sexta-feira, 31 de janeiro de 2020

Juro baixo transforma mercado de crédito e de investimento - Estadão

Juro baixo transforma mercado de crédito e de investimento


O rápido recuo da taxa de juros pegou os brasileiros despreparados. Até então nossa cultura era de investir em poupança e renda fixa”, diz Costa, fundador e ex-presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). De uma hora para outra, completa ele, os investidores tiveram de buscar novas formas de remunerar seu capital, elevando a procura por renda variável e aumentando o preço dos ativos. “Isso acabou gerando uma discussão sobre uma bolha especulativa.
Na avaliação de Costa, se comparados aos ativos internacionais, o mercado brasileiro não está caro nem barato. Mas se levar em conta o patamar dos ativos de três anos atrás, está caro. Ele, no entanto, não vê com preocupação o risco de formação de uma bolha. “No passado, o estrangeiro abocanhava boa parte das emissões na Bolsa. Hoje, na busca de novas opções de investimento, é o brasileiro que tem feito esse papel”, diz ele, explicando a alta do mercado.
Processo.
Para Maílson, ex-ministro da Fazenda, o Brasil vive hoje “o admirável mundo novo dos juros baixos”, que veio para ficar. Ele acredita que esse é o resultado de um conjunto de ações que aumentou a potência da política monetária brasileira – num processo que durou 25 anos. Com os juros mais baixos, diz ele, o mercado de capitais já assume papel de provedor do crédito no País, seguindo o caminho dos Estados Unidos, onde representa 80% do crédito. Por aqui, esse número é de 30%, um grande avanço, na avaliação de Maílson. “O que ocorre hoje é algo inimaginável há cinco anos.
O economista destaca, entretanto, que apesar de o mercado apostar em novas quedas na Selic, a taxa de equilíbrio não é de 4,25% ou 4% ao ano. “Essa é uma taxa estimulativa. Vemos a Selic em torno de 7% ao ano daqui a dois anos.
Saudável.
Newton Rosa, economista-chefe da Sul América, concorda. Mas, segundo ele, mesmo se subir um pouco, a taxa de juros vai estimular novas captações, especialmente do setor de infraestrutura que puxará o crescimento econômico neste ano junto com o consumo das famílias.
Na opinião de Rosa, apesar da lenta retomada da atividade econômica, o movimento de agora é mais saudável. “Antes a economia voltava mais rápido a base de mais gasto público. Hoje vemos um padrão novo de crescimento, baseado na volta do emprego e do consumo das famílias.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Fonte: IstoÉ Dinheiro

O Brasil virou uma republiqueta? Cosi è, si vi pare - Hussein Kalout

O Brasil contra o Direito Internacional

O ramo, princípio basilar de nossa atuação, passou a ser um mero detalhe, quando não um estorvo a ser ignorado ou até mesmo tripudiado

