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sábado, 27 de abril de 2013

CNPq adere ao novo Apartheid: tornou-se racista, como boa parte do governo e os militantes da nova causa racialista

O novo RACISMO do CNPq

Incrível: o Brasil caminha de fato para construir um novo Apartheid, oficial, tanto quanto o era o da África do Sul, antes do regime de maioria negra (teoricamente multirracial), quando o Estado promovia ativamente a separação da população em categorias raciais.

Ao acessar nesta data meu Currículo Lattes, para atualizar os dados com as últimas publicações, fui confrontado (este é o termo) com a afirmação de que a escolha de minha classificação racial era OBRIGATÓRIA, como antigamente se fazia no regime do Apartheid da África do Sul, ou na Alemanha nazista, ambos de triste memória.
Não tinha escolha, a não ser indicar a "minha raça", pois o sistema, de tão fascista, me obriga a fazer uma escolha, antes de poder dar prosseguimento ao que vim fazer no site do CNPq.
Gostaria de colocar raça humana, ou nenhuma, mas lá estavam todas das supostas raças que "dividem" a população brasileira.

Infelizmente, como último recurso, escolhi justamente a última opção, que simplesmente se refere a "Não desejo declarar".
PROTESTO: fica parecendo uma negativa de minha parte frente a uma determinação OBRIGATÓRIA de um ESTADO que se tornou RACISTA.

Não é que eu "Não desejo declarar".
Eu quero, sim, declarar que ABOMINO esse tipo de RACISMO numa instituição que se toma por científica.
Esse é mais um avanço fascista da minoria de militantes racialistas, os novos partidários do Apartheid, que pretendem dividir o país em categorias raciais absolutamente esquizofrênicas:

Branca
Parda
Preta 
Indígena
Amarela

Será que é isso que desejamos para o nosso país: o novo Apartheid?

Protesto veementemente contra o racismo dos companheiros, fascistas enrustidos, que pensam que são progressistas, quando são reacionários autoritários, fazendo o Brasil recuar mais de um século na escala civilizatória.
RACISTAS!

Paulo Roberto de Almeida 
Hartford, 27 de Abril de 2013

domingo, 14 de outubro de 2012

Progressos do Apartheid oficial no Brasil: cotas gerais, extensas, permanentes


Folha de S.Paulo, 14/10/2012 - 06h00

Dilma vai criar cota para negro no serviço público

JOÃO CARLOS MAGALHÃES
NATUZA NERY
DE BRASÍLIA

O Palácio do Planalto prepara o anúncio para este ano de um amplo pacote de ações afirmativas que inclui a adoção de cotas para negros no funcionalismo federal.
A medida, defendida pessoalmente pela presidente Dilma Rousseff, atingiria tanto os cargos comissionados quanto os concursados.
O percentual será definido após avaliação das áreas jurídica e econômica da Casa Civil, já em andamento.
O plano deve ser anunciado no final de novembro, quando se comemora o Dia da Consciência Negra (dia 20) e estarão resolvidos dois assuntos que dominam o noticiário: as eleições municipais e o julgamento do mensalão.
O delineamento do plano nacional de ações afirmativas ocorre dois meses depois de o governo ter mobilizado sua base no Congresso para aprovar lei que expandiu as cotas em universidades federais.
Folha teve acesso às propostas. Elas foram compiladas pela Seppir (Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial) e estão distribuídas em três grandes eixos: trabalho, educação e cultura-comunicação.
A cota no funcionalismo público federal está no primeiro capítulo: propõe piso de 30% para negros nas vagas criadas a partir da aprovação da legislação. Hoje, o Executivo tem cerca de 574 mil funcionários civis.
No mesmo eixo está a ideia de criar incentivos fiscais para a iniciativa privada fixar metas de preenchimento de vagas de trabalho por negros.
Ou seja, o empresário não ficaria obrigado a contratar ninguém, mas seria financeiramente recompensado se optasse por seguir a política racial do governo federal.
Outra medida prevê punição para as empresas que comprovadamente discriminem pessoas em razão da sua cor de pele. Essas firmas seriam vetadas em licitações.
EDUCAÇÃO E CULTURA
No campo da cultura, há uma decisão de criar incentivos para produtores culturais negros. Na semana passada, a ministra Marta Suplicy (Cultura) já anunciou que serão lançados editais exclusivos para essa parte da população.
No eixo educação, há ao menos três propostas principais: 1) monitorar a situação de negros cotistas depois de formados; 2) oferecer aos cotistas, durante a graduação, auxílio financeiro; 3) reservar a negros parte das bolsas do Ciências sem Fronteira, programa do governo federal que financia estudos no exterior.
A implantação de ações afirmativas é uma exigência do Estatuto da Igualdade Racial, aprovado pelo Congresso em 2010, o último ano do segundo mandato de Lula.
Segundo o estatuto, é negro aquele que se diz preto ou pardo --juntas, essas duas autodefinições compõem mais da metade dos 191 milhões de brasileiros, de acordo com o Censo de 2010.
ESSENCIAL
O plano é tido no governo como essencial para diminuir a desigualdade gerada por diferenças de cor e ampliar a queda na concentração de renda na última década.
Nesse sentido, o plano, ao usar unicamente critérios raciais, seria mais cirúrgico do que o sistema de cotas aprovado pelos congressistas em agosto, que reserva metade das vagas nas federais para alunos egressos de escolas públicas e, apenas nessa fatia, institui a ocupação prioritária por negros e índios.
Politicamente, será um forte aceno da gestão Dilma aos movimentos sociais, com os quais mantém uma relação distante e, em alguns momentos, conflituosa --como durante a onda de greves de servidores neste semestre.
Editoria de Arte/Folhapress

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

A ideologia do afrobrasileirismo - um artigo PRA de 2004

Para complementar a informação iniciada em dois posts abaixo, em que registro a reação irada de um militante da causa negra no Brasil -- não exatamente um afrobrasileiro, no máximo um afrodescendente -- a meu artigo sobre essa ideologia nefasta, importada, racista e divisiva, transcrevo abaixo o artigo em questão, não sem antes lançar um desafio a meu irado leitor:

Desafio esse militante a provar, de fato (ou seja, com base em evidências explícitas e não apenas baseadas em autodeclaração), que ele é um afro-brasileiro, ou seja, um brasileiro que conserva traços culturais, linguísticos, gastronômicos, ideológicos, ou quaisquer outros que sejam especificamente africanos e exclusivamente africanos, e não apenas brasileiros, ou seja, integrando elementos culturais de diversas culturas que foram incorporadas ao mainstream do Brasil, nesse imenso cadinho que constitui a sociedade nacional.
Provando, merece ganhar um ou dois livros, a sua escolha.
Paulo Roberto de Almeida

Rumo a um novo apartheid?: Sobre a ideologia afro-brasileira
Paulo Roberto de Almeida, Sociólogo (ítalo e luso-descendente).
revista Espaço Acadêmico (Ano IV, nº 40, setembro 2004)
link: http://www.espacoacademico.com.br/040/40pra.htm

Faço questão de me comprometer, igualmente, com o combate às discriminações. Adotaremos políticas afirmativas para garantir direitos iguais a todos, sem distinção de gênero, etnia, raça, condição física, crença religiosa ou opção sexual. Queremos eliminar as desigualdades, valorizando as diferenças.
Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003)

1. Colocando a questão
Um espectro parece rondar, atualmente, a sociedade brasileira: o do apartheid. Refiro-me à possibilidade de surgimento, disseminação e consolidação de uma nova forma, não menos insidiosa do que a tradicional (já suficientemente conhecida e combatida), de apartheid. Trata-se de um apartheid social – não necessariamente racial –, baseado numa nova separação cultural e ideológica, e portanto mental, dos brasileiros. Eles passariam a ser divididos em duas categorias fundamentais: a dos afrodescendentes, de um lado, a de todos os demais brasileiros, de outro.

Antes que alguém me acuse de “inimigo dos afrodescendentes” quero deixar bem claro que reconheço, sim, a existência de uma enorme defasagem social, educacional, cultural e profissional atuando em desfavor dos chamados “afro-brasileiros”, que é o resultado histórico das condições sociais de pobreza e desigualdade que sempre atingiram com maior acuidade a população de origem negra. Também sou, sim, explicitamente, a favor de políticas de ação afirmativa e de favorecimento educacional para os brasileiros pobres em geral e, em especial, no que for possível, com ênfase acrescida na situação da população negra. Mas quero deixar manifesto, desde já, que não acredito que qualquer tipo de “reserva de mercado” nos exames vestibulares de ingresso no terceiro ciclo represente uma mudança dramática da situação dos mais desfavorecidos, brasileiros pobres em geral e populações negras em particular.

A questão das cotas no vestibular é um aspecto menor, não o mais importante, de um problema maior, que é a desigualdade de chances que vitima os negros e mulatos brasileiros nas várias vertentes de uma inserção social que teima em ser persistentemente lenta, na educação, no emprego, nas possibilidades de ascensão social, enfim. Tenho dúvidas, porém, de que políticas de promoção desse tipo devam ser conduzidas como resultado de algum tipo de consciência (ou “remorso”) quanto à necessidade de reparação histórica à comunidade negra pelos males sofridos desde o tráfico e a escravidão (e nas fases seguintes de discriminação de fato ou de indiferença “ativa”). Também rejeito as alegações dos que são contrários às cotas universitárias pela suposta necessidade de preservar ensino de qualidade e sistema de mérito nas universidades públicas (elas já estão, de fato, trabalhando em uma situação “sub-ótima” no que respeita seus presumidos “padrões de qualidade” ou de “excelência”, em razão das muitas disfunções acumuladas ao longo de anos e anos de democratismo populista, de irresponsabilidade no controle do desempenho de seus professores, de corporativismo exacerbado e outros males).

O que pretendo tratar neste ensaio é uma outra questão: a da emergência e atual afirmação, ainda que incipiente, de uma ideologia do “afrobrasileirismo” (à falta de uma melhor definição).

