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sexta-feira, 1 de abril de 2016

Petrolao-Pasadena: o heroi secreto que deu inicio a Lava Jato, agora não mais desconhecido

Tudo o que sabia ou se desconfiava, agora confirmado. 
Sabemos que Pasadena -- e varios outros casos mais -- integra o comportamento mafioso dos MAIORES LADRÕES da história brasileira.
Paulo Roberto de Almeida 

VEJA.com 

Exclusivo: Gerente da Petrobras conta a VEJA que mandou avisar Dilma da compra superfaturada de Pasadena

De 2003 a 2005, Otávio Pessoa Cintra ocupou o cargo de gerente da Petrobras América, no Texas, EUA. Ali, ele teve contato com o escândalo que está na origem de tudo e garante que avisou seus superiores na ocasião. "Tomei conhecimento em 2014 que Dilma sabia de tudo"

Por: Hugo Marques 31/03/2016 às 17:35

Otávio Cintra da Petrobras

Otávio Cintra, da Petrobras(Marcelo Tabach/VEJA)

Sua identidade nunca foi revelada, mas ele está no melhor lado da Lava Jato. Como informante, ajudou a Polícia Federal a dar os primeiros passos para desvendar o esquema de corrupção na Petrobras. Seu nome é Otávio Pessoa Cintra. Ele é engenheiro, tem 55 anos e é funcionário da estatal há 30 anos. De 2003 a 2005, Cintra ocupou o cargo de gerente da Petrobras América, braço da estatal no exterior, com sede em Houston, no Texas, Estados Unidos. Ali, ele teve contato com o escândalo que está na origem de tudo: a compra, altamente superfaturada, da refinaria de Pasadena, também em Houston. Em entrevista a VEJA, Cintra garante: "Pasadena era um projeto secreto". A história de Cintra mostra como um funcionário da estatal teve acesso a informações comprometedoras e tentou, sem sucesso, alertar seus superiores para o que estava acontecendo. Ele conta que mandou recado para a então ministra Dilma Rousseff na época. E soube, há dois anos, que seu recado chegou à destinatária. "Tomei conhecimento em 2014 que Dilma sabia de tudo."

O engenheiro conta que, no segundo semestre de 2005, já exasperado com as tentativas frustradas de denunciar a roubalheira na Petrobras, procurou o deputado Jorge Bittar, do PT do Rio de Janeiro, então influente na ala ética do partido. Na época, a Petrobras estava sob a presidência de José Sérgio Gabrielli. Cintra contou ao deputado o que sabia, deu detalhes do rombo de Pasadena e pediu que o assunto fosse levado a Dilma Rousseff, então ministra da Casa Civil e presidente do Conselho de Administração da Petrobras. Em 2014, encontrou Paulo César de Araújo, o assessor que intermediara seu encontro com Bittar, e quis saber o destino de sua denúncia de nove anos atrás. A resposta que ouviu: "O Bittar levou o assunto ao Gabrielli e ao Gabinete Civil da Presidência da República". Depois desse diálogo, Cintra ficou certo de que Dilma foi informada do que se passava na Petrobras mas não tomou atitude alguma.

Otávio Cintra começou a auxiliar a Polícia Federal em 28 de abril de 2014. Prestou um depoimento formal no qual detalhou o que sabia sobre Pesadena, sobre operações ilegais envolvendo a compra de blocos de exploração de petróleo em Angola e casos de superfaturamento, além de citar nomes de funcionários que, mais tarde, se tornariam estrelas do escândalo, como o ex-diretor Nestor Cerveró, e o lobista Fernando Soares, conhecido como Fernando Baiano. Suas revelações foram registradas num documento de dezessete páginas, anexado ao processo da Lava Jato. A identidade do informante, no entanto, ficou sob segredo até agora.

Depois de prestar seu depoimento sigiloso à Polícia Federal, Cintra ainda tentou levar o assunto adiante. Procurou o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que encaminhou o engenheiro ao deputado Antônio Imbassahy, então membro da CPI da Petrobras. Imbassahy tentou convocar Cintra para depor formalmente na CPI, ocasião em que poderia denunciar publicamente tudo o que sabia. O requerimento de sua convocação nunca foi votado. A seguir, os principais trechos de sua entrevista a VEJA:

"PROJETO SECRETO"

Como o senhor ficou sabendo da compra de Pasadena pela Petrobras? Eu era commercial manager da Petrobras América. Estava em 2005 nos Estados Unidos e vi essa movimentação das pessoas fazendo viagens pelos EUA, passavam pela Petrobras America. E nós, o comercial da companhia, não éramos ouvidos sobre o negócio. Tínhamos que ser ouvidos. E por que isso não acontecia? Porque Pasadena era um "projeto secreto" . Por isso não envolvia a gente. Vi que estavam comprando Pasadena quase clandestinamente.

Na época, como gerente, o senhor não fez nada para impedir o golpe?Ainda em 2005, fui ao presidente da Petrobras America, o Renato Bertani, meu chefe. Disse a ele que não fazia sentido comprar Pasadena, ainda mais por aquele preço absurdo. A Petrobras tinha acabado de recusar a compra de toda a refinaria de Pasadena por 30 milhões de dólares e, naquela, eles estavam comprando a metade da mesma refinaria por 360 milhões de dólares, sem consultar ninguém. Era óbvio que havia algo por trás daquilo.

