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domingo, 10 de março de 2024

Entrevista de Edmar Bacha (Brazil Journal): Declarações-bomba contra Lula e o PT - comentários de Maurício David

Brasil poderia deslanchar, mas Lula põe empresários na defensiva, diz Bacha


Entrevista ao Brazil Journal, 10/03/2024


Eleitor de Lula no pleito de 2022, o economista Edmar Bacha diz que o Brasil tem oportunidades “extraordinárias,” mas não as está aproveitando por falta de confiança de empresários e investidores na economia. E todo mundo sabe o que está gerando este clima: o próprio comportamento e as decisões do Presidente. “Lula ainda tem na cabeça que o Estado deve forçar o investimento das empresas e usar seus instrumentos para fazer com que isso aconteça,” Bacha disse nesta entrevista ao Brazil Journal. É o caso da Vale, que Lula e trata como se ainda fosse estatal apesar de ter sido privatizada há 26 anos. O economista diz que o ministro do Trabalho “age como um sindicalista dos anos 1930” ao tentar regular os aplicativos, e que a política industrial anunciada pelo vice-presidente Geraldo Alckmin vai afastar o Brasil ainda mais das cadeias internacionais de valor. Mas para Bacha, nem tudo são espinhos no governo Lula. Ele elogia a gestão de Fernando Haddad – “Está tudo errado na área econômica, com exceção da parte fiscal” – a nomeação de Nísia Trindade Lima para a Saúde e as iniciativas do presidente na área social. “Lula faz um bom trabalho nessa área.” Bacha diz que o País terá que fazer a reforma do Estado, outra reforma da Previdência, e aumentar a eficiência dos programas sociais. Mas se o Governo insistir nas ideias atrasadas, é o próprio PT que pagará o preço. “O Lula não entendeu que o mandato dele é muito restrito. Se o bolsonarismo for minimamente competente e apresentar um candidato razoável, por exemplo, o Tarcísio de Freitas [governador de São Paulo], o Lula vai ter que ralar para ser reeleito.” Abaixo, os principais trechos da entrevista. 

 

Como o senhor avalia a gestão do governo Lula? 

 

Acho que o Haddad está conseguindo segurar as pontas. Basicamente, é disso que se trata, enfrentar o “fogo amigo” dentro do governo e o “fogo inimigo” no Congresso. Bolsonaro realmente deixou esse horrível legado. Outro dia vi o gráfico da proporção das emendas dos parlamentares no Orçamento Geral da União [R$37,6 bilhões, metade do total previsto para investimento em 2024].

 

Foi boa ideia acabar com o teto de gastos?

 

Não foi bom acabar com o teto, mas, tendo visto todos os furos de que o teto foi vítima, era preciso conceber alguma coisa nova. O Haddad conseguiu, dentro das circunstâncias, conceber algo aceitável para Lula e o PT. A gente não pode esquecer que este é um governo do Lula e do PT. Dentro desse constrangimento, acho que ele fez o melhor possível. O governo tem diversas dimensões. A política externa, por exemplo, é um absurdo. 

 

Por quê?

 

Porque é um absurdo que Celso Amorim, que é antiamericano radical desde sempre, esteja no comando da política externa. Estamos apoiando Vladimir Putin, Nicolás Maduro e Xi Jinping, e fazendo coisas unilaterais no Oriente Médio, quando deveríamos tentar fazer o meio de campo. 

 

Que papel o Brasil poderia ter no conflito entre Israel e Palestina?

 

Temos condições internas para fazer o meio de campo no Oriente Médio porque essas questões estão razoavelmente pacificadas no Brasil. A lei antirracismo, por exemplo, foi proposta por Afonso Arinos de Melo Franco e aprovada em 1951. Naquela época, os EUA ainda tinham “apartheid”. Estamos purgando os pecados do passado, mas enfim, somos uma sociedade misturada e temos honra de sermos assim. Obviamente, há um problema terrível de distribuição de renda que a gente precisa enfrentar, mas que está sendo trabalhado. Lula faz um bom trabalho nessa área. Imagine ter a Nísia Trindade Lima no Ministério da Saúde. Isso é uma verdadeira prenda! Então, há coisas boas no governo.

 

O que o preocupa além da política externa?

 

Lula ainda tem na cabeça que o Estado deve forçar o investimento das empresas e usar seus instrumentos para fazer com que isso aconteça. Ele não tem mais as estatais na mão porque elas foram privatizadas. Lula quer entrar na Vale porque a companhia não está investindo tanto quanto ele queria. Ele entrou na Petrobras. O presidente [Jean Paul Prates] que ele nomeou quer comprar de volta refinarias privatizadas [durante os governos Dilma Rousseff, Michel Temer e Jair Bolsonaro]. Está querendo, também, comprar os postos de gasolina de volta [a BR Distribuidora foi privatizada em 2019]. Isso é absurdo! A Petrobras tinha que estar focada para fazer o que sabe fazer bem, que é a exploração de petróleo. É uma empresa estatal, então, precisa ter uma super governança. A Lei das Estatais [aprovada na gestão Temer] tentou fazer isso, mas, hoje, essa lei está sob ataque do Lula e dos petistas. Vejo problemas também no Ministério do Trabalho. 

 

Por quê?

 

O ministro do Trabalho [Luiz Marinho] age como um sindicalista dos anos 1930. Ele acha que está fazendo a consolidação das leis do trabalho para um Brasil que estaria começando a se industrializar e a se urbanizar… Ele pressionou de todas as formas para fazer a chamada, entre aspas, regularização da atividade dos entregadores de aplicativos. Os entregadores reagiram, dizendo: “Não queremos essa regularização”. O pessoal do PT tem uma mentalidade atrasada. 

 

Como o senhor avalia a política industrial lançada pelo governo? 

 

A esta altura da partitura, aumentar a tarifa sobre importação, os requisitos de conteúdo local e a preferência para compras governamentais são decisões contrárias ao aumento da produtividade da economia. Está tudo errado na área econômica, com exceção da parte fiscal. A reforma tributária passou muito bem no Congresso, mas eu me pergunto: se o Lula estivesse realmente interessado e não tivesse delegado o assunto totalmente para o pobre do Bernard Appy [secretário especial da Reforma Tributária], que teve que resolver tudo com o Congresso sem nenhum poder político, teriam aparecido tantos jabutis quanto apareceram? E agora, há o risco de termos ainda mais jabutis na regulamentação. A reforma tributária manteve o IPI sobre produtos que tenham similares fabricados na Zona Franca de Manaus.

 

Este é um jabuti?

 

Acho que eles vão restringir a lista de produtos sujeitos a essa regra. Espero que seja como a lista da cesta básica. Há a promessa de revisão daqui a cinco anos. Nos próximos anos, temos que ficar batendo em cima para que, de fato, daqui a cinco anos a gente possa tirar esses jabutis da árvore. Quando a Constituição foi promulgada em 1988, fixou-se prazo de cinco anos para a revisão. Houve revisão? Lembro-me perfeitamente. Mandamos 63 projetos de emenda constitucional e o Congresso rejeitou 62. Só passou a criação do Fundo Social de Emergência [que desvinculou 20% da arrecadação dos tributos federais atrelados a gastos com saúde e educação]. O PIB cresceu 2,9% no ano passado, mas a taxa de investimento recuou 3%.

 

Falta confiança aos empresários?

 

Não há confiança. O que me irrita no Lula é que o país poderia estar deslanchando se houvesse confiança. Há oportunidades extraordinárias, mas é preciso ficar na defensiva com o Lula o tempo todo. Sabe-se lá como ele vai intervir na economia. E uma economia que joga na defesa não vai para frente. 

 

O senhor defende há muitos anos a abertura da economia como medida necessária para o aumento da produtividade. Vê alguma chance para essa agenda?

 

Os “Mercadantes” estão muito exultantes com o fato de que, agora, os EUA começaram a praticar a política industrial. Mas é uma política voltada para a sua luta contra a China. E, aí, o pessoal do governo do PT diz: “Se eles fazem, a gente pode fazer também”. O Alckmin fala: “Olha quanto eles [os americanos] estão gastando”. Quando o mundo estava se globalizando, o Brasil não se globalizou. Agora, o mundo está se desglobalizando. 

 

Durante a pandemia, cadeias globais de produção foram quebradas. Isso não criou oportunidade para o Brasil se reindustrializar?

 

Acho que sim. O país precisa repensar a indústria. A questão não é ter política industrial, e sim ter uma política industrial voltada para a integração do Brasil nas cadeias internacionais de valor. A política industrial anunciada pelo governo é o contrário: é para desintegrar ainda mais o Brasil das cadeias internacionais de valor. Vai na contramão do que precisa. Esse pessoal não entende que isso vai criar meia dúzia de empregos, mas a que custo fiscal e a que preço para os consumidores nacionais? Nós, que temos dinheiro para viajar ao exterior, podemos comprar tudo lá fora, sem pagar nenhum imposto aqui. E ainda nos deixam comprar mais US$1.000 no free shop, sem pagar imposto. Mas e os brasileiros que não conseguem sair do país porque não têm dinheiro? Esses brasileiros descobriram que existe um canal chinês que vende produtos, de até US$ 50, sem imposto. Aí, vem o governo querendo taxar esse pessoal. Isso é falta de respeito com os consumidores brasileiros, especialmente os de baixa e média renda. Eles [o governo e os empresários contrários à abertura comercial] acham que o mercado interno é deles. Meu argumento é sempre produtividade, mas o que realmente me toca é a insensibilidade social com o consumidor de baixa renda no Brasil. 

 

O senhor enxerga alguma saída política, capaz de romper esse “pacto” anti-abertura comercial?

