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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

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sexta-feira, 22 de junho de 2018

William Blake, o poeta romantico por excelencia - Stephen F. Eisenman (book excerpt)

William Blake and the Age of Aquarius
By Stephen F. Eisenman
excerpts Delanceyplace
Though not widely known for his poetry and paintings during his lifetime, and considered somewhat mad because of his mystical and highly expressive work, William Blake (1757-1827) was a well-regarded artist of the Romantic age. His influence on the world of art and literature in the 1950s and 1960s vaulted his reputation to the highest levels, where it remains. He had particularly strong influence on children's authors such as Maurice Sendak:
"Blake's Songs of Innocence and of Experience was written partly for children. The poems employ simple concrete language, repetition, rhymes and near rhymes, and a constant number of beats per line, ensuring melodic regularity. (Irregular line lengths and an extra accented syllable at the end of some lines ensured variety.) But whereas most Enlightenment thinkers, such as Locke, saw children as blank slates, Blake described them as possessed from the beginning of fear, anger, and love -- treasures implanted by God. We are all, as Hendrix would say, 'experienced' from the start.

"And unlike most artists and writers or his time, for example his friend Mary Wollstonecraft, who saw childhood as a life stage uncontaminated by corruption, Blake saw it is a period of untamed desire, turmoil, and loss. Children are lost and found, born into slavery and oppression, and forced to work as chimney sweeps. Though the 'Ecchoing Green' from Songs of Innocence (fig. 54a/b) is a place of 'sunrise,' 'happy skies,' and 'bells cheerful sounds,' it is also a place where 'the sun does descend' and 'sports no more seen on the darkening green.' The words and images of this song describe a single day of childish play followed by return home for rest, but they also suggest the passage from youth to maturity, even hinting -- with the word darkening­ -- at death and corruption. The word ecchoing, with its archaic spelling, suggests an earlier time when people and the land heard each other's voices and even protected each other. In the time of darkening those echoes are silenced.

"Blake's Songs were obviously not written only for children, and many writers and artists of the late 1950s and 1960s explored their basic dialectic of innocence and experience. Pediatrician (and later antiwar activist) Benjamin Spock, child psychologist Bruno Bettelheim, and children's book authors E. B. White and Maurice Sendak, among others, reconsidered the psychological and emotional lives of children, diagnosing terrors, violence, ultra-aggressive urges, and dangers as much as joy and love. Sendak, who called Blake 'from the first, my great and abiding love ... my teacher in all things,' is crucial in this lineage -- and in the exhibition Blake and the Age of Aquarius -- because he not only borrowed from Blake but also deeply understood him. In Where the Wild Things Are (1963), the little boy Max, like the child in Blake's 'Little Boy Lost' and 'Little Boy Found,' is shown to possess two opposing mental states. He imaginatively indulges his most exuberant desires (experience) for mastery of the beastly 'Wild Things' before returning at the end of the story to the safety of home and family (innocence)."
"A Little Boy Lost"

Nought loves another as itself,
Nor venerates another so,
Nor is it possible to thought
A greater than itself to know.

'And, father, how can I love you
Or any of my brothers more?
I love you like the little bird
That picks up crumbs around the door.'

The Priest sat by and heard the child;
In trembling zeal he seized his hair,
He led him by his little coat,
And all admired the priestly care.

And standing on the altar high,
'Lo, what a fiend is here! said he:
'One who sets reason up for judge
Of our most holy mystery.'

The weeping child could not be heard,
The weeping parents wept in vain:
They stripped him to his little shirt,
And bound him in an iron chain,

And burned him in a holy place
Where many had been burned before;
The weeping parents wept in vain.
Are such thing done on Albion's shore?


"The Little Boy Found"

The little boy lost in the lonely fen,
Led by the wandering light,
Began to cry, but God, ever nigh,
Appeared like his father, in white.

He kissed the child, and by the hand led,
And to his mother brought,
Who in sorrow pale, through the lonely dale,
The little boy weeping sought.

William Blake and the Age of Aquarius
Author: Stephen F. Eisenman
Publisher: Princeton University Press
Copyright 2017 by Mary and Leigh Block Museum of Art
Pages: 69 - 71

quinta-feira, 21 de junho de 2018

Paulo Guedes expoe o nucleo de sua reforma economica - entrevista Gazeta do Povo

O que pensa o ministro da Fazenda de um eventual governo Bolsonaro

Paulo Guedes, coordenador do programa econômico de Bolsonaro, defende uma agenda econômica liberal e uma aliança de centro-direita para tirar o país da crise