2. Um problema não apenas conceitual
Em primeiro lugar, recuso a qualificação de “afro-brasileiros”, ainda que aceite a realidade de que temos, obviamente, “afrodescendentes”. Mas os nossos brasileiros “afrodescendentes” são tão africanos, hoje, quanto eu sou português ou italiano pela minha ascendência, ou seja, hoje em dia quase nada, ou de fato absolutamente nada. Somos todos brasileiros, e apenas brasileiros, ponto.

Isso se deu ao cabo de um imenso e bem sucedido experimento de miscigenação étnica e cultural, um processo único no mundo, já suficientemente explorado por autores vários – entre eles Gilberto Freyre – para ser novamente explorado aqui. Somos o verdadeiro melting-pot do mundo, muito mais do nos Estados Unidos, que conservaram vários traços de apartheid racial ou étnico. Não existem afro-brasileiros no Brasil, assim como não existem AfroAmericans nos EUA: existem negros americanos ou brasileiros negros, mulatos e das mais variadas colorações, que foram trazidos ao Brasil – ou aos EUA – como escravos e que se converteram em brasileiros – ou americanos – como quaisquer outros, independentemente de serem, e permanecerem, desfavorecidos nos planos social, profissional e até do reconhecimento cultural. Nos EUA, a condição estritamente material é até mais favorável aos negros, bem mais do que no Brasil, diga-se de passagem, mas o isolamento cultural – e racial – é bem maior, em virtude da segregação legal que acabou criando duas culturas e até mesmo dois “universos mentais”, totalmente distintos e em grande medida opostos. Todo e qualquer processo de miscigenação racial – ou étnica, para evitar uma terminologia indevida – é único e original, e o nosso foi verdadeiramente de miscigenação, à diferença dos EUA, onde jamais ocorreu (salvo de maneira extremamente marginal) qualquer “osmose” racial entre negros e as demais comunidades formadoras da população americana.

Quando digo que recuso o “afrobrasileirismo” é porque acredito que esse conceito não é o resultado de uma condição étnica, cultural ou mesmo histórica, mas sim uma ideologia, politicamente importada e artificialmente explorada, que pode contribuir, também no Brasil, para a criação do mesmo sistema de aparteísmo racial ou cultural que se constata existir nos Estados Unidos. Não creio que seja bom para o Brasil, aliás para os próprios “afrodescendentes” – quer reconheço existir, como disse –, aderirmos a uma ideologia que vai contra todos os princípios do nosso bem sucedido melting-pot, introduzindo em seu lugar a divisão, a diferenciação e o apartheid. A promoção dos valores “negros” não deveria em princípio ser feita em detrimento de valores universais e igualitários que estão na base de nosso sistema constitucional e cultural.

Muito bem, diriam os “afrodescendentes”, como resolver o problema da desigualdade de fato que impede, basicamente, a maior parte dos “negros” e assemelhados de entrarem na universidade e de galgarem postos profissionais mais condizentes com o perfil de ascensão social que se deseja para todos, inclusive os milhões de brasileiros pobres, brancos ou mestiços de outras etnias, que também sofrem os mesmos problemas? Como reconheço que a “solução universal” da melhoria da qualidade das escolas públicas pode ser uma quimera irrealizável no curto prazo, sou absolutamente a favor de bolsas de estudo (e outras formas de ajuda) generosamente distribuídas a “afrodescendentes” candidatos a ingressar em nossas escolas, de maneira a habilitá-los a prestar um vestibular nas mesmas condições (ou quase) que os demais.

Ainda que esta medida possa ser injusta do ponto de vista do branco pobre, igualmente morador de favelas ou zonas rurais periféricas, creio que ela pode e deve representar um começo de ação afirmativa no sentido de resgatar todo o sofrimento imposto pela sociedade nacional – majoritariamente branca, pelos seus estratos dirigentes e pelas suas decisões políticas, reconheça-se – à sua comunidade negra brasileira e outros estratos desfavorecidos. Aliás, acho que as universidades públicas poderiam e deveriam começar a oferecer cursinhos pré-vestibulares nos quais elas passariam a admitir, de modo maciço, todos os brasileiros pobres, em especial os negros e mulatos. Os estados deveriam desenvolver programas extensivos de bolsas de estudos (gratuitas, isto é, sem reembolso) dirigidas prioritariamente aos estratos de baixa renda, em especial os negros.

Trata-se de um sistema de “cotas”, sem qualquer “reserva de mercado” e baseado inteiramente no princípio da meritocracia, que permanece um sistema válido de seleção de candidatos a quaisquer cargos ou escolas públicas. Os negros – e outros pobres – do Brasil precisam de programas intensos de formação educacional e de preparação profissional: bolsas e cursos de preparação podem fazer a diferença positiva, sem introduzir a “diferença negativa” do regime de cotas baseadas em critérios raciais ou demográficos de escassa legitimidade democrática.

3. Agora ao coração do problema: a ideologia do “afrobrasileirismo”
Acredito que o “afro-brasileirismo” é um conceito em busca de definição, até mesmo entre seus promotores mais ativos. Não sou um conhecedor extenso da literatura a esse respeito, mas não me lembro de ter lido uma definição que fosse sociologicamente sustentável sobre essa “condição”. Por isso pretendo abordar o problema de um ponto de vista histórico, antropológico e, em seguida, político-ideológico.

As definições raciais brasileiras são tão diversificadas quanto a plasticidade da língua nacional, ou como a própria realidade étnica subjacente às populações que aqui se misturaram ao longo dos séculos. Sobretudo a partir da “importação” de negros africanos, entre os séculos 16 e 19, mas também com base nos elementos autóctones e nas muitas etnias imigradas desde a independência, constituiu-se um povo legitimamente brasileiro, dotado de características singulares no conjunto dos “povos novos” — a definição é devida ao antropólogo Darcy Ribeiro — e que é certamente original do ponto de vista das relações interétnicas e culturais que essas comunidades mantêm entre si. Pode-se indicar a preservação de certos traços “culturais”, gastronômicos ou religiosos no interior desses diversos elementos constitutivos do povo brasileiro, mas dificilmente se poderá apontar, entre eles, diferenças significativas ou considerar que seus modernos representantes possam reivindicar um “pertencimento” geográfico outro que não ao próprio Brasil.

Entretanto, a partir da importação acrítica de um conceito estranho à cultura e às tradições sociais brasileiras, a questão da “alteridade” étnico-geográfica começa agora a ser colocada em questão no caso dos negros e mulatos brasileiros. Com efeito, a partir de uma matriz importada dos Estados Unidos está sendo introduzida no Brasil a concepção segundo a qual, dentre os diversos segmentos da população brasileira, se encontrariam, não mais negros, pardos e mulatos (e suas infinitas variações subjetivas), mas um grupo novo na paisagem social do país: os afro-brasileiros. Tal como apresentada por seus proponentes, tratar-se-ia não apenas de uma nova categoria (ou classificação) étnico-cultural, mas de todo um programa político de promoção social e da identidade cultural desse segmento talvez majoritário no País.

Em que medida essa proposta é demograficamente pertinente, sociologicamente consistente, historicamente sustentável, etnicamente adequada e “politicamente correta”? Desde já esclareço minha posição por um ceticismo de princípio em relação a esse tipo de conceito e à “realidade” que o sustenta. Não creio que a noção de “afro-brasileiro” seja positiva do ponto de vista da integração social das diversas vertentes do povo brasileiro, podendo mesmo ser negativo para o programa que supostamente deveria ser o de todos os cidadãos nacionais: superar a velha segregação racial que ainda persiste apesar dos avanços logrados, em lugar de construir um novo apartheid racial.

Este é exatamente o ponto que constitui o objeto destas minhas reflexões pouco sistemáticas: em última instância, a proposta dos afro-brasileiros, se implementada como programa político, redundaria na substituição da velha discriminação racial contra negros e mulatos, combatida por gerações inteiras da causa negra brasileira, por um novo tipo de apartheid, a exemplo daquele que se constituiu nos Estados Unidos depois da abolição da escravidão. Ele significa, sinteticamente falando, a separação e a promoção de atitudes, comportamentos e práticas sociais exclusivamente reservados às populações de origem negra, com todas as suas implicações negativas para a integração ampliada das diversas componentes do povo brasileiro.

Antes, contudo, que se queira ver nos propósitos do autor algum elemento de racismo antinegro ou de descaracterização da luta antidiscriminação conduzida por muitos movimentos militantes da causa negra, gostaria de deixar bem claro minha posição de partida. Creio, como muitos outros sociólogos ou simples cidadãos, que o mito da “democracia racial” brasileira é exatamente isso, um mito, mascarando as muitas práticas não institucionais de discriminação de fato que, ainda hoje, dificultam a afirmação econômica, a ascensão social e a auto-estima psicológica dos negros e mestiços do Brasil. São bastante conhecidos os problemas que afetam negros e mulatos no Brasil: menor escolarização, renda inferior e chances reduzidas de mobilidade ascensional, seja no emprego, seja em outros canais de inclusividade social. A pobreza que atinge os negros e outras camadas mestiças não é simplesmente pobreza, mas vem acoplada a outros problemas que alguns sociólogos chamam de “ciclo cumulativo de desvantagens”.

Feito o diagnóstico sumário e bem estabelecida a justificativa para uma política (ou políticas setoriais) de promoção ativa desses segmentos — às quais sou amplamente favorável, geralmente num sentido não diretamente discriminatório, mas incidindo de forma preferencial, e concentrada, nas populações pobres — a questão que pretendo colocar neste pequeno ensaio é esta aqui: em que a ideologia afro-brasileira pode contribuir para a superação dessas desvantagens cumulativas que penalizam obviamente com maior acuidade aqueles que são objeto de sua atenção?