Revista Época, 31/01/2020

Quem se dedica ao estudo das relações internacionais provavelmente se formou com uma certeza: a defesa do direito internacional tornou-se, ao longo do século XX, parte inextrincável da identidade internacional brasileira.
Do Barão do Rio Branco e da atuação de Rui Barbosa na Conferência da Haia, passando pela fundação da ONU e das instituições de Bretton Woods e outros arranjos regionais à OEA e ao MERCOSUL, o Brasil consolidou a reputação de um grande defensor do direito como método para regular as relações entre países.
Essa defesa do direito internacional – e das instituições multilaterais, que são supostas dar-lhe consequência prática – ganhou estatura de princípio constitucional em 1988, refletindo um amplo consenso na sociedade, nos partidos políticos e na academia. Um consenso que, perseguido na prática por meio da política externa, tornou-se fonte de credibilidade e influência.
Não adotamos, é certo, esse princípio apenas por idealismo, mas por considerar que essa postura atende melhor ao interesse nacional, contribuindo para criar previsibilidade nas relações internacionais, ao mesmo tempo em que protege os relativamente mais fracos da imposição de interesses pelos mais fortes.
Nos últimos 75 anos, o Brasil investiu capital político e diplomático para reforçar as instituições multilaterais. O país se engajou na construção de arcabouços jurídicos com vistas a enfrentar desafios comuns em variados campos: paz e segurança, direito humanitário, direitos humanos, comércio internacional, meio ambiente, entre outros.
Em matéria de direito internacional, a antiga certeza converteu-se, por força da atual “política externa”, em dúvida. O consenso passou a ser ativamente combatido em nome de uma ruptura conservadora, cujos objetivos conjunturais de política interna são priorizados em detrimento do compromisso histórico com o direito e as regras multilaterais. 
Dessa forma, o direito internacional, de princípio basilar de nossa atuação passou a ser um mero detalhe, quando não um estorvo a ser ignorado ou até mesmo tripudiado.
Isso tem sido a nova norma, como demonstram o voto contrário à resolução que condenava o embargo unilateral contra Cuba, a inédita posição sobre o conflito Israelo-Palestino e o endosso irrestrito à eliminação do general iraniano Qassem Suleimani pelos Estados Unidos.
Em cada um desses temas, o Brasil se afastou do seu compromisso com o direito internacional. O governo preferiu agarrar-se cegamente a alinhamentos puramente ideológicos, patrocinou narrativas alheias ao interesse nacional e marginalizou a análise racional dos interesses de longo prazo. 
Análises lúcidas e preocupações justificáveis de nossos militares e de assessores econômicos foram descartadas, levando de roldão o princípio de respeito ao direito internacional que no passado sempre nos blindaram contra guinadas que teriam colocado em risco interesses concretos do país.
No caso do embargo contra Cuba, a ideia teria sido punir o regime que exporta revolução socialista desde 1959. Mas se é assim, por que será que aliados dos EUA e críticos do governo cubano, como o Canadá e todos os europeus, inclusive o Reino Unido, integraram a maioria de 187 países que votaram a favor da resolução que condenava o embargo unilateral?
Não foi certamente por amor ao socialismo que até a Hungria de Orbán votou a favor da resolução. O propósito era não legitimar o instrumento do embargo, que é contrário ao direito internacional. Apoiar o embargo, como fizemos, é aceitar que o mais forte pode decidir sozinho medidas coercitivas. Se no futuro formos alvos de medidas de força, será difícil esgrimir o direito internacional para nos defender.
A nota do Itamaraty saudando o “acordo do século” do presidente Trump para a “paz e a prosperidade” entre Israel e os palestinos é um dos mais grotescos passos da história da diplomacia brasileira. O suposto acordo de paz não é um acordo e nem é de paz. Trata-se de uma tentativa de impor solução unilateral arquitetada para salvar a reeleição de Netanyahu em Israel e fortalecer a posição eleitoral de Trump. 
O pioneirismo fica por conta de como o Brasil decidiu entrar nessa farsa, diminuindo-se ao patamar de uma republiqueta de quinta categoria. Joga-se por terra um posicionamento de 73 anos de uma diplomacia profissional que sempre buscou se pautar pelo equilíbrio na busca de uma solução negociada de dois Estados.
Para endossar esse teatro, a diplomacia bolsonarista topou agredir o direito internacional, ferir a constituição federal e implodir o voto brasileiro em todas as resoluções do âmbito das Nações Unidas – inclusive aquelas aprovadas com apoio dos EUA ou sem o veto dos EUA no Conselho de Segurança da ONU. 
E isso sem contar, ainda, que o Brasil já mudou uma série de votos em organismos internacionais para favorecer Israel, inclusive no tema do Golã sírio ocupado e da agência de apoio aos refugiados palestinos (UNRWA).
Na mesma toada, no episódio da eliminação do General Suleimani o Itamaraty só faltou aplaudir o assassinato - uma grave violação ao direito internacional. O afã de agradar foi tão grande que o Brasil, país sem interesse estratégico na região, deu um endosso que nem aliados mais próximos e membros da coalizão anti-Estado Islâmico se dignaram a estender aos EUA.
Quando se minimiza o direito internacional em nome de alianças políticas, visão ideológica ou alucinações teocráticas, o que se tem como resultado não é apenas o definhamento de um abstrato poder de influência e persuasão. 
Nos casos mencionados, além de fazer minguar nosso já escasso “soft power” e contribuir para um mundo mais caótico e desordenado na esteira da política temerária de Trump, nossa diplomacia está arando um terreno minado, alimentando os monstros que diz atacar e aumentando a probabilidade de perdas econômicas e elevando o risco de segurança.
Espero que, antes de adotar essa postura, nossos luminares da política externa tenham executado medidas de reforço da segurança dos bens e ativos do Brasil no exterior, inclusive de nosso pessoal diplomático e nossas comunidades de expatriados. Afinal, não seriam tão amadores a ponto de não calcular pelo menos esse risco que afeta a segurança e a integridade dos nossos compatriotas.

Écologie politique en Amérique latine: colloque IHEAL, Paris, 5-7/05/2020


 Cher.es toutes et tous,

Nous avons le plaisir de vous proposer l’appel à communications pour le colloque international, « Ce que l’Amérique latine fait à ‘l’écologie politique’. Bilan d’étape d’un courant ascendant des sciences sociales », les 5, 6 et 7 mai 2020 au Campus Condorcet (Paris/Aubervilliers).
Le texte de l’appel à communications ainsi que toutes les informations se trouvent sur le site du colloque (date limite de réception des propositions de communication : 20 février 2020).

Résumé : La political ecology s’est aujourd’hui imposée comme un courant interdisciplinaire central pour penser les relations société/environnement. En Amérique latine, l’ecología politica s’est développée très rapidement depuis plus d'une trentaine d’année avec une grande richesse théorique, empirique et militante, et se trouve aujourd’hui dans une première phase d’institutionnalisation académique alors que la conjoncture politique actuelle du continent autorise également à considérer qu’une première phase se termine. Ce constat justifie l’idée de réaliser un ‘bilan d’étape’, et dans ce but, ce colloque international sera structuré selon quatre axes de débat:
1) Cartographier les spécificités de cette ecología política latino-américaine vis-à-vis du courant anglo-saxon;  2) Cerner les raisons des difficultés d’appropriation en France de ce courant par les sciences sociales;  3) Interroger la diversité interne de ce courant, notamment à travers la mise en valeur de trajectoires nationales/régionales de la ecología política4) Identifier les fronts émergents et reconfigurations du programme.
Ce colloque est cofinancé par 10 établissements de l’enseignement supérieur et de la recherche, et plusieurs conférenciers invités ont déjà confirmés leur participation : Susana Hecht (Université de Californie, Los Angeles, EUA), Joan Martinez-Alier (Université Autonome de Barcelone, Espagne), Gabriela Merlinsky (UBA, CONICET, Argentine), Diana Ojeda (Université des Andes, Colombie), Jose Augusto Padua (Univ. Fédérale de Rio de Janeiro, Brésil), Erik Swyngedouw (Université de Manchester, R.U.).