 | Hugo Harada
Coordenador do programa econômico do pré-candidato Jair Bolsonaro (PSL) à Presidência da República, o economista Paulo Guedes defende uma agenda econômica liberal e uma aliança de centro-direita para tirar o país da crise. Ele diz que um eventual governo Bolsonaro terá como prioridade a resolução da crise fiscal, com corte de gastos, privatizações, concessões e desimobilizações para pagamento da dívida pública, reforma tributária, lançamento de um novo regime previdenciário com base no sistema de capitalização e descentralização dos recursos da União para Estados e municípios, o que também garantiria a governabilidade. Só assim, segundo o economista, será possível alcançar o “progresso”.
Guedes, que é um economista liberal, foi convidado pelo próprio Bolsonaro para montar o programa econômico do pré-candidato a presidente. Caso o pré-candidato do PSL vença as eleições, Guedes deve ser o novo ministro da Fazenda, que em um eventual governo Bolsonaro se chamará Ministério da Economia. Seria a primeira vez que o economista ocuparia um cargo no Poder Executivo. 
O economista e ex-banqueiro já recebeu alguns convites, mas sempre negou as investidas. A única participação dele na política foi em 1989, ano da primeira eleição direta para presidente, quando montou o plano econômico de Guilherme Afif Domingos. Chamado de “Juntos chegaremos lá”, o programa era liberal, defendia o famoso tripé macroeconômico, um Banco Central independente e privatizações para redução da dívida pública.
Quase trinta anos depois, pouco mudou na agenda econômica de Guedes. Mas os desafios ficaram ainda maiores. A dívida pública federal chega a R$ 3,658 trilhões, o déficit primário é de 1,78% do Produto Interno Bruto (PIB), o desemprego ainda atinge 13,4 milhões de trabalhadores, reformas estruturais não foram feitas e a retomada da economia está acontecendo de maneira mais lenta do que o previsto.
Em entrevista à Gazeta do Povo, o economista criticou os planos econômicos adotados desde a redemocratização, falou sobre as principais ideias para atacar a crise fiscal e afirmou que o programa econômico liberal de Bolsonaro, chamado até então de “O caminho da prosperidade”, representará o “progresso”, enquanto os ideais de Estado, defendidos pelo capitão da reserva, como preservação da vida e da propriedade, representarão a “ordem”.

Confira os principais trechos da entrevista, concedida por telefone:

Gazeta do Povo - Quais devem ser as prioridades econômicas de um eventual governo Bolsonaro?

Paulo Guedes* - Por trás do programa econômico do Jair Bolsonaro existe um diagnóstico, que é o seguinte: os gastos do governo subiram descontroladamente por décadas. Foi isso que nos levou à hiperinflação, à moratória externa e é isso que nos está levando hoje ao endividamento em bola de neve. Pela primeira vez, a dimensão fiscal é o coração de um plano. O Plano Cruzado foi congelar preços. O Plano Collor foi congelar poupança. O Plano Real foi o choque monetário. Qual foi o erro de todos eles? Faltou a todos os planos a dimensão fiscal. Esse descontrole de gastos corrompeu a nossa democracia e levou à estagnação econômica. É a exaustação do modelo social-democrata. 

Como resolver a crise fiscal do país? É possível fazer isso sem aumentar impostos?

Começou a diferença entre um social-democrata e um liberal-democrata. Como é o social-democrata, sobe impostos. Como é o liberal-democrata, de jeito nenhum. Nós não vamos aumentar impostos. Olhando para um horizonte mais longo, nós não gostaríamos que tivesse nenhuma alíquota acima de 20%. A ideia é fazer uma brutal simplificação de impostos, com redução de alíquotas e ampliação de base de incidências. Ou seja, quem já paga tem que pagar dali para baixo. E a meta, ao longo desses quatro anos, é ir reduzindo alíquotas. E se houvesse governo de oito anos, em oitos anos chegar a não ter alíquota mais do que 20%. Hoje tem gente que paga 0% e gente que paga 40%. Nós preferimos que todo mundo pague, no máximo, 20%. Hoje tem vários impostos que têm isenções, como LCI, LCA, letra de câmbio agrícola, letra de câmbio imobiliário, vários grandes fundos que não pagam impostos. Da mesma forma, a pessoa física paga 27,5%, daí o sujeito faz uma pessoa jurídica e paga 17,5%. Está errado. A ideia é ampliar a base e reduzir as alíquotas.

Se vocês não vão subir impostos, o que fazer para resolver a crise fiscal?

Primeiro vamos atacar as despesas discricionárias. A maior dela, a prioritária, que inclusive estava sendo parte da agenda desse governo, é a da Previdência. Depois, você tem que tentar olhar para as [despesas] não discricionárias. Se eu entrar em privatizações, concessões, desimobilizações e reduzir a dívida, eu comecei atacar as despesas não discricionárias. Então, são três grandes despesas: a previdenciária, a administrativa (que eu ataco através da reforma do estado) e a de juros.

Qual é a sua proposta para a reforma da Previdência?

A Previdência brasileira é uma fábrica de desigualdade, entre o funcionalismo público e o privado e mesmo dentro do funcionalismo público. Ela também está quebrando antes do país envelhecer. Terceira coisa: o financiamento dela, ou seja, os encargos trabalhistas são uma arma de destruição em massa de empregos. Eles são tão altos que para um brasileiro conseguir emprego o outro tem que ficar desempregado. A alíquota é tão alta que a base é pequena. É muito melhor ter alíquotas mais baixas para todo mundo contribuir.
Nós estamos estudando uma reforma da Previdência para atacar todas as dimensões do problema. A primeira coisa é uma espécie de renda mínima para os idosos. Hoje, você mistura assistencialismo com Previdência. A segunda coisa é que nós temos que fazer uma transição do sistema de repartição para o sistema de capitalização. O sistema de repartição é uma covardia contra nossos filhos e netos. O sistema já está quebrando hoje, quando eles chegarem lá não vai ter aposentadoria para eles. Temos que permitir que eles se libertem, que eles não entrem nesse avião que está caindo. Uma coisa somos nós que já estamos nesse regime. Outra são nossos filhos e netos. É uma covardia você deixar para as gerações futuras um sistema de repartição. Você tem que fazer um sistema de capitalização. E isso vai dar um choque de empregabilidade, porque nós vamos reduzir dramaticamente os encargos trabalhistas, vamos mudar a base de incidência.