 

Essa coisa é muito difícil. Estava pensando politicamente o seguinte: todos nós somos produtores de alguma coisa e consumidores do resto. O que a gente produz a gente quer proteger. Para proteger o que produzo, eu sei como agir. Vou lá no meu sindicato, no meu deputado, no Ministério da Indústria e Comércio. Agora, para as coisas que eu consumo, a quem eu recorro, com quem me reúno? Com quem? Não tem! Não há agregação de interesses individuais em coletividades que possam exercer a pressão que os grupos de interesse operam sobre o governo. E, aí, nós somos prejudicados. Bem, nós não porque temos como fazer compras no exterior. Eu me lembro bem quando, em 1983, trouxe um computador dos EUA pela primeira vez e o José Serra olhou para mim e perguntou: “O que é isso, hein?”. Naquela época, tínhamos uma Lei de Informática que proibia a importação de computadores. 

 

O Plano Real completa 30 anos em julho. O senhor vê alguma ameaça à estabilidade dos preços? 

 

Não.

 

Acredita nisso porque os brasileiros aprenderam que inflação baixa é algo bom?

 

Não são os brasileiros, e sim a classe política. Os políticos aprenderam que, se não mantiverem a inflação sob controle, eles caem fora.

 

Que reformas o país precisa fazer além de abrir a economia?

 

A reforma do Estado brasileiro, um tema que vem sendo bastante tratado pelo Arminio Fraga e a Ana Carla Abrão. Qual é o aspecto mais importante dessa reforma? Uma reforma administrativa entendida amplamente. A gente tem que reduzir o peso que o gasto de pessoal exerce hoje sobre o orçamento. Há também a questão da Previdência, que vai voltar, uma vez que o Lula está corrigindo o salário mínimo acima da inflação. Com o piso da Previdência indexado ao salário mínimo, essa situação vai se deteriorar ao longo do tempo. Mesmo os programas sociais poderiam ser melhor gerenciados. O ex-senador Tasso Jereissati apresentou proposta de lei de responsabilidade social dando um pouquinho mais de consistência e integração às transferências sociais. Estas poderiam ser feitas de forma muito mais efetiva, com muito menos custo e mais benefícios para quem de fato necessita. 

 

De que forma? 

 

Unificar os programas, ter portas de entrada e saída, criar poupança para quem necessita no setor informal, para uso durante momentos de desemprego. Enfim, teria muito o que fazer para tornar o Estado mais leve e ágil, e mais voltado para o que deve fazer pelo país.

 

Como o senhor analisa a polarização política que caracteriza hoje a política brasileira? 

 

Aqui, o problema foi o afundamento do PSDB. O partido surgiu como alternativa ao petismo, mas só foi bem-sucedido por causa do real. O Plano Real criou essa possibilidade de o PSDB ficar no governo federal por oito anos e, no governo de São Paulo por 20. O PSDB se desintegrou. O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, está tentando alguma coisa, vamos ver o que ele consegue.

 

Por que o encolhimento do PSDB explica a polarização?

 

Porque isso criou um vácuo no espectro anti-lulista e anti-PT. A direita se apropriou desse espaço. No passado recente e na época do governo do presidente Fernando Henrique Cardoso [1995-2002], o centro tinha controle sobre suas partes. Estou pensando aqui em Ulysses Guimarães, Franco Montoro, Mário Covas, José Richa, Eduardo Campos e outros grandes líderes que tivemos. O PMDB, de onde nasceu o PSDB, era uma força que também se diluiu em inúmeros partidos com aspectos fisiológicos e muito pouco caráter programático. O PSDB é um partido de centro-esquerda. Por que seu espaço foi ocupado pela extrema-direita? Acho que aí tem um problema de personalidade. De vez em quando a história é determinada por indivíduos. O líder carismático que apareceu [Jair Bolsonaro] é um líder de extrema-direita.

 

Que grupos a extrema-direita representa? 

 

O agronegócio moderno e as igrejas pentecostais. Não consigo ver muitas outras características que possam ser identificadas. 

 

Por que o Lula ganhou a eleição? 

 

Porque, na última hora, muita gente, inclusive eu e os pais do Real, declarou voto nele. Foi isso, até mais do que os votos da Simone Tebet, que garantiu a vitória. Mas o Lula não entendeu isso até hoje. 

 

O quê, exatamente?

 

Lula não entendeu que o mandato dele é muito restrito. Se o bolsonarismo for minimamente competente e apresentar um candidato razoável, por exemplo, o Tarcísio de Freitas [governador de São Paulo], o Lula vai ter que ralar para ser reeleito.

 

O senhor vê riscos à democracia brasileira? 

 

Com Trump, sim. Da vez que o Bolsonaro tentou, eu estava tranquilo porque, pensei, se ele quiser fazer alguma coisa, os americanos não deixam. 

 

No cenário externo, que riscos o senhor vê adiante?

 

O maior é a eleição de Donald Trump. É complicada a situação. Os americanos se acostumaram a ter uma taxa de juros muito baixa por muito tempo. A dívida pública não importava muito porque qualquer crescimento do PIB compensava a elevação da dívida. Agora, com os juros a 5,5% ao ano, não mais. O mundo é muito sensível aos juros americanos. O problema do Trump é seu discurso super radical, dizendo, por exemplo, que quer classificar imigrantes como terroristas. É inacreditável!

 

Ele disse que não indicará Jay Powell para novo mandato no comando do Federal Reserve [Fed, o banco central dos EUA]. Isso preocupa? 

 

Pois é, sabe-se lá qual será a política monetária, embora a estrutura do Fed seja muito sólida. Não dá para colocar muitos “pombos” [economistas subservientes ao governo] na diretoria. Ele está falando em colocar imposto de 150% sobre o que se compra da China. Isso não depende tanto do Congresso para fazer. E tem a questão da geopolítica. 

 

Qual, exatamente? 

 

Trump está ameaçando enfraquecer a OTAN, além de todas as outras organizações multilaterais. Seriam os EUA se voltando para si mesmo. O isolacionismo se manifestando a esse nível pode ser muito ruim para o mundo.Os europeus terão que reagir de alguma maneira porque a ameaça da Rússia está aí. Matéria do “The New York Times” revelou a atração, por Vladimir Putin, de uma importante ala do partido Republicano. Não é só o Trump. É um grau muito grande de deterioração em relação ao que se espera do país líder do mundo ocidental. 

 

Com a possível volta de Trump, voltamos para a era das incertezas?

 

Essa é a questão. O retorno de Trump é algo que, obviamente, não vai ser bom. O que podemos discutir é o quão ruim será porque os interesses comerciais e empresariais americanos no exterior são muito relevantes. A dependência da força do dólar, tendo em vista que os EUA são um país deficitário e que sua dívida externa precisa se manter sólida, é muito importante. Ainda hoje é impossível imaginar uma corrida contra o dólar. Todas as crises internacionais, inclusive, as mais recentes, foram uma corrida para o dólar, que continua sendo o ativo mais seguro. Isso expõe o mundo.

 

Por quê?

 

Seria um risco enorme você não dispor da moeda básica, um ativo sobre o qual os investidores não têm a menor dúvida. Este seria o limite que um governo Trump, isolacionista e muito aguerrido, poderia provocar no mundo. Temos que nos preparar para essa situação. E como estamos? O saldo comercial do Brasil é bem favorável [US$98,8 bilhões em 2023, recorde histórico]. Temos boa perspectiva tanto em termos de safra agrícola quanto de petróleo e gás. E temos reservas internacionais bastante fortes [US$ 354 bilhões]. A gente tem que se preocupar com a solidez fiscal porque o que pode ocorrer de pior é uma crise financeira, que vai nos atingir diretamente.

 

De que forma?

 

Atinge a colocação da dívida pública aqui no país, mesmo esta sendo interna. Haveria fuga de capitais. Se você olhar a composição das reservas internacionais ao longo dos últimos anos, há uma queda da importância do dólar. Ao contrário do que alguns previam, isso não ocorre por causa do renminbi. Há uma diversificação de portfólio em relação a países ocidentais sólidos, mas a dimensão desses mercados é muito pequena. Você pode diversificar 5%, 10% ou 15% do portfólio das reservas, mas, logo, logo, chega ao limite porque não existe outro país, com exceção da China, com a dimensão econômica dos EUA. Dependendo do que ocorra na Europa, temos que imaginar como seria porque, lá, não há mais líderes com a qualidade da Angela Merkel [ex-premiê da Alemanha]. Isso é preocupante porque, se não forem os EUA, têm que ser a Europa para segurar o mundo ocidental. 

 

Como o senhor vê a situação econômica da China?

 

Enquanto continuar o controle político que o Partido Comunista possui, os chineses têm os instrumentos em mãos [para lidar com uma possível crise]. Eles não têm problema fiscal como o nosso. Têm um superávit fiscal considerável. A taxa de poupança da China é extraordinária [45% do PIB]. O Brasil [cuja taxa de poupança em 2023 foi de 15,4%] tem um problema de excesso de demanda, enquanto na China falta demanda. É por isso que os chineses dependem tanto das exportações e dos investimentos em construção civil. Mas, os governantes têm os instrumentos e é mais fácil combater falta de demanda do que falta de oferta. O fato é que acabou o milagre chinês. A discussão neste momento é a que taxa de crescimento eles vão pousar.


Leia mais em https://braziljournal.com/brasil-poderia-deslanchar-mas-lula-poe-empresarios-na-defensiva-diz-bacha/?utm_source=Brazil+Journal&utm_campaign=928212ade3-weekendjournal-10032024-1_COPY_03&utm_medium=email&utm_term=0_850f0f7afd-928212ade3-427950289 .

 

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Citações do dia : em bombástica entrevista publicada no dia de hoje, Edmar Bacha (o principal economista da área direita do PSDB, ex-presidente do BNDES) usa seus drones para bombardear Lula, Alckmin, Aloizio Mercadante e à população civil em geral...

 

Algumas das suas pérolas : (há pérolas de sabedoria, outras parecem que saídas de um bombardeio israeli da Faixa de Gaza...) 