Nous vous encourageons à proposer (via le site web ci-dessus) une communication et à réserver ces journées de mai pour venir discuter avec la communauté qui se rassemblera à cette occasion au Campus Condorcet autour de l’écologie politique. 

Pour le comité d’organisation de ECOPOL-AL,
David Dumoulin Kervran (IHEAL-CREDA, Université Sorbonne Nouvelle

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Estimadas y estimados,

Tenemos el placer de compartirles el llamado a propuestas para el simposium internacional « La ecología política en America latina. Balance de epoca y debates transnacionales » a realizarse los 5, 6 y 7 de mayo del 2020 en el Campus Condorcet (Paris / Aubervilliers).
El texto de este llamado, junto con todas las informaciones relativas al evento, se encuentran en el sitio (fecha límite de postulación: 20 de febrero 2020).
Resumen: En América Latina, la ecología política se ha desarrollado rápidamente en los últimos treinta años, a partir de una gran riqueza de enfoques, de miradas y de prácticas militantes. Como consecuencia de ello, en la actualidad atraviesa una fase de institucionalización académica y exhibe un gran nivel de consolidación como marco de análisis intelectual y político. Este simposio internacional tiene como objetivo revisar el panorama de la ecología política en América Latina en términos de :
1) hacer una cartografía de la ecología política latinoamericana en contrapunto con la corriente anglosajona;   2) identificar las razones que dificultan su apropiación por las ciencias sociales en Francia; 3) desarrollar un primer balance de la diversidad interna de la ecología política latinoamericana, en particular en lo que refiere al desarrollo de trayectorias nacionales/regionales y, 4) identificar temas, agendas  emergentes y aspectos invisibilizados, así como los diferentes modos de reconfiguración de esta corriente.
Este simposio internacional es financiado por 10 instituciones académicas, y ya tiene confirmados los siguientes destacados ponentes : Susana Hecht (Universidad de California, Los Angeles, EE.UU.), Joan Martinez-Alier (Universidad Autónoma de Barcelona, España), Gabriela Merlinsky (UBA, CONICET), Diana Ojeda (Universidad de los Andes, Colombia), Jose Augusto Padua (Univ. Federal de Rio de Janeiro), Erik Swyngedouw (Universidad de Manchester, Reino Unido).

Les invitamos a enviar una comunicación en el sitio a reservar los primeros días de mayo para venir a intercambiar ideas con la comunidad que se reunirá en el Campus Condorcet entorno de la ecología politica.

Por el comite organizador de ECOPOL-AL,
David Dumoulin Kervran (IHEAL-CREDA, Université Sorbonne Nouvelle)

 ***

Dear all,

We are pleased to share the call for abstracts for the International Symposium“Political ecology in Latin America. Balance of epoch and transnational debates”, that will be held on May 2020 (5, 6, and 7)  at Campus Condorcet-   Paris / Aubervilliers. 
The following link provides information about the call and logistics (Deadline for submissions of abstracts is February 20th). 

Abstract: Political ecology has now emerged as a central interdisciplinary field for thinking about society / environment relations. For the last 30 years, ecología política has been very rapidly developed in Latin America, with great theoretical, empirical and militant richness. As a result, Political Ecology is facing an institutionalizing phase and display a significant level of consolidation as a frame of intellectual and political analysis.
This International Symposium aims to revise the Political Ecology panorama in Latin America according to four topics : 1) Map the specificities of this Latin American political ecology vis-à-vis the Anglo-Saxon current; 2) Identify the reasons why Political Ecology as a field of research has not yet been appropriated by the French social sciences; 3) Examine the internal diversity of this field, focusing on national / regional trajectories of ecological política; 4) Identify new topics and emergent agendas of this research-program.

This conference is co-funded by 10 academic institutions, and several keynote speakers have already confirmed their participation: Susana Hecht (University of California, Los Angeles, USA.), Joan Martinez-Alier (Universitat Autonoma de Barcelona, Spain), Gabriela Merlinsky (UBA, CONICET, Argentina), Diana Ojeda (University de los Andes, Colombia), Jose Augusto Padua (Univ. Federal de Rio de Janeiro, Brazil), Erik Swyngedouw (University of Manchester, U.K.).
 
We encourage you to submit a paper to the website save the date and come to share with the community that will gather in Campus Condorcet on this days of May.

For the organization committee of ECOPOL-AL,
David Dumoulin Kervran (IHEAL-CREDA, Université Sorbonne Nouvelle)

Institut des hautes études de l'Amérique latine
IHEAL
Université Sorbonne Nouvelle - Paris 3
Campus Condorcet - Bâtiment de Recherche Sud
5, cours des Humanités, 93322,  Aubervilliers - bureau 5028A
Facebook : IHEAL CREDA Twitter : @IHEAL_CREDA
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O Brasil nas duas guerras mundiais - Mary Del Priori, Carlos Daróz (Unesp)


Mary Del Priore e Carlos Daróz resgatam o papel do Brasil nas duas guerras mundiais



Coletânea de ensaios de especialistas em história militar contemplam sob diferentes ângulos a participação da única nação da América do Sul presente nos dois grandes conflitos