Seria uma forma de atacar tanto a reforma da Previdência quanto a geração de empregos?

Os dois estão associados. Você só vai resolver o problema da Previdência fazendo a transição de um regime para o outro. E isso gera um choque de empregabilidade, criando milhões de empregos. Quem está no atual fica no atual. O liberal sempre oferece uma opção. Quem quer ficar nesse, fica nesse. Os jovens vão ter o direito de escolher se eles querem ficar no avião que está caindo ou se eles querem ir para o novo regime trabalhista e previdenciário.

Mas o senhor não vai mexer no sistema atual da Previdência? 

Tem um sistema que está aí com problemas que vai ter que ser equacionado. É um problema que vai ter que ser atacado. Tem o outro lado disso: ao invés de ficar fazendo remendando para as gerações mais novas, temos que oferecer uma alternativa. 

Então, quando o senhor citou a mudança para o regime de capitalização e a redução dos encargos, isso tudo seria para o novo regime?

Exato. Vem um novo regime aí que vai criar tanto emprego que vai mostrar tão errado como está o antigo. E aí vai ter fila de gente querendo entrar.

E as pessoas que estão no antigo regime vão conseguir entrar no novo?

Isso nós vamos discutir. Se quiser pagar o custo, pode. Está disposto a vender a Petrobras? A Eletrobras? Eu vou proteger a nova geração.

Além da reforma da Previdência, vocês propõem enxugamento da máquina pública para cortar gastos? Redução de ministérios?

Isso é simbólico e é importante logo no início: uma redução dramática de ministérios, no máximo 15. Só que mais do que isso: nós queremos trocar o eixo. No antigo regime, o governo investe em infraestrutura, tem uma porção de empresas estatais, fica se endividando em bola de neve. O governo carrega ativos mal geridos e focos de corrupção.

O senhor está falando das estatais? 

Entre outras coisas. Estou falando do prédio que caiu em São Paulo. Aquilo era um ativo da União, valia R$ 100 milhões. Esse valor a 10% ao ano, que foi o juro médio nesses últimos anos, dá R$ 10 milhões. Ou seja, tinha dado casa apara todo mundo que estava ali. Ativo mal gerido. Estamos estudando uma reforma do Estado. Dentro da reforma do Estado, você tem privatizações, concessões e desimobilizações.

O senhor defende a privatização de todas as estatais?

Sempre que eu respondo isso, as pessoas dizem: “radical, liberal”. Me diga quais que você não quer [privatizar]? Você quer os Correios que entregam carta atrasada e teve o estouro do mensalão lá dentro? Você quer a Petrobras, mal gerida durante muitos anos e foco de corrupção? Ou vamos supor que a Petrobras é bem gerida, mas quem disse que a gente quer o monopólio no refino? Viu o rolo que deu na logística do país por causa do monopólio do refino? Ter monopólio é ruim para o consumidor, é ruim para a cadeia produtiva, cria nós logísticos. 
O ônus da prova é o contrário. Hoje, você tem que provar que deve privatizar uma empresa. Eu acho que deve ser o seguinte: prova para mim qual que deve ficar estatal?

O dinheiro das privatizações seria usado para pagar os juros da dívida pública?

Na hora que eu privatizo, eu começo a reduzir a conta de juros, que eu sou obrigado a pagar. Quando você privatiza e você reduz a dívida, você libera centena de bilhões de reais para as áreas sociais. Mas nós vamos descentralizar isso [para Estados e municípios]. Hoje, a União carrega um monte de estatais, para ganhar dividendos, e se endivida em bola de neve. Na hora que você vende ativos, você reduz a sua dívida. Se está na mão do estado, vai virando foco de corrupção e vai se tornando menos eficiente. As estatais não têm mais capacidade de investimento. Por exemplo, a Eletrobras está sem capacidade de investimento. Vai dar apagão no país em quatro anos. Ou você privatiza ou vai ficar sem educação, sem saúde, sem luz e pagando juros. Na hora que você privatizar, você não está só matando dívidas, você está atraindo centenas de milhões de dólares para investimento em infraestrutura brasileira. O governo está privatizando para reduzir divida, levar o dinheiro para área social e, ao mesmo tempo, atraindo investimento privado. Tem 20 a 30 anos que estamos fazendo “crowding out”, ou seja, expulsando investimento privado. Nós vamos fazer 30 anos de “crowding in”, nós vamos estimular o investimento privado a entrar nessas áreas todas [que serão privatizadas]. Por isso que precisamos privatizar.

Então o senhor defende a manutenção de programas sociais? 

Evidentemente que sim. Até queremos ampliar. Por isso que tem que ter as privatizações. Quanto mais eficiente você for, mais fraterno você pode ser. É uma indecência você gastar um plano Marshall l por ano com juros. O Brasil reconstrói uma Europa por ano [com o que paga de juros da dívida pública].

O senhor está falando de reformas grandes. Um eventual governo Bolsonaro teria força para implantar essas reformas?

Nós vamos chegar lá. Eu estou te dando uma visão de futuro de país. Nós temos que trocar o eixo público. Nossa visão de futuro é não mexer nos programas [sociais]. Aumentar, se puder. Em vez de ser o governo federal ficar cheio de empresas estatais, fazendo infraestrutura, queremos os governos municipais e estaduais com esse dinheiro fazendo a área social. Quero descentralizar. Queremos o pacto federativo.

O senhor quer dizer que a revisão do pacto federativo está ligada à estratégia de conseguir governabilidade?