4. As conseqüências ideológicas do “afro-brasileirismo”: o novo apartheid
Quando utilizo o conceito de ideologia para referir-me ao programa político “afro-brasileiro” pretendo denotar exatamente essa característica básica do termo: trata-se de uma importação acrítica, mais ou menos clandestina — pois que não reconhecida de forma cabal, e sem o pagamento do devido copyright —, de um conceito racial-geográfico pronto e acabado e que se refere a uma experiência histórica e social alheia às realidades brasileiras, qual seja a dos Estados Unidos. Como pretendo discutir, subsistem problemas enormes, e não apenas de ordem epistemológica, à incorporação ingênua desse conceito ao universo racial, social e político brasileiro.

O que seria um afro-brasileiro? Trata-se tão simplesmente de um brasileiro dotado de ascendência africana? Certamente, mas em que sentido esse brasileiro negro, da era contemporânea, continua sendo africano? Provavelmente tanto quanto eu, neto de imigrantes portugueses e italianos, continuo sendo europeu, ou seja: nada, ou quase nada. Sou tão “europeu” quanto meu concidadão negro é “africano”, ou seja muito pouco, apenas por vagas identidades ancestrais que nos definem muito pouco em nossa atual identidade. Quero crer que somos ambos apenas e tão somente brasileiros.

Em outros termos, não apenas é difícil, mas afigura-se impossível definir grupos humanos mediante uma origem indistintamente “continental”, uma vez que pessoas e núcleos familiares se afiliam a determinados grupos humanos com identidades mais restritas do que o âmbito geográfico continental. Mormente no caso dos atuais brasileiros negros, trazidos ao Brasil como escravos em lotes individuais (em alguns casos do mesmo grupo de origem), suas tribos e etnias de origem perderam-se irremediavelmente, logo em seguida, na terrível mistura humana realizada pelos escravagistas e depois pela sociedade de “acolhimento”. Assim como parece difícil, no Brasil contemporâneo, falar de “eurobrasileiros” ou “ásiobrasileiros”, seria virtualmente impossível, nas condições ainda mais desestruturadoras da “imigração” africana, justificar a existência dessa categoria recriada de “afro-brasileiros”.

A rigor, pretendendo atribuir uma origem geográfica a todos os outros imigrantes voluntários, poderíamos falar de “ítalo-brasileiros”, ou “nipo-brasileiros”, por exemplo, pois eles possuem características sociais e culturais similares, identificando-se pela língua ou pelos costumes comuns, inclusive religiosos e alimentares. Ora, tal não ocorre com os supostos “afro-brasileiros” — ou ocorreria em escala muito menor, apenas no caso de certos grupos lingüísticos e religiosos concentrados na Bahia, identificados com a religião islâmica —, uma vez que eles são o resultado da mais trágica e desumana “emigração” conhecida em toda a história da humanidade, processo ocorrido ao longo de séculos e séculos de transferência forçada de lotes inteiros de indivíduos, arrancados de grupos de origem que poderiam ser bantos, ovambos, ibos, haussas ou quaisquer outros capturados pelos mercadores. Contrariamente aos imigrantes voluntários, eles não tiveram condições de preservar — salvo casos extremamente restritos — línguas ou costumes de origem, que de resto se espalhavam por várias regiões africanas. Um história sem dúvida alguma trágica, mas esta é a herança de vários séculos de escravismo e de colonização do Novo Mundo.

Não se trata, assim, de uma realidade brasileira, pois esta é uma história universal. Ou seja, não existem afro-brasileiros, assim como não existem afroamericanos ou afroqualquer outra nacionalidade que se queira. Existem negros, ou mestiços, americanos, brasileiros, colombianos, venezuelanos, cubanos, e vários outros mais, em resumo, cidadãos negros ou mulatos que se tornaram cidadãos de seus atuais estados nacionais. Se isto é um fato, como se justifica o aparecimento e consolidação dessa ideologia racialista?

Segundo minha interpretação, essa construção ideológica apenas surge como resultado da situação peculiar dos negros americanos, submetidos durante décadas e décadas a uma situação de apartheid de fato e de direito que os converteu em cidadãos de uma categoria à parte nos Estados Unidos. Eles já não eram africanos, a qualquer título — tanto porque o tráfico foi precocemente substituído pela “criação” de escravos —, mas não possuíam os direitos e franquias dos demais americanos, de origem branca e européia. A situação se agravou, paradoxalmente, depois da guerra civil, uma vez que a segregação foi sendo lentamente construída ao longo do último terço do século 19 e início do século 20 (aqui com o consentimento e o estímulo do governo federal e da Suprema Corte). A evolução terminológica acompanhou a tomada de consciência do problema negro nos Estados Unidos: eles primeiro foram “negros”, no sentido mais pejorativo do termo, isto é niggers, depois se converteram, numa conotação menos agressiva, em colored ou black people, para serem finalmente enquadrados, até com o seu consentimento, nessa categoria aparentemente inocente de African Americans.

Este o termo oficial — falso, hipócrita, de fato irreal e historicamente não fundamentado — sob o qual são atualmente identificados os negros americanos, aliás bem mais negros do que no Brasil, pois que não dispondo do mesmo “estoque” (inicial ou produzido) de mestiços e mulatos e dos “fluxos e refluxos” de outras categorias intermediárias. Compreende-se sua utilização, nos Estados Unidos, num sentido parcialmente ideológico, pois que servindo para fundamentar uma luta pela afirmação de direitos civis e, concomitantemente, pela promoção da igualdade de chances nos mercados laboral e educacional, luta sustentada tradicionalmente pela Associação Nacional para o Avanço do Povo de Cor (NAACP). Menos compreensível parece ser a introdução no Brasil, de forma consciente, de um conceito de separação, não de inclusão, que seria supostamente o objetivo maior de todos as categorias de brasileiros.

Aparentemente, porém, os negros brasileiros não desejam ser simplesmente brasileiros, mas sim esta outra condição, irreal e construída, de “afro-brasileiros”. Que tipo de conseqüência poderia ter esta atitude para a (des)construção da nação brasileira?

5. A revolução cultural em marcha: a valorização das diferenças
Transcrevo novamente, para comentar, a frase destacada em epígrafe, retirada de um dos discursos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, certamente preparada por um militante da chamada “causa negra” para apoiar as políticas de promoção de direitos das minorias e de grupos sociais desfavorecidos, adotadas conscientemente pelo governo: “Faço questão de me comprometer, igualmente, com o combate às discriminações. Adotaremos políticas afirmativas para garantir direitos iguais a todos, sem distinção de gênero, etnia, raça, condição física, crença religiosa ou opção sexual. Queremos eliminar as desigualdades, valorizando as diferenças.”

Minha opinião é a de que “garantia de direitos iguais” deve existir, em princípio, via criação de condições ou oportunidades iguais para todos, o que se dá geralmente por meio da educação (essencialmente nos dois primeiros ciclos de ensino e na vertente técnico-profissional). Políticas afirmativas são, por definição, discriminatórias em sua essência e intenção, o que acarreta o risco de criar novas formas de apartheid social ou racial, num país que deveria eliminar as desigualdades eliminando também as diferenças, por meio da miscigenação ativa, não via exaltação de valores étnicos ou raciais exclusivos (e portanto excludentes).

Antevejo um sério problema “político” em relação ao que acabo de expor, isto é, a promoção de uma política de “miscigenação ativa”, que entendo ser a única solução efetiva para os males – não só no Brasil, mas em todo mundo – da discriminação e do racismo: os militantes da “causa negra” me acusarão de tentativa de “branqueamento”, quando não do “crime de etnocídio”, ao pretender eliminar o problema via mistura racial. Eu responderia de imediato que é isso mesmo, pretendo não apenas “acabar” com a “raça negra” – mesmo não concordando com tal caracterização – mas também com a “raça branca” (e a “asiática”, e a “médio-oriental”) e outras tantas mais que podem existir neste país tão variado, e instintivamente tão integrado, como é o Brasil. A eliminação das diferenças de “raça” – essa palavra tão enganosa e deformadora, mas ainda assim tão útil do ponto de vista daqueles que se colocam do ponto de vista das diferenças, que não é o meu – é a única forma efetiva de se cortar pela raiz qualquer sentimento de rejeição em face da “alteridade”, pelo simples motivo de que não haveria mais, pelo menos idealmente, nenhum tipo de “alteridade” estritamente definida.

Creio mesmo que o Brasil encontra-se muito mais perto de realizar esse ideal da miscigenação “hegemônica” antes que qualquer outro povo do mundo. Os EUA poderão ser, talvez, e de certa forma já são, o primeiro país “multinacional” do planeta, haja vista a constante imigração e o afluxo ininterrupto dos mais diversos povos naquele país continente. Mas eles demorarão um certo tempo, se é que conseguirão de verdade chegar à condição desejável, para atingir a etapa que reputo indispensável e necessária de ser ou constituir progressivamente uma sociedade verdadeiramente “multirracial”. Acho que o Brasil encontra-se mais perto desse ideal, ainda que sua “inclusividade nacional” seja bem inferior à dos EUA. Não importa: o relevante é a atitude mental e o comportamento social subjacentes à esse ideal de miscigenação, e nisso o Brasil parece imbatível.

O único obstáculo a esse estado de “abolição de fronteiras étnicas” – uma imensa revolução no caminho de um gênero humano potencialmente “globalizado” – é representado, precisamente, pela ideologia das “diferenças”. Por que a “diferença” teria de ser um valor em si, independentemente e à parte da diversidade cultural entre povos distintos, o que é um fato da história? O perigo que vejo nesse “culto das diferenças”, em especial em se tratando de grupos étnicos, é justamente o da separação, o do apartheid.

Registre-se, aliás, que não vejo a promoção das “diferenças” como iniciativa política de qualquer outro grupo racial ou étnico no Brasil, à exceção dos próprios negros ou “afrodescendentes”. Atribuo essa especificidade “política” à história de discriminação social e mesmo de racismo aberto ou velado que reconheço ter existido e que ainda existe no Brasil. Compreendo sua existência, mas não creio, sinceramente, que ela seja boa, desejável ou até mesmo funcional do ponto de vista das políticas de promoção ativa de inclusão social, de igualdade de fato, racial e cultural, e do ponto de vista da construção de uma “nacionalidade brasileira” inclusiva e abrangente.

