditadura no sentido de superar as divisões estéreis dos movimentos de oposição numa ampla frente que deveria servir de base para a recriação – ou a nova fundação – de um partido socialista moderno, reformista, liberto daqueles chavões herdados do marxismo clássico e mais propenso a fazer no Brasil aquilo que os partidos socialdemocratas reformistas já faziam na Europa, ou seja, um sistema de mercado caracterizado por uma economia parcialmente controlada pelo Estado e engajado num distributivismo social tanto mais necessário no Brasil quanto a pobreza e a desigualdades eram percebidas como o principal problema do país.
Pois bem: passados quase quarenta anos daquelas notas – que sequer reli, no momento em que alinho estas novas reflexões – quais seriam minhas observações e argumentos sobre o momento político brasileiro, sobre sua crise generalizada – ou seja, não apenas econômica, mas também política e, sobretudo, moral – e sobre as tarefas dos atores conscientes, civicamente responsáveis pelo que é, e pelo que pode ser, o Brasil, numa tentativa de superação do estado de anomia que parece prevalecer no plano da institucionalidade e da própria sociedade? Faço a pergunta porque é evidente, aos olhos de todos aqueles que acompanham a conjuntura e seus desdobramentos desde o anterior processo eleitoral, que o Brasil vive uma crise de legitimidade no que se refere à governança política, quando não uma crise de ilegalidades continuadas que se desenrolam à vista de todos os que se detêm sobre o espetáculo de imoralidades e desatinos que compõem as páginas políticas e policiais dos principais meios de comunicação.
Como diria alguém, nunca antes na história do País descemos tão baixo na escala de valores que deveriam presidir a governança, e este ambiente difuso de mal-estar atinge todos os poderes e todas as instâncias da esfera pública (e acadêmica) que somos condenados a contemplar quase de maneira impotente, ou protestando de forma quase vã por meio dos instrumentos de comunicação social. Cidadãos honestos, simples contribuintes compulsórios do ogro famélico que nos retira dois quintos da nossa renda (sem devolver serviços proporcionais ao esforço contributivo) se sentem desarmados em face do festival de bandalheiras, fraudes, falcatruas e roubalheiras que são exibidos cotidianamente nesses meios de comunicação social, inclusive os oficiais. Estaríamos anestesiados em relação aos crimes que são cometidos no âmbito do Estado, por parte de um governo mentiroso, corrupto e corruptor? Creio que não, de que é prova este mesmo texto indignado que me decidi escrever no momento de uma nova volta ao Brasil. O que está acontecendo, e o que poderíamos fazer?
Minha primeira constatação é puramente factual: estamos sob a dominação temporária – mas que se delonga por um tempo excessivamente longo na vida de nossa geração de ativos participantes da vida pública – de um partido que não responde às mesmas regras do jogo democrático como a maioria dos demais partidos – e eles são certamente em excesso – inseridos em nosso sistema democrático de muito baixa qualidade. Esse partido, que pode ser chamado de gramsciano, mas que eu chamaria simplesmente de totalitário, está imbuído de que representa os interesses do povo de quem diz defender os interesses, num sentido de “justiça social”, distributivismo, inclusividade, participação, enfim todo um conjunto de objetivos alinhados sob a bandeira do social, e tem um projeto de poder que pretende excluir a alternância democrática. Para isso recorre a todo tipo de expediente – inclusive os mais deletérios e condenáveis do ponto de vista da moralidade política – para manter e monopolizar esse poder, que não é buscado apenas para fins de “mudanças sociais”, mas também para satisfazer o desejo pessoal de seus dirigentes corruptos. Que estes sejam profundamente corruptos não cabe a menor dúvida, bastando uma recordação dos numerosos casos investigados e alguns até condenados pela justiça do país.
Minha segunda constatação é igualmente objetiva: esse mesmo partido corrupto e corruptor, é um apoiador das piores ditaduras, no continente e alhures, agindo sempre em benefício de regimes totalitários, em todas as instâncias nacionais e internacionais, o que constitui um profundo motivo de vergonha a todos os democratas do país, não apenas aos diplomatas que são obrigados a contemplar – e muitas vezes a compactuar – com essas alianças espúrias, com essa conivência com regimes violadores dos direitos elementares dos seus próprios cidadãos. Pior ainda: o governo destina importantes recursos recolhidos compulsoriamente do povo brasileiro para apoiar esses regimes ditatoriais e corruptos. Isso também é motivo da mais profunda vergonha, para todos nós, que sabemos que o próprio governo, contrariando as mais elementares regras da governança, esconde esses fatos (e o volume de recursos) da cidadania e dos próprios agentes políticos encarregados de zelar pela boa aplicação dos recursos públicos.
(...)
Hartford, 28 de junho de 2015

801 anos da Magna Carta: indago se o Brasil ja chegou la? - Paulo Roberto de Almeida