Essa visão de futuro vai dar a governabilidade. Estados e municípios, vocês querem dinheiro para fazer a área social? Aprovem nosso programa de privatizações. A governabilidade será uma aliança política de centro-direita. Quem é social-democrata está governando o país há 30 anos, aumentou os impostos, estagnou a economia, corrompeu a política. Teve coisas boas também, como abriu os orçamentos públicos para a área social. 
O estado estava fazendo infraestrutura com estatais. Nós temos uso melhor para isso. Preferimos privatizar e deixar o setor privado fazer esse investimento de infraestrutura. Aí reduzimos dívida, liberamos recursos para estados e municípios, e eles vão atacar essa área social.

O senhor vem de uma corrente de pensamento liberal da economia, mas o deputado Jair Bolsonaro já demonstrou apoiar ideias estatizantes e nacionalistas. Como tem sido as conversas com o deputado e como os senhores têm resolvidos suas discordâncias para montar o plano econômico do pré-candidato?

Isso foi verdade. Só que os economistas brasileiros levaram oito anos para chegar à política monetária certa, 12 anos para chegar à política cambial adequada e 14 anos para chegar à responsabilidade fiscal. Tão querendo que o Bolsonaro faça isso tudo em seis meses. Eu confesso que o Bolsonaro está indo mais rápido do que eles [economistas]. Ele não chegou onde eles estão hoje. Hoje, eles estão na frente. Mas Bolsonaro só está há seis meses nessa linha. Eles ficaram 14 anos. Eles não podem quer que o Bolsonaro entenda em seis meses o que eles levaram anos para entender. 

Mas o Bolsonaro está neste caminho?

Sim, está nesse caminho.

E o senhor está tendo liberdade para montar o plano econômico?

Ele está fazendo a campanha e está delegando a parte de economia. Então, realmente, quem está fazendo o plano sou eu mesmo. 
É uma aliança política de centro-direita em torno de um programa econômico liberal-democrata. O Brasil dos últimos 30 anos sempre foi uma aliança de centro-esquerda, em torno de um programa social-democrata. Ele [Bolsonaro] não está preocupado se eu sou liberal e eu não estou preocupado se ele é estatizante. Porque é uma aliança de centro-direita em torno de um programa liberal-democrata. Então, o programa não vai ser nem tão liberal como eu sou, nem tão estatizante quanto ele seria, o que eu não acho que ele é mais. 

Em que fase está a elaboração do plano?

Estamos nas diretrizes e primeiras simulações. Têm umas 30 pessoas ajudando, incluindo ex-diretor de Banco Central, do BNDES, gente que já esteve no Ministério da Fazenda e muita gente jovem e bem informada. É um plano que trabalha com essa visão de futuro que eu te falei. E essa visão de futuro é “ordem e progresso”. Ordem é estado de direito, governo constitucional democrático, livre imprensa, império da lei, federação forte, poderes independentes. E o que é progresso? Recuperação do equilíbrio fiscal, aceleração do crescimento e geração de empregos, promoção do novo pacto federativo com descentralização de recursos para estados e municípios, redução da dívida pública com privatizações, concessões e desimobilizações para viabilizar o corte de juros e atrair investimentos privados para infraestrutura, redução e simplificação de impostos, adoção do regime de capitalização na previdência, desburocratização da economia, abertura da economia para aumentar o grau de competição e reforma do estado, que sai da área de infraestrutura e vai para a área social.
*Paulo Guedes é economista com PhD pela Universidade de Chicago, referência do pensamento econômico liberal. Foi um dos fundadores do banco Pactual (atual BTG) e é fundador e sócio majoritário do grupo financeiro BR Investimentos, hoje parte da Bozano Investimentos. É, ainda, ex-CEO e sócio majoritário do Ibmec e um dos fundadores do Instituto Millenium. Foi também integrante do conselho de administração de empresas como PDG Reality, Localiza e Anima Educação. Além da carreira como economista e banqueiro, tem vasta atuação acadêmica: foi professor de macroeconomia na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), na Fundação Getulio Vargas (FGV) e no Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA) no Rio de Janeiro.

quarta-feira, 20 de junho de 2018

Brasil falindo ou ja falido? Preciso reescrever esse paper - Paulo Roberto de Almeida

Academia.edu me cumprimenta por este paper: 

Brazil as a Failing State (or, is it already a Failed State?)”, Brasília, 12 June 2017, 15 p. Note of opinion drafted for the Estoril Political Forum, Panel Brazil, June 27, 2017. Divulgado no blog Diplomatizzando(26/06/2017; link: http://diplomatizzando.blogspot.pt/2017/06/brasil-existe-uma-crise-da-democracia.html), disseminado no Facebook (https://www.facebook.com/paulobooks/posts/1569376183125826). Postado na plataforma Academia.edu (18/06/2018; link: https://www.academia.edu/36866539/Brazil_as_a_Failing_State_or_is_it_already_a_Failed_State_-_Estoril_Political_Forum_2017); postado novamente no blog Diplomatizzando (19/06/2018; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/06/brazil-as-failing-state-or-is-it.html).