A ideologia afro-brasileira representa a negação de tudo o que representamos como nação e como povo. Não creio que os afrodescendentes brasileiros estarão mais bem servidos, do ponto de vista cultural, material ou mesmo espiritual, com uma ideologia grupal que exalta a diferença e promove a separação. Acredito mesmo que os militantes da causa negra não deveriam jactar-se de defender a causa de uma ideologia importada, que não tem nada a ver com a realidade brasileira e que resultaria, afinal de contas, numa construção artificial do ponto de vista da história e da psicologia social dos negros.

As discriminações devem ser efetivamente combatidas, não pela criação de novas formas de discriminação, tanto mais patéticas quanto voluntariamente adotadas, em nome de uma ideologia importada que não visa, de fato, promover a inclusão social, mas o desenvolvimento separado e combinado dos vários grupos étnicos em que se divide, até aqui, a população nacional de grandes países multi-étnicos como o Brasil e os EUA. Uma sociedade verdadeiramente integrada, como pode chegar a ser a sociedade brasileira em futuro não muito distante – se não socialmente, mas pelo menos do ponto de vista “racial” –, representa uma sociedade na qual não apenas as discriminações de fato sejam uma relíquia do passado mas também uma formação social na qual o racismo se torne uma hipótese inexistente até do ponto de vista teórico, pela impossibilidade prática de qualquer tipo de “separação racial”.

Isto é o que eu penso, de verdade. Se ouso parodiar o líder negro Martin Luther King, incansável batalhador das causas cívicas (e não da causa racial) nos EUA, eu diria, simplesmente: “eu tive um sonho…”

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A ideologia do afrobrasileirismo: uma reacao tardia...

Recebi, em minha caixa da UnB (sim, ainda tenho uma, mesmo depois de anos sem dar aulas naquela universidade bizarra), a mensagem abaixo, que reproduzo tal qual, sem o e-mail de origem (por razões óbvias), que protesta contra um artigo meu de 2004.
Demorou seis anos, portanto, para que alguém resolvesse protestar, defendendo as cores (se ouso dizer) do afrobrasileirismo, essa ideologia que pretende que o Brasil se divide em pretos, de um lado, e todo o resto, do outro, sendo que os pretos (ou negros, ou afrobrasileiros, como voces quiserem), seriam uma "minoria" discriminada.
"Minoria" apenas para os militantes racistas da raça negra -- sorry, mas eles adoram se identificar com a "raça negra", seja lá o que isso queira dizer --, pois, segundo a última PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio, 2009-2010) a população autodeclarada como sendo afrodescendente é de 53% por cento do total, ou mais (sempre aumentando, claro, pois muitos estão de olho em políticas discriminatórias a favor deles, com base em cotas raciais e similares).
Bem, não pretendo responder agora ao Marcus, mas vou remeter a meu artigo, e depois retomar o assunto, em algum novo trabalho sobre a ideologia afrobrasileira.
Vale a pena este debate, pois ele é um dos mais importantes da sociedade brasileira contemporânea. Dele depende saber se vamos criar uma sociedade inclusive, verdadeiramente multirracial, misturada, miscigenada -- como aliás já acontece na prática -- ou se vamos caminhar para uma sociedade segmentada em "raças", ou, sendo mais preciso, uma sociedade dividida em pretos, de um lado (e segundo os ideólogos do afrobrasileirismo todo e qualquer mulato é negro por definição), e, do outro, todo o resto da sociedade, amarelos, brancos, levemente avermelhados, acobreados (como os índios, por exemplo), enfim, todo esse povo que não merece receber o rótulo de "afrobrasileiro" e que, portanto, não deve fazer juz a nenhuma política dita de ação afirmativa, na verdade de cunho racista, mesmo tendo de pagar a conta dos anos de escravidão e injustiça que todos nós, não-negros, devemos como reparação aos ditos afrodescendentes.
Disso depende, como eu disse, se vamos viver numa sociedade de Apartheid, ou numa sociedade "normal", o que eles dizem que a sociedade brasileira nunca foi, por ser racista e discriminatória contra os negros mesmo sem reconhecer. Enfim, vocês conhecem toda a argumentação e não preciso me estender agora. Mas prometo voltar...
Paulo Roberto de Almeida

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Eis a mensagem recebida: (tal qual)

From: ||||||| ||||||| ||||||| ||||||| ||||||| ||||||| ||||||| ||||||| ||||||| ||||||| ||||||| ||||||| ||||||| |||||||
Subject: Rumo a um novo Apartheid - Sobre a ideologia Afro-brasileira
Date: 21 de janeiro de 2011 18:49:15 BRST
To: Paulo Roberto de Almeida - UnB

Em primeiro lugar... Não está sendo implantado um apartheid no Brasil. Sempre existiu um Apartheid aqui. No entanto, diferentemente de outros países que são abertamente racistas, o Brasil é um país de falsidades e dissimulações... Tudo aqui é por debaixo dos panos.

Nós afro-brasileiros, temos sido SISTEMATICAMENTE prejudicados ao longo da história desse país. E não adianta nem falar que a exclusão é social e não racial porque, no caso dos afro-brasileiros, é tanto social quanto racial.

As cotas não acirraram o racismo, como muitos afirmaram e desejaram.

Outra coisa:
Você escreveu: ...recuso a qualificação de “afro-brasileiros”...

Quem é você pra recusar ou aceitar alguma coisa... Nós negros é que devemos nos definir da forma que acharmos mais adequada... Você não tem nada com isso!

Como se já não bastasse todos os anos de escravidão, e uma abolição feita de forma a empurrar os negros para as margens da sociedade, mantendo-nos em condições de extrema pobreza, que nos expôs à mortalidade infantil, desnutrição, doenças e mazelas sociais... Ainda temos que esperar que os branquinhos nos digam como devemos nos definir?

Eu sou afro-brasileiro, e ponto final.

Duvido que algum negro já tenha lhe dito que você está errado ao definir-se como “ítalo e luso-brasileiro”... Então, vê se cuida da tua vida!!!

Marcus.


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O Marcus protesta contra este meu artigo:

472. “Rumo a um novo apartheid?: sobre a ideologia afrobrasileira
revista Espaço Acadêmico (Ano IV, nº 40, setembro 2004)
link: http://www.espacoacademico.com.br/040/40pra.htm
Relação de Trabalhos nº 1322.

Suponho que ele ainda esteja disponível no mesmo URL, do contrário podem me pedir.

O Marcus está manifestamente com raiva desse meu artigo. Então, em lugar de argumentar contra minhas posições, ele simplesmente me "convida", ou ordena, a ficar fora da discussão:

"Quem é você pra recusar ou aceitar alguma coisa... Nós negros é que devemos nos definir da forma que acharmos mais adequada... Você não tem nada com isso!"

ou no final:

"Então, vê se cuida da tua vida!!!"

Bem, isso pode ser típico da UnB, ou de certos alunos da UnB: em lugar de argumentar com base em regras simples do diálogo socrático, eles colocam logo um monte de !!!s, como se isso fosse um substituto para um debate racional.

Vou responder ao Marcus, e a todos os que pensam como ele, mas não agora.
Por enquanto eu apenas gostaria de dizer o seguinte:

Não vou ficar fora disso, e tenho muito a fazer, além de cuidar da minha vida. Sou um simples brasileiro, como o Marcus, cidadão consciente, como ele parece ser -- embora um tantinho exaltado e dado a repentes de agressividade -- pagador de impostos, como ele certamente é -- pelo menos indiretamente -- e pretendo exercer em toda a plenitude meus direitos de cidadão.
Entre esses direitos se inclui o de contribuir para a construção de uma sociedade inclusiva -- como ele parece também pretender -- sem os laivos do racismo e do Apartheid, uma sociedade que não precise catalogar e carimbar os seus filhos com qualquer rótulo racial ou geográfico, que os una como brasileiros, de preferência miscigenados, misturados, sem uma cor precisa, a não ser aquela cor morena que parece predominar no Brasil (mas isso pode despertar acusações de "etnocídio" em certas áreas, que pretendem a preservação da "raça negra").
Por isso mesmo, vou continuar exercendo meu direito de expressar minha opinião, em toda liberdade, sem constrangimentos de qualquer espécie, e sem ceder a ameaças de quem quer que seja.

Voltarei ao debate Marcus. Aguarde...

Paulo Roberto de Almeida

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Cotas e acoes afirmativas: o depoimento de um "embaixador negro"

A Folha de S.Paulo publicou, nesta quinta-feira, 6 de janeiro de 2011, matéria sobre o que a FSP acredita ser o "primeiro embaixador negro" da história do Itamaraty. Pode ser, embora não está dito que ele é embaixador por ser negro, ou por ser um diplomata tão competente como tantos outros para merecer a promoção ao último posto da carreira, algo esperado por todos os que se dedicam, de verdade, à carreira.
O diplomata em questão se manifesta em favor de ações afirmativas, mas não foi tão afirmativo a respeito de cotas, sobretudo as de natureza racial. Essa questão ficou não explícita em sua entrevista, e ele talvez não queira, ou não tenha querido, para o jornal, se manifestar a respeito. Em todo caso, a questão permanece aberta: devem existir cotas raciais no serviço público brasileiro? Ou ainda: as pessoas precisam ser classificadas racialmente para beneficiar-se de alguma vantagem implícita ou explícita, que exclui os não pertencentes àquela "raça"?
Paulo Roberto de Almeida

MINHA HISTÓRIA BENEDICTO FONSECA FILHO, 47
Folha de S.Paulo, 6 de janeiro de 2011

Meu pai foi agente de portaria, um contínuo (...) O preconceito nunca se apresenta claramente. No campo das relações humanas, você nota reação positiva ou negativa (...) É preciso que haja ações afirmativas (...) Eu não me beneficiei de nenhuma política. Na minha época, isso não havia.

