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sexta-feira, 29 de março de 2019

The Economist: o mandato de Bolsonaro pode ser curto... (Mon Dieu!)


Um trecho da matéria: 
"Dois dos quatro presidentes eleitos anteriormente no Brasil sofreram impeachment porque, como afirmou Fernando Henrique Cardoso, “não foram mais capazes de governar”."
 Pode-se acrescentar que dois dos que não foram objeto de impeachment, foram parar na cadeia, um deles trancafiado por muitos anos, por chefe de quadrilha e ladrão maior do Brasil em toda a história do país.
Como diria um grande compositor, amigo do presidente condenado: 
"A coisa aqui tá preta..." (sem qualquer racismo, claro...).
Paulo Roberto de Almeida

The Economist: Jair Bolsonaro, o presidente aprendiz do Brasil
A menos que ele pare de provocar e aprenda a governar, o seu mandato no Palácio do Planalto pode ser curto
The Economist, O Estado de S.Paulo
28 de março de 2019 | 20h56
Uma das principais razões pelas quais Jair Bolsonaro venceu a eleição presidencial no ano passado foi o fato de prometer movimentar de novo a economia depois de quatro anos de recessão. Ao nomear Paulo Guedes, um defensor do livre mercado, como seu superministro da Economia, ele conquistou o apoio do mundo empresarial e financeiro. Muitos imaginavam que a chegada de Bolsonaro à Presidência por si só traria nova vida para a economia. Mas, depois de três meses, ela continua moribunda como sempre. Os investidores começam a perceber que Guedes tem uma árdua tarefa de conseguir aprovar no Congresso a reforma da Previdência, crucial para a saúde fiscal do Brasil. E o próprio Bolsonaro não vem colaborando.
Bolsonaro
Jair Bolsonaro, presidente da República Foto: FÁBIO MOTTA/ESTADÃO
déficit fiscal de 7% do Produto Interno Bruto (PIB) tem um enorme peso sobre a economia, significando que os juros para os tomadores de empréstimo privados serão mais altos do que seriam do contrário. As pensões respondem por um terço do total das despesas públicas e são uma das razões pelas quais o Estado gasta pouco na infraestrutura fragilizada. O projeto de reforma do governo enviado ao Congresso no mês passado estabelece uma idade mínima para a aposentadoria, eleva as contribuições e preenche lacunas, com uma previsão de economias de R$ 1,2 trilhão durante dez anos. O déficit da Previdência foi de R$ 241 bilhões no ano passado. A reforma da Previdência, por si só, não fará com que o Brasil retome um crescimento econômico robusto. Serão necessárias reformas fiscais e outras medidas para aumentar a competitividade. Mas ela se tornou um objeto sagrado.
Bolsonaro está numa situação privilegiada porque, depois de dois anos de debate público e político, a reforma da Previdência hoje é menos impopular do que antes. Mas não é necessariamente uma proposta que conquista votos. E Bolsonaro não faz campanha para isso. “Toda a discussão sobre a reforma da Previdência é algo que os brasileiros gostariam de não ter”, afirma Monica de Bolle, economista brasileira do Peterson Institute for Internacional Economics.
A aprovação, assim, exige liderança do topo. Que está ausente. Em sua campanha, Bolsonaro denunciou a “velha política” corrupta do “toma lá, dá cá” no Congresso. Mas ele não possui uma estratégia alternativa para controlar o Legislativo. Entrou desnecessariamente em confronto com alguns aliados, incluindo Rodrigo Maia, o poderoso presidente da Câmara. O padrasto da mulher de Maia, Wellington Moreira Franco, um ex-ministro, foi preso em 21 de março junto com o ex-presidente Michel Temer, por suspeitas de suborno, o que ambos negam. O que levou a comentários feitos pelos filhos de Bolsonaro, que são assessores próximos do presidente, e que Maia considerou como um ataque pessoal. Sua resposta foi que ele não marcaria votações sobre a reforma da Previdência para um governo que chamou de “deserto de ideias”. As autoridades esta semana tentaram apaziguar Maia. Mas a reforma da Previdência deve sofrer atrasos e diluição.
O grande problema é que Bolsonaro ainda tem de mostrar que entende a sua nova função. Ele dissipou capital político, por exemplo, exortando as Forças Armadas a comemorarem o aniversário em 31 de março do golpe militar de 1964. Seu governo é de uma “confusão monumental”, afirmou Claudio Couto, da Fundação Getúlio Vargas (FGV). À parte a sua equipe econômica, seu governo é uma coleção de generais aposentados, políticos de médio escalão, protestantes evangélicos, um filósofo antes obscuro chamado Olavo de Carvalho. “Ninguém sabe para onde ele vai, qual o curso que está tomando”, disse o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. “Ele avança, depois recua, o tempo todo.”
Se o governo tem um elemento-chave, trata-se do general Hamilton Mourão, o vice-presidente, que tem tentado impor alguma disciplina política. Mas, com frequência, entra em atrito com a família Bolsonaro. Olavo de Carvalho o chamou de “idiota” e afirmou que, se as coisas continuarem como estão por mais seis meses, “tudo estará acabado”.
Embora de modo diferente, outros começam a pensar o mesmo. E ainda por cima, estão surgindo evidências de que a família Bolsonaro está ligada a membros de um grupo criminoso de ex-policiais do Rio de Janeiro acusado do assassinato da ativista Marielle Franco, o que eles negam.
Dois dos quatro presidentes eleitos anteriormente no Brasil sofreram impeachment porque, como afirmou Fernando Henrique Cardoso, “não foram mais capazes de governar”. Por mais que odeiem Bolsonaro, os democratas não devem desejar que ele não chegue ao fim do seu mandato. Ainda é o início. Mas sua Presidência já enfrenta um teste crucial. “Temos duas alternativas”, disse seu porta-voz esta semana. “Aprovar a reforma da Previdência ou afundarmos num poço sem fundo.” Se o seu chefe pelo menos fosse assim claro. 
Tradução: Terezinha Martino 