Mauricio David


Declarações de Edmar Bacha:

 

“Lula ainda tem na cabeça que o Estado deve forçar o investimento das empresas e usar seus instrumentos para fazer com que isso aconteça”

 

a política industrial anunciada pelo vice-presidente Geraldo Alckmin vai afastar o Brasil ainda mais das cadeias internacionais de valor

 

se o Governo insistir nas ideias atrasadas, é o próprio PT que pagará o preço

 

A política externa (...do PT) , por exemplo, é um absurdo

 

é um absurdo que Celso Amorim, que é antiamericano radical desde sempre, esteja no comando da política externa

 

O ministro do Trabalho [Luiz Marinho] age como um sindicalista dos anos 1930

 

 O pessoal do PT tem uma mentalidade atrasada

 

aumentar a tarifa sobre importação, os requisitos de conteúdo local e a preferência para compras governamentais são decisões contrárias ao aumento da produtividade da economia. Está tudo errado na área econômica, com exceção da parte fiscal

 

O PIB cresceu 2,9% no ano passado, mas a taxa de investimento recuou 3%.

 

O que me irrita no Lula é que o país poderia estar deslanchando se houvesse confiança. Há oportunidades extraordinárias, mas é preciso ficar na defensiva com o Lula o tempo todo. Sabe-se lá como ele vai intervir na economia. E uma economia que joga na defesa não vai para frente

 

Os “Mercadantes” estão muito exultantes com o fato de que, agora, os EUA começaram a praticar a política industrial. Mas é uma política voltada para a sua luta contra a China. E, aí, o pessoal do governo do PT diz: “Se eles fazem, a gente pode fazer também”. O Alckmin fala: “Olha quanto eles [os americanos] estão gastando”. Quando o mundo estava se globalizando, o Brasil não se globalizou. Agora, o mundo está se desglobalizando.

 

A questão não é ter política industrial, e sim ter uma política industrial voltada para a integração do Brasil nas cadeias internacionais de valor. A política industrial anunciada pelo governo é o contrário: é para desintegrar ainda mais o Brasil das cadeias internacionais de valor. Vai na contramão do que precisa. Esse pessoal não entende que isso vai criar meia dúzia de empregos, mas a que custo fiscal e a que preço para os consumidores nacionais? Nós, que temos dinheiro para viajar ao exterior, podemos comprar tudo lá fora, sem pagar nenhum imposto aqui. E ainda nos deixam comprar mais US$1.000 no free shop, sem pagar imposto. Mas e os brasileiros que não conseguem sair do país porque não têm dinheiro?

 

. A gente tem que reduzir o peso que o gasto de pessoal exerce hoje sobre o orçamento. Há também a questão da Previdência, que vai voltar, uma vez que o Lula está corrigindo o salário mínimo acima da inflação. Com o piso da Previdência indexado ao salário mínimo, essa situação vai se deteriorar ao longo do tempo.

 

Por que o Lula ganhou a eleição? Porque, na última hora, muita gente, inclusive eu e os pais do Real, declarou voto nele. Foi isso, até mais do que os votos da Simone Tebet, que garantiu a vitória. Mas o Lula não entendeu isso até hoje. 

 

Se o bolsonarismo for minimamente competente e apresentar um candidato razoável, por exemplo, o Tarcísio de Freitas [governador de São Paulo], o Lula vai ter que ralar para ser reeleito.

 

. A dependência da força do dólar, tendo em vista que os EUA são um país deficitário e que sua dívida externa precisa se manter sólida, é muito importante. Ainda hoje é impossível imaginar uma corrida contra o dólar. Todas as crises internacionais, inclusive, as mais recentes, foram uma corrida para o dólar, que continua sendo o ativo mais seguro. Isso expõe o mundo.

 

. Atinge a colocação da dívida pública aqui no país, mesmo esta sendo interna. Haveria fuga de capitais. Se você olhar a composição das reservas internacionais ao longo dos últimos anos, há uma queda da importância do dólar. Ao contrário do que alguns previam, isso não ocorre por causa do renminbi.

 

A taxa de poupança da China é extraordinária [45% do PIB]. O Brasil [cuja taxa de poupança em 2023 foi de 15,4%] tem um problema de excesso de demanda, enquanto na China falta demanda.

 

. O fato é que acabou o milagre chinês. A discussão neste momento é a que taxa de crescimento eles vão pousar.


segunda-feira, 21 de dezembro de 2020

Acabou o Consenso de Washington? Shannon K. O’Neil (Foreign Affairs)

 Não acredito! Pois ele não é um receituário que se aplique por inteiro a todos os países. Como estava no cerne do seminário sobre uma década de reformas na AL, ele era apenas uma síntese do que poderia ser feito para avançar nessas reformas. Elas continuam válidas e nem todas foram aplicadas concretamente. Anos depois, um segundo seminário foi feito para avançar nas reformas, mas políticos e povos estavam cansados, como ocorreu depois de 2009 e agora mesmo, sob a pandemia. Faltam líderes que consigam impulsionar reformas, mas como visto no caso de Merkel e Macron, os MM da Europa, nem isso é suficiente. 

A estupidez por vezes vence...

Paulo Roberto de Almeida 


Protection Without Protectionism

Getting Industrial Policy Right

Shannon K. O’Neil

Foreign Affairs, Nova York – Jan.-Fev. 2021

 

Foe two decades, the free movement of goods, services, and capital was the world’s guiding principle, crystallized in the so-called Washington consensus. Although countries didn’t always live up to these ideals or implement laissez-faire policies, most aspired to do so.They had to explain, justify, and limit their deviations from this consensus, at least in theory. The vast majority of the world’s countries signed on to multilateral institutions that promoted and enforced this view—such as the International Monetary Fund (IMF) and the World Trade Organization (WTO). 

Yet the era of the Washington consensus is now over—and despite what some commentators have argued, the COVID-19 pandemic is not the cause of its demise. Developing countries started pushing back against the consensus in the early years of this centuryMature economies began to sour on its tenets after the 2008 global financial crisisToday, advanced countries and developing ones alike are embracing “industrial policy,” a catchall term for government interventions in certain industries and in the broader economy. This shift is apparent even in the United StatesThe Trump administration ignored and attacked the liberal world order that the United States has led for decades. But its approach partly reflected a new conventional wisdom in Washington in favor of an economic path that relies much more on active government involvement.

The policies of the Washington consensus spurred growth and development all over the world. But they had clear downsides, as well. Free trade disadvantaged workers in many developed countries, including the United States, and market-based approaches proved inadequate in tackling global crises such as climate changeRedressing the faults of the Washington consensus, however, does not mean the United States should embrace protectionism, which would spell economic disaster.Global supply chains are here to stay, and U.S. workers will be left behind if American companies can’t take advantage of them. A U.S. industrial policy built on more global cooperation and competition, better U.S. access to international markets, and public investments at home can mitigate the shortcomings of the Washington consensus and avoid the pitfalls of protectionism.

The Washington consensus grew out of the volatility of the 1970s and 1980s. Mainstream economic thinking shifted as traditional, Keynesian economists fumbled through recessions and stagflation and more market-friendly, neoliberal thinkers gained currency in academic departments. Their intellectual godfather, Milton Friedman, won the 1976 Nobel Prize in Economics. By the 1980s, his acolytes were populating finance ministries and multilateral institutions around the world, ready to put his teachings into practice. As they did, debt crises were spreading throughout emerging markets, spurring a backlash against fiscal deficits and populist spending. Meanwhile, central economic planning lost its luster with the collapse of the Soviet Union. 

Under the Washington consensus, trade agreements brought down tariffs, eliminated quotas and government licenses for imported goods, and protected intellectual and other property rights. International money flows surged as capital markets opened up. Governments deregulated industries and privatized state-owned enterprises. At the same time, multilateral institutions enforced the rules; the WTO, for example, adjudicated disputes and punished rule breakers. The IMF encouraged countries to open up to foreign investment and prescribed spending cuts and other austerity measures to get debtor countries back on track. 

In retrospect, this faith in the consensus was misplaced. Emerging markets that followed the prescribed path often didn’t thrive. Despite bursts in trade and investment, many economies didn’t expand or diversify. Meanwhile, places that bent (or even broke) the rules, such as China, Taiwan, and Vietnam, made much more progress.Opening up to global capital proved not to be the blessing that was promised. Money came in, but it also flowed out quickly, intensifying boom-and-bust cycles. In Asia, many countries blamed the IMF and its austerity measures for deepening and extending the economic and social losses from the 1997 financial crisis. 

The era of the Washington consensus is now over.

The consensus eventually wore thin in wealthier countries, as well, where neoliberal policies offered little to address the harm done to workers by falling or stagnating wages, the loss of manufacturing jobs, and the decline of labor unions. Meanwhile, after the 2008 financial crisis, social safety nets began to fray, owing to the prolonged economic downturn and austerity measures—implemented even at a time when servicing public debt cost very little, with interest rates falling close to zero. 

Economists tried to save the model by supplementing its basic menu with reforms such as anticorruption regulations and targeted antipoverty measures, for example, conditional cash transfers to the needy. But it was too late; the sheen had faded. In finance ministries, at central banks, and even in conversations among elites in snowy Davos, the site of the annual conference of the World Economic Forum, critiques of the Washington consensus spread. As global policy attitudes shifted, so did the actions of the consensus’s institutional enforcers. Starting in 2015, the WTO relinquished its role as a promoter of freer trade when, after years of stalemate, negotiators finally gave up on the Doha Round of international trade negotiations, which would have further lowered trade barriers on agricultural goods and other products. In 2019, the WTO lost its ability to referee disputes when the United States refused to approve new judges to its appellate court. Meanwhile, the IMF has done an about-face: after years of preaching austerity, the fund has determined that fiscal restraint is out and spending is in. This past fall, IMF economists officially blessed more government largess, designating it a necessary catalyst in spurring private-sector investment. 