Filho de um contínuo, Benedicto Fonseca Filho, 47, foi promovido em dezembro a embaixador, o primeiro negro de carreira. E o mais jovem. Passou por Buenos Aires, Tel Aviv e Nova York. Vai chefiar o departamento de Ciência e Tecnologia. Ele declara orgulho de ser negro e filho de pais humildes que o educaram para chegar ao topo na casa mais aristocrática do país.

(...) Depoimento a JULIANA ROCHA, DE BRASÍLIA

Nasci no Rio, em 1963. Mudei para Brasília em 1970 porque meu pai veio ser funcionário do Itamaraty. Ele foi agente de portaria, que é um contínuo.
Quando eu tinha nove anos, toda a família foi para a [antiga] Tchecoslováquia [no leste europeu], quando meu pai foi removido para Praga por três anos.
Naquele tempo, todos os funcionários das embaixadas eram de carreira. Hoje, esses são terceirizados.
Foi essa experiência internacional que me despertou o interesse pelo Itamaraty. Talvez por ter estudado em escolas internacionais, na escola francesa e na americana.
Meu pai e minha mãe, na sua humildade, nunca pouparam esforços para nos proporcionar as melhores condições de estudo.
Hoje, meu pai tem 84 anos, já é aposentado há 14. Minha maior satisfação foi eu ser promovido com ele ainda vivo. Ele ficou tão ou mais contente do que eu.
Fiz o concurso [do Itamaraty] em 1985 e entrei de primeira, aos 22 anos. Quando saiu a lista dos aprovados, um jornal de Brasília fez uma matéria que dizia: "Mulher e negro passam em primeiro lugar no Rio Branco". A mulher foi o primeiro lugar e eu, o segundo.
Vinte e cinco anos depois, uma mulher passar em primeiro lugar já não causa tanto espanto. Naquela época, tinha só uma mulher embaixadora.
Hoje, são várias mulheres embaixadoras, acho que 20, ocupando postos importantes. Talvez chame muito mais atenção quando um negro ascende na carreira do que uma mulher.
Em relação à diversidade racial já avançamos muito, mas ainda temos muito que avançar. Houve um olhar para essa questão na gestão do ministro Celso Amorim.

PRECONCEITO
O preconceito nunca se apresenta claramente. No campo das relações humanas, você nota reação positiva ou negativa das pessoas.
Mas seria leviano dizer que eu experimentei uma situação que pudesse identificar como preconceito [no Itamaraty]. Nunca houve.
Me lembro de um caso [de reação positiva]. A primeira vez que fui à ONU em 2004, um colega do Caribe me chamou no canto para dizer que pela primeira vez via um diplomata negro na delegação brasileira.
Ele enfatizou: "It's the first time ever, ever. We are proud" [É a primeira vez. Estamos orgulhosos].
Eu faço um paralelo com os EUA, que tiveram um sistema de cotas importante para criar uma classe média negra que se autossustenta, que agora pode seguir em frente sem a necessidade de políticas diferenciadas.
No Brasil, as cotas das universidades vão produzir uma diversidade salutar.

COTAS NO ITAMARATY
É preciso haver políticas de ação afirmativa. No ministério, damos bolsas para proporcionar condições financeiras adequadas para que os afrodescendentes se preparem, o que tem tido um resultado muito positivo.
O objetivo é dar condições para pessoas que têm talento. Algumas vezes é visto como se estivessem recebendo um privilégio. Temos o cuidado de preservar as condições de preparação.
Eu não me beneficiei de nenhuma política. Na época, não havia. Mas olhando retrospectivamente, creio que me beneficiei de certas circunstâncias.
Tive oportunidades que raramente os negros têm. Morei no exterior, estudei idiomas com a ajuda do Itamaraty, porque ajudavam nos estudos dos filhos dos funcionários.
Os críticos das cotas têm uma contribuição que não é irrelevante. Eles dizem que, cientificamente, não há raças, não há diferenças entre brancos e negros.
É uma desmistificação para quem acha que há diferenças intrínsecas. Mas há uma falha no argumento. Do ponto de vista humano e das relações sociais, existem diferenças.
Basta ver os índices sociais, condições de saúde e de moradia para ver que existe um problema. Isso não é tratado de maneira séria e aprofundada [pelos críticos].
Nosso país tem muitos passivos. A preocupação social e racial tem que andar lado a lado. Ou deixamos as coisas acontecerem, ou tentamos uma intervenção. O assunto não pode ser jogado para debaixo do tapete.

ÁFRICA
Nos últimos anos, houve uma preocupação de diversificar as relações externas, ter um olhar novo não só em relação à África. Resgatar elementos de nossa identidade, cultura e sociedade.
Mas também avançamos na área comercial, levando em conta nosso interesse econômico. Tenho orgulho de ser negro. Faz parte da minha identidade. E de ser brasileiro. Mais do que isso, tenho orgulho de ser filho dos meus pais.

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Cotas no Itamaraty: uma questao polemica

Até o presente momento, o concurso do Itamaraty tinha dois tipos de candidatos: os afrodescendentes beneficiados com bolsas do programa de "ação afirmativa" do MRE (mais CNPq e Seppir), e todos os demais, os "sem bolsa", independente de serem brancos ou amarelos "pobres". Um afrodescendente de classe média, desde que selecionado, poderia ser contemplado com generosa bolsa para estudar e se preparar para o concurso, que continuava a ser feito inteiramente em bases igualitárias, descontando-se o "empurrão" financeiro.
A partir de 2011, pode ser que tenhamos dois tipos de diplomatas: os afrodescendentes, beneficiados com a política de cotas raciais introduzida por simples portaria pelo ministro "sainte" (apud Lula), e todos os demais, de fato a maioria, mas ainda assim disputando sem o "empurrão" quantitativo agora criado.
Ou seja, ademais dos 300 aprovados na primeira fase, o concurso contará com 10% de "cotistas", que precisarão, obviamente, ser identificados por um "tribunal racial" do Instituto Rio Branco, mas cabe ainda determinar se esses 30 cotistas serão retirados dos bolsistas afrodescendentes, ou dos candidatos em geral, caso no qual se teria de fazer um novo processo de seleção durante a primeira fase do concurso (ou se aceitar a autodeclaração e se estipular, por exemplo, um percentual qualquer de notas inferiores à média, como atualmente parece ser aplicado para o caso dos "deficientes").
Em qualquer hipótese, a medida introduz uma cunha "racialista" num concurso que permanecia, até aqui, razoavelmente meritocrático (claro, sem considerar as "desigualdades estruturais" e a tal de "dívida histórica", que os adeptos das políticas de Apartheid racial sempre invocam como argumentos para justificar o tratamento racista e divisivo que consiste em separar os supostos afrodescendentes de todos os demais brasileiros não pigmentados).
A questão toda, junto com a medida agora tomada, é altamente polêmica, sujeita a controvérsias passionais, como já observado na discussão sobre o estatuto da (des)igualdade racial, aprovado pelo Congresso de maneira amputada (em relação ao que pretendiam os adeptos das políticas racialistas) neste ano de 2010.
O Brasil, pela ação do governo, está criando uma nação dividida em "raças", a pretexto de reparar "injustiças históricas". Não creio, sinceramente, que isso seja positivo, para o Brasil, para o Itamaraty, para os diplomatas em geral.
Paulo Roberto de Almeida

Concurso para admissão de diplomatas terá cotas para negros
Agência Brasil, 28 de dezembro de 2010

Nova regra já passa a valer no concurso do primeiro semestre de 2011, quando serão abertas 30 novas vagas para negros que passarem para a segunda fase

BRASÍLIA - O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, assinou nesta terça-feira, 28, portaria que institui a reserva de vagas para candidatos negros no concurso de admissão à carreira de diplomata, realizado pelo Instituto Rio Branco. A portaria será publicada amanhã no Diário Oficial da União.

Segundo a nova regra, que valerá para o concurso do primeiro semestre do ano que vem, serão abertas 30 novas vagas para negros que passarem para a segunda fase. Atualmente, 300 candidatos são classificados para a segunda etapa de provas. Agora, 330 participarão dessa fase, sendo 30 deles negros.

Ao todo, o concurso é composto de quatro etapas. A primeira é de múltipla escolha. Na segunda etapa, é aplicada uma prova de português e, na terceira, questões dissertativas sobre vários assuntos. A última prova é de línguas.

A portaria assinada hoje dá continuidade ao Programa de Ação Afirmativa do Instituto Rio Branco, iniciado em 2002, que concede bolsas de estudo a candidatos afrodescendentes, com o objetivo de auxiliar na sua preparação para o exame de admissão ao instituto.

Até o momento, 198 candidatos negros foram beneficiados pelas bolsas de estudo, dentre os quais 16 foram aprovados no concurso de admissão à carreira de diplomata.

De acordo com o Itamaraty, no primeiro semestre, deverão ser chamados para o curso de formação de diplomatas 26 candidatos que passaram nas quatro fases do último concurso.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

O Apartheid, na pratica (Little Rock, Arkansas, 1959)

Deve ser terrível viver numa sociedade segregada racialmente.
Que bom seria se o Brasil JAMAIS criasse distinções baseadas em "raças", ou na cor da pele.
Infelizmente, sou obrigado a constatar que os novos "racialistas" se empenham ativamente em dividir o Brasil em negros (incluindo aí abusivamente os mestiços) e não-negros, que aliás são minoria, segundo a PNAD...
Paulo Roberto de Almeida

Calendário Histórico
1957: Os Nove de Little Rock
Rachel Gessat
Deutsche Welle, 24.09.2010

Em 24 de setembro de 1957, o presidente Dwight Eisenhower envia tropas militares a Little Rock, capital do Arkansas, para escoltar nove escolares negros que deveriam frequentar uma escola de brancos.