Paulo Roberto de Almeida

Hi Paulo Roberto, 
Congratulations! You uploaded your paper 2 days ago and it is already gaining traction. 
Total views since upload: 
You got 50 views from the United States, Brazil, Angola, Portugal, Argentina, Ukraine, and Romania on "Brazil as a Failing State (or, is it already a Failed State?) - Estoril Political Forum 2017". 
Thanks,
The Academia.edu Team

Creio que vou ter de reescrever esse paper. Eu tinha sido muito cauteloso um ano atrás...
Paulo Roberto de Almeida

Miseria da universidade brasileira: tem remedio? - Artigo de Dennys Garcia Xavier (Gazeta do Povo)

Golpe? É hora do “contragolpe” nas universidades brasileiras


Querem falar sobre impeachment, sobre liberdade ou ciência? Ótimo, é mesmo preciso. Que não seja, entretanto, sob a égide da foice e do martelo balançando sobre nossas cabeças

Dennys Garcia Xavier 
Gazeta do Povo, 20/06/2018

Há vida inteligente dentro da Universidade brasileira e ela está farta de se submeter. Nossa história acadêmica não é muito diversa daquela verificada em outras instâncias dependentes da “arquitetônica do jeitinho”, própria da Zumbilândia chamada Brasil. 
Nos esportes, por exemplo, acontece de modo quase idêntico: não produzimos boa qualidade em série ou de forma sistemática – sequer em quantidade risível – e, então, na maioria das vezes, dependemos de talentos individuais/abnegados que surgem, aqui e ali, também como exceções que confirmam a regra da nossa reconhecida incompetência. 
No mundo das Instituições de Ensino Superior, o tal “curso sobre o golpe”, multiplicado pelas Universidades tupiniquins na velocidade que só a sua mediocridade permitiria, não poderia ficar sem resposta. Resolvemos agir (e não apenas neste caso). 
“Oras, mas não se pode oferecer livremente um curso sobre o tal ‘golpe’, mesmo com clara intenção ideológico-partidária, dentro de uma Universidade?”, alguém poderia justamente perguntar. Claro que pode, responderia eu, mas talvez não deva, especialmente diante de um quadro geral que coloca nosso sistema de ensino entre os piores do mundo, acompanhado de países miseráveis, alguns dos quais em guerra civil declarada. 
É preciso superar a fase do medo de reputações manchadas pelo submundo universitário, das ameaças patrocinadas por colegas, da perseguição sorrateira no interior dos Departamentos e Faculdades. É preciso avançar, mesmo com o inevitável sacrifício pessoal naturalmente derivado do combate a práticas políticas que nos arrastam progressivamente para a periferia da produção científica no mundo. Somos uma pátria de analfabetos/analfabetos funcionais. E a Universidade tem enorme parcela de culpa nesta história. É preciso mudar com máximo senso de urgência. 
A UniLivres, organização de alunos e professores que tem como principal objetivo exatamente a luta pela liberdade dentro das Instituições de Ensino Superior do país, oferece alternativa. Querem falar sobre impeachment, sobre liberdade ou ciência? Ótimo, é mesmo preciso. Que não seja, entretanto, sob a égide da foice e do martelo balançando sobre nossas cabeças. 
Eis aqui proposta concreta: curso de extensão “Democracia e Liberdade em tempos de crise - impeachment e ciência na Universidade brasileira”. Conteúdo ministrado gratuitamente, via WEB, por cinco professores universitários distantes do universo das utopias coletivistas, obtusas e castradoras que nos levaram a fracasso inequívoco. 
Estamos falando de atividade suprapartidária, de abordagem técnica, com bibliografia que não inclui, por exemplo, blogs patrocinados por vassalos de correntes políticas comprometidos com valores dificilmente confessáveis, mas sobremaneira explícitos nas trincheiras sindicais ideologicamente aparelhadas. São cinco módulos de formação, com, em média, uma hora cada, sobre Educação (Profa. Anamaria Camargo), Literatura (Profa. Fernanda Sylvestre), Filosofia (com o autor deste texto), Economia (Prof. Ubiratan Jorge Iorio) e Direito (Profa. Janaína Paschoal). 
Inscrita ou não, qualquer pessoa pode assistir às aulas pela página da UniLivres no Facebook ou pelo  YouTube
A importância de tais iniciativas? Bem, os fatos falam por si com eloquência. 
Há tempos a Universidade brasileira virou as costas para a sociedade que a mantém. Há uma série de fatores que explicam o fenômeno, sem, entretanto, justificá-lo minimamente. 
Em primeiro lugar, a estrutura pensada para as Instituições Públicas de Ensino Superior é o que poderíamos denominar “entrópica”. Com isso quero dizer que passam mais tempo a consumir energia para se manter em operação do que a fornecer, como contrapartida pensada para a sua existência, efetivo aperfeiçoamento na vida das pessoas comuns, coagidas a bancá-las por força de imposição estatal. 
Insisto para evitar mal-entendidos: não desconsidero as contribuições pontuais e louváveis que a custo conseguimos divisar no interior das IPES. No entanto, não é esse o seu arcabouço procedimental de sustentação. Os exemplos de desprezo pelo espírito republicano e pelo real interesse da nação se multiplicam quase que ao infinito: Universidades e cursos abertos sem critério objetivo de retorno, bolsas e benefícios distribuídos segundo regras pouco claras – muitas vezes contaminadas por jogos internos de poder político –, concursos e processos seletivos pensados “ad hoc” para contemplar interesses subjetivos e pouco nobres entre outros. Em texto que contou com grande repercussão nacional, o Prof. Paulo Roberto de Almeida esclarece o que aqui alego: 