O problema estava no preço e no modo com que a operação estava sendo feita? A compra de Pasadena tinha que necessariamente passar pela Petrobras América. Eu era o gerente comercial da Petrobras América e estava presenciando a movimentação para a compra de uma refinaria que antes não estava nos planos estratégicos da empresa. Cabia a nós o contato sobre as oportunidades para a empresa. Em duas outras oportunidades anteriores, nós fomos consultados. Pasadena era uma empresa familiar, as margens eram baixas, não tinha crédito no mercado. Ela não podia comprar petróleo. Imagina uma padaria que não podia comprar farinha de trigo, que não podia fazer pão. E essa era apenas uma das muitas operações estranhas que ainda estavam por vir.

"A DILMA E O GABRIELLI SABIAM"

O senhor alertou seus superiores sobre as irregularidades na compra de Pasadena? No segundo semestre de 2005, tive um encontro com o deputado Jorge Bittar. Eu falei: "Deputado, tem irregularidade na compra de Pasadena. Meia dúzia de suspeitos estão envolvidos nessa negociação". Quem intermediou o encontro no gabinete do deputado, no Edifício Di Paoli, no Rio, foi meu amigo, o Paulo César Araújo, que trabalhava com o Bittar. O Bittar, então, levou o assunto à ministra da Casa Civil da Presidência da República e ao presidente a Petrobras, Sérgio Gabrielli.

Como é que o senhor sabe que a então ministra Dilma foi alertada? O Paulo César, assessor do Bittar, me confirmou. Quando estourou a Operação Lava Jato, tivemos outro encontro, em 2014, no mesmo Edifício Di Paoli. O Paulo falou: "O pior é que sua denúncia foi levada à Casa Civil e ao Gabrielli". A Dilma e o Gabrielli sabiam. O Bittar foi à Casa Civil e ao Gabrielli. Eu só tomei conhecimento agora em 2014 que a Dilma sabia de tudo.

"PETROBRASSSS..."

O senhor fez alguma outra incursão na tentativa de denunciar o que estava acontecendo na empresa?Depois que o presidente Lula já tinha terminado o mandato, me encontrei com ele no Chile, onde também fui gerente. Em uma cerimônia, salvo engano em 2013, um representante do Itamaraty me colocou sentado ao lado dele, e me apresentou como funcionário da Petrobras. Pensei em aproveitar a oportunidade e falar com o ex-presidente, mas não foi possível. O ex-presidente tinha bebido um pouco de uísque, me olhou, deu um tapa forte no meu peito e disse, sorrindo: "Petrobraaasssss". Aí todo mundo riu, mas não teve jeito de conversar com ele, não tinha clima.

Foi sua última tentativa de trazer o assunto a público? Apresentei os problemas da Petrobras para o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, numa reunião, em 2014, já depois do escândalo da Lava Jato. Ele pediu que eu conversasse com o deputado Antonio Imbassahy. Fiz isso. O deputado apresentou requerimento me convocando em 2015 para prestar depoimento na CPI, mas o requerimento sequer foi analisado.

"COMEÇARAM A ME PERSEGUIR"

Como o senhor reagiu quando a Lava Jato começou a revelar tudo?Fiquei com medo. Tenho medo desse grande 'sistema'. Tive medo de matarem minha família. Vai que alguém me aborda na rua. Numa discussão de rua, dão um tiro, e é queima de arquivo. A prova de que realmente o esquema é muito maior é que começaram a me perseguir dentro da Petrobras depois que avisei o deputado Bittar. Perguntavam de forma irônica: "Por que o Paulo Roberto Costa gosta tanto de você?". Fiquei sem dormir. Quando você se volta contra o sistema, o sistema te destrói. Quando fiz essa denúncia, o mundo se voltou contra mim.

O que mais aconteceu para o senhor dizer que o mundo se voltou contra o senhor? Desde que comecei a falar abertamente sobre Pasadena dentro da empresa, nunca mais tive promoções, nunca mais me deram funções de relevo na companhia. Nos Estados Unidos, cheguei a ganhar mais de 100 mil reais por mês e hoje não ganho um terço disso. Nos últimos anos, fico encostado num computador, na internet, esperando a aposentadoria chegar e ainda com medo de sofrer algum tipo de retaliação.

Hoje, diante do que já foi descoberto, qual avaliação que o senhor faz sobre o que aconteceu?Todos eles, toda a diretoria da Petrobras é cúmplice. Toda decisão de diretoria é colegiada. O Gabrielli é igualzinho ao Paulo Roberto. Só que o Gabrielli colocava para conversar o assistente dele. Eles mandam emissários. Se der problema, eles dizem: ""ão autorizei ninguém a falar em meu nome". É a mesma política do Lula. Você acha que o Lula negociava com a arraia-miúda? Quem conversava era o Zé Dirceu.

Procurado por VEJA, o ex-deputado Jorge Bittar, hoje presidente da Telebrás, disse, primeiro, que não se lembrava do encontro com o engenheiro Cintra. Depois, que o encontro nunca existiu. Seu ex-assessor Paulo César também negou. "Eu não me lembro nem de conhecer essa pessoa", disse ele, hoje proprietário da Fragmenta Destruição Segura de Informações, empresa especializada na inutilização de documentos e arquivos. O ex-presidente Fernando Henrique confirmou a reunião com Otávio Cintra. O deputado Imbassay disse que a bancada governista impediu a convocação do engenheiro para depor. "Ele podia ter contribuído muito com os trabalhos da CPI, mas a convocação dele sequer foi analisada."

http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/exclusivo-gerente-da-petrobras-conta-a-veja-que-mandou-avisar-dilma-da-compra-superfaturada-de-pasadena



Cesar Maia elogia o Itamaraty, e espera um novo chanceler de qualidade

Ex-Blog do Cesar Maia
Cesar Maia, 
1/04/2016
O NOVO MINISTRO DAS RELAÇÕES EXTERIORES! 
     