Final da década de 50 nos Estados Unidos: com base numa sentença da Corte Suprema, todas as escolas do país foram conclamadas a eliminar as restrições raciais. Também em Little Rock, capital do estado de Arkansas, as autoridades escolares começaram a preparar um plano de integração.

Chegou-se a um consenso: seriam mantidos os colégios exclusivos dos negros, mas alguns escolares negros teriam permissão para frequentar os colégios dos brancos. Foram escolhidos nove candidatos negros, seis moças e três rapazes, que deveriam frequentar a Central High School no ano letivo que se iniciava, juntamente com 1.900 escolares brancos.

Resistência aberta
Para muitos, no sul dos EUA, era inaceitável a eliminação da segregação racial nas escolas. Um dos principais adversários da integração era o governador de Arkansas, Orval E. Faubus. Ele conclamou abertamente à resistência e ordenou às tropas da Guarda Nacional de Arkansas que cercassem a escola.

No dia 3 de setembro de 1957, os escolares negros tentaram, pela primeira vez, entrar no colégio. Foram impedidos pelos soldados, os quais receberam aplausos frenéticos da turba de brancos, reunida diante do prédio da escola. No dia 4 de setembro, Elisabeth Eckford, uma das escolares negras, quase foi linchada pela multidão. Os soldados presenciaram o incidente sem intervir.

Mas logo a imprensa americana divulgou os acontecimentos e as autoridades federais ficaram cientes do conflito. Uma sentença judicial obrigou o governador de Arkansas a retirar, finalmente, as tropas da escola. No dia 23 de setembro de 1957, os escolares negros tentaram mais uma vez assistir às aulas.

O New York Times informou sobre os acontecimentos do dia da seguinte maneira: "Uma turba de manifestantes em pé de guerra, aos berros e histéricos, obrigou hoje nove escolares negros a deixarem a Central High School. Apesar da presença de um grande número de policiais locais e estatais para proteger os negros contra ataques, essas forças policiais acabaram desistindo em face da fúria de cerca de mil manifestantes brancos e, por volta do meio-dia, ordenaram aos alunos negros que deixassem a escola. A tentativa de integração durou 13 minutos. Os negros foram escoltados pela polícia através da turba e levados para as suas casas, sem serem feridos".

A posição de Eisenhower
No entanto, diversos repórteres, especialmente os negros, foram atacados e espancados pela multidão. Na noite de 23 de setembro, o presidente Dwight Eisenhower fez um pronunciamento pela televisão, dirigindo-se ao povo americano: "Como se sabe, a Corte Suprema dos Estados Unidos decidiu que são inconstitucionais as leis sobre a segregação racial nas escolas. Nossa opinião pessoal quanto à decisão não desempenha qualquer papel na imposição do cumprimento da lei. A base dos nossos direitos e liberdades individuais é assentada na garantia de que o presidente e o Poder Executivo apóiam e impõem as decisões da Corte Suprema. Se necessário, com todos os recursos à disposição do presidente".

O discurso do presidente deixou duas coisas claras. Em primeiro lugar, Eisenhower não era exatamente um paladino do movimento em prol dos direitos civis dos negros. A sua argumentação foi mantida quase exclusivamente no nível formal. Mas também ficou muito claro que o presidente estava decidido a acabar com a resistência em Little Rock. O conflito em torno dos nove escolares negros transformara-se também numa luta de poder entre as autoridades estaduais e federais.

Primeiro dia de aula "normal"
Como a situação em Little Rock continuasse inalterada, Eisenhower pôs todas as unidades policiais e militares de Arkansas sob o comando federal, no dia 24 de setembro. Além disso, enviou mil homens da 101ª divisão, uma tropa federal regular, para Little Rock. Os soldados postaram-se diante da escola e dissolveram imediatamente toda tentativa de agrupamento de manifestantes. Cada um dos nove escolares recebeu um guarda-costas, que o acompanhou à sala de aulas, montando guarda à porta, todo o tempo.

Com tal proteção, os nove escolares negros puderam a 25 de setembro de 1957 frequentar, pela primeira vez, um dia inteiro de aulas no seu novo colégio. Mas os nove adolescentes tiveram de enfrentar, sem qualquer amparo, as provocações verbais, sociais e, em parte, físicas dos seus colegas brancos.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

O Brasil a caminho do Apartheid - Estatuto da (Des)Igualdade Racial sancionado

Mais um passo no caminho do racismo institucionalizado, sempre vicioso e viciado, e que promete criar mais racismo no Brasil, infelizmente...

Lula diz que democracia fica mais representativa e justa com Estatuto da Igualdade Racial
Agência Brasil
20/07/2010 21:04

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse nesta terça-feira (20/7), durante cerimônia de sanção do Estatuto da Igualdade Racial, que o país passará a ser mais justo com a entrada em vigor do texto, que prevê garantias e o estabelecimento de políticas públicas de valorização para os negros.

“A democracia brasileira parece mais justa e representativa com a entrada em vigor do Estatuto da Igualdade Racial. Estamos todos um pouco mais negros, um pouco mais brancos e um pouco mais iguais”, discursou Lula, no Itamaraty, para uma plateia formada, em sua maioria, por representantes de diversos movimentos que lutam pela questão da igualdade racial.

Lula ressaltou que seu governo foi duramente criticado por defender a "agenda dos desafios da igualdade racial” e lembrou que, “os críticos de sempre”, chegaram a ingressar com ações no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a política de cotas nas universidades públicas. "O que construímos nesses sete anos e seis meses foi uma sólida ponte entre a democracia política e a democracia social".

Mas agora, no período eleitoral, acrescentou Lula, mesmo os críticos mais duros não contestam essas medidas. “Agora, às vésperas das eleições, ninguém mais contesta. Nem sempre foi assim e a sociedade enxerga a distância o que se dizia antes e o que se diz agora. Quantas vezes não fomos criticados por trazer a agenda dos pobres para dentro o governo”, criticou o presidente, acrescentando que, durante o seu governo, mais de 20 milhões de pessoas deixaram a linha da pobreza e passaram para a classe média.

“Fomos criticados duramente por isso e fomos desdenhados pelos críticos de sempre. Os desafios da desigualdade ainda são tratados como um falso problema e uma questão menor do desenvolvimento e da democracia. O mesmo se deu na luta contra a fome no Brasil”, disse Lula.

O presidente ainda minimizou as mudanças no estatuto durante a tramitação no Congresso, como a retirada da política de cotas. “Vocês não perderam nada, ganharam e ganharam muito. Se faltou algo, vamos colocar mais massa", afirmou.

O presidente da Rede de Cursinhos Populares Educafro, frei David Raimundo dos Santos, também acredita que, apesar das mudanças, o Estatuto da Igualdade Racial representa um avanço na questão das políticas de igualdade racial no Brasil. “As mudanças são o retrato da falta de dimensão política que a comunidade negra não conseguiu construir nesses 510 anos de Brasil”, argumentou.

“Cedemos o dedo para não perder o braço. O que sobrou, é superior à força política que a sociedade negra possui”, acrescentou frei Davi. Ele acredita que a comunidade negra precisa aproveitar as eleições para aumentar sua representação política nas esferas estaduais e federal.

terça-feira, 22 de junho de 2010

Ministro racista quer implementar Apartheid mesmo sem lei...

Algumas pessoas não desistem em seus intentos racialistas. Em países normais, um ministro como esse já teria sido demitido pelo chefe de Estado, por pretender violar a ordem legal.
No Brasil, como é o governo o principal violador da legalidade constitucional, não podemos esperar algo desse tipo.
Mas que é inacreditável, isso é.
Uma terra sem lei...

Ministro estuda criar regra sobre cotas sem passar pelo Congresso
Mariana Oliveira
Do G1, 18/06/2010

Congresso aprovou estatuto da igualdade racial, mas deixou cotas de fora.
Eloi Araujo, da Igualdade Racial, diz que Lula sanciona estatuto em 20 dias.

São Paulo - O governo federal estuda criar uma regulamentação para o sistema de cotas para negros em universidades sem que o tema passe por discussão no Congresso, segundo informou o G1 o ministro da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Eloi Ferreira de Araujo.

De acordo com o ministro, o recém-aprovado Estatuto da Igualdade Racial possibilita que a regulamentação ocorra sem que uma lei sobre o tema seja discutida e aprovada pelos congressistas.

Na última quarta-feira (16), o Senado aprovou o estatuto, mas deixou de lado as cotas raciais, tema que gera divergência no próprio Congresso e na sociedade civil.

Na avaliação do ministro, o texto do estatuto prevê que sejam criadas ações afirmativas. Para ele, as cotas estão entre essas ações.

"Tem um projeto de lei que tramita no Senado, que trata da política de cotas especificamente. Agora nossa opinião é que, porque esse estatuto diz no capítulo da educação que o Poder Executivo deverá adotar ações afirmativas, isso dá ao Poder Executivo a condição de regulamentar essa política. Ações afirmativas para efeito desse estatuto consideram-se ações e medidas especiais adotadas pelo Estado e pela iniciativa privada para correção das desigualdades. Ação afirmativa é um instituto 'guarda-chuva'. Cotas é espécie, ação afirmativa é gênero. As cotas estão dentro das ações afirmativas."

Questionado se o tema não teria que passar por discussão no Congresso, o ministro afirmou: "Não precisa passar pelo Congresso porque o texto da lei assim nos dirige, diz que é possível fazer. Esse estatuto (da Igualdade Racial) é apenas extraordinário."

De acordo com Araujo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve sancionar o estatuto em 20 dias. "(A partir da sanção) estaremos dialogando com a subsecretaria de Assuntos Jurídicos da Presidência da República para estabelecermos como regulamentar os dispositivos dessa natureza. Nosso juízo é que é possível agora estabelecer a implementação das cotas porque existe uma lei que diz que podemos fazê-lo e diz que o governo deve adotar ações afirmativas na educação."