Of course, even in the heyday of the consensus, industrial policy had not disappeared. Governments continued to intervene in markets, using a mix of trade rules, tax incentives, low interest rates, and public contracts to protect domestic businesses, create jobs, and attract and direct investment. States built critical infrastructure, funded research labs, trained workers, and enticed immigrants—or tried to woo back their own citizens who had emigrated elsewhere and acquired new skills. 

Asian countries, in particular, took this more hands-on approach. Although China professed a belief in market-based reforms at crucial moments, such as when it was applying for WTO membership, it never played by the laissez-faire rules. Instead, Beijing expanded public financing and subsidies, strengthened protections for domestic industries, and forced foreign companies that wanted to do business in China to share their proprietary technology with Chinese partners. Japan also protected and supported certain sectors, keeping out rice imports through quotas and tariffs and barring foreign-made autos through strict environmental and safety standards.

In Europe, the European Economic Community and its successor, the European Union, played an important role in national economies, as well, most notably by stitching together over two dozen countries into one market. EU regulations covered everything from labor laws to environmental standards, and Brussels spent tens of billions of dollars to build roads and rails, deepen ports, and connect rivers. It provided public funding for research and development and temporary loans to many companies. More recently, the EU has stepped up subsidies for local industries and allowed national governments to intervene in order to keep major European firms from coming under the control of foreign investors. 

Support for more active state intervention in the economy has grown in the United States, too.States already routinely offer carrots, such as tax breaks, worker training, and cheap electricity, to attract new plants or corporate headquarters. The federal government also mandates that U.S. highways and airports be built with steel and iron made in the United States, that publicly funded school lunch programs use only American-grown foods, and that many defense contracts include “Buy American” clauses. More recently, the Trump administration raised and expanded tariffs, and President Donald Trump used his bully pulpit to name and shame U.S. companies operating abroad. 

 

THE NEED TO INTERVENE

 

Even governments that oversee market-based economies sometimes must intervene to overcome market failures and deal with problems that individual companies or whole industrial sectors choose to ignore. And when it comes to research and development, governments are the only actors that can invest in ways that ignite innovation again and again, as they have far more resources and a longer time frame than any private enterprise. In the United States, federal funding spurred the science behind the Internet, global positioning systems, touch screens, solar panels, LED lights, fracking, artificial intelligence, quantum computing, and the sequencing of the human genome. The federal government has backed hundreds of university research labs, private contractors, and businesses, and those investments have paid off many times over by seeding new industries, boosting tax revenues, improving public health, and securing U.S. technological dominance. The case for an active role for government has only grown stronger in recent years as the effects of climate change—perhaps the clearest example of a market failure—have become more apparent. In the United States, even professed libertarians have warmed to state activism to ward off the threat.

More traditional national security issues present additional reasons to expand the public sector’s role in the economy. Some of the newfound enthusiasm for industrial policy stems from a growing realization about the vulnerabilities that come with global supply chains. International manufacturing enhances efficiency by allowing companies to shave costs, but it also exposes production to faraway natural disasters, targeted attacks, or aggression by other states. In 2011, for example, floods in Thailand submerged factories that made auto components for days, halting work on Honda and Toyota assembly lines all over the world. The COVID-19 pandemic has revealed the risks posed by the global concentration of production sites for even relatively mundane goods such as ventilators, personal protective equipment, and pharmaceutical ingredients; last March, the United Kingdom had just a few weeks’ worth of aspirin left within its borders.

Countries increasingly worry that international supply chains could be weaponized for geopolitical gain—for example, if China denied adversaries access to the rare-earth minerals that power everyday electronics. The United States has already taken steps in this direction, using its central role in global finance to force European companies to divest from Iran and Indian refiners to turn away Venezuelan oilThe United States has also banned semiconductor companies that use U.S. equipment or software, no matter where they are based, from selling their products in China. In 2019, Japanstopped exporting essential chemicals for semiconductor manufacturing to South Korea because of ongoing tensions between the two countries over reparations for war crimes committed during World War II. 

As technology becomes ever more embedded in people’s lives, policymakers worry that foreign hardware and software could expose citizens and governments to surveillance and espionage.Technological backdoors into phones could reveal sensitive information; car computers could be hacked and vehicles remotely hijacked; and malware could bring down power plants, electricity grids, or banking systems. One way states can address these national security vulnerabilities is to entice companies to move back home—or convince them not to leave in the first place.

 

THE PITFALLS OF PROTECTIONISM

 

History, however, provides many examples of industrial policy gone wrong. Supposedly temporary protections for infant industries or struggling economic sectors often become permanent, encouraging the development of monopolies or oligopolies. Over time, such measures impede national competitiveness, as protected corporations and sectors are less inclined to innovate. Governments are rarely wise or nimble enough to figure out the right amount of protection.

Latin America’s experience in the postwar period highlights these potential downsides. Several countries introduced a mix of tariffs, quotas, licenses, industrial subsidies, and credits to spur domestic manufacturing. There were initial economic gains: GDP surged ahead in many countries, as did local manufacturing of steel, chemicals, cars, and all sorts of consumer goods. In Brazil, the aerospace corporation Embraer made inroads into the international jet market, and the mining company Vale became one of the world’s biggest miners of iron ore. In Mexico, lucrative government contracts and control of the domestic retail cement market helped fund the building materials company Cemex’s successful global expansion. But more often, governments weren’t particularly good at choosing winners and were even worse at weeding out unproductive but politically connected companies. Indigenous innovation stalled, as monopolies and oligopolies captured the benefits of government protections and created a bevy of multimillionaires and billionaires. Consumers paid higher prices for inferior goods, and taxpayers shouldered the burden as country after country faced public debt crises and economic stagnation. 

The COVID-19 crisis has laid bare the importance of striking the right balance. The United States has long maintained stockpiles of crude oil, essential medical supplies, copper, zinc, and a number of other essential commodities. Now, Washington is broadening the list to include personal protective gear, ventilators, and pharmaceutical ingredients. Owing to geopolitical concerns, another nearly three dozen commodities are likely to be put on the list, including rare-earth minerals. 

 

SHANNON K. O’NEIL is Vice President, Deputy Director of Studies, and Nelson and David Rockefeller Senior Fellow for Latin America Studies at the Council on Foreign Relations.

 

Para acessar a íntegra do artigo:

https://www.foreignaffairs.com/articles/united-states/2020-12-08/protection-without-protectionism