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Não é segredo para ninguém que as IPES funcionam em bases razoavelmente “privadas” – isto é, são reservadas essencialmente para uma clientela relativamente rica (classes A, B+, BB, e um pouco B-, com alguns merecedores representantes da classe C), que se apropria dos impostos daqueles que nunca terão seus filhos nesses templos da benemerência pública. Na verdade, essa clientela é a parte menos importante do grande show da universidade pública, que vive basicamente para si mesma, numa confirmação plena do velho adágio da “torre de marfim”. Não se trata exatamente de marfim, e sim de uma redoma auto e retroalimentada pela sua própria transpiração, com alguma inspiração (mas não exatamente nas humanidades e ciências sociais). A Capes e o CNPq, ademais do próprio MEC, asseguram uma confortável manutenção dos aparelhos que mantém esse corpo quase inerme em respiração assistida, ainda que com falhas de assistência técnica, por carência eventual de soro financeiro. 
Nessa estrutura relativamente autista, a definição das matérias, disciplinas e linhas de pesquisa a serem oferecidas a essa distinta clientela não depende do que essa clientela pensa ou deseja, e sim da vontade unilateral dos próprios guardiães do templo, ou seja, os professores, inamovíveis desde o concurso inicial, independentemente da produção subsequente. A UNE, os diretórios estudantis, os avaliadores do Estado, os financiadores intermediários (planejamento, Congresso, órgãos de controle) e últimos de toda essa arquitetura educacional (isto é, toda a sociedade) e, sobretudo os alunos, não possuem nenhum poder na definição da grade curricular, no estabelecimento dos horários, na determinação dos conteúdos, na escolha da bibliografia, no seguimento do curso, enfim, no desenvolvimento do aprendizado, na empregabilidade futura da “clientela”, que fica entregue à sua própria sorte. Sucessos e fracasso são mero detalhe nesse itinerário autocentrado, que não cabe aos professores, às IPES, ao MEC responder pelos resultados obtidos (ou não), que de resto são, também, uma parte relativamente desimportante de todo o processo . 
Jamais questione, portanto, pelos motivos expostos, os tantos “gênios” produzidos e alimentados pela academia brasileira. No geral, pensam ser nada mais do que uma obviedade ter alguém para sustentar suas aventuras autoproclamadas científicas, os seus exercícios retóricos de subsistência e seu esforço em fazer parecer importante aquilo que, de fato, especialmente em um país pobre e desvalido, não tem qualquer importância (e me refiro com ênfase distintiva aos profissionais das áreas de Humanidades). Tem razão, portanto, Raymond Aron quando diz: 
Quando se trata de seus interesses profissionais, os sindicatos de médicos, professores ou escritores não reivindicam em estilo muito diferente do dos sindicatos operários. Os quadros defendem a hierarquia, os diretores executivos da indústria frequentemente se opõem aos capitalistas e aos banqueiros. Os intelectuais que trabalham no setor público consideram excessivos os recursos dados a outras categorias sociais. Empregados do Estado, com salários prefixados, eles tendem a condenar a ambição do lucro . 
Estamos evidentemente diante do renascimento do acadêmico egghead ou “cabeça de ovo”, segundo roupagem brasileira, naturalmente. Indivíduo com equivocadas pretensões intelectuais, frequentemente professor ou protegido de um professor, marcado por indisfarçável superficialidade. Arrogante e afetado, cheio de vaidade e de desprezo pela experiência daqueles mais sensatos e mais capazes, essencialmente confuso na sua maneira de pensar, mergulhado em uma mistura de sentimentalismo e evangelismo violento. O quadro, realmente, não é dos mais animadores. 
Depois, vale ressaltar outro elemento que configura o desprezo do mundo das IPES pela sociedade. A promiscuidade das relações de poder que se formam dentro dela, sem critério de competência, eficiência ou inteligência, o que a tornam problema a ser resolvido, em vez de elemento de resolução de problemas. Talvez esse seja um dos mais graves entraves a ser enfrentado no âmbito da educação brasileira de nível superior: seu compromisso ideológico com o erro, com o que evidentemente não funciona, com uma cegueira volitiva autoimposta que a impede de enxergar o fundamento de tudo o que é: a realidade, concreta, dura, muitas vezes injusta, mas...a realidade. Trata-se de uma máquina que se retroalimenta com sua própria falência e que, por isso mesmo, atingiu estágio no qual pensar a si mesma, se reinventar, é quase um exercício criativo de ficção. 
Certo, não podemos abrir mão de ciência de alto nível, de vanguarda, de um olhar ousado para o futuro. Isso seria reduzir a Universidade a uma existência “utilitária” no pior sentido do termo: e não é disso que estou falando nesta sede. 
Digo mais simplesmente que é passado o momento de darmos resposta a anseios legítimos da população, à necessidade de instruirmos com ferramentas sérias e comprometidas uma massa humana completamente alijada de conteúdos muitas vezes basilares, elementares, que permeiam a sua existência. 
O momento, não obstante complexo, é propício. Parte da Universidade brasileira parece querer acordar do “sono dogmático” que a deixou inerte diante do diferente nas últimas décadas. Seria mesmo inevitável.