A reportagem interrogou se a regulamentação poderia ocorrer por meio de um decreto, mas o ministro disse que é preciso aguardar a sanção para começar essa discussão.

Na opinião do ministro, as cotas poderiam seguir o percentual da população negra dentro da população de cada estado. "O juízo é sonhar com o que o IBGE estabelece para cada estado. Aí a gente vai ter uma situação para cada estado. Em São Paulo, temos percentual bastante presente. Em Santa Catarina, menor percentual."

O senador Demóstenes Torres (DEM-GO) disse que, caso o governo regulamente as cotas, haverá questionamentos. "Isso é o que se chama de tentativa de fazer com que o Congresso brasileiro seja fechado ainda que esteja aberto. Se o presidente editar um decreto, o Senado pode sustar o decreto do presidente. Essa matéria tão polêmica deve ser regulamentada evidentemente através de uma lei." Demóstenes também disse que "o ministro se viu derrotado em uma posição e tenta dar um golpe".

Na avaliação do advogado especializado em direito da população negra Marco Antônio Zito Alvarenga, ex-presidente da Comissão do Negro e de Assuntos Antidiscriminatórios da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de São Paulo, quem deve decidir sobre as cotas é o Judiciário. "Na minha visão quem emerge como o grande baluarte para definir o conteúdo das cotas é o Judiciário."

Tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) desde o ano passado uma ação protocolada pelo Democratas que questiona a política de cotas. Não há previsão para o tribunal analisar o tema.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

O debate sobre o racismo oficial (1) - Renato Janine Ribeiro

Este deve ser uma resposta, mas acredito que receberá troco, a ser devidamente acompanhado aqui.
Sou contra o que escreve o autor, inclusive porque acredito que a politica racialista do governo conduz à criação de um Apartheid no Brasil, e considero ridícula sua assertiva de que as cotas tem prazo para acabar (segundo ele, dez anos).
Mas coloco seu artigo, para poder debater em seguida.

Sem preconceito nem ódio
Renato Janine Ribeiro
O Estado de S.Paulo, 24 de maio de 2010

Demétrio Magnoli, analisando um artigo inédito meu, pergunta o que penso do que ele chama "ensino do ódio", que consistiria em criar artificiosamente divisões raciais no Brasil, opondo, num país miscigenado, supostos descendentes puros de brancos a outros puros descendentes de escravos (13/5, A2).

Considero justo beneficiar grupos historicamente discriminados com uma ação afirmativa que reverta a tendência a continuar a discriminação. Isso vale para as mulheres, os negros, os indígenas, os pobres, para citar só algumas categorias. A ação afirmativa, nos EUA, é procedimento mais complexo do que a mera quantificação de beneficiários ? que chamamos de "cotas" ? e mudou profundamente aquele país. Vejam-se as séries de TV, sempre com negros em posição de destaque, mais que no Brasil. Veja-se o presidente dos EUA.

Apoio, por isso, a política compensatória. Se deixarmos as coisas meramente seguirem seu curso, o preconceito continuará. Mas há cuidados a tomar. Primeiro, uma política de cotas deve ter prazo de validade. Isso porque seu cerne é compensatório. É mais do que um paliativo, mas não muito. Se dermos aos afrodescendentes um bônus de dez pontos num vestibular, ajudaremos os que estão a um passo de passar na prova ? não aqueles, muito mais numerosos, que discriminados estão e assim continuarão. Tornaremos mais multicores as salas de aula, acostumaremos brancos e negros a conviver, teremos mais negros na direção da política e da economia. Isso é bom. Mas não resolveremos a discriminação como um todo.

Por isso sustentei, quando estava na Capes e participei de algumas reuniões no Ministério da Educação sobre a reforma universitária, em 2004, que as cotas não deviam durar mais que dez anos. E também que a nota de corte para os cotistas não fosse muito inferior à dos não-cotistas. Numa certa universidade, tinham entrado cotistas com um quarto da nota dos últimos não-cotistas. Esse caso é injusto, eticamente, e um desastre em termos educacionais.

Não concordo com Demétrio nem com nossa amiga comum Yvonne Maggie, autora com ele e outros do livro Divisões Perigosas, que a diferença entre brancos e negros no Brasil seja de todo artificiosa. Quem me convenceu disso foi Elio Gaspari, num artigo neste jornal há talvez dez anos, em que ele dizia que nunca, para discriminar negativamente os negros, houve grande dificuldade no País. Qualquer porteiro sabe quem ele deve mandar subir pelo elevador de serviço. A dificuldade de saber quem é negro, quem é branco começou quando se cogitou de discriminar a favor ? afirmava ele. É por isso que me parecem legítimas as ações afirmativas. Mas só com prazo máximo no tempo e distância justificada nas notas de corte, em torno de 10%, penso eu.

Por que as limitações? Por duas razões. A primeira é que, se é legítimo discriminar afirmativamente quem antes o foi negativamente, caso essa política se perpetue, forçará a criação de grupos ditos raciais, antagônicos entre si ? ou seja, se essas políticas forem radicais, Demétrio e Yvonne acabarão tendo razão e se construirão identidades artificiais, divisões, sim, "perigosas" num país que, afinal, é bastante miscigenado.

A segunda é que, curiosamente ao contrário do que Demétrio parece me atribuir, sou frontalmente contra qualquer exacerbação de identidades. O que acho mais positivo em nosso tempo é termos a liberdade, cada um de nós, de assumir identidades contraditórias e até mesmo provisórias. Antigamente, alguém da classe média paulista, com chance de educação superior, estudaria Direito, Medicina ou Engenharia, casar-se-ia e teria filhos, seria católico e apoiaria, digamos, o Partido Republicano Paulista. Hoje, uma pessoa nessa condição pode fazer cursos bem diferentes, ter filhos ou não, ser heterossexual ou homossexual, pertencer ao partido e à religião que quiser, até ser ateu... Isso é admirável. Nunca tivemos tanta liberdade. Ela traz riscos, porque deixa as pessoas inseguras. Viver na contradição é difícil, mas é mais verdadeiro do que se tornar, cada pessoa, um parque temático. Permite uma realização pessoal maior. Uma das iniciativas que tentei nessa direção foi um projeto de graduação interdisciplinar em Humanidades proposto na USP, que não foi aprovado na universidade, mas tem inspirado projetos de bacharelado interdisciplinar bem-sucedidos em outros Estados. Era um curso que contestava justamente a ideia de identidade.

Por isso mesmo, embora eu aprove o espírito e mesmo a letra de várias medidas preconizadas no Estatuto da Igualdade Racial ? na verdade, um projeto que em 70 artigos mencionava a palavra "negro" ou "negra" 79 vezes, subestimando assim outras etnias ?, não acho conveniente uma lei específica que repete o que já está em outras ou exige políticas direcionadas só para uma parte da população, preconizando, por exemplo, "a redução de mortes violentas entre jovens negros". Por que não a redução de mortes violentas entre todos os jovens? Perdemos todos quando se perde o sentido universal que devem ter, como regra, as políticas sociais. Por outras razões, sou um pouco cético quando o estatuto manda ensinar História Africana: nosso ensino básico é tão deficiente que seria melhor reforçar o conhecimento das duas linguagens básicas, o Português e a Matemática, como plataforma para estudar as demais ciências, antes de impor novos conteúdos a professores e alunos.

Finalmente: o meu texto que Demétrio Magnoli analisou não foi publicado. Apresentei-o num colóquio entre pesquisadores brasileiros e britânicos das ciências humanas, fruto de acordo que assinei, em nome da Capes, com a British Academy, que é a equivalente da Royal Society para as ciências humanas e sociais. Os papers deveriam ter sido editados em português e inglês, internacionalizando mais a pesquisa brasileira em humanas e abrindo uma rotina de encontros nossos com os britânicos. Infelizmente, o acordo não teve continuidade. Fico contente que pelo menos um dos artigos então apresentados tenha saído da gaveta, graças à crítica de Magnoli.

PROFESSOR TITULAR DE ÉTICA E FILOSOFIA POLÍTICA DA USP

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

1665) O racismo de certos afrodescendentes: o afrobrasileirismo

Por falta de tempo ou por concentração em temas de natureza mais econômica ou de relações internacionais, não tenho me dedicado a um assunto que me preocupa sobremaneira, como cidadão (não do Brasil, pois não tenho esses acessos patrioteiros, mas do mundo), que é o da ascensão do racismo, no Brasil e no mundo, favorecido por todos esses militantes de causas meritórias que acabam descambando para o racismo inverso, que consiste em promover a alteridade como valor absoluto.
Ora, como acredito -- ops, tenho certeza -- que somos essencialmente iguais, e que a humanidade só conseguirá superar esse mal terrivel que é o racismo caminhando para a mistura total dos povos, minha tendência é a de recusar absolutamente essa plataforma da promoção dos "direitos dos negros", pois isso é racismo ao reverso.
Sei que existe racismo, e que ele faz muito mal às pessoas assim discriminadas, mas acredito que ele poderá ser combatido pela promoção da mistura, como aliás fez e faz o Brasil e outros povos naturalmente.
A despeito de toda a militância negra racista, a sociedade brasileira e a humanidade caminharão inevitavelmente, irremediavelmente, em direção da mistura, qualquer que sejam os esforços dos racistas oficiais, brancos, negros, amarelos, whoever...
Eles apenas conseguem criar um pouco mais de intolerância e de racismo no caminho dessa mistura, que vai passar por cima deles e de todas as suas teorias racistas.
Bem, como não tenho tipo tempo de me dedicar a esses temas, como dizia ao início, permito-me postar aqui a referência a um antigo trabalho meu que trata, perifericamente dessas questões, ao discutir, de um ponto de vista essencialmente antropológico, a questao do afrobrasileirismo, que me parece uma mistificação tremenda.
Atenção: não nego a realidade dos afrodescendentes, uma realidade para mais da metade dos brasileiros. O que nego é essa mistificação construída do afrobrasileirismo, uma ideologia nefasta para o futuro do Brasil.