1. A hipótese do impeachment de Dilma é cada dia mais concreta. A crise econômica profunda se mostra em todas as latitudes com a queda do PIB que passa a ser depressão, taxa de desemprego recorde, quebra de milhares de empresas, taxas de juros extravagantes, perda do grau de investimento por todas as agências de risco, a indústria definhando, inflação roçando os dois dígitos,Estados quebrados...
     
2. É natural que os debates, as análises, as colunas, as entrevistas, e o noticiário se concentrem na questão econômica. E especulem sobre medidas a serem adotadas pelo novo governo e nomes para o Ministério da Fazenda e Banco Central. Claro que tudo isso é muito importante. 
     
3. Mas há um elemento consensual que precisa ser devidamente equacionado: a taxa de confiança, a credibilidade no novo governo. Afirma-se que só a saída de Dilma e sua substituição por Temer vão gerar uma reversão de expectativas. No prazo imediato é verdade. Os mais experientes sugerem que o novo presidente se afaste da  ilusão de um plano de governo. O fundamental é aprovar de imediato 2 ou 3 medidas de forte impacto que sinalizem a nova dinâmica fiscal e econômica. 
     
4. Mas a questão de fundo da taxa de confiança não estará resolvida, pois nem o presidente, nem o nome do ministro da fazenda são suficientes, embora necessários. O presidente terá uma semana para ir ao Congresso e propor duas ou três medidas. Um bom início. 
     
5. Mas o ponto chave da taxa de confiança no caso brasileiro é a expectativa de governos, e investidores externos sobre a sustentabilidade do que disser o governo. A desintegração mais profunda da credibilidade do atual governo se deu no setor externo. O desmanche da imagem do Brasil ocorreu com velocidade surpreendente, estimulado pela coreografia externa do governo se abraçando com os populismos mais coloridos bolivarianos, africanos e no médio oriente. 
     
6. A prioridade maior no momento do impedimento de Dilma é a escolha do Novo Ministro das Relações Exteriores. Esse deve ter um currículo carregado de conhecimento e experiência na  diplomacia presidencial, geopolítica internacional, na diplomacia econômica… 
     
7. Desde a América do Sul, desentravando o MERCOSUL na direção da União Europeia, afirmando uma coordenação com a Aliança do Pacífico, estabelecendo um diálogo sério e prático com os EUA, reinserindo-se na ONU como uma potência ocidental e cristã, que é, voltando a ter uma voz de prudência nos conflitos de média intensidade, sem tergiversar sobre o terrorismo, afirmando a segurança jurídica internacional…
     
8. O Novo Ministro das Relações Exteriores, tendo esta dimensão, alavanca a confiança no novo governo, constrói imediatamente as pontes  necessárias para integrar o país, rompendo o isolamento e a desconfiança, política, diplomática, econômica... O Novo Ministro das Relações Exteriores tem uma enorme vantagem operacional: conta com uma máquina diplomática de enorme eficiência, tradição e respeitabilidade, garantidora imediata da nova política externa a ser executada.    
 
                                                  

Um seminario divertido: Varnhagen, o passado e o futuro do Brasil - resumo P.R. Almeida



Meu resumo preparado para o seminário, que sequer usei, pois falei muito menos do que está inscrito abaixo, mas que pode ser útil, para aqueles muito preguiçosos, e que não querem ler as 45 páginas do ensaio completo, que já foi informado aqui: 

http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2016/04/livro-sobre-varnhagen-ser-apresentado.html

Foi um prazer participar deste seminário, com as tiradas inteligentes do Embaixador Synesio Sampaio Goes, e as palestras altamente interessantes dos demais colaboradores: professor Arno Weling, embaixadores Seixas Corrêa e Carlos Cardim, ministro Luis Claudio Villafañe. Bom debate ao final. 
Foi transmitido ao vivo, depois que eu souber do link k
Meu resumo está abaixo.
Paulo Roberto de Almeida  


O pensamento estratégico de Varnhagen: contexto e atualidade
Resumo para Seminário
Paulo Roberto de Almeida

Não lido; texto disponível na plataforma Academia.edu e remissão no meu blog:
  Disponível na plataforma Academia.edu (https://www.academia.edu/23891582/O_pensamento_estrat%C3%A9gico_de_Varnhagen_contexto_e_atualidade). 

