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domingo, 3 de fevereiro de 2019

Nunca Antes na Diplomacia: "Itamaraty sob tutela de militares" - Igor Gielow (FSP)

Na verdade, não é exatamente "Nunca Antes" – título de meu livro de 2014: Nunca Antes na Diplomacia: a política externa brasileira em tempos não convencionais (Curitiba: Appris, 2014), que precede o próximo: Contra a Corrente: ensaios contrarianistas sobre as relações internacionais do Brasil (2014-2018) –, pois durante o regime militar também ocorreu uma espécie de tutela, mas apenas ao início e sob circunstâncias especiais. Depois os militares e diplomatas se entenderam muito bem, como duas corporações de Estado, visando ao Brasil, não interesses partidários ou setoriais. Tanto foi assim, que começou no regime militar a sucessão de diplomatas no comando da diplomacia. Atualmente, estamos assistindo de fato a uma tutela.
Paulo Roberto de Almeida


Após crise, Itamaraty está sob tutela de militares do governo

Ação ocorreu após Ernesto Araújo assinar documento sobre a Venezuela sem consultar generais

A ala militar do governo promoveu uma espécie de intervenção branca no Itamaraty, tutelando os movimentos do chanceler Ernesto Araújo sobre temas considerados sensíveis —crise na Venezuela à frente.
O chanceler, que nunca comandou um posto no exterior, se indispôs com os militares logo na largada do governo, numa crise até aqui inaudita.
No dia 4 de janeiro, ele participou de reunião no Peru do Grupo de Lima, que reúne 14 países para discutir a situação política venezuelana.
O grupo, que considera ilegítima a reeleição do ditador Nicolás Maduro no ano passado, se encontrou para determinar novas medidas contra o governo em Caracas.
Quando o documento foi divulgado, militares ligados à área de inteligência ficaram de cabelo em pé com o item “D” das providências anunciadas: “Suspender a cooperação militar com o regime de Nicolás Maduro”, dizia o texto.
Só que Araújo não consultou a área militar sobre isso. E é justamente a cooperação com as Forças Armadas venezuelanas que mantém o Brasil minimamente informado sobre os passos da ditadura.
Isso ocorre tanto devido ao “backchannel”, informações de bastidor trocadas por oficiais, como com a observação direta da área de inteligência. Como diz um experiente negociador da região, o Brasil sabe mais sobre Caracas por meio dos próprios militares chavistas do que por canais diplomáticos regulares.
Isso aconteceu enquanto uma outra crise, essa pública, transcorria. Também na primeira semana do governo, o presidente Jair Bolsonaro e o chanceler defenderam a instalação de uma base americana no Brasil, algo que soa herético aos militares daqui.
O general da reserva Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) buscou o reduzir a um mal-entendido por parte da mídia —o fato de que o secretário de Estado americano, Mike Pompeo, confirmou a oferta foi convenientemente deixado de lado.
No caso da Venezuela, alguns oficiais sugeriram que Araújo fosse demitido. Outros ponderaram sobre o dano de imagem que tal queda geraria e sugeriram que ele se consultasse mais com os ministros egressos da área militar.
Pelo menos dois generais com assento importante no governo conversam regularmente com o chanceler.
Um diplomata alinhado à nova chefia diz que isso é normal, dada a sobreposição de responsabilidades entre Itamaraty e militares.
Já um outro embaixador, em posição mais privilegiada mas no campo que Araújo promete remover de cargos de comando no ministério, afirma que não há comunicado sensível do chanceler que não tenha o teor discutido com a área de Defesa.
Seja qual for a gradação, o efeito da tutela foi visto ao longo do mês. Araújo reduziu sua visibilidade no caso Venezuela a poucas declarações e 7 das 22 postagens que fez no Twitter em janeiro.
Na mão inversa, o general Hamilton Mourão, o vice-presidente que ocupou a cadeira de Bolsonaro por seis dias no mês, falou em diversas ocasiões vezes sobre a crise.
Numa delas, na semana passada, indicou qual os caminho que as Forças Armadas da Venezuela deveriam tomar: oferecer uma saída ao ditador.
Mourão também antecipou movimentos que Araújo confirmou em entrevista coletiva na sexta (1º), como atender o pedido do líder oposicionista Juan Guaidó para o envio de ajuda à Venezuela e promover sanções econômicas contra membros do regime.
Até por não ser demissível, o general tem vocalizado a insatisfação. Como presidente interino, recebeu duas delegações árabes para dizer que não haverá a mudança da embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém, promessa de campanha de Bolsonaro repetida ao premiê israelense, Binyamin Netanyahu.
Araújo apenas disse que mudança está em estudo.
O movimento é destinado a agradar a base evangélica do presidente, que vê no reconhecimento da cidade como capital de Israel o restabelecimento de uma verdade bíblica e uma antessala para a volta de Cristo à Terra.
Os árabes, grandes compradores de aves brasileiras, prometem retaliar porque o status de Jerusalém é disputado entre palestinos e israelenses.
O vice também descartou, como já fizera o general Heleno e o próprio Bolsonaro, qualquer intervenção militar contra Maduro. A ideia foi ventilada várias vezes pelo presidente americano, Donald Trump, e os fardados temem que o chanceler se inspire em seu ídolo declarado.
Mourão também trocou farpas públicas com Olavo de Carvalho, o misto de escritor e ideólogo a quem Araújo deve seu discurso político e a indicação, feita por meio de Eduardo Bolsonaro, deputado federal pelo PSL-SP. Ele, Araújo e o assessor internacional da Presidência, Filipe Martins, são alunos de Olavo engajados no projeto de “livrar o Itamaraty das amarras ideológicas”, como diz o presidente.
O vice também criticou o chanceler numa entrevista à revista Época, dizendo que ele não havia dito a que veio. Em particular, oficiais da ala militar e generais da ativa são bem menos diplomáticos, especialmente quando comentam o caudaloso discurso de estreia de Araújo. Outras manifestações, como o artigo em que creditou a Deus a união entre Bolsonaro e Olavo, são apenas alvo de chacota.
Não por acaso, Mourão tem se encontrado com embaixadores para tentar desfazer a má impressão que o governo Bolsonaro causa entre políticos estrangeiros —salvo, naturalmente, Trump e líderes assemelhados na Itália, Hungria ou Israel.