Contexto atual

Vivemos período histórico particularmente afetado pelo bullshit. E, na condição de estudiosos, nos cabe mínima compreensão articulada do fenômeno de proporções evidentemente brutais. É a época da “pós-verdade” (post-truth). O termo foi escolhido em 2016 pelo Departamento Oxford Dictionaries daquela Universidade como a palavra do ano, em referência a substantivo que relaciona ou denota circunstâncias nas quais fatos objetivos têm menos influência em moldar a opinião geral do que apelos à emoção e a crenças pessoais. 
Segundo a Oxford Dictionaries, o termo “post-truth” foi usado com aquela inflexão semântica pela primeira vez em 1992, pelo dramaturgo sérvio-americano Steve Tesich. Apesar de uso razoavelmente corrente desde sua criação, a palavra registrou um pico de uso em tempos recentes, algo em torno dos 2.000% de aumento em 2016. 
A informação dá bem a medida do drama que enfrentamos atualmente. Para aquele Departamento, pós-verdade deixou de ser termo periférico para se tornar central no comentário político, agora frequentemente usado por grandes publicações sem ulterior necessidade de esclarecimento ou definição: um fenômeno que por certo não se verifica apenas em âmbito de macroesfera, mas também em microesfera, vale dizer, em relações pessoais e profissionais subjetivas e de menor visibilidade, igualmente importantes na composição geral do fenômeno bullshit no mundo de hoje. 
Eis que as consequências dessa nova forma de ideologismo se mostram nefastas enquanto transformam praticamente todas as expressões do espírito humano em formas diversas de ideologias, quase sempre contaminadas pelo desprezo da busca pela verdade, ao menos enquanto pode ser alcançada/desejada pelo homem, e, então, pelas causas que subjazem as coisas e os fenômenos. A esse propósito, diz Edgar Morin: 
As ideologias têm uma expectativa de vida superior à dos homens. Elas são mais biodegradáveis do que os deuses, mas algumas podem viver até por vários séculos. As que se definem “científicas” e garantem que sabem realizar na Terra sua promessa de Salvação (...) mostram-se em toda a sua fragilidade após a vitória, que assinala, ao mesmo tempo, sua falência . 
Se os fatos são obstinados, as ideias os esmagam com mais frequência do que o contrário. Estamos diante de uma forma de fé latente, abraçada por alguns como reflexo inequívoco da verdade e apresentada por outros (pelos ideólogos) como aquilo que se deve aceitar como verdadeiro, acreditem eles ou não no que convidam a conhecer. 
Essa é uma lição da qual simplesmente não devemos nos esquecer. A realidade não é um bloco monolítico, cujos problemas podem ser resolvidos com receita ingênua e engessada. A velha estrutura argumentativa “aut... aut...” (”ou isso... ou aquilo...”) – cuja gênese remonta à lógica aristotélica, mas que foi erroneamente aplicada a quase tudo no mundo da ciência pós-cartesiano – deve ser substituída por aquela “et... et...” (“e isso... e aquilo...”), mais rica, não redutiva e nada ingênua se bem aplicada. 
Não nos enganemos: aquela estrutura é sedutora também porque detentora de forte tom messiânico. Mesmo homens inteligentes foram seduzidos por ela e a abraçaram sem qualquer restrição. 
O adversário – e mesmo alguns dos nossos colegas associados à causa, seduzidos por inebriante convicção – se considera portador de verdade absoluta e há poucas coisas mais complexas do que tentar diálogo com portadores de dogmas inquestionáveis. 
Deixemos o sebastianismo a quem com ele se sente confortável e dele depende: na Universidade, até o fim, falaremos de realidade e de ciência, tudo calibrado por ceticismo e pragmatismo. 
Dennys Garcia Xavier é professor Associado de Filosofia Antiga, Política e Ética da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Doutor em Storia della Filosofia pela Università degli Studi di Macerata. Tem Pós-doutorado pela Universidade de Brasília (UnB) e Pós-doutorado pela Universidade de Coimbra.

Rui Barbosa em Buenos Aires em 1916: os deveres dos neutros na Grande Guerra

Em 1916, Rui Barbosa foi designado embaixador extraordinário pelo governo brasileiro para as comemorações do primeiro centenário da independência argentina. Ao lado da participação nas cerimônias oficiais, Rui Barbosa foi convidado para fazer uma conferência na Faculdade de Direito da Universidade de Buenos Aires.
No navio que o levava do Rio de Janeiro à capital argentina, Rui Barbosa redigiu rapidamente uma  grande palestra que ficou conhecido como "Conceptos Modernos del Derecho Internacional", resumida pelos jornais argentinos e brasileiros, e depois corrigida para integrar suas obras completas, cujo link está aqui:

Cem anos depois, eu escrevi um pequeno artigo sobre essa base conceitual da diplomacia brasileira:

3006. “Rui Barbosa e o direito internacional”, Brasília, 7 julho 2016, 3 p. Artigo sobre os 100 anos da conferência realizada por Rui Barbosa em Buenos Aires, sobre os conceitos modernos do direito internacional, mais conhecida como o dever dos neutros.

Reproduzo abaixo esse artigo.