“A guerra é um dos fenômenos mais constantes na trajetória humana e conceituá-la nunca foi uma tarefa simples”, assinalam os historiadores Mary Del Priore e Carlos Daróz, que reúnem, em A história do Brasil nas duas guerras mundiais, lançamento da Editora Unesp, estudos sobre a participação do país nos dois confrontos bélicos. A coletânea busca apresentar uma pluralidade de temáticas, que vai desde a geopolítica até a economia, passando pelo desenvolvimento das instituições militares brasileiras, pela espionagem e por questões do cotidiano dos soldados.
A obra, em seus dez capítulos, permite ao leitor ultrapassar as linhas gerais em que são descritas as participações brasileiras e observar de posição privilegiada o que ocorria na trincheira, no navio, no quartel. O livro “vem preencher a lacuna ainda sentida na bibliografia relativa à temática, contemplando ângulos raramente explorados do envolvimento brasileiro nos combates, como a geopolítica, a economia, a espionagem, o desenvolvimento de instituições militares e o próprio cotidiano dos soldados no calor da batalha”, comentam os organizadores. 
Apesar da falta de experiência para atuar no front, o Brasil foi o único país da América do Sul a enviar contingentes para as duas grandes guerras. Os fluxos migratórios precedentes, vindos da Europa e da Ásia, são apontados como um dos fatores responsáveis por aproximar o país dos conflitos, pois as centenas de milhares de imigrantes e seus descendentes foram mobilizados, complicando a neutralidade brasileira. “Em ambas ocasiões, o país posicionou-se inicialmente neutro, mas foi conduzido à beligerância quando diversos de seus navios mercantes foram afundados por submarinos alemães, na Primeira Guerra Mundial, e alemães e italianos, no segundo conflito”.
Sobre os organizadores – Mary Del Priore é doutora em História pela Universidade de São Paulo (USP). Lecionou História na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP e na Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio de Janeiro. Publicou, pela Editora Unesp, Ao sul do corpo (2009), História do esporte no Brasil (2009),História do corpo no Brasil (2011), História dos homens no Brasil (2013) e História dos crimes e da violência no Brasil (2017). Em 1998, recebeu os prêmios Jabuti e Casa Grande & Senzala pelo livro História das mulheres no Brasil (1997). Carlos Daróz é historiador, professor, pesquisador e escritor. Doutorando em História Social (UFF), é especialista em História Militar, mestre em Operações Militares e em História. Colaborador do Instituto de Geografia e História Militar do Brasil (IGHMB), é autor de diversos artigos e livros sobre a temática.
Título: A história do Brasil nas duas guerras mundiais
Organizadores: Mary Del Priore e Carlos Daróz
Número de páginas: 262
Formato: 16 x 23 cm
Preço: R$ 82,00
ISBN: 978-85-393-0820-0 
Assessoria de Imprensa da Fundação Editora da Unesp
imprensa.editora@unesp.br
(11) 3242-7171 ramal 517

Corrupção: o ex-ministro da Defesa Celso Amorim aparece numa trama - revista Veja

Léo Pinheiro: novas revelações sobre pagamento de propina envolvendo Lula
Nenhum empreiteiro desfrutou a intimidade do ex-presidente Lula como José Adelmário Pinheiro Filho, ex-­presidente da construtora OAS. A camaradagem entre os dois começou na década de 80 e se estreitou quando o ex-­sindicalista chegou ao Palácio do Planalto. Nesse período, eles se transformaram em bons companheiros, relação que atravessou os dois mandatos presidenciais e continuou firme depois que o petista deixou o Planalto. A dupla se encontrava com frequência, viajava junta em jatinhos, degustava cachaças especiais e se tornou parceira em grandes, pequenos e lucrativos negócios. Para o ex-presidente, o empreiteiro era simplesmente o “Léo”. Para o empreiteiro, Lula era o “Brahma” — uma referência à marca de cerveja. A Operação Lava-Jato abalou a amizade, especialmente depois que Pinheiro confirmou em juízo que pagava propina ao ex-presidente e ao PT em troca de contratos na Petrobras. Ambos acabaram na cadeia. Agora, para sepultar de vez a relação, Pinheiro, em delação premiada, está contando tudo o que essa simbiose produziu.
VEJA teve acesso a trechos inéditos da colaboração. Em um deles, Léo Pinheiro revela os detalhes de uma grande ajuda que recebeu do ex-presidente, retribuída na mesma proporção. Em 2014, a presidente Dilma Rousseff anunciou que o Brasil faria investimentos bilionários na área de defesa. De olho no filão, a empresa criou a OAS Defesa. O objetivo era disputar as principais licitações. Mas havia um problema: a nova companhia não tinha o selo que a credenciaria como empresa estratégica de defesa (EED), uma exigência que a impediria de celebrar contratos com o governo. “Diante das dificuldades que a OAS Defesa estava enfrentando para se habilitar, procurei o ex-presidente Lula pedindo sua intervenção junto ao ministro Celso Amorim”, contou Léo Pinheiro. Prestativo, o ex-presidente, segundo ele, ligou imediatamente para o ministro.
Pouco tempo depois, o empreiteiro se encontrou com Amorim no Ministério da Defesa. Na audiência, o ministro foi extremamente cordial, segundo Léo Pinheiro, e deixou claro que, “em função do pedido de ajuda feito pelo ex-presidente Lula”, iria convocar uma reunião com seus assessores e “determinar o credenciamento da empresa”, o que realmente aconteceu na sequência. “Sem a interferência de Lula, a OAS não obteria a certificação necessária”, afirmou. E o que o ex-presidente recebeu em troca da ajuda? “A remuneração de Lula estava no bojo do pacote de diversas outras vantagens”, disse o delator em sua colaboração.
ROLO – Dilma: acusações de Léo Pinheiro são “infundadas e descabidas”Nelson Almeida/AFP
Parte desse “pacote de vantagens”, como se sabe, já resultou na condenação de Lula a 25 anos de prisão, dos quais ele cumpriu até agora apenas 580 dias. Em troca dos contratos que ganhava no governo e nas estatais, como na Petrobras, a OAS recompensou o ex-presidente com um apartamento tríplex no Guarujá e reformas no sítio que Lula frequentava em Atibaia. Além disso, a empreiteira “remunerou” o petista em alguns milhões por “palestras”. Essas vantagens eram depositadas numa conta clandestina abastecida pela empreiteira e administrada pelo PT, cujo saldo chegou a 80 milhões de reais. Pinheiro confirmou que os acertos financeiros que favoreceram o ex-­presidente eram tratados com João Vaccari, ex-tesoureiro do partido, que também foi condenado e preso na Operação Lava-Jato.
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Em outro capítulo de sua delação, o empreiteiro envolveu ainda nas tramoias a ex-presidente Dilma Rousseff. Pinheiro relata que, certa vez, procurou o ex-presidente para propor medidas que o governo poderia implementar que “beneficiariam diretamente a OAS e as principais empresas do setor”. Na época, Lula solicitou um estudo sobre o tema e disse que “conversaria com a então presidente Dilma” — e ainda sugeriu um ardil: para esconder que as empreiteiras estavam por trás do projeto, uma entidade de classe se apresentaria como autora da ideia. Pinheiro acatou o conselho e destacou o presidente de um sindicato do setor para a missão, exatamente como havia sido combinado. O apoio do Brahma, de acordo com Léo, foi “determinante” para aprovar mudanças que engordaram o caixa das construtoras. “Léo Pinheiro se tornou um braço da Lava-Jato para perseguir Lula”, acusa Cristiano Zanin, advogado do ex-­presidente. Celso Amorim disse que não se recorda do suposto pedido de Lula, e Dilma considerou que as acusações contra ela são “infundadas e descabidas”. A amizade, de fato, acabou.
Publicado em VEJA de 5 de fevereiro de 2020, edição nº 2672