quinta-feira, 10 de abril de 2014

Eleicoes 2014: o nunca antes que nunca foi, e vai voltar - Editorial Estadao

Lula assumiu

10 de abril de 2014 | 2h 11
Editorial O Estado de S.Paulo
Nunca antes, desde a posse da presidente Dilma Rousseff, o seu patrono Luiz Inácio Lula da Silva assumiu publicamente, em alto e bom som, a tutela sobre a apadrinhada como na sua entrevista de anteontem a nove blogueiros selecionados por sua lealdade, para ter de antemão a garantia de não ser surpreendido por perguntas incômodas, muito menos ter contestadas as suas respostas. Essa encenação em que uns se limitam a levantar a bola para que o outro, livre de marcação, arremate e comemore foi a forma que Lula escolheu para sair da muda e informar o País do seguinte:
Se pudesse, registraria em cartório a sua condição de não candidato ao Planalto este ano, e os jornalistas de sua confiança deveriam "contribuir para acabar com essa boataria toda"; o governo tem que "ir para cima" e o PT tem que reagir "com unhas e dentes" à tentativa da oposição de fazer a CPI da Petrobrás, e se o partido assim tivesse procedido em relação à CPI dos Correios, em 2005, "possivelmente a história teria sido outra" (ou seja, o mensalão acabaria abafado); a economia está aquém do que ele e a presidente gostariam, mas não tanto como faz crer "a massa feroz de informação deformada", e de todo modo Dilma precisa explicar na campanha eleitoral o que fará para melhorar a situação a partir de 2015.
Desde sexta-feira, quando se encontraram em São Paulo, a criatura sabia que o criador iria ele próprio "para cima" do desencanto e do pessimismo que não cessam de ensombrear o governo. O que ele ouve em seu confessionário no bairro paulistano do Ipiranga, onde funciona o instituto que leva o seu nome, confere com a sua proverbial intuição para convencê-lo de que o descrédito de confiança das elites políticas, a começar dos companheiros, e das lideranças empresariais nas aptidões da presidente chegou a um nível alarmante. Se o poder fosse uma conta bancária, ela estaria afundada no cheque especial, beirando a inadimplência.
Isso, há de raciocinar Lula, ainda não prenuncia o desmanche do projeto da reeleição, mas deixa antever acidentes de percurso capazes de ameaçar a travessia com o imponderável. O mais desalentador terá sido descobrir, a cada conselho dado, mas não atendido, que a pupila ou apenas finge concordar com ele, por se achar em posse de atributos suficientes para exercer o mando como lhe pareça melhor, ou por não conseguir segui-los, porque, em poucas palavras, não é do ramo. Seja como for, Lula deve ter sido particularmente enfático ao lhe ordenar que proclamasse estar disposta a investir com unhas e dentes contra a CPI da Petrobrás - o que ela fez na segunda-feira ao avisar que não recuará um milímetro da "disputa política" com a oposição.
Decerto Lula também lhe terá dito que pretendia vir a público para defender o governo. Não se sabe se acrescentou algo como "ainda que fosse necessário cobrar da governante promessas de dias melhores para a economia". Seria uma contraofensiva ao seu estilo, a que não poderiam faltar as habituais caneladas na imprensa. "Temos que retomar com muita força essa questão da regulação dos meios de comunicação do País", aos quais acusa de tratar Dilma com "falta de respeito e de compromisso com a verdade". (Isso não o impediu de propor a Dilma "uma política agressiva de comunicação".) A sucessora não só enfiou a obsessão de Lula no fundo da gaveta, como disse logo depois da posse que "devemos preferir o som das vozes críticas da imprensa livre ao silêncio das ditaduras".
Se tiver apenas metade da inteligência de que há de se achar dotada, Dilma deve ter passado pelo desconforto de atinar com o que Lula efetivamente pretendia ao chamar os holofotes para si - mostrar a tutti quanti que resolveu exercer, agora à plenitude, a função de fiador da presidente. Ou seja, ele não precisa "voltar" para acalmar a legião de queixosos da conduta da afilhada. E ele estará por perto até o fim de seu mandato para prevenir ou, em último caso, remediar, a tempo e a hora, derrapadas da mandatária. Por sinal, como quem não quer nada, mas querendo, Lula disse aos seus blogueiros que tem recebido mais políticos, ativistas e empresários do que no seu tempo de presidente.