Questões introdutórias e de organização do ensaio
Este é um ensaio de aproximação intelectual ao pensamento estratégico de Francisco Adolfo de Varnhagen, que pode ser enquadrado na categoria da história das ideias políticas no Brasil. A temática principal, desdobrável em duas perguntas vinculadas entre si, poderia ser apresentada da seguinte maneira:
(1) Varnhagen, seja enquanto historiador, seja como diplomata, ou mesmo como “estadista improvisado”, possuía, ou era dotado de, “um” pensamento estratégico? Em outros termos, em que medida aderia ele a conceitos basilares das doutrinas estratégicas do seu tempo, e como tais conceitos, se presentes efetivamente em seu pensamento, se refletiram em sua vasta obra, tanto a de cunho historiográfico – como a História Geral do Brasil (1854-57) – quanto a de natureza mais política – como, por exemplo, o Memorial Orgânico (1849-1850) –, tal como se tentará aqui discutir?
 (2) Existiam doutrinas estratégicas, ou de natureza geopolítica, propriamente formalizadas, no período formativo do pensamento de Varnhagen, e de que tipo seriam essas estratégias, ou “geopolíticas”, em construção na primeira metade do século XIX, que se desenvolveram mais para o final do século e que passaram a conhecer notável florescimento na primeira metade do século XX?
(3) Quais os componentes principais do pensamento estratégico de Varnhagen – se admitirmos que ele possuiu um – e como este se apresentou em sua obra?
(4) Que consequências ou efeitos teve esse tipo de pensamento no ideário, ou na ideologia, das elites dirigentes brasileiras, em especial as militares e as diplomáticas, nas décadas que se seguiram?
(5) Que legado produziu no pensamento estratégico brasileiro do século XX, quais foram os seus porta-vozes e qual o impacto desse tipo de pensamento na definição de políticas públicas nas áreas da segurança nacional, do desenvolvimento econômico e do papel do Estado na organização nacional? Como a vertente do pensamento propriamente “estratégico” de Varnhagen se incorporou à, ou recebeu continuidade na, obra de “geopolíticos” do século XX?
(6) Existe uma modernidade em Varnhagen? Dito de outra forma, suas reflexões e propostas para os problemas brasileiros de meados do século XIX poderiam ser transpostas, com as adaptações de praxe, aos desafios brasileiros do início do século XXI? Qual seria o pensamento estratégico, de inspiração varnhageana, que poderia impulsionar um esforço similar, ou funcionalmente equivalente, para “civilizar” o Brasil, quase 170 anos depois das propostas originais?
Historiadores: Arno Wehling, Nilo Odália, e outros, além do próprio Varnhagen

1. Varnhagen possuía um pensamento estratégico?
Memorial Orgânico de 1849-50 não tinha sido divulgado originalmente em seu nome, mas apenas oferecido às assembleias “por um brasileiro”, ou “um amante do Brasil” –, Varnhagen não o lista entre suas obras realizadas até aquele momento.
Mesmo reconhecendo em Varnhagen um pensador estratégico – ou, então, um historiador dotado de visão estratégica – cabe reconhecer que sua influência direta nas políticas de Estado, ou nas ações de outros estadistas do Império, foi reduzida, limitada, ou relativamente diminuta, e sua própria época, cabendo-lhe mais propriamente, e a justo título, um papel preeminente no próprio pensamento histórico e historiográfico...

2. Quais tipos de pensamento estratégico existiam na época de Varnhagen?
A formulação de doutrinas estratégicas certamente não emerge apenas a partir de Clausewitz, pensador geralmente identificado com o nascimento formal das concepções táticas e estratégicas quanto ao uso de forças militares para finalidades eminentemente políticas. Mas é a partir da obra do militar e estrategista prussiano do começo do século XIX que o pensamento estratégico começou a conhecer progressos constantes, tal como estimulado pelas grandes guerras de movimento da era napoleônica, que prenunciam os grandes conflitos globais do final do século XIX e da primeira metade do século XX. O próprio Napoleão é autor da famosa frase que pretende que todo Estado deve conduzir sua política a partir de sua geografia.
Varnhagen reflete todas essas ideias em vários de seus trabalhos, em especial no História Geral. A produção mais relevante nessa área é obviamente posterior à vida ativa do historiador brasileiro, mas é inegável que trabalhos de eminentes geopolíticos – do final do século XIX e início do XX – tomam como ponto de partida o pensamento de naturalistas, geógrafos, geólogos e antropólogos que haviam formulado suas teorias em décadas anteriores (Costa, 2008). Varnhagen não está alheio, bem ao contrário, ao que intelectuais de relevo no cenário europeu produzem nesse contexto, como destaca Arno Wehling em sua tese sobre Varnhagen e a Construção da Identidade Nacional (1999).
Na correspondência de Varnhagen, mas também em suas notas bibliográficas são inúmeras as referências aos trabalhos de membros dessas academias, assim como a eminentes pensadores (Tocqueville; Montesquieu, que havia formulado uma “teoria dos climas”), juristas (Vattel), geógrafos e naturalistas (Humboldt), economistas (Jean-Baptiste Say) ou historiadores (Guizot, Ranke).

3. Quais os componentes centrais do pensamento estratégico de Varnhagen?
Foi no contexto de redefinição das prioridades nacionais, quando a segunda geração de “pais da pátria” começa a desenhar a arquitetura do Segundo Império – com a criação da presidência do gabinete de ministros, em 1847, por exemplo –, que o ainda relativamente jovem historiador (33 anos) empreende uma obra de reflexão e de proposições políticas que o habilita (ainda que “clandestinamente”) a ser considerado um pensador estratégico. Varnhagen identifica os problemas a serem superados pelo país, e dispõe a propor um conjunto de reformas que ajudariam a administração imperial na dura tarefa de “civilizar” o Brasil. A intenção, explícita ou não, era a de dar ao país uma feição a mais próxima possível do paradigma europeu, um modelo supostamente ideal de ordem política e de organização econômica com o qual, não apenas o historiador de Sorocaba, mas também diversos outros tribunos do Império, se identificavam plenamente.
Essa obra foi o Memorial Orgânico de 1849-1850, divulgado inicialmente em duas etapas e sem indicação de autoria – a não ser o genérico “Um Brasileiro” – e republicado uma única vez numa revista obscura de meados do século XIX: essa pequena, mas densa obra permaneceu quase totalmente desconhecida da inteligência nacional, uma vez que foi escassamente repercutida na bibliografia subsequente e permaneceu ignorada até mesmo dos principais autores que se ocuparam de questões geopolítica brasileira no decorrer do século XX. Arno Wehling se encarregou de “redescobrir” a obra, e a ele devemos esse revival de um trabalho relevante na história das ideias no Brasil.
Pode-se dizer que se trata de um ensaio político de planejamento estratégico chamando a atenção da Administração do Império – o opúsculo anônimo estava dirigido às assembleias Geral e provinciais – para os principais problemas detectados pelo jovem historiador como obstáculos conjunturais ou estruturais ao progresso da nação e oferecendo, pragmaticamente, um conjunto de soluções pertinentes a cada problema detectado. Os seis problemas nacionais, apresentados como “proposições enunciadas” e “justificadas” no segundo capítulo do texto original (1849), são os seguintes:
1) Limites (ou seja, as fronteiras ainda incertas do Estado);
2) Situação da capital (com a proposta de sua transferência para o interior);
3) Comunicações interiores (isto é, transportes e mobilidade);
4) Divisão atual em províncias (profunda restruturação territorial);
5) Defesa [interna] (vale dizer, questões de estratégia militar e fortificações);
6) População (imigração e cruzamento de raças, minimizando as “inferiores”).