Disputa Moro-Bolsonaro: episódios de baixa política- Revista Veja

O plano para afastar Sergio Moro da disputa presidencial
Sem saber, Sergio Moro se moveu em direção a uma armadilha na segunda-­feira 27. Uma semana depois de ameaçar deixar o governo por divergências com o presidente Bolsonaro diante da provável divisão da pasta da Justiça, o ministro foi indagado em entrevista ao programa Pânico, da Rádio Jovem Pan, sobre a possibilidade de assumir uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF). Diplomático, respondeu que achava a perspectiva “interessante” e até “natural” para um ex-­juiz de carreira como ele, mas que a escolha evidentemente cabia ao presidente da República. Se ficaria satisfeito caso essa indicação viesse a acontecer? “Claro”, disse, sem hesitar. Moro também voltou a repetir que não será candidato a nada e que apoiará a reeleição de Bolsonaro. Foram declarações na medida para atenuar as intrigas e suspeitas que levaram ao estremecimento das relações entre o ministro e o presidente durante o primeiro ano do governo. Foi também a senha que alguns esperavam para tirar da gaveta um plano que se propõe a eliminar qualquer possibilidade de Moro disputar uma eleição nos próximos anos.
Pesquisas mostram que o ministro da Justiça, caso decidisse ingressar definitivamente no mundo da política, seria o único nome capaz de bater Bolsonaro nas próximas eleições presidenciais. Moro nega que tenha a intenção de concorrer com o chefe. Chegou a dizer, em tom de brincadeira, que, se necessário, tatuaria na testa “Bolsonaro 2022” para não deixar dúvidas sobre sua postura. O presidente, porém, não acredita nessa convicção — de uns tempos para cá, elegeu o ministro como adversário e ensaiou demiti-lo mais de uma vez, mas foi advertido de que poderia estar disparando um tiro no próprio pé. O ministro é dono de uma sólida popularidade. Recentemente, o PSL, o partido que abrigava Bolsonaro até o fim do ano passado, encomendou uma pesquisa para medir a gestão de Bolsonaro no governo e de Moro no ministério. Resultado: Moro alcança 72% de avaliações positivas, enquanto Bolsonaro fica 40 pontos atrás. Esse cenário reforça teorias e suspeitas de que o ministro tentará voos políticos mais altos. Ao mesmo tempo, desencadeia reações no grupo que não vê essa possibilidade com bons olhos.
NO SUPREMO – A indicação de Moro pode ocorrer em novembroNelson Jr./SCO/STF
Na segunda-feira, logo depois da entrevista, a neutralização de uma eventual candidatura de Moro foi tratada numa conversa entre o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e lideranças partidárias. Muitos deputados gostaram de ouvir que o ministro ainda vê como uma perspectiva “interessante” a indicação do nome dele para o Supremo. Avaliam que essa pode ser a melhor e mais indolor saída para todas as partes — para o ex-juiz, que chegaria ao topo da carreira, para o presidente da República, que se livraria de um fantasma, e também para uma boa parte do Congresso, especialmente a turma dos enrolados na Lava-Jato e os que repudiam o comportamento de “justiceiro” do ministro. Em novembro, o decano do STF, Celso de Mello, completará 75 anos e será obrigado a se aposentar. Os parlamentares já enviaram recados ao presidente de que a indicação de Moro para a vaga não será um problema, e sim o início da solução. No Senado, onde ocorrerá a sabatina, Davi Alcolumbre, o presidente da Casa, avisou que a indicação seria aprovada com extrema facilidade. Mas ainda restou uma dúvida: o que garantiria que Sergio Moro não usará o próprio STF como trampolim para a carreira política?
Na reunião com as lideranças, Rodrigo Maia apresentou a solução: o Congresso tem na gaveta, pronto para ser votado, um projeto que prevê quarentena de seis anos para juízes e membros do Ministério Público que decidirem deixar a carreira e disputar eleições. Se aprovada, a quarentena abarcaria estrategicamente duas eleições majoritárias (2022 e 2026), quando são escolhidos os governadores, senadores e o presidente da República, e uma disputa municipal (2024). Dessa forma, numa hipótese absolutamente esdrúxula, se Moro assumisse a vaga de Celso de Mello em novembro e renunciasse depois para disputar uma eleição, ele seria imediatamente alcançado pela lei e só estaria apto a concorrer a partir de novembro de 2026. Se o objetivo dele for a Presidência da República, o projeto