Rumo a um novo apartheid?: sobre a ideologia afrobrasileira
(Brasília, 29 ago. 2004, 11 p. Originais: 1322; Publicados: 512)

Ensaio sobre a possibilidade de uma separação “mental” dos grupos raciais no Brasil, com base na promoção das diferenças entre a etnia negra e as demais.

Publicado na revista:
Espaço Acadêmico (a. IV, n. 40, set. 2004)
http://www.espacoacademico.com.br/040/40pra.htm

1358) Cronica do racismo ordinario

Sexta-feira última, dia 12 de fevereiro de 2010, estava eu como de hábito pesquisando na Biblioteca do Itamaraty-Brasília, quando fui surpreendido com a consulta de um senhor, visivelmente mulato (mas isso só veio a ter importância depois, como constatei), que me perguntou sobre a existência de estudos sobre a preparação e a formação do diplomata.
Tentei alinhar a bibliografia que eu conhecia de cabeça e responder às muitas indagações do "pesquisador", quando descobri que se tratava de um funcionário da Secretaria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República (aquela mesma do PNDH-3, de funesta existência), e que ele estava ali tentando visualizar meios e procedimentos para acelerar, ou facilitar, segundo seus argumentos, o acesso de negros à carreira diplomática.

Mencionei então o "programa de ação afirmativa", consistente no fornecimento de bolsas a candidatos afrodescendentes, o que ele conhecia amplamente, embora não tenha sido, aparentemente, o sucesso esperado. Informei inclusive que eu tinha participado voluntariamente do programa, enquanto tutor de um grupo de bolsistas afrodescendentes de Brasilia, nos anos de 2004 e 2005, mas que depois não tinha mais sido procurado.

Como a conversa enveredou para os méritos do programa, fui absolutamente sincero ao dizer que eu era contra aquele programa, pois ele discriminava contra brancos pobres, ou contra índios ou outros candidatos merecedores que não se enquadrassem no critério racialista do programa, que inclusive acabava premiando "negros" de classe média, que eram os que aparentemente dispunham de maiores chances de ingresso na carreira. Portanto, o programa não se destinava apenas e tão somente a corrigir uma injustiça social, mas a "colorir" o Itamaraty, o que para o meu interlocutor representava a "reparação de uma injustiça social".

Discordei imediatamente, posto que programas desse tipo corriam o risco de criar um novo racismo no Brasil, ou um Apartheid racial, já que separando absoltuamente negros (ou assimilados a tal) dos brancos ou outros.
Meu argumento é que o racismo devia ser combatido pela mestiçagem generalizada e pela educação de qualidade nos estratos mais pobres da população, se preciso com bolsas e outros apoios aos necessitados, o que fatalmente recolheria uma vasta proporção de negros e mulatos.

Esta não era a intenção de meu intelocutor, que contra toda evidência, pretendia se classificar como negro, quando ele era manifestamente um mestiço, um mulato, um pardo, ou seja lá o que for, isto é, um brasileiro típico, misturado.
Ele pretendia me fazer acreditar que os problemas dos negros eram de racismo e discriminação, no que eu concordava apenas em parte.

Reconheço racismo no Brasil, posto que algumas pessoas são racistas, mas considero que não se deve criar leis racialistas, pois isto introduziria justamente as sementes do racismo oficial no Brasil.

Foi conversa perdida: meu intelocutor insistia em se declarar negro, e como todos os negros ele achava que havia racismo no Brasil, e que por causa disso, não havia diplomatas negros.

Terminei a conversa por ali, convencido de que se está criando um monstro no Brasil, que se chama racismo oficial, que são todas essas politicas de promoção de "negros", estimuladas por militantes, que não pretendem se misturar com os brancos, e por isso são racistas declarados.

Acho que estamos enveredando por um caminho muito ruim para o nosso país...

Paulo Roberto de Almeida (16.02.2010)

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

1437) A construcao do Apartheid no Brasil -- O pré-sal e as cotas raciais...

Também achei estranho vincular o pré-sal, a discriminacão racial e as políticas (ainda bem) reparadoras. Todos ficamos aliviados ao constatar que uma pequena parte das fabulosas riquezas do pré-sal pode e deve ir para as minorias oprimidas no país.
Ops, espere um pouco, alto lá, vamos com calma.
Também li na imprensa que, na última PNAD cerca de 54 por cento dos brasileiros se (auto)definiram como negros ou pardos. Ou seja, para todos os efeitos, afro-descendentes são maioria neztepaiz.
Sendo assim, nós brancos caucasianos é que somos minoria, e devemos, assim receber todas as proteções e benesses da lei: cotas, reservas, dinheiro do pré-sal, e tudo o que mais for.
Somos minoria (quase oprimida), em todo caso assistindo a um poderoso movimento de construção do Apartheid neztepaiz.
Não acredita? Leia abaixo...
PRA


O pré-sal e a equidade de gênero e raça
Adilton de Paula
Jornal do Brasil, 21/10/2009

RIO - No dia 5 de outubro, em Curitiba, um grupo de técnicos e especialistas nas questões de energia, raça e gênero, convidados pelo Instituto Adolpho Bauer (IAB) e pela Associação Nacional dos Coletivos de Afro-Empreendedores Brasileiros (Anceabra), discutiram O marco regulatório do pré-sal e a promoção da igualdade de gênero e raça.

Partimos do pressuposto de que o petróleo é de propriedade de todo o povo brasileiro, e que qualquer novo processo do país advindo da exploração e uso deste combustível (como no caso do pré-sal) deve reverter em benefício e riqueza para o conjunto da população brasileira.

Partimos também da premissa de que a sociedade brasileira tem uma dívida histórica com grande parcela de nossa população (negros e mulheres), a qual vem sendo excluída e precarizada ao longo da história de desenvolvimento de nosso país e sociedade. E, por isso, neste sentido, qualquer enriquecimento do país deverá levar em conta, de forma substancial, a presença desta população na distribuição e partilha destas riquezas.

Verificamos, também, que ao longo da história da sociedade brasileira, tivemos diversas benesses naturais, que geraram imensas margens de enriquecimento do país, mas que, no entanto, excluíram e impediram a participação dos negros e das mulheres deste processo. Assim foi com o ciclo da madeira, com a cana de açúcar, com o ciclo do ouro, da borracha, do café e mesmo com o amplo processo de industrialização por que passamos a partir das primeiras décadas do século passado.

Com o advento do pré-sal, economistas e especialistas mostram que o Brasil passará a ser a quinta economia mais rica do planeta. Vemos isto como altamente positivo, mas não podemos aceitar que este enriquecimento mais uma vez sirva à apropriação individual ou esteja a serviço de grupos fechados e tradicionais (homens, brancos, jovens).

Nós nos posicionamos conjuntamente com as lutas e mobilizações propostas pela FUP (Federação Unificada dos Petroleiros) e com o posicionamento da UNE (União Nacional dos Estudantes), de que a maior parcela dos recursos que serão gerados nesta nova onda de riquezas do pré-sal deverá ser direcionada ao setor educacional brasileiro.

Hoje, mais que nunca, investir em educação é investir no futuro da sociedade brasileira.

Ressaltamos, entretanto, que para não manter o criminoso fosso de separação social de classe, gênero e raça no país, é fundamental que estes recursos reforcem as políticas afirmativas como o Prouni, levando em consideração que este é um real espaço e mecanismo de promoção da justiça social e da equidade de gênero e raça.

O grupo levantou dado e informações e está produzindo um documento, mais denso de justificativa sócio-histórico, sobre o porquê e a importância de o pré-sal ser uma peça fundamental na promoção do combate ao machismo e ao racismo e na promoção da igualdade de gênero e raça.

Partimos da seguinte pergunta geradora: é possível com o pré-sal gerar riquezas e promover a igualdade de gênero e raça?

Julgamos que sim, é possível, mais que possível, é necessário e devido, já que ao longo de nossa história jogamos estas parcelas da sociedade à marginalização e as deixamos nos piores processos de pobreza e miserabilidade. Julgamos que não há desenvolvimento sustentável, sem a promoção da igualdade de gênero e raça. E entendemos que o Brasil não chegará a ser uma grande economia e uma grande nação, se não houver solidariedade e justiça social.

Acreditamos também que este é um debate muito promissor, e por isso convocamos todos a dialogar conosco.

Não queremos ficar no reducionismo do debate do pré-sal pelo pré-sal, queremos discutir crescimento e desenvolvimento, queremos discutir como fortalecer e desenvolver todo o povo brasileiro e principalmente como podemos romper com as amarras e dores da exclusão, principalmente com a exclusão de classe, gênero e raça.

Saímos desse diálogo fortalecidos e animados porque vamos fazer o debate reverberar em todas as nossas redes sociais e em todos os espaços políticos e institucionais.

Chamamos a atenção de todos e todas para a cegueira institucional e pobreza da grande mídia, que tenta nos taxar e evitar o diálogo. Solicitamos que se abra o diálogo, sem dogmas, racismos, machismos e outros preconceitos, pois temos certeza de que, com uma conversa franca e aberta, todos teremos muito mais a ganhar do que a perder.

O Congresso Nacional terá que votar o marco regulatório até o fim de outubro. Portanto, solicitamos a todos e a todas que monitorem seus políticos, enviem e-mail, telefonem, entrem em contato e perguntem sobre seus respectivos posicionamentos sobre o pré-sal e principalmente como pensam sobre este tema em conjunto com a promoção da igualdade de gênero e raça.

Defendemos o pré-sal em regime de partilha, acreditamos que esta riqueza é de todos e que por todos e todas precisa ser usufruída.

Espalhe este debate, mobilize sua família, amigos e comunidade, e vamos contribuir mais uma vez para a construção de um grande país e de uma grande nação com espaços, direitos e oportunidades iguais para todos e todas.

Adilton de Paula é presidente do Instituto Adolpho Bauer