quarta-feira, 27 de março de 2019

Acesso do Brasil a OCDE: defesa da ditadura militar prejudica entrada do Brasil

Celebrar golpe de 64 pode enfraquecer entrada do Brasil na OCDE
É possível que a determinação do presidente seja vista por alguns países-membros como um ato antidemocrático e de desrespeito aos Direitos Humanos
Bolsonaro: o presidente determinou que os militares comemorem o golpe de 1964 
Clara Marina Cerioni, jornalista
Revista Exame, 26/03/2018
https://exame.abril.com.br/economia/celebrar-golpe-de-64-pode-enfraquecer-entrada-do-brasil-na-ocde/

São Paulo — A ordem do presidente Jair Bolsonaro para que militares celebrem o dia 31 de março de 1964, data em que se iniciou a Ditadura Militar, pode trazer consequências no processo de entrada do Brasil na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

De acordo com fontes ouvidas por EXAME, é possível que a atitude seja vista por alguns países-membros da organização como um ato antidemocrático e de desrespeito aos Direitos Humanos — requisitos exigidos para as nações que fazem parte do bloco.

“A adesão de novos países depende de unanimidade entre os membros. Por isso, atitudes como a de Bolsonaro podem ser um problema, principalmente para países que consideram o respeito à democracia como determinante, como a França, por exemplo”, diz um analista com conhecimento no assunto. “Essas declarações colocam em risco todo o esforço econômico para a entrada do Brasil no órgão. É um elemento de risco político grave”.

Dentre os 37 países desenvolvidos que formam o grupo estão alguns que já passaram por regimes ditatoriais como a Alemanha e o Chile. A entrada do Brasil no bloco tem sido discutida entre Bolsonaro e o presidente dos EUA, Donald Trump. 

Na Declaração de 50 anos da OCDE, disponível no site da instituição, está definido que “os membros formam uma comunidade de nações comprometidas com os valores da democracia baseados no estado de direito e direitos humanos”.

Essa é uma determinação para a maior parte das organizações entre países. O Mercosul excluiu a Venezuela do bloco por conta de violações contra os direitos humanos no país, por parte da ditadura de Nicolás Maduro.

Para Carolina Pedroso, especialista em Relações Internacionais pela UNESP, o pedido de celebração do Golpe Militar que, comprovadamente, violou os direitos humanos pode fazer com que o Brasil fique com uma imagem arranhada na OCDE.

“O país pode se prejudicar se houver o entendimento de que essa apologia à ditadura é um traço autoritário do atual governo por parte dos demais membros”, diz.

Segundo o relatório final da Comissão Nacional da Verdade (CNV), grupo que analisou por mais de dois anos as violações durante os 21 anos da Ditadura Militar, o período deixou ao menos 434 mortes e mais de 200 desaparecidos.

Balança e agrado eleitoral
Apesar da ordem dada pelo presidente aos militares, ainda é possível que os interesses econômicos dos países da OCDE com o Brasil se prevaleçam na hora de aprovar sua entrada.

Paulo de Tarso Santos, cientista político, afirma que os membros buscam garantias de interesses econômicos como prioridade.

“Se o Brasil garantir reservas de petróleos aos estrangeiros e manter os processos de privatização, por exemplo, é provável que isso se prevaleça”, diz.
Carolina Pedroso também alerta para as prioridades econômicas, que, segundo ela, são importantes. “Os membros avaliam se as contas públicas estão em dia, se a inflação está controlada, se há rigor na punição de evasão de divisas, entre outras medidas”.