político terá de esperar até 2030. “Há um sentimento generalizado sobre a necessidade de impedir que agentes públicos se utilizem do poder e se transformem em xerifes, pensando em um capital eleitoral para se eleger”, disse Fábio Trad (PSD-MS), autor do projeto. Ele nega que sua proposta, apresentada no fim do ano passado, seja dirigida a impedir a candidatura de Moro. Na reunião, Rodrigo Maia informou que, assim que terminar o recesso parlamentar, em fevereiro, pretende votar a urgência do projeto, o que significa que ele poderá ser tirado da gaveta e entrar em pauta a qualquer instante. “A estratégia agora é convencer o Bolsonaro a indicar o Moro para o STF”, diz um dirigente partidário que tratou do assunto com Rodrigo Maia.
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Na quarta-feira 29, Moro e Bolsonaro se encontraram pela primeira vez depois da crise que quase resultou na saída do ministro. O clima foi de cordialidade. Parecia estar tudo apaziguado entre os dois — e estava realmente, mas o que poucos sabiam é que horas antes do encontro uma nova confusão quase provocou o rompimento entre os dois. Antes de receber Sergio Moro, Bolsonaro se reuniu com o diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem. O presidente confidenciou a assessores que havia decidido trocar o diretor da Polícia Federal, Maurício Valeixo, depois de ver uma foto dele ao lado de Moro e do juiz Marcelo Bretas. Bolsonaro entendeu a imagem, postada nas redes sociais, como uma provocação. Além disso, em agosto do ano passado ele se irritou ao descobrir que havia uma investigação na PF do Rio de Janeiro que supostamente envolveria o deputado Hélio Negão, seu amigo de longa data. Alertado, o presidente vislumbrou indícios de mais uma conspiração contra ele e anunciou que iria trocar o superintendente da corporação no Rio. Chegou a sugerir o nome do substituto, que foi desconsiderado por Valeixo. As baterias de Bolsonaro se voltaram então contra o diretor. Valeixo é um ex-integrante da equipe da Lava-Jato e foi alçado ao cargo pelas mãos de Moro. Na ocasião, o ministro ameaçou deixar o posto caso o delegado fosse demitido. Ramagem, que participou da equipe de segurança de Bolsonaro durante a campanha, iria substituí-lo.
NO CONGRESSO – Maia e Alcolumbre: projeto em caráter de urgênciaJonas Pereira/Ag. Senado
No círculo mais íntimo do presidente há gente que o alerta sobre o perigo que o ministro da Justiça representa e gente que o adverte do perigo ainda maior que ele representaria fora do governo. Dessa segunda turma fazem parte o ministro Paulo Guedes, da Economia, o general Augusto Heleno, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, e o general Luiz Eduardo Ramos, secretário de governo da Presidência. Ramos foi o primeiro a saber da intenção do presidente de trocar a direção da PF na manhã de quarta-feira e, prevendo o desfecho que a história poderia ter, decidiu agir. Logo cedo, ele ligou para Guedes, que tinha uma audiência marcada com o presidente. Guedes é ao mesmo tempo o ministro mais próximo de Moro e também um dos principais conselheiros do presidente. Ramos, por sua vez, é considerado um dos mais influentes auxiliares de Bolsonaro. Os dois convenceram o presidente a mudar de ideia.
À tarde, Moro e Guedes foram ao encontro de Bolsonaro no Palácio do Planalto. Segundo um assessor do presidente, não se falou de divisão do ministério nem de demissões na Polícia Federal, muito menos de intrigas e traições. O presidente, ao contrário, elogiou o trabalho do ministro. O ministro, por sua vez, devolveu a gentileza ao ressaltar que abandonara 22 anos de magistratura e decidiu aceitar o convite para o governo por acreditar no projeto do presidente. Depois disso, Bolsonaro contou algumas piadas, e, com a chegada da atriz Regina Duarte, que vai assumir a Secretaria da Cultura, a formalidade sumiu definitivamente. O encontro terminou em uma longa sessão de fotos: Bolsonaro ao lado de Regina, Regina ao lado de Moro, Guedes ao lado de Regina… À noite, o presidente recebeu dois desafetos do ministro da Justiça. Um deles detalhou o plano gestado no Congresso. Bolsonaro ouviu atentamente, mas não fez nenhum comentário.
Publicado em VEJA de 5 de fevereiro de 2020, edição nº 2672

Deirdre McCloskey, por Fernando Schuler

Mais um artigo sobre a grande economista liberal da trilogia sobre as virtudes burguesas.