Problemas
Motivos
Solução
Limites por definir com nove países
Indefinição das fronteiras
Negociações bilaterais
Capital litorânea
Deslocada em relação ao país, sem boas fortificações
Capital interior
Escassez de comunicações internas/mercado interno
Ausência de sistema (“plano combinado”) de comunicações internas, insuficiente ação provincial e inexistência de ação nacional
Articulação de comunicações e rotas comerciais (ex.: tropeiros)
Divisão de províncias do Império
Desigualdade territorial “monstruosa”, caráter inteiramente empírico, indefinição de limites, política joanina errônea de enriquecer e fortalecer o litoral, sem desenvolver as províncias do interior, pequenas províncias com carga tributária inviável
Redivisão territorial, com critérios de equilíbrio e equivalência
Fragilidade da defesa do país
Ausência de pensamento estratégico para a defesa nacional
Maior alocação de recursos, identificação de pontos cruciais e criação de territórios militares
Heterogeneidade da população
Extensão da escravidão africana e forte contingente de indígenas não aculturados
Colonização indígena e europeia e proteção ao cruzamento
Fonte: Wehling, 2013c: 160-201, cf. p. 174.

Cada uma das propostas, e suas respectivas “soluções”, foram extensivamente comentadas pelo historiador Arno Wehling (2013c), e não caberia, nos limites deste ensaio, retomar os argumentos substantivos do historiador oitocentista e a apreciação que deles é feita pelo historiador contemporâneo. Pode-se, no entanto, destacar os elementos de caráter “estratégico” inseridas nessas questões, no que elas possuem de relevância continuada para uma nova reflexão em torno da “construção da Nação”, uma tarefa urgente nos tempos de Varnhagen, e aparentemente ainda válida, hoje, em relação a quase todos os problemas selecionados no ensaio original do brasileiro incógnito de 1849-50.
Restam, portanto, três questões, das seis originais, que ainda possuem um forte caráter estratégico tal como concebido por Varnhagen, e talvez nos mesmos termos que ele atribuiu aos problemas (a) da infraestrutura (comunicações e transportes internos); (b) da divisão regional do país e ao (c) da defesa (ou da segurança) da nação, tão frágil, ou talvez tão insuficiente, quanto a de 150 anos atrás. As reflexões do jovem historiador sobre essas questões permanecem tão relevantes quanto eram importantes os problemas por ele detectados e discutidos em meados do século XIX; suas “soluções” continuam igualmente válidas para essas insuficiências do desenvolvimento nacional.

4. Como o pensamento de Varnhagen se refletiu no Estado imperial?
Varnhagen moldou o pensamento histórico, antropológico e político das elites dirigentes do Brasil desde o Segundo Reinado até a era Vargas, e talvez até a República de 1946. Ele se fez presente em todos os cursos de história dos liceus e das faculdades de Direito, e nas demais instâncias da educação nacional durante mais de três gerações completas, o que representa um bem sucedido fenômeno editorial e de impregnação ideológica raramente visto por outros autores no campo da história nacional até os “fundadores” das modernas concepções historiográficas no pós-guerra.
Varnhagen era politicamente conservador, preferindo um sistema de representação restrita, perfeitamente adequada ao sufrágio censitário que vigia sob o Império (Wehling, 1999: 84). A melhor síntese sobre o seu pensamento político é, mais uma vez, oferecida por esse historiador:
Recusando o absolutismo e temendo a revolução jacobina, em tese, e preocupado, no caso brasileiro, com a massa escrava potencialmente explosiva e com eventuais focos de insatisfação popular das camadas urbanas Varnhagen foi partidário do afunilamento da representação política e desejava concentrá-la na propriedade rural, no comércio e na alta burocracia. Defendeu sempre um censo alto para o alistamento eleitoral e o sufrágio indireto [no Memorial orgânico], mas, como já ressaltou Américo Jacobina Lacombe, propugnava o voto secreto. Sua ética não permitia coonestar eleições fabricadas. (p. 84-85)

Continua o historiador, atual presidente do IHGB:
No Memorial orgânico, na obra historiográfica e na Correspondência, inclinou-se claramente para a filosofia política, conservadora, mas não reacionária, como um liberal da primeira metade oitocentista, isto é, antidemocrático. Aliás, apenas endossava a opinião dominante da época do Regresso e limitava-se a defender a própria regra constitucional.
(...) Suas inclinações antidemocráticas o levariam mesmo, em torno a 1850, a considerar seriamente a possibilidade de abandonar o constitucionalismo liberal... (p. 85)
(...) [A ideologia do Regresso assumia] papel semelhante ao das ideias liberais que circulavam na Europa após a restauração: um Estado do laissez-faire no plano econômico, mas efetivamente gendarme no plano social e político, isto é, mantenedor do statu quo institucional, assegurado pelo controle do poder político pelos proprietários através do sufrágio censitário e indireto. (p. 87-88)
(...) Para Nilo Odália [1979; 1997], que neste ponto acompanharemos, Varnhagen foi um dos intérpretes mais qualificados do projeto político conservador que definiu o Estado imperial e que se caracterizava por: (a) atribuir ao Estado um papel não só político, mas de organização social; (...) (b) constituir uma nação branca e europeia; (c) criar um Estado forte e centralizado que, por sua vez, constituiria a nação. (p. 88)