segunda-feira, 25 de maio de 2020

A Crise do Coronavírus e a Estratégia Industrial - IEDI

IEDI, Boletim n. 1000, 25/05/2020

A Crise do Coronavírus e a Estratégia Industrial
Sumário 
O IEDI vem intensificando sua agenda de debates e reflexões sobre o futuro do Brasil e de sua indústria, com o objetivo de identificar as condições necessárias para que tenhamos uma economia capacitada a superar a grave crise decorrente da pandemia do coronavírus. Uma indústria alinhada com o padrão internacional, quanto à sua competitividade, produtividade e sofisticação tecnológica, garantirá importante contribuição para o País reencontrar uma trajetória sólida para o seu desenvolvimento.
A irrupção da pandemia do coronavírus tornou o contexto econômico e social do Brasil, assim como no restante do mundo, muito mais complexo e desafiador, exigindo ações de caráter emergencial para a preservação da vida, dos empregos e das empresas. 
Frente a esta nova situação, que já ocasiona transformações profundas na economia doméstica e internacional, o IEDI procura fomentar, através deste documento, o diálogo no País sobre as estratégias que devem ser seguidas para a economia, a sociedade e a indústria, tendo em vista a necessidade de acelerarmos a agenda de remoção de obstáculos que há muito tempo dificultam o nosso progresso, sempre ambicionando o desenvolvimento socioeconômico brasileiro. 
A assídua participação dos Conselheiros do IEDI nas reuniões promovidas pelo Instituto e suas valiosas sugestões de aprimoramento do presente documento foram contribuições decisivas. O trabalho contou ainda com a colaboração do corpo técnico do IEDI e de especialistas em temas de importância para o avanço do País. 
A indústria, que é um dos mais importantes motores do crescimento socioeconômico e destacada fonte de novos produtos, novas tecnologias e novas formas de produzir, encontra-se no centro de nossas reflexões. Seu papel estratégico para os países ressurgiu face à pandemia do coronavírus, com a interrupção de elos das cadeias globais de valor e com a dificuldade de obtenção de equipamentos e materiais médico-hospitalares fundamentais para o enfrentamento desta crise. 
Embora a indústria seja o ponto de partida de nossa reflexão, não é o único aspecto a ser enfatizado. Retomar o caminho do crescimento sustentado e do desenvolvimento econômico e social implica construirmos pilares de atuação com o objetivo de sanear o Estado, reduzir distorções de nosso ambiente econômico, melhorar as condições de competitividade e de produtividade da indústria e promover melhores condições de vida e de mobilidade social aos brasileiros. 
Além disso, diante dos desafios impostos pela crise do coronavírus, ações emergenciais se fazem indispensáveis para preservar vidas, empregos e empresas, assegurando melhores condições para a retomada do crescimento.
Ações nesta direção têm sido tomadas no mundo todo e, no campo econômico, incluem, entre outras, o diferimento ou a isenção por certo período de tempo de impostos, taxas e contribuições federais, estaduais e municipais; o desenho de linhas de financiamento para pagamento da folha de salários e de capital de giro das empresas, com a participação de recursos do Tesouro; a regulamentação da redução da jornada de trabalho e salários, com compensações pelo governo; a transferência de renda direta para famílias mais vulneráveis e trabalhadores informais; o suporte financeiro do governo federal a estados e municípios; bem como medidas de aumento da liquidez e a autorização de compra de ativos públicos e privados por parte do Banco Central.
O Brasil, acompanhando o que outros países vêm fazendo, adotou esse leque de iniciativas cuja real eficácia dependerá do constante aprimoramento de sua implementação, para que sejam contemplados os agentes econômicos e indivíduos para quem foram direcionadas. 
Atualmente, continuam existindo lacunas importantes, como a dificuldade do acesso aos programas de financiamento por micro e pequenas empresas e a necessidade de se incorporar nestes programas paulatinamente empresas de maior porte, diferimento do pagamento de tributos estaduais e municipais e o desbloqueio de créditos tributários das empresas, empoçados nas diferentes esferas de governo. 
Há ainda sério risco de agravamento das condições de liquidez das empresas de maior porte, sendo necessária a coordenação de ações entre governo, bancos públicos e bancos privados no desenho de mecanismos horizontais e com marco temporal, que promovam a irrigação do crédito. 
A recomendação do IEDI nesse tema é que as diferentes esferas do poder público acompanhem sistematicamente as condições econômicas e sociais dos próximos meses e não hesitem em adaptar os programas ou reforçá-los. Caso os benefícios das iniciativas não cheguem às empresas e à população ou se revelem insuficientes aos propósitos para os quais foram criados, o ônus para o País será um doloroso atraso na recuperação de sua economia e do emprego, além de custo fiscal ainda maior. 
De qualquer modo, mesmo que a crise do coronavírus amplie fortemente o gasto e a dívida pública em um primeiro momento, as iniciativas para reequilibrar as contas públicas continuam fundamentais. É imprescindível que preservemos os esforços já realizados e asseguremos uma tendência de médio e longo prazo de equilíbrio fiscal.
Este é o primeiro pilar de um programa de superação da presente crise, que consiste na trajetória favorável das contas públicas associada a um avanço significativo da governança do Estado. Estas são condições precedentes para que sejam preservadas conquistas muito importantes, como inflação e taxas de juros baixas. São também condições para os demais ajustes que igualmente são imprescindíveis. 
Elevar a competitividade e a produtividade deve constituir o segundo pilar do programa de desenvolvimento econômico e social, tendo como destaque a Reforma Tributária, que deverá (i) promover a simplificação do sistema tributário com a redução do custo de prestação dos tributos e da insegurança jurídica, (ii) eliminar a cumulatividade de impostos e o acúmulo de créditos dos contribuintes, com a sua pronta devolução, (iii) desonerar completamente as exportações e os investimentos e (iv) através da tributação no destino, de forma abrangente e com alíquotas horizontais, eliminar incentivos disfuncionais a formas de realização das atividades que acabam adicionando custos sistêmicos. Da mesma forma, a sequência da Reforma Trabalhista será mais uma ferramenta para aumento da produtividade, maior segurança jurídica e adaptação às novas formas de trabalho.
O IEDI também avalia como pertinentes iniciativas adicionais de grande alcance: o desenvolvimento do mercado de capitais e o novo papel do BNDES; a diminuição do custo do crédito; os ajustes na regulação econômica e a melhora do ambiente de negócios, reduzindo a insegurança jurídica; e o incentivo aos investimentos em infraestrutura. 
A recuperação econômica após a crise do coronavírus pode ter nos investimentos de infraestrutura relevante instrumento de aceleração do emprego e do crescimento econômico, com os avanços regulatórios necessários e a constituição de mecanismos de financiamento capazes de atrair o investimento privado. Pode igualmente requerer a recomposição da parcela pública dos investimentos, em grande medida complementar às inversões privadas na área.
Nesta mesma direção, é preciso acelerar a agenda de inserção competitiva da economia brasileira no mundo. O País deve abrir o maior número de frentes possíveis de negociações de acordos comerciais, enfatizando o gradualismo, a horizontalidade e a transparência, e ter iniciativa para reduzir suas barreiras internas aos fluxos de comércio. O ingresso na OCDE também seria relevante neste processo, pois nos possibilitaria alinhar normas e procedimentos com as principais economias mundiais, que têm demonstrado resultados mais favoráveis que os nossos.
A agenda de redução do chamado “Custo Brasil”, que representa cerca de 22% do PIB brasileiro, segundo estimativa da Secretaria Especial de Produtividade, Emprego e Competitividade do Ministério da Economia, se faz absolutamente necessária para potencializar os ganhos do País com o avanço da integração internacional. 
O aporte das atividades industriais forma o terceiro pilar para a construção do futuro do Brasil. A contribuição do setor será maximizada se, a exemplo do que fazem muitos outros países desenvolvidos e em desenvolvimento, for adotada uma estratégia industrial que vise, em última análise, elevar a produtividade e a competitividade do setor e do País. Ações nesta direção, que já vinham ganhando destaque no mundo ao longo dos últimos anos, devem ser reforçadas no período pós coronavírus. 
Na estratégia a ser seguida pelo Brasil, cabe mencionar os seguintes temas: 
     1.  O País deve criar condições para absorver as tecnologias emergentes na revolução da Indústria 4.0, em curso a nível mundial, e também promover, por meio de ferramentas horizontais, o desenvolvimento e a aplicação dessas inovações.
     2.  Potencialização da inovação, por meio do apoio às atividades de P&D das instituições de ciência e tecnologia públicas e do setor privado, do fortalecimento da educação básica e tecnológica e através de programas consistentes que articulem universidades, institutos de pesquisa, setor produtivo e governo.
     3.  Fomento à modernização do parque industrial, através de instrumentos horizontais e com limite temporal, com o objetivo de impulsionar a produtividade e competitividade e para melhorar a performance ambiental das empresas brasileiras.
     4.  Mobilização de competências industriais, sem comprometer o objetivo de produtividade e competitividade das empresas, para o enfrentamento de desafios sociais, muitos deles agravados pela crise do coronavírus, como segurança sanitária, saneamento e sustentabilidade ambiental.
     5.  Aumento da exportação de manufaturados, em especial de produtos mais complexos e intensivos em tecnologia, o que pressupõe a maior inserção competitiva de nossa economia. 
     6.  Agregação de valor a atividades primárias em que o Brasil apresenta grande potencial de desenvolvimento ou reconhecida vantagem competitiva.
O IEDI acredita que os princípios e diretrizes recomendados neste documento serão de grande valia para colocar o Brasil nos trilhos do desenvolvimento econômico e social de longo prazo. 
Entretanto, o enorme contingente de brasileiros sem as condições mínimas de renda e de acesso à saúde, à moradia, à educação de qualidade, à segurança e ao saneamento traz a certeza de que é preciso um quarto pilar para o nosso desenvolvimento, que consiste em acelerar as políticas públicas no campo social e torná-las mais efetivas em mudar esta realidade. 
Um País com baixa mobilidade social está condenado a ser menos competitivo e pouco inovador. É urgente redefinirmos a alocação de recursos públicos de forma a eliminar estas distorções. A pandemia ressaltou ainda mais a necessidade desta ação.
O avanço no quadro social do País tem a capacidade de tornar o mercado consumidor ainda mais pujante e de elevar a produtividade do trabalho, o que fortaleceria a indústria, bem como todos os demais setores da economia. 
Este documento será encaminhado às autoridades públicas e ao meio político e acadêmico, servindo de guia para o diálogo entre o Instituto e a sociedade.

A Crise do Coronavírus e a Estratégia Industrial

A disseminação do coronavírus tem colocado aos países do mundo todo, inclusive ao Brasil, novos desafios de natureza sanitária, com forte pressão sobre seus sistemas de saúde, mas também de natureza econômica e social, face a interrupções nas cadeias produtivas e à brusca contração da demanda, em função das necessárias medidas de isolamento social. A escalada do desemprego e o risco de falência de empresas são consequências que os países se esforçam para evitar.
Este quadro de grande excepcionalidade, ao mesmo tempo em que impõe obstáculos adicionais para que o Brasil retome uma trajetória de crescimento econômico robusto e sustentado ao longo do tempo e promova a melhoria da qualidade de vida de sua população, também pode abrir novas oportunidades para desenvolvermos e aumentarmos a eficiência de nosso sistema produtivo.
O cenário pós-crise do coronavírus pode se revelar promissor para a indústria brasileira, com a taxa de câmbio do Real em um nível competitivo e com países à procura de novos fornecedores, de modo a reduzir sua atual dependência de um número pequeno de fontes de suprimento de partes, peças, componentes, insumos e equipamentos fabricados pela indústria. 
Por isso, o IEDI inseriu este novo contexto à estratégia de desenvolvimento que tem defendido para o Brasil, identificando os principais desafios que o País deverá enfrentar para alçar a indústria nacional ao padrão internacional, quanto à competitividade, produtividade e sofisticação tecnológica. Na visão do IEDI, a superação de tais desafios e o fortalecimento da indústria darão contribuições fundamentais para o nosso desenvolvimento econômico e social. 