Deirdre McCloskey no Brasil
Autora da monumental trilogia Virtudes Burguesas, a historiadora Deirdre McCloskey é uma liberal em tempo integral, escreve Fernando Schüler na Gazeta do Povo:


Deirdre McCloskey visita o Brasil nesta semana. Concorde-se ou não com suas ideias, é alguém que merece atenção. Ela é autora de uma trilogia monumental, Bourgeois Virtues, sobre a formação do mundo moderno, e recentemente lançou Why Liberalism Works, com um bom resumo de suas visões, ainda sem tradução no Brasil.

Não faço ideia da razão pela qual a palestra que daria na Petrobras foi cancelada. O que é irrelevante, visto que todos, como sempre, já sabem de tudo, não é mesmo? Mas o episódio me dá uma boa pista sobre como começar explicando quem é a senhora McCloskey.

Em primeiro lugar, é uma liberal em tempo integral. Não brinca com essa história de separar a liberdade econômica das liberdades na cultura e nos costumes. O liberalismo nasce do direito de dizer “não”. Ponto. Seu vértice é a “igualdade de consideração e respeito”. Vem daí seu horror a qualquer forma de reacionarismo, à esquerda e à direita, e seu mau humor com o bolsonarismo. Em especial sua ideia de inflexionar políticas públicas para a “maioria cristã”, real ou imaginária.

O liberalismo, na sua visão, não se situa em um algum ponto intermediário entre esquerda e direita. Socialistas e conservadores gostam do Estado, por diferentes razões. Liberais gostam do fluxo espontâneo da vida. Isso vale tanto para quem quer enquadrar aplicativos de transporte na CLT, padronizar as escolas ou dizer que tipo de arte vale e qual a estrutura “verdadeira” de uma família.

Sua visão do mundo atual contrasta com o catastrofismo reinante em boa parte do universo intelectual. Em 200 anos, diz ela, a renda média cresceu perto de 30 vezes, e a miséria foi virtualmente extinta no mundo avançado. Nos anos recentes, o avanço migrou para o mundo em desenvolvimento. A igualdade cresceu entre os países. Entre o início dos anos 1990 e 2015, segundo dados do Banco Mundial, caiu de 36% para 10% o número de pessoas vivendo abaixo da linha de extrema pobreza, sendo a China a maior responsável por esse resultado.

É no acesso a bens essenciais para o bem-estar, no entanto, que a qualidade de vida e um sentido básico de igualdade vêm avançando mais rapidamente. O Serviço de Estatísticas do Trabalho dos EUA mostrou que “em 1901, um domicílio americano gastava em média 42,5% de sua renda com alimentação, contra apenas 13,2% em 2002”. Os dados são amplamente conhecidos e deixam muita gente nervosa. Eles põem água fria na retórica de que estamos nos tornando uma enorme Gotham City, povoada por palhaços abandonados e bilionários malvados.

Deirdre vai na contramão desse discurso, argumentando que são exatamente políticas de abertura e inclusão ao mercado que vêm retirando milhões de pessoas da miséria, mundo afora. Ela não vê problema na desigualdade econômica ou na multiplicação do número de bilionários, desde que sua riqueza venha da competição, da inovação, da melhora da vida dos outros, e não da captura do Estado.

Perguntei-lhe qual a sua ideia mais original. Ela não pensou muito para mencionar a tese de que é o livre fluxo de ideias e a inventividade humana, não o capital, a geopolítica ou a educação formal, que estão na base da prosperidade.

Seu foco são as ideias e a narrativa. A virada para o século 19 assistiu a uma mutação em vastas regiões da Europa e na América. O homem comum, o padeiro, o comerciante, o inventor de coisas ganhou dignidade, e sucessivas barreiras foram quebradas. Uma narrativa honrando o “inovismo”, termo que ela por vezes usa no lugar de capitalismo, cumpre aí um papel vital. Coisa que vai muito além do terreno econômico, invadindo a cultura, os direitos, o sexo e os estilos de vida.

Deirdre chamava-se Donald e resolveu trocar de sexo, no fim dos anos 1990. Fez de si mesma um exemplo dessas coisas. Seus filhos não a perdoaram. Tem um neto que nunca conheceu. Em algumas noites tristes, costumava estacionar o carro perto da casa do filho mais velho e observar seus amores, solitária. Com o tempo, parou de fazer isso. Tornou-se uma professora bem-humorada com um evidente gosto para desafiar o senso comum. Ela parece saber que, na vida pessoal ou intelectual, a liberdade cobra seu preço. E que é preciso seguir vivendo.

General Santos Cruz: a podridão moral dos olavo-bolsonaristas - J. R. Guzzo

Guzzo não aponta o dedo para os autores, apenas se refere ao escabroso episódio, mas cabe, sim, dizer claramente quem, quais foram os indecentes e criminosos responsáveis por um dos mais abjetos momentos de um governo que chafurda num pântano de intrigas e maledicências.
Os filhos do capitão e aquele guru destrambelhado que se expatriou estão diretamente implicados, com a ajuda de milicianos da guerra eletrônica clandestina, nesse que foi o maior, mas apenas o segundo (antes tinha ocorrido um similar contra Gustavo Bebbiano) episódio de um macabro festival de torpezas de um governo que vive imerso nesse mar de sandices políticas.
Esses personagens são uma espécie de figurantes de baixíssima qualidade de dramas shakespeareanos do submundo das torpezas políticas, algo indigno até para o baixo nível desse ajuntamento de ambições pessoais que se pretende uma administração pública.
O prosseguimento das investigações policiais deveria permitir chegar aos criminosos, mas os seus mandantes já se sabe que são.
Paulo Roberto de Almeida