Esse era o universo conceitual, o quadro mental, e a ideologia política no qual se moviam amplos setores das elites patrimonialistas do Império, sobretudo no estamento burocrático no qual se situava Varnhagen, cuja principal preocupação era a manutenção da ordem política, motivo pelo qual, mesmo liberais de fachada tendiam a favorecer e promover um Estado forte como garantia da continuidade da obra de “construção da Nação”, que eles concebiam como unicamente possível von Oben, pelo alto, como faria Bismarck logo mais adiante. Esse conjunto de concepções estatizantes e nacionalistas moldaram o pensamento de Varnhagen, o que fazia com que sua obra histórica se ajustasse perfeitamente aos “instintos” políticos e intelectuais de amplas frações das elites dirigentes do país, tanto do Império quanto do período republicano. O mesmo molde geral também se refletia nas suas concepções em relações internacionais, como destaca, mais uma vez o mesmo historiador especialista no sorocabano:
Embora defendesse soluções diplomáticas [aos conflitos externos com Estados limítrofes, com os quais existiam territórios fronteiriços mal delimitados], Varnhagen realmente encarava a guerra ao estilo de Clausewitz...  (p. 93)

Após resumir os principais pontos do Memorial na sua tese de 1999, e examinar a natureza das “soluções” propostas, o mesmo Wehling sintetiza de modo feliz o pensamento de Varnhagen, neste curto parágrafo e em passagens subsequentes:
Percebe-se aqui quanto de ancien régime subsistia na concepção de Varnhagen e como sua ideia de monarquia aristocrática chocava-se com os novos tempos do liberalismo e da monarquia constitucional.
(...) Em todas as medidas propostas por Varnhagen no Memorial orgânico ressalta a atuação direta do Estado. Centralizar a capital, definir limites, redividir o país, criar sistemas viários e de defesa e redefinir a composição étnica da população eram soluções que necessariamente passavam pela presença estatal. A esse patrimonialismo hobbesiano não ocorreriam as soluções, por exemplo, do liberalismo clássico, como as de Adam Smith ou, mais radicais, as de seu contemporâneo Herbert Spencer. Oscilando entre a nostalgia da monarquia tradicional portuguesa da época do Renascimento e o voluntarismo político pombalino, Varnhagen considerava tais propostas ainda exequíveis em meados do século XIX. (p. 99-100)

Não surpreende, assim, que armado de todas essas concepções, que podem ser descritas como ativamente conservadoras, Varnhagen continuasse a atrair os favores de toda uma elite e de gerações de litterati que não lhe eram muito distantes, seja no pensamento político, seja nas propostas sociais, já bem entrado o século XX. Será preciso esperar o entre-guerras, e a emergência de uma nova teoria social brasileira – com, entre outros, o marxista Caio Prado Jr., o historiador weberiano Sérgio Buarque de Holanda e o antropólogo cultural Gilberto Freyre –, para que esse edifício conceitual do conservadorismo liberal de fachada começasse a ser substituído por uma nova ciência social e historiográfica mais conforme aos tempos de ascensão das camadas médias liberais. Os tempos de Varnhagen, enquanto figura dominante na historiografia brasileira, chegavam ao final, com a ascensão de outros pesquisadores nesse terreno, entre eles um crítico contundente daquela historiografia, que foi o historiador José Honório Rodrigues.