Mais de um ano atrás, voltando do Brasil aos Estados Unidos no mesmo dia em que, ao que parece, a Magna Carta completava exatos 800 anos (com o desconto da passagem do calendário juliano para o gregoriano), eu redigia, em pleno voo, uma curta nota relativamente pessimista, ao constatar quão distantes estávamos do principal dispositivo desse documento relevante para a construção da democracia moderna: o princípio de que ninguém está acima da lei, nem mesmo o rei.
Vivíamos, então, uma tremenda agitação na sociedade, com inúmeros, provavelmente mais de duas dezenas de pedidos de impeachment contra a mandatária irresponsável e fraudadora que nos governava desde 2011 (e que tinha sido reeleita de forma fraudulenta em 2014), e a Câmara dos Deputados (que poderia estar fazendo o papel dos barões revoltados), era dirigido por um perfeito bandido parlamentar. Não tínhamos, assim, nenhuma perspectiva de que algo pudesse mudar no cenário político.
Mais de um ano depois, algo mudou, não como gostaríamos, e por circunstâncias muito fortuitas às quais não são alheias as iniciativas de um pequeno grupo de procuradores federais abrigados em Curitiba e um juiz corajoso -- a chamada República de Curitiba -- mas algo mudou para melhor. O bandido parlamentar está lutando defensivamente antes de ser definitivamente cassado, por demanda da sociedade, e deve enfrentar cadeia logo. A mandatária fraudulenta, finalmente, deve ser afastada, ainda que deva merecer cadeia também, o que não sabemos se vai ocorrer. Os demais mafiosos envolvidos no mais gigantesco caso de corrupção do Brasil podem vir a prestar contas com a justiça.
Ou seja, já nos aproximamos um pouquinho do espírito da Magna Carta.
Em todo caso, vou postar novamente o que escrevi um ano atrás, para registrar minha opinião sobre o momento político brasileiro.
Paulo Roberto de Almeida


Pequena reflexão no dia em que a Magna Carta completa 800 anos

Paulo Roberto de Almeida 

Examinando o panorama a partir do nosso ambiente de vida e de trabalho, é forçoso reconhecer que, no que se refere ao principal dispositivo desse compromisso não exatamente constitucional, mas simplesmente costumeiro, e que tem a ver com o Estado de Direito, o Brasil infelizmente ainda não chegou lá, como se diz. Não apenas “nossos” soberanos se permitem ignorar a regra simplicíssima de que ninguém está acima da Lei, nem mesmo o Rei, como também eles pretendem se situar à margem da, quando não contra a Lei, e passam a violar, muitas vezes impunemente, simples mandamentos constitucionais ou a mais elementar legalidade, que seria a chamada responsabilização das suas ações e omissões enquanto governantes. O mandonismo e o patrimonialismo, tão tradicionais em nossa cultura política, ainda contaminam todo o ambiente da governança em nosso país, geralmente com os piores exemplos vindos daqueles mesmos que deveriam resguardar, proteger, defender e obedecer à Lei. Esta é uma simples constatação primária, feita a partir da leitura dos jornais diários, onde se lê que dirigentes e representantes de um partido promíscuo, vinculado a meliantes e outros barões ladrões, estão sempre envolvidos com alguma falcatrua contra os recursos da coletividade, ou seja, nossos impostos duramente (e compulsoriamente) recolhidos por um Estado extrator, atrabiliário, e por um governo corrupto e corruptor.
Sinto muito, Senhora Magna Carta, mas a comemoração neste seu dia assume a forma de uma simples constatação de fracasso, pelo menos no que se refere ao Brasil.
No plano multilateral, por outro lado, estou totalmente convencido de que, se a Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, fosse apresentada hoje, para sua aprovação pela Assembleia da ONU, ela simplesmente não seria aprovada, e seria rejeitada inclusive por Estados que a ratificaram à época. Esta é outra triste constatação de nossos tempos, que parecem ter recuado em relação às liberdades antigas. Neste caso, o texto da Declaração, uma derivação mais elaborada da famosa Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, da revolução francesa, estaria sendo vítima não só do recrudescimento desavergonhado por parte dos novos autoritários (alguns até mesmo velhos totalitários), como também de muitos adeptos do “politicamente correto”, com seu festival de bobagens alegadamente em defesa de minorias e outras espécies “não protegidas”.
Ainda temos um longo caminho pela frente em defesa das mais elementares liberdades democráticas, uma vez que a história não é necessariamente linear, e até pode até recuar em certas esferas.
Sorry Magna Carta...

em voo Atlanta-Hartford, 15 de junho de 2015.

2833. “Pequena reflexão no dia em que a Magna Carta completa 800 anos”, em voo Atlanta-Hartford, 15 de junho de 2015, 2 p. Postado no blog Diplomatizzando (link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2015/06/pequena-reflexao-no-dia-em-que-magna.html).