Indústria e Desenvolvimento

No Brasil, assim como no restante do mundo, a indústria é uma das principais alavancas do progresso dos países. A inovação industrial, ao criar novos bens, processos, tecnologias e equipamentos de produção para o conjunto da economia, promove o aumento da produtividade e da complexidade da estrutura produtiva. É isto que assegura a contínua elevação da renda e do bem-estar do conjunto da população.
A importância da indústria se tornou ainda mais evidente no enfrentamento da pandemia do coronavírus. Diante das rupturas das cadeias globais de valor e de obstáculos ao comércio internacional, muitos países têm buscado mobilizar suas competências industriais para evitar o quadro de escassez de equipamentos e suprimentos de saúde.
Países como Alemanha, França, Japão, Estados Unidos e Reino Unido, somente para citar alguns exemplos, estão reunindo empresas e atores de seus sistemas de inovação para reconverterem linhas de produção e fabricarem equipamentos médicos e hospitalares e equipamentos de proteção individual (EPI) para seus agentes de saúde. No Brasil, empresas de diferentes setores, como máquinas e equipamentos, automóveis e autopeças, têxteis, química, higiene e limpeza, entre outros, também estão contribuindo para responder à demanda emergencial por estes produtos. Tal processo pode e deve ser acelerado, acompanhando as tendências internacionais, sem que isso, contudo, comprometa os objetivos de aumento da produtividade e da competitividade das empresas.
Não podemos deixar de lado outros aspectos mais de longo prazo que ressaltam a relevância do setor manufatureiro no dinamismo de nossa economia, a começar pelo fato de que vem daí a maior parte dos gastos em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D). De acordo com a Pintec 2017 do IBGE, a indústria de transformação é responsável por 67% no total de dispêndios empresariais em P&D. 
Ademais, a indústria é capaz de potencializar e espalhar o crescimento, devido às relações intersetoriais que nutre. Segundo estimativas com base em dados de 1947 a 2018 para o Brasil, ao crescer 1% a indústria alavanca crescimento de 2% nas demais atividades econômicas. Ou seja, quando a indústria se dinamiza, o PIB total do País também se expande mais.
Outra destacada razão pela qual a indústria é capaz de impulsionar o crescimento da economia como um todo: sua maior taxa de investimento. No Brasil, quando os investimentos totais chegaram à sua melhor marca, de 20,9% do PIB em 2013, as inversões da indústria se situaram em patamar bem superior: 24,1% do PIB setorial.
Além desses fatores, a indústria no Brasil também tem posição relevante na criação de empregos formais (20% do total do setor privado) e na contribuição às receitas do setor público – o setor respondeu em 2016 por 27% da arrecadação, um índice que reflete sua elevada carga tributária: 45% do valor adicionado da indústria.
Vale mencionar, ainda, que no Brasil e no mundo a relação entre indústria e serviços vem se estreitando. Por esta razão, a indústria crescentemente tem servido à exportação de serviços, em geral daqueles de maior qualidade. Segundo a OCDE/OMC, cerca de 32% do valor adicionado das exportações mundiais de manufaturados correspondem a serviços incorporados. No caso do Brasil, esta relação é ainda maior, chegando a 37%.

Os Obstáculos à Indústria e ao Setor Produtivo Brasileiro

Assim, cuidar bem do setor industrial faz bem à economia como um todo, embora não seja isto que o Brasil tem feito nas últimas décadas. Os obstáculos são de diferentes ordens e se ampliaram com a pandemia do coronavírus, que tem desorganizado cadeias produtivas e os mercados.
Revigorar nossa indústria neste contexto atual de profundo choque econômico, tanto do lado da oferta como do lado da demanda, implicará ações e políticas públicas em três tempos, respondendo aos desafios emergenciais impostos pela pandemia, mas também organizando a fase de recuperação econômica e retomando o encaminhamento de deformações de nosso ambiente econômico que nos afasta dos padrões existentes no restante do mundo.
Em primeiro lugar, medidas emergenciais devem buscar fortalecer nosso sistema de saúde, de modo a enfrentar o aumento da demanda por tratamentos hospitalares, bem como assegurar a manutenção de empregos, o fluxo de renda para as famílias e a viabilidade das empresas, que viram seus mercados e, consequentemente, suas vendas se contraírem fortemente.
Ações adotadas nesta direção incluem, entre outras, o diferimento ou a isenção por certo período de tempo de impostos, taxas e contribuições federais, estaduais e municipais; o desenho de linhas de financiamento para pagamento da folha de salários e de capital de giro das empresas, com a participação de recursos do Tesouro; a regulamentação da redução da jornada de trabalho e salários, com compensações pelo governo; a transferência de renda direta para famílias mais vulneráveis e trabalhadores informais; o suporte financeiro do governo federal a estados e municípios; bem como medidas de aumento da liquidez e a autorização de compra de ativos públicos e privados por parte do Banco Central.
O Brasil, acompanhando o que outros países vêm fazendo, adotou esse leque de iniciativas cuja real eficácia dependerá do constante aprimoramento de sua implementação, para que sejam contemplados os agentes econômicos e indivíduos para quem foram direcionadas. 
Nesse sentido, os programas já em curso deverão ser alterados ou complementados por outras ações em função do desenrolar da crise. Atualmente, continuam existindo lacunas importantes, como a dificuldade do acesso aos programas de financiamento por micro e pequenas empresas e a necessidade de se incorporar nestes programas paulatinamente empresas de maior porte, diferimento do pagamento de tributos estaduais e municipais e o desbloqueio de créditos tributários das empresas empoçados nas diferentes esferas de governo. 
Há ainda sério risco de agravamento das condições de liquidez das empresas de maior porte, sendo necessária a coordenação de ações entre governo, bancos públicos e bancos privados no desenho de mecanismos horizontais e com marco temporal, que promovam a irrigação do crédito. 
Será necessário que as diferentes esferas do poder público acompanhem sistematicamente as condições econômicas e sociais dos próximos meses e não hesitem em adaptar os programas ou reforçá-los. Caso os benefícios das iniciativas não cheguem às empresas e à população ou se revelarem insuficientes aos propósitos para os quais foram criados, o ônus para o País será um doloroso atraso na recuperação de sua economia e do emprego, além de custo fiscal ainda maior. 
Em segundo lugar, é preciso organizar a normalização das atividades econômicas, assim que o controle da curva epidemiológica da Covid-19 no Brasil permita a retomada da economia. A exemplo de outros países, no Brasil os governos federal, estaduais e municipais, de modo coordenado, terão de formular os protocolos de funcionamento das atividades econômicas, para que a reativação mais ampla da produção e circulação de bens e serviços seja duradoura.
aceleração do crescimento do PIB, passado o momento mais agudo da crise do coronavírus, poderá demandar a manutenção de alguns programas emergenciais e de transferência de renda por um período mais longo do que o previsto. Será necessária a adoção de medidas adicionais, como um programa que acelere as concessões, privatizações, parcerias público-privadas (PPPs) e a retomada de obras públicas, com foco na celeridade, atratividade e na segurança jurídica. Avaliamos que nesse caso cabe ao governo e ao Congresso a proposição da legislação e dos marcos regulatórios, alinhados com os objetivos mencionados acima, ficando ainda a cargo do Estado a realização, por si mesmo ou através de PPPs, daqueles projetos meritórios do ponto de vista socioeconômico, mas que não atraiam o interesse do setor privado. 
Em todos estes casos, porém, é fundamental que o esforço de equilíbrio das finanças públicas permaneça presente e assegure a sustentabilidade da dívida pública a médio e a longo prazo.
E para isso será fundamental também a presença do terceiro conjunto de ações e políticas que compreende a agenda de reformas, com o objetivo de conferir maior agilidade e eficiência ao Estado brasileiro e reduzir distorções de nossa economia que comprometem a competitividade dos bens e serviços produzidos no País. Compreende ainda a execução de corretas e modernas estratégias industriais e de inovação, capazes de alavancar a produtividade não apenas da indústria, mas da economia como um todo. É o encaminhamento destes temas que colocará novamente o Brasil nos trilhos do desenvolvimento.
Os avanços já logrados na direção de reconstituir o equilíbrio fiscal, por meio do contingenciamento dos gastos públicos e de reformas, como a da Previdência e a fixação de um teto ao crescimento real das despesas do Estado, não podem ser perdidos. Ainda que o combate da pandemia do coronavírus e de seus efeitos econômicos provoque grandes ampliações de gastos e da dívida pública, é fundamental que guardem um caráter transitório, não comprometendo uma trajetória sustentável para as finanças públicas, sob o risco de perda de credibilidade e aumento das incertezas quanto ao futuro de nosso País.
Ademais, não podemos perder de vista que parte importante desta agenda ainda está por realizar, notadamente a Reforma Tributária que deverá (i) promover a simplificação do sistema tributário com a redução do custo de prestação dos tributos e da insegurança jurídica, (ii) eliminar a cumulatividade de impostos e o acúmulo de créditos dos contribuintes, com a sua pronta devolução, (iii) desonerar completamente as exportações e os investimentos e (iv) através da tributação no destino, de forma abrangente e com alíquotas horizontais, eliminar incentivos disfuncionais a formas de realização das atividades que acabam adicionando custos sistêmicos. Da mesma forma, o aperfeiçoamento da Reforma Trabalhista será mais uma ferramenta para aumento da produtividade, diminuição da insegurança jurídica e adaptação às novas formas de trabalho.
Não custa sublinhar que, para o IEDI, o desajuste fiscal é grave e será ainda maior na atual conjuntura, de forma que as iniciativas para reequilibrar as contas públicas são mandatórias, devendo ser consideradas a todo o momento. São essas as condições para destravarmos o crescimento da economia e para endereçarmos solução para as demais questões que não são de natureza exclusivamente fiscal. 