5. Qual o legado desse pensamento na construção do Estado brasileiro moderno?
Varnhagen impactou diretamente o pensamento historiográfico nacional durante mais de meio século, e residualmente bem além disso. Pode-se dizer que todos os homens de Estado, parlamentares, magistrados, diplomatas, acadêmicos e os membros cultos da sociedade, ou seja, praticamente a integralidade da elite brasileira, passou a oferecer um relato da história do Brasil com base no seu magnum opus de pesquisa historiográfica.
Esses legados de que compartilhavam tanto Varnhagen quanto Paranhos Jr. – o da defesa da primazia do Executivo em momentos de debates acirrados no seio do corpo parlamentar, o da estabilidade institucional, os da união nacional e da integridade territorial da pátria – são os mesmos que penetraram nos corações e mentes dos principais líderes nacionais, civis e militares, ao longo das décadas e décadas que se seguiram à estabilização do país, desde o final do período regencial. Os militares, mais até do que os civis, serão bem mais ciosos na defesa desses princípios e valores, e eles o demonstraram diversas vezes, com suas intervenções recorrentes na vida política, desde antes do final do Império e no decorrer da República até 1985. De certa maneira, eles constituem uma espécie de “pensamento estratégico” que vai se refletir nas obras e nas ações de diversos agentes públicos desde essa época de transição do Império para a República, independentemente dos partidos ou das filosofias políticas a que se vinculavam esses líderes e estadistas da nação.
Os geopolíticos brasileiros do século XX partilham com Varnhagen as mesmas preocupações fundamentais dessa categoria especial de pensadores: a segurança e o desenvolvimento da nação, com base numa atuação específica do Estado dirigida ao território (defesa, organização espacial, infraestrutura) e população (capacitação técnica, formação educacional, elevação dos padrões de produtividade). Mas, paradoxalmente, foram poucos os pensadores dessa vertente que se referem diretamente a Varnhagen, ou tomam apoio no Memorial Orgânico de 1849 para elaborar a respeito do conjunto de tarefas que o historiador oitocentista havia concebido como parte de uma missão para “civilizar” o Brasil. No período anterior à Segunda Guerra Mundial, a preocupação maior desses pensadores é a questão da “projeção continental” do Brasil...
O desconhecimento da obra precocemente “geopolítica” de Varnhagen, ou seja, basicamente do seu Memorial de 1849, por esses eminentes pensadores da geopolítica brasileira do século XX, se explica provavelmente pelo fato de que o texto original e a sua “reedição” improvisada numa revista relativamente marginal do Segundo Império permaneceram ignorados da maior parte da intelligentsia brasileira na era republicana, com exceção dessas rápidas referências à transferência da capital, provavelmente feitas a partir de remissões secundárias. No entanto, vários dos componentes conceituais do pensamento de Varnhagen aparecem nas reflexões dos pensadores do século XX, a começar pelo primeiro grande geopolítico, Mário Travassos, que já se preocupava, desde os anos 1930, como fez Varnhagen, quase um século antes, com as interligações entre as bacias hidrográficas do vasto interior brasileiro, e a construção de uma rede de comunicações que assegurasse ao Brasil a posse efetiva desse grande espaço territorial.
Essa ignorância, ou esse desconhecimento da obra do mais “geopolítico” dos historiadores brasileiros do século XIX pelos pensadores estratégicos do século XX pode ser frustrante para o estudioso que se debruça sobre a contribuição, a todos os títulos meritória, do historiador de Sorocaba para uma reflexão bem informada sobre os principais problemas brasileiros atinentes ao território, ao seu povo, à defesa da nação. Não obstante essa ausência de menção a Varnhagen, cujo pensamento propriamente “estratégico” não foi, assim, devidamente incorporado, ou não recebeu continuidade na obra dos geopolíticos brasileiros do século XX, cabe destacar que todos os elementos relevantes da doutrina e da metodologia geopolítica contemporânea, em geral e do Brasil, estavam seja em germe, ou se manifestavam explicitamente, na obra pioneira de Varnhagen, de forma mais sistemática no Memorial de 1849, mas também de modo esparso, e bem presentes, no História Geral.

6. Existe uma modernidade em Varnhagen?
Varnhagen foi refutado em várias de suas “opiniões” sobre os grandes problemas brasileiros, e algumas de suas soluções – em relação aos índios, por exemplo – já não eram “politicamente corretas” mesmo numa época de hegemonia do homem branco, europeu, sobre todas as demais “raças”. Que algumas de suas propostas tenham ressurgido de forma modificada nos anos e décadas transcorridos desde então apenas prova a resiliência dos problemas e, provavelmente, a importância de sua reflexão pragmática para o encaminhamento de alguma solução para eles.
Mas, pergunto, as reflexões e propostas de Varnhagen, notadamente no Memorial, para os problemas brasileiros de meados do século XXI poderiam ser transpostos, com as adaptações de praxe, aos problemas brasileiros do início do século XXI? Seria possível tomar inspiração no pensamento estratégico do jovem historiador de 33 anos para impulsionar esforço similar, de oferecer soluções a vários problemas que não parecem ser muito diferentes, hoje, do que eram para o Brasil em construção de 170 anos atrás?
Inspirado, portanto, naquele primeiro esforço de reforma da nação, e adotando a forma sintética elaborada pelo historiador Arno Wehling, vejamos que tipo de esforço racionalizador poderia ser feito hoje, para encaminhar alguns dos grandes problemas pendentes da nacionalidade.

Memorial pragmático para a reforma da Nação (2016)
Problemas
Motivos
Solução
Retrocesso econômico, desorganização produtiva
Desindustrialização, exportações de commodities
Esforço concentrado em ganhos de produtividade
Descolamento dos mercados internacionais
Perda de competitividade por excesso de tributação
Reforma tributária, redução da carga fiscal, globalização
Deficiências de infraestrutura
Inexistência de ação estatal por inépcia e falta de recursos
Privatização extensiva em todas as áreas de logística
Desigualdades regionais persistentes
Políticas de “desenvolvimento regional” baseadas em induções equivocadas
Atendimento das vantagens comparativas ricardianas nas especializações regionais
Fragilidade da defesa do país
Inadequações do pensamento estratégico para a defesa; autonomia sem base no PIB
Maior alocação de recursos, mas busca de sinergias na cooperação com aliados
Heterogeneidade da população em termos de capacitação profissional
Deficiências graves na qualidade da educação de base; professores ineptos
Reforma radical do ensino público; acolhimento de imigrantes
Fonte: Elaboração de Paulo Roberto de Almeida, inspirado no Memorial Orgânico de Varnhagen (1849-50), tal como sintetizado por Wehling (2013c: 174).