Rui Barbosa e o direito internacional

Paulo Roberto de Almeida
  
            Cem anos atrás, quando a Argentina comemorava o primeiro centenário de sua independência, o governo brasileiro designou o senador Rui Barbosa para ser o seu representante nos festejos daquele evento. Ademais de participar das cerimônias oficiais, Rui Barbosa foi convidado a fazer uma palestra na Faculdade de Direito e Ciências Sociais de Buenos Aires, ali pronunciando uma das alocuções mais importantes da história do direito internacional no Brasil. Dada a importância de suas reflexões para a própria construção da doutrina jurídica que sustenta a essência da política externa brasileira, bem como para a afirmação dos mais importantes valores e princípios da diplomacia sempre defendida pelo Itamaraty, cabe relembrar alguns dos aspectos importantes dessa conferência, inclusive para os nossos dias.
            Para facilitar a tarefa, temos à nossa disposição a excelente edição dessa conferência pela Fundação Casa de Rui Barbosa, através da qual, em 1983, Sérgio Pachá estabeleceu um texto definitivo do original em espanhol, realizando ele mesmo a tradução, acompanhada de notas e de uma excelente introdução a esse texto, de enorme repercussão, à época (e ainda hoje) na Argentina), durante muito tempo conhecido como "O Dever dos Neutros". Rui Barbosa não era desconhecido na Argentina, onde já havia vivido em 1893, fugindo da perseguição que lhe movia o governo de Floriano, por ter batalhado pelos envolvidos na revolta da Armada. Ele começa a parte substantiva de sua conferência de 1916 relembrando justamente esse episódio, defendendo a liberdade nas palavras de um de seus mais admirados promotores argentinos, Juan Batista Alberdi: "A civilização política é a liberdade. Mas a liberdade não é senão a segurança: a segurança da vida, da pessoa, dos bens."
            Ele continua, então, por um verdadeiro hino em louvor à nova "civilização argentina", não sem antes lembrar a barbárie dos antigos caudilhos que tinham levado o país à anarquia e à tirania. Num exercício arriscado de profetismo, Rui Barbosa anunciava aos argentinos da audiência que "há muito que consolidastes a vossa civilização. Vinte e cinco anos, pelo menos, de governo estável, ordem constante e progresso ininterrupto vos libertaram para sempre das recaídas no mal da anarquia. Um desenvolvimento colossal da riqueza, as acumulações do trabalho na prosperidade, uma abundante transfusão do sangue europeu, um civismo educado nos melhores exemplos da liberdade conservadora, grandes reformas escolhidas com discrição, adotadas com sinceridade e praticadas com inteireza depuraram dos últimos vestígios da antiga doença vosso robusto organismo, talhado para um crescimento gigantesco, asseguraram-vos no mundo uma reputação definitiva e fizeram da República Argentina um dos centros da civilização contemporânea, uma nação cujo invejável progresso pode resumir-se numa palavra, dizendo-se que a República Argentina é um país organizado." A Argentina de fato era, cem anos atrás, um dos países mais ricos do mundo, possuindo uma renda per capita superior à de vários países europeus, equivalente a 73% da renda média nos EUA (já então o mais rico de todos) e cinco vezes maior do que a renda per capita dos brasileiros. 
            Depois de repassar os episódios mais relevantes do itinerário político argentino, iniciado em 1806, caminhando para a independência já em 1810 e consagrado definitivamente no Congresso de Tucuman, em 9 de julho de 1816, quando se proclama solenemente, em nome de todo o povo argentino, a autonomia completa em face do soberano espanhol, Rui Barbosa chega ao cerne de sua conferência: um novo exercício da força bruta, contra o direito, representado pela Grande Guerra, especialmente a invasão da Bélgica neutra pelas tropas do Império alemão, em total desrespeito aos princípios da neutralidade, discutidos poucos anos antes na Segunda Conferência da Paz da Haia, na qual Rui havia sido o chefe da delegação brasileira. Suas palavras, em defesa desse princípio, foram muito claras: “Entre os que destroem a lei e os que a observam não há neutralidade admissível. Neutralidade não quer dizer impassibilidade; quer dizer imparcialidade; e não há imparcialidade entre o direito e a injustiça. (...) O direito não se impõe somente com o peso dos exércitos. Também se impõe, e melhor, com a pressão dos povos”. 
            Esse exato discurso de Rui Barbosa foi relembrado pelo chanceler Oswaldo Aranha, em 1942, quando o Brasil se viu confrontado à extensão da guerra europeia ao continente americano, instando, então, o Brasil, a assumir suas responsabilidades no plano dos princípios do direito internacional e dos valores da solidariedade hemisférica. A Alemanha tinha, mais uma vez, violado a neutralidade da Bélgica, para invadir a França. A postura de Aranha – que havia recepcionado Rui, como jovem estudante no Rio de Janeiro, quando o jurista desembarcou na volta ao Brasil –, foi decisiva para que, ao contrário da vizinha Argentina, então controlada pelo Grupo de Oficiais Unidos, de orientação simpática ao Eixo, o Brasil adotasse uma postura compatível com a construção doutrinal iniciada por Rui e de acordo a seus interesses nacionais, nos contextos hemisférico e global, em face do desrespeito brutal ao direito internacional cometido pelas potências nazifascistas na Europa e fora dela.  
            Vinte anos depois, o chanceler San Tiago Dantas soube preservar o patrimônio jurídico da diplomacia brasileira ao defender, de maneira clara, o respeito ao princípio da não intervenção nos assuntos internos de outros Estados, que estava em causa nas conferências e reuniões pan-americanas em torno do caso de Cuba. Outros juristas e diplomatas brasileiros, ao longo do século, a exemplo de Raul Fernandes, Afrânio de Melo Franco, Afonso Arinos de Melo Franco e Araújo Castro, participaram dessa construção doutrinal e pragmática dos valores e princípios da diplomacia brasileira. Há que se reconhecer, no entanto, que Rui Barbosa foi um dos grandes iniciadores e batalhadores pela afirmação dessas grandes diretrizes políticas que hoje integram plenamente o patrimônio consolidado da diplomacia brasileira. 
Paulo Roberto de Almeida, ministro da carreira diplomática, é diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais, da Funag, e professor no Uniceub.



Sistema comercial multilateral e regional: artigos de imprensa

Referências recebidas do Google Alert, em 18/06/2018:

comércio internacional do Brasil
Atualização semanal  19 de junho de 2018
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