Guzzo: "Episódios como o do general Santos Cruz são um desastre para o governo Bolsonaro".
Quer dizer que falsários têm acesso ao presidente da República, para lhe mostrar conversas telefônicas de um dos seus ministros não apenas gravadas ilegalmente, mas também falsificadas? J. R. Guzzo, via Gazeta do Povo:

O presidente da República, naturalmente, tem o direito de confiar em quem quer e de desconfiar de quem ele acha que não merece a sua confiança. Tem, como é óbvio, o direito de nomear e demitir os seus próprios ministros, sem ter de pedir licença para o Congresso, o Poder Judiciário ou os outros ministros da sua equipe. Não tem a obrigação, enfim, de explicar por qual motivo nomeou ou demitiu este ou aquele ministro – embora esse tipo de justificativa certamente acabe ajudando a tornar o seu governo e as suas decisões mais compreensíveis para o público pagante.

Com tudo isso, a demissão do general Santos Cruz do cargo de ministro da Secretaria de Governo, em junho do ano passado, permanece um episódio em aberto. Seria melhor, para todos, que estivesse fechado. Mas não está.

Como foi amplamente divulgado na ocasião, vieram ao conhecimento geral, um pouco antes de sua demissão, umas fitas gravadas de conversas pessoais do general Santos Cruz no qual sua voz – ou o que foi apresentado como sua voz – dizia uma série de barbaridades contra o presidente Jair Bolsonaro e membros de sua família.

O general, desde o começo, disse que era tudo mentira. Nunca tinha falado nada daquilo – mesmo porque, no momento em que as gravações foram feitas, ele estava dentro de um avião, isolado do resto do mundo, viajando para São Gabriel da Cachoeira, nos confins da Amazônia. Não adiantou muito, ou não adiantou nada.

O presidente da República, em vez de aceitar a palavra de um oficial general do Exército brasileiro, aparentemente acreditou no que diziam as fitas – anônimas na ocasião e anônimas até agora, do ponto de vista da sua autoria. Nunca, pelo menos, ninguém disse o contrário.

Tudo poderia ficar por isso mesmo se não fosse um detalhe: as gravações foram forjadas. Uma longa perícia da Polícia Federal, que acaba de ser divulgada, comprovou que as fitas com acusações ao presidente Bolsonaro foram uma obra de falsificadores. É uma história para lá de péssima. Quer dizer que falsários têm acesso ao presidente da República, para lhe mostrar conversas telefônicas de um dos seus ministros não apenas gravadas ilegalmente, mas também falsificadas?

Bolsonaro não precisa de gravação nenhuma, verdadeira ou falsa, para demitir um ministro de Estado; basta que não tenha mais confiança nele, ou simplesmente não o queira mais no ministério. Mas do jeito que esta história ficou, não é possível, positivamente, achar que está tudo bem, e que não aconteceu nada demais.

Há um lado escuro no governo do presidente Bolsonaro. Claro que há. Não adianta nada ficar inventando uma “transparência” que não existe em governo nenhum do mundo – por que iria existir aqui? Quem faz este tipo de observação, na verdade bem simples, é normalmente descrito nos círculos do governo, na melhor das hipóteses, como um idiota que não sabe do que está falando. Nos demais casos é classificado como mais um inimigo do presidente e aliado oculto dos que torcem pela desgraça do país.

Não se trata de uma coisa e nem de outra, Trata-se apenas de dizer o óbvio: episódios como o do general Santos Cruz são um desastre para o governo.

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Bolsonaro não acreditou na palavra de Santos Cruz. Acreditou nas fitas e demitiu um ministro que é general do Exército. J. R. Guzzo, em sua coluna publicada pelo Metrópoles:


O general Santos Cruz foi demitido do seu cargo de ministro da Secretaria de Governo, em meados de 2019, por ter dito uma série de coisas horríveis a respeito do presidente Jair Bolsonaro– ou era isso, pelo menos, que aparecia em fitas gravadas de suas conversas. Na ocasião, o general negou que tivesse dito quaisquer dessas coisas. Nem poderia, explicou ele, porque no momento em que foram feitas as tais gravações, estava dentro de um avião, voando sobre a Amazônia, sem contato com o mundo exterior.

Bolsonaro não acreditou na palavra de Santos Cruz. Acreditou nas fitas e demitiu o ministro, pouco depois de ter tomado conhecimento delas. Agora, uma perícia da Polícia Federal prova que as fitas foram forjadas – Santos Cruz nunca disse o que disseram ao presidente que ele havia dito. Como é que vai ficar isso, então?

É perturbador que um ministro de Estado seja demitido de seu cargo com base na violação criminosa de suas comunicações. É mais perturbador ainda que falsificadores de conversas trafeguem nos mais altos círculos da República, a ponto de fornecerem ao presidente Bolsonaro o conteúdo de suas fraudes. É perturbador, enfim, que o presidente prefira acreditar em falsários e não na palavra que lhe foi dada por um oficial-general do Exército brasileiro – e o pior de tudo será que tudo fique por isso mesmo, com a admissão de que há um lado escuro dentro do governo e que este lado pode agir com impunidade, mesmo depois da comprovação de suas ações.


Quem são os falsificadores? Da próxima vez que vierem com um golpe parecido, o presidente da República vai acreditar neles outra vez? Não se trata de pequenas intrigas de palácio – e sim da atividade de uma gangue que forja conversas para obter objetivos claramente definidos. Quem está seguro, se essa gente continuar em ação?