Registre-se, desde logo, que as três questões centrais são praticamente as mesmas – infraestrutura de comunicações e transportes, desequilíbrios regionais e deficiências na defesa nacional –, ao passo que as duas primeiras – limites com os vizinhos e transferência da capital – já se completaram, por assim dizer, enquanto que a última – heterogeneidade da população – adquire hoje características essencialmente sociais, e não mais raciais (a despeito dos esforços atuais de militantes negros para, com o apoio do governo, separar de modo artificial a cultura dominante a pretexto de uma “dívida histórica” de gerações passadas ou de particularismos raciais ou étnicos).
Varnhagen, se pudesse revisitar o Brasil neste momento de crises estruturais que o país vive – economicamente, institucionalmente, moralmente – talvez encontrasse motivos para reescrever o seu Memorial de 1849. Como vimos, ele precisaria mudar algumas coisas, talvez importantes, mas de todo modo suscetíveis de incorporação a um pensamento estratégico tão ágil, e aberto às mais diversas inteligências, quanto era o seu. Em outros aspectos, sua identificação de problemas e suas propostas de soluções permanecem válidas no todo (infraestrutura, por exemplo, ou mesmo acolhimento de imigrantes) ou parcialmente (defesa, desequilíbrio regional), necessitando apenas as adaptações metodológicas ou substantivas tal como foram apresentadas em nossa tabela de “reformas pragmáticas”. Um pensador estratégico como era ele saberia identificar rapidamente os novos problemas (vários, aliás, muito velhos, como é o da educação) e propor algum consenso político em torno de reformas modernizadoras.
O que ele se propunha, no seu Memorial de 1849, finalmente, era nada mais, nada menos que as elites nacionais empreendessem um grande projeto para “civilizar” o país, e enriquecer a nação. A missão permanece válida nos dias de hoje, inclusive porque, visivelmente, vários dos atuais problemas do Brasil parecem ser quase os mesmos de 170 anos atrás; as soluções também podem ser relativamente similares, ou pelo menos, funcionalmente equivalentes. Talvez Varnhagen reclamasse apenas da falta de estadistas com os quais dialogar e para os quais propor soluções...

Paulo Roberto de Almeida
1/04/2016

Quando Tocqueville andou pelo Brasil (nao faz muito tempo: juro que me perguntaram) - Paulo Roberto de Almeida

Acontece cada uma...
Como eu falava de uma missão, bem tardia, de Tocqueville por estas bandas, alguém me perguntou, assim inocentemente, quando é que ele tinha vindo ao Brasil.
Pois é, não faz muito tempo...
Pelo menos de acordo com este relatório:

http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2011/07/tocqueville-de-novo-em-missao-o-brasil.html

Paulo Roberto de Almeida

Livro sobre Varnhagen, a ser apresentado em seminario no IRBr, em 1/04/2016 - capitulo Paulo R. Almeida

Informo (como se diz nos telegramas de chancelaria), sobre meu trabalho mais recente, ainda em revisão para próxima publicação:


2944. O pensamento estratégico de Varnhagen: contexto e atualidade”, Brasília, 23 março 2016, 44 p. Texto preparado para o seminário “Varnhagen (1816-1878): diplomacia e pensamento estratégico”, realizado em 1/04/2016 no Instituto Rio Branco, e destinado a integrar livro a ser publicado pela Funag: Varnhagen: diplomacia e pensamento estratégico (em preparação). Disponível na plataforma Academia.edu (https://www.academia.edu/23891582/O_pensamento_estrat%C3%A9gico_de_Varnhagen_contexto_e_atualidade).

 

Eis o índice do livro, ainda com título provisório: 

Varnhagen (1816-1878)
Diplomacia e pensamento estratégico
 

 
Sumário

Apresentação
   (Ministro de Estado das Relações Exteriores)
Prefácio
       Sérgio Eduardo Moreira Lima

1. Integridade e integração nacional: duas ideias-força de Varnhagen
       Arno Wehling
2. Varnhagen: A formação do Brasil vista de “fora” e de “dentro”
       Luiz Felipe de Seixas Corrêa
3. A geração de Varnhagen e a definição do espaço brasileiro
       Synesio Sampaio Goes Filho
4. O descobridor de Brasília: Varnhagen, ideólogo da modernização
       Carlos Henrique Cardim
5. O pensamento estratégico de Varnhagen: contexto e atualidade
       Paulo Roberto de Almeida
6. Varnhagen e a América do Sul
       Luis Cláudio Villafañe Gomes Santos

Notas sobre os autores

E o que selecionei como frontspício (mas não sei se será mantido):

Acabemos pois com as adulações, que elas, longe de fomentar o patriotismo, ocasionam a incúria e o desleixo. Se acaso censurais ou lamentais este ou aquele vício na administração, este ou aquele cancro consumidor do país, nunca faltará uma voz que vos diga: “Ora! O país é grande: temos muitos recursos: no futuro seremos e aconteceremos etc. ...” Desgraçados! E que havemos de ser, se não pomos de nossa parte os meios? (...) Porventura a natureza portentosa do Brasil já não era a mesma na época do descobrimento?

Memorial Orgânico que à consideração das Assembleias Gerai e provinciais do Império apresenta um brasileiro
Dado à luz por um amante do Brasil
[Francisco Adolfo de Varnhagen]
 (edição incógnita, impressa em Madri, em 1849, capítulo primeiro: “Alguns enunciados”).



Francisco Adolfo de Varnhagen apresenta uma “resumida alegação do que tem feito em prol do país”, não só vários trabalhos historiográficos, aos quais tem dedicado “muitas horas, e muitos dias passados que pudera, depois de preencher os deveres da Secretaria, e os de representação, entregar à distração, os entregou ao Brasil, roubando-os por ventura alguma vez ao sono”, como, por exemplo, “com o escrever a História do Brasil para oferecer à S. Majestade”, além de “sérios estudos... sobre outros pontos de nossa pública administração, e a dizer por escrito ao país muitas verdades em vez de o adular...”

 “Memorial” enviado ao Ministro do Império pelo recém designado Encarregado de Negócios em Madri, nas últimas semanas de 1851; constante do Arquivo Imperial em Petrópolis, in: Clado Ribeiro de Lessa (org.); Francisco Adolfo de Varnhagen. Correspondência Ativa. Rio de Janeiro: INL, 1961, pp. 167-8.