O encaminhamento dos temas relacionados ao “custo sistêmico” ou “Custo Brasil”, que, segundo estimativa da Secretaria Especial de Produtividade, Emprego e Competitividade do Ministério da Economia, representa um valor anual de aproximadamente R$ 1,5 trilhão, equivalente a 22% do nosso PIB, é de suma importância para o desenvolvimento econômico e social do País e também será relevante para conter o progressivo declínio industrial das últimas décadas, permitindo, como consequência, o avanço em direção ao maior crescimento.
É fundamental que preservemos os atuais baixos níveis da taxa básica de juros (Selic). As taxas de juros dos empréstimos às famílias e às empresas, porém, seguem elevadas e muito acima do padrão internacional. Para enfrentar este problema, deveríamos perseguir a redução de todos os custos incidentes sobre o crédito, em função da tributação, de deficiências de nosso ordenamento jurídico, referente a garantias e aos processos de falência empresarial, e de impedimentos à diversificação dos mecanismos de crédito. Um cenário duradouro de juros baixos seria muito benéfico para o País, especialmente para a indústria, e é uma importante condição para que consigamos recuperar nossa economia mais rapidamente da crise do coronavírus.
Juros domésticos sistematicamente em linha com padrões internacionais também é um pré-requisito para o desenvolvimento do mercado de capitais. Com isso, as empresas passam a depender menos de fontes oficiais de crédito para financiar seus investimentos. Ainda não completamos o percurso em direção a esse estágio e algumas ações sugeridas pelo IEDI podem acelerar e aperfeiçoar o funcionamento desse mercado, como a eliminação de obstáculos à colocação de títulos corporativos.
Os bancos oficiais, como o BNDES, que têm se mostrado importantes para assegurar liquidez a empresas no contexto da crise do coronavírus, assumem também um papel de destaque no processo de desenvolvimento dos mercados de capitais. Ao mesmo tempo, porém, isso permitiria que esses agentes se voltassem para fins mais estratégicos do que vem sendo feito. 
O IEDI defende que a atuação do BNDES priorize áreas com maior capacidade de alavancar o desenvolvimento econômico-social do País, a exemplo do financiamento da inovação, de programas de modernização produtiva com vistas ao aumento da produtividade, da infraestrutura, de micro e pequenas empresas, das exportações de produtos de maior complexidade, entre outras frentes.
Cabe enfatizar que o Brasil ainda aparece na contramão da economia internacional em temas que também elevam os custos da produção doméstica se comparados aos de outros países e minam a competitividade de nossos produtos. É o caso da complexidade e cumulatividade do sistema tributário do País – ou seja, de impostos retidos e não compensados ao longo da cadeia de produção. 
No campo tributário, a pretensão do setor industrial deve ser alta, defendendo a instituição de um IVA nacional que reúna todos os impostos e contribuições indiretos das três esferas de governo, primando pela simplificação em sua estrutura e clareza na aplicação. A simplicidade tributária e regulatória deve se tornar a norma para qualquer empresa de qualquer porte e de qualquer setor de nossa economia, reduzindo custos e atrasos que, hoje, ferem a competitividade do produto nacional.
Vale ressaltar que não apenas no âmbito tributário, mas em vários pontos de interação entre empresas e governos ou agências regulatórias, há muito que se caminhar na desburocratização, assegurando processos com maior segurança jurídica. 
Compõe ainda o “custo sistêmico” o ônus para o setor produtivo ditado pelo atraso dos investimentos em infraestrutura. Em 2019, o País investiu a módica soma de 1,87% do PIB, segundo estimativa da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (ABDIB), que afirma ser preciso investir 4,31% do PIB em infraestrutura por ano, ao longo de no mínimo dez anos seguidos, para reduzir gargalos à competitividade e aumentar a produtividade.
Diante de tamanha deficiência e das pressões orçamentárias que a saúde e as medidas econômicas compensatórias da crise do coronavírus devem provocar, os investimentos privados em infraestrutura precisam ser acelerados, por meio de concessões e parcerias público-privadas (PPPs) e do aprimoramento dos marcos regulatórios que leve em conta as especificidades dos entraves em cada segmento da infraestrutura. Deste modo, haverá uma melhora das condições para a oferta de bens e serviços na economia brasileira. 
Em algumas áreas o quadro é dramático, como em portos, cujos contratos de concessão entre 1990-2018 levaram, segundo dados do Banco Mundial, ao menor volume de investimentos no acumulado no período dentre as diferentes áreas de infraestrutura. Na energia elétrica, além de investimentos insuficientes, outro problema que subtrai competitividade à produção nacional é a ausência de uma política energética voltada à indústria, ou ao menos aos seus ramos eletrointensivos, tal como é amplamente praticado em países desenvolvidos.
A falta de investimento em saneamento e o baixo atendimento da população pelos sistemas de água e esgoto, bem como o déficit habitacional, cobraram um preço elevado do País ao favorecer a disseminação da Covid-19 entre as camadas mais vulneráveis da sociedade. Segundo a Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (ABCON), o Brasil fica atrás de 105 países no ranking internacional de cobertura de saneamento, pior classificado do que outros latino-americanos como Peru, México e Chile. A aprovação do marco regulatório do setor de saneamento é um instrumento decisivo para que o setor privado ajude a mudar esta realidade.
Os investimentos em infraestrutura, que têm a capacidade de gerar forte demanda de bens industriais, constituindo uma via de fortalecimento da indústria no Brasil, podem ser estimulados ainda com a promoção do desenvolvimento do mercado de seguros garantia (especialmente performance bonds) para concessões de infraestrutura, além do apoio à repactuação ou à venda de contratos de concessão de forma a viabilizar projetos já concedidos.
Nesse tema, a atuação do BNDES e dos bancos de fomento também continuará importante, sobretudo, ao contemplar os seguintes aspectos: viabilizar financiamentos nos moldes de um project finance non recourse; flexibilizar as linhas de crédito com aumento dos desembolsos para capital de giro (prazo e taxas competitivas) e dos empréstimos ponte; criação/utilização de fundos garantidores; aceitação de diversos tipos de garantias; possibilidade de compartilhamento de garantias pelos bancos de fomento.
recuperação econômica após a crise do coronavírus também pode ter nos investimentos de infraestrutura relevante instrumento de aceleração do crescimento, com os avanços regulatórios necessários e a constituição de mecanismos de financiamento adequados, como mencionados anteriormente. Pode igualmente requerer recomposição da parcela pública dos investimentos, em grande medida complementar às inversões privadas na área.
Quando o País se aproximar das condições vigentes no mundo nos temas aqui abordados, a indústria, assim como a produção nacional como um todo, estará em igualdade em sua competição com os similares estrangeiros, tornando-se também menos vulnerável às oscilações da taxa de câmbio. Terá, assim, maior ou menor sucesso na concorrência internacional de acordo com a sua própria produtividade e geração de inovações. Este é o País que se espera construir nos próximos anos.
Entretanto, não parece adequado aguardar a solução dessas questões para, então, se promover a aproximação da economia com o exterior, dado o atraso em que o País se encontra neste tema. 
É fundamental, então, elaborar e executar uma verdadeira política de comércio exterior, que estreite os laços entre o Brasil e o restante do mundo e que garanta previsibilidade a todos os atores envolvidos. Dado o atraso existente, é importante que o País reduza ou elimine suas próprias distorções que impedem uma maior integração, alinhando, por exemplo, suas tarifas de importação à média internacional através da celebração de acordos internacionais, que sejam graduais, horizontais e transparentes, o que concorreria para reduzir os custos de investimentos e estimular a formação de capital do País. 
Ademais, poderiam potencializar os efeitos positivos desta maior integração o desenvolvimento adicional dos mecanismos de financiamento das exportações, as ações de facilitação de comércio além do estabelecimento dos já mencionados acordos comerciais, tal como o acordo com a União Europeia. 
São exemplos de ações a serem adotadas: simplificação, racionalização e aperfeiçoamento da legislação que regula o comércio exterior; desobstrução dos canais de financiamento às exportações e participação em grandes acordos comerciais, pois este é o caminho mais rápido, efetivo e promissor para superar o isolacionismo que o País se impôs. Além disso, o País deve abrir o maior número de frentes possíveis de negociações comerciais, ter iniciativa para reduzir suas barreiras internas aos fluxos de comércio e estabelecer uma nova dinâmica para o Mercosul, enfatizando o efetivo livre comércio, a harmonização de normas e a maior flexibilidade para seus membros, entre outras medidas. O ingresso na OCDE também seria relevante neste processo, pois nos possibilitaria alinhar normas e procedimentos com as principais economias mundiais, que têm demonstrado resultados mais favoráveis que os nossos.
Os benefícios que o comércio exterior proporciona, ao ampliar o acesso a insumos, a bens de capital e a tecnologias com custo menor e maior produtividade, terão decisiva importância para a economia doméstica. 
Ao se respeitar padrões adequados na área macroeconômica, na tributação, na infraestrutura, na segurança jurídica, no financiamento e no custo do crédito, que são comuns nas economias desenvolvidas e nos países emergentes de maior estatura, e ao melhor se integrar na economia internacional, o País desfrutará plenamente do potencial que sua economia, e em particular, seu setor industrial, poderá aportar ao desenvolvimento. 
A recuperação do crescimento econômico sustentado e a retomada do desenvolvimento no Brasil passam pelo crescimento da indústria, com um avanço acentuado de sua produtividade e de sua competitividade. 

Estratégia Industrial, Inovação e Exportação de Manufaturados

Para o IEDI é imprescindível ao Brasil adotar instrumentos modernos de estratégia propriamente industrial, a exemplo de outros países. Assim, potencializará as contribuições que o dinamismo do setor traz para a superação da atual recessão e para o desenvolvimento de longo prazo, por meio da inovação, dos avanços na produtividade, da geração de renda e de emprego e do estreitamento dos laços com os mercados internacionais. 
Estratégias industriais visando fortalecer o setor e tornar a indústria 4.0 uma realidade, que já vinham sendo recomendadas por instituições globais, como a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) e a UNCTAD (Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento), e que nos últimos anos estavam sendo largamente aplicadas pelos governos de grandes potências econômicas, como EUA, Alemanha e Japão, e pelos principais emergentes, como a China e a Índia, podem ganhar impulso adicional no contexto pós crise do coronavírus, que explicitou novos benefícios da digitalização, assim como os riscos de ruptura das cadeias globais de valor e da dependência de alguns países da importação de insumos estratégicos. Esses riscos devem muito provavelmente acelerar os investimentos em prol do modelo industrial 4.0, que permite reaproximar a fabricação dos mercados consumidores.
Assim, a política voltada à indústria ocupou espaço relevante nas agendas dos mais variados países no passado, continua ocupando no presente e, certamente, terá importância crescente no futuro. O Brasil não pode deixar de trilhar o mesmo caminho e apenas assistir o novo salto no progresso industrial, já em curso em outras regiões do planeta. 
Por isso, se não priorizar o tema da indústria 4.0 e acelerar a formulação de um plano nacional robusto e coeso, articulando os agentes de seu sistema de inovação e os instrumentos de política industrial, sua posição no ranking global da manufatura, que já está em rota descendente, pode recuar ainda mais. Em 2018, o País encontrava-se na 9ª colocação, isto é, muito próximo de ser excluído do grupo das dez maiores potências industriais.
O IEDI recomenda, assim, que o País, apoiado em políticas horizontais, crie condições para absorver as tecnologias emergentes da indústria 4.0, mas com certo protagonismo e ambição de também participar do desenvolvimento dessas inovações. 
Neste sentido, serão necessárias ações preparatórias que não se referem diretamente à indústria 4.0, embora permitam que a indústria de diversos segmentos e estratos de empresas se preparem para dar o salto em direção ao novo padrão industrial. É urgente multiplicar os instrumentos públicos e as ações empresariais para a digitalização das empresas e dos processos industriais. Há também que se pensar na formação de recursos humanos e competências tecnológicas necessárias à indústria do futuro, bem como para a transformação do tecido industrial, seja o de empresas de todos os portes, sobretudo aquelas de base tecnológica, seja das cadeias industriais em que o Brasil possui posição de relevo global.
Dentre as ações que poderiam contribuir para estes objetivos podemos incluir: apoio financeiro público para soluções vinculadas à indústria 4.0 e à preparação do ambiente para a sua adoção, ações de encorajamento à contratação de serviços de consultoria em programas de melhoria de qualidade e produtividade, bem como para a produção enxuta; estímulos ao desenvolvimento de soluções tecnológicas baseadas em microeletrônica e digitalização; constituição de protótipos de unidades de produção com elevados índices de automação a partir dos Institutos Senai de Inovação e das organizações de pesquisa e desenvolvimento tecnológico que possuem integração com a indústria; criação de consórcios de médias e pequenas empresas para acelerar a introdução de novos modelos de produção e de soluções digitais; envolvimento das grandes empresas líderes de cadeias produtivas globais no fortalecimento das suas redes de fornecedores e clientes; atração para a indústria de recursos humanos altamente capacitados, incluindo profissionais com experiências internacionais; apoio financeiro à aquisição de ativos tecnológicos no exterior; estímulo à criação de empresas de base tecnológica para a indústria 4.0, entre outras medidas discutidas neste documento.
Em consonância com as experiências internacionais mais recentes e a premente necessidade de acompanhamento da próxima revolução tecnológica da indústria, o IEDI sugere a adoção de uma estratégia industrial organizada em torno de seis temas principais: 
     •  a adoção de uma política para a indústria 4.0, cujos contornos já foram indicados; 
     •  a potencialização da inovação empresarial, com particular atenção às tecnologias 4.0; 
     •  a ampliação e modernização do parque industrial, de modo a alavancar sua produtividade e competitividade; 
     •  a mobilização de competências industriais para enfrentar desafios sociais, agravados pela pandemia (saúde, saneamento, meio ambiente etc.), sem comprometer os objetivos de produtividade e competitividade das empresas;
     •  o aumento da exportação de manufaturados, em especial de produtos mais complexos e intensivos em tecnologia; 
     •  a agregação de valor a atividades primárias em que reconhecidamente o Brasil apresenta forte vantagem comparativa.
Além de um esforço redobrado no sentido de que o setor público interrompa o declínio dos últimos anos nos investimentos e incentivos para P&D e volte a fomentar a inovação, três iniciativas deveriam ser priorizadas: (i) acompanhar sistematicamente as necessidades tecnológicas das empresas e monitorar a difusão de inovações, o que exigirá infraestrutura tecnológica, redes de comunicação, internet das coisas, máquinas e equipamentos especializados, além de softwares e serviços tecnológicos que utilizem inteligência artificial; (ii) apoiar as atividades de P&D das instituições de ciência e tecnologia públicas e do setor privado; (iii) fortalecer e aprimorar a educação básica e tecnológica e promover programas consistentes que articulem universidades, instituições de pesquisa, setor produtivo e governo, por meio da criação de cursos específicos em nível técnico, graduação e pós-graduação, assim como fundos e linhas de financiamento à pesquisa universitária em áreas de interesse social e econômico – neste item, é importante prever a introdução de novas tecnologias na educação e inserção de pesquisadores na indústria, entre outras iniciativas –; (iv) desenhar políticas orientadas a missões, pois estas permitem considerar as interações dinâmicas entre políticas horizontais (por exemplo, educação, capacitação tecnológica, pesquisa e inovação) e verticais (saúde, meio ambiente, energia etc.), além de permitirem uma definição mais clara de metas e a verificação de seus resultados efetivos.
Como já foi indicado acima, é de fundamental importância que o Estado brasileiro, assim como ocorre em outros países, alavanque cada vez mais a inovação. Para tanto, é necessário não apenas elevar o volume de recursos federais destinados à Ciência, Tecnologia e Inovação, mas também modificar o padrão de alocação desses recursos. 
Neste sentido, o IEDI julga oportuno aprimorar a execução dos Fundos Setoriais e do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico; ampliar o uso instrumentos de fomento à inovação nas empresas, em especial a Lei do Bem que deve ser ajustada para que possa ter a sua utilização ampliada; estimular e prover recursos para a expansão do modelo EMBRAPII; dar continuidade ao programa Inova Empresa e fomentar o desenvolvimento do mercado de venture capital, entre outras medidas.
Para que a inovação garanta a competitividade da indústria no longo prazo, é necessária a execução de um programa de modernização de caráter horizontal, já que os desincentivos que a economia brasileira tem conferido ao investimento produtivo elevaram a idade média dos equipamentos industriais nos últimos anos, afastando-se da média internacional. 
Para a renovação e atualização do maquinário da indústria, seriam de grande valia ajustes em programas de financiamento do BNDES com o estabelecimento de parâmetros que reforçassem a adoção de tecnologias modernas e que também melhorassem a performance ambiental de nossas empresas, preparando-as para atender aos compromissos que o Brasil vem assumindo em relevantes acordos internacionais.
Esta iniciativa modernizante teria a capacidade de reerguer a indústria de bens de capital, cuja perda de produção durante a crise de 2014-2016 foi da ordem de 40%, elevar a produtividade industrial e criar condições de integração à indústria 4.0.
Quanto à ampliação da exportação de manufaturados, além da maior inserção competitiva da economia brasileira, será imperativo no plano interno estreitar os laços entre as políticas industriais, de inovação e a de comércio exterior, que no Brasil, continuam sendo muito tênues. Em economias emergentes com trajetórias de sucesso industrial, a articulação entre essas políticas perpetuou nas empresas a capacidade de concorrência construída a partir de vantagens decorrentes da inovação e do aprendizado obtido com suas experiências nos mercados externos. Neste particular, o Brasil tem muito a evoluir.
O contexto atual pode se revelar um momento oportuno para avançarmos nesta direção, favorecendo estratégias mais ostensivas de ganho de participação em mercados externos, mesmo diante de expectativas de declínio do comércio internacional em 2020. A devolução de impostos retidos na cadeia das exportações, poderia ampliar ainda mais a oportunidade que se abre de a indústria melhorar seu desempenho exportador.
Para seguir este caminho, o País precisa rapidamente encontrar soluções para os problemas de toda ordem que retiram competitividade de sua produção, como relatado anteriormente. Precisa ainda adotar uma política de comércio exterior continuada e previsível, garantir a manutenção do atual sistema de defesa comercial brasileiro e investir maciçamente em inovação e tecnologia, se quiser elevar a participação de produtos complexos e de maior intensidade tecnológica em sua pauta de exportações. Uma política moderna e adequada de apoio à inovação é condição crucial para o êxito da política de comércio exterior, sobretudo, em um ambiente de disrupção tecnológica que vem emergindo com a indústria 4.0. 
Outros dois eixos de uma nova estratégia industrial no País ao mesmo tempo que fortalecem a indústria também ajudam a resolver antigos problemas de nossa estrutura econômica e social. 
O primeiro deles diz respeito aos desafios sociais do País, alguns já bem conhecidos, como os casos do déficit habitacional ou da precária cobertura de saneamento básico. Estes, assim como a insuficiente infraestrutura de saúde, tornaram-se evidentes com a pandemia do coronavírus, dificultando as medidas de isolamento social e o atendimento médico-hospitalar, sobretudo das parcelas mais carentes da sociedade. Por esta razão, são temas que o País terá de discutir e continuar encontrando soluções. 
Em outros casos, os desafios são novos, ou ao menos ganharão cada vez mais atenção no futuro, como o envelhecimento populacional, a mobilidade nas cidades e a sustentabilidade ambiental. Neste último tema, os compromissos que o Brasil tem assumido em relevantes acordos internacionais, já demandam das empresas investimentos que melhorem seu desempenho ambiental. 
O enfrentamento destas questões deve ser parte de um permanente esforço de melhorar o desenho de políticas públicas no campo social para que se tornem mais efetivas em mudar a realidade atual do País, onde é enorme o contingente de brasileiros sem as condições mínimas de renda, de acesso à saúde, à moradia, à educação de qualidade, à segurança e ao saneamento. 
Um País com baixa mobilidade social está condenado a ser menos competitivo e pouco inovador. É urgente redefinirmos a alocação de recursos públicos de forma a eliminar estas distorções. 
Em todas estas frentes, a indústria tem contribuições a dar, não apenas assegurando a produção de bens necessários para suprir as necessidades, mas também desenvolvendo respostas inovadoras em parceria com outros agentes de nosso sistema de inovações, por meio das quais as formas de vencer esses desafios sociais podem vir a se tornar menos custosas, mais rápidas e eficazes. Ganha a sociedade e ganham as empresas, que acumulariam novas habilidades e abririam novos mercados.
Outro eixo refere-se à agregação de valor às atividades primárias, em que o Brasil apresenta conhecida competitividade. O dinamismo no campo tem tudo para estimular o avanço industrial, enquanto o progresso da indústria constitui uma via importante para o avanço da agropecuária moderna, notadamente naquilo que diz respeito à incorporação de novas tecnologias em máquinas, equipamentos e insumos para o setor agrícola.
Esta relação de mão dupla deve se intensificar ainda mais no futuro próximo e incluir cada vez mais serviços conexos. Desta forma, será possível desenvolver uma manufatura de sucesso a partir de vantagens comparativas naturais e alavancadas pela tecnologia já disponível ou em fase final de desenvolvimento.