Um artigo publicado em 2016 por Christina Davis, professora da Harvard University, no entanto, analisa que as condições para a entrada e permanência de países na OCDE envolvem mais do que apenas a renda e os padrões econômicos, mas principalmente a defesa da democracia.

Juliano Cortinhas, professor de relações internacionais na Universidade de Brasília, diz que não é apenas a comemoração do 31 de março de 1964 que pode trazer problemas para o Brasil, mas todas as declarações do presidente.

“Bolsonaro ganhou as eleições por uma tropa armada nas redes sociais e não tem uma agenda positiva econômica. Isso faz com que ele precise chamar atenção para garantir seus eleitores”.

De forma geral, a interpretação é a de que a postura de Bolsonaro tem a finalidade de agradar seu eleitorado radical, que tem perdido força nas redes sociais. A popularidade do presidente, que caiu 15 pontos na última semana, também pode ter tido influência em sua decisão.

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segunda-feira, 18 de março de 2019

Duelo Olavo de Carvalho- Augusto Heleno em Washington

O DUELO DE OLAVO DE CARVALHO E AUGUSTO HELENO EM WASHINGTON

Como foi o jantar que pareceu ser oferecido ao filósofo, e não ao presidente Jair Bolsonaro
O jantar oferecido na residência do embaixador brasileiro em Washington, Sérgio Amaral, na noite de domingo 17, colocou frente a frente expoentes das duas alas que duelam pela influência no governo Jair Bolsonaro. De um lado, o escritor Olavo de Carvalho, mentor do grupo ideológico; de outro, o ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno, general de quatro estrelas que comanda a tropa militar que atua no Planalto. Um dia antes, o filósofo afirmara na capital americana que Bolsonaro está por militares próximos com "mentalidade golpista."
A caipirinha servida como aperitivo aos convidados não ajudou a quebrar o gelo inicial. Enquanto Olavo de Carvalho era bajulado por integrantes da comitiva, Heleno ficou de canto em conversa ao pé do ouvido com o porta-voz da Presidência Otávio do Rêgo Barros, outro general.
O clima, segundo observou um convidado à ÉPOCA, era tenso, como se os militares tivessem entrado de penetras em uma festa particular da turma ideológica. O jantar reuniu a comitiva do presidente, o escritor Olavo de Carvalho e pensadores da direita americana, como o ex-estrategista de Donald Trump Steve Bannon, o acadêmico Walter Rusell Mead, a colunista do Wall Street Journal Mary Anastasia O’Grady e o editor da revista literária The New Criterion, Roger Kimball.
Pouco antes do jantar ser servido, Heleno tomou a iniciativa de buscar a aproximação com o escritor. O chefe do GSI puxou assunto dizendo que só o conhecia pela mídia e emendou com uma tentativa de afago a Carvalho. "Certamente, nos daremos bem pessoalmente", disse Heleno. Ao melhor estilo fanfarrão que lhe dá fama no Twitter, o escritor retrucou: "Não sou o monstro que dizem que sou."
Todos riram à volta, mas a noite não era mesmo dos militares, em menor número. Quando o presidente Bolsonaro chegou à residência do embaixador todos os convidados o esperavam em um semi-círculo em que Olavo de Carvalho era o centro. Bolsonaro e os ministros cumprimentaram Steve Bannon, o ex-estrategista do presidente americano, Donald Trump. Em seguida, o presidente se dirigiu para cumprimentar rapidamente o filósofo. O porta-voz Otávio do Rêgo Barros confirmou que eles não conversaram separadamente durante todo o jantar.
Antes de ser servido o cardápio, que incluiu mousse com ovas de salmão, beef Wellington, purê de nabo e quindim, o ministro da Economia, Paulo Guedes se dedicou a falar sobre a reforma da Previdência com Mary Anastasia O'Grady, colunista do Wall Street Journal. Em outro lado do ambiente, o ministro da Justiça e Segurança, Sergio Moro, emendou uma conversa com um grupo, entre os quais estavam Matt Schlap, presidente da União Conservadora Americana, e Roger Kimball.
O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, se juntou ao deputado federal, Eduardo Bolsonaro em uma conversa com Steve Bannon e Chris Buskirk, editor do site "American Greatness".
Quando todos se juntaram, Paulo Guedes puxou a sucessão de elogios a Carvalho e o classificou como "o líder da revolução".
"Você é o líder da revolução", disse Guedes, atribuindo a Carvalho um papel importante da divulgação de ideias liberais para os brasileiros, o que foi fundamental para a eleição do presidente Bolsonaro.
Sergio Moro, que já foi alvo das críticas de Carvalho e seus seguidores pela indicação da especialista Ilona Szabó como suplente no Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, seguiu a adulação ao escritor. Disse que era uma honra conhecer alguém que inspirou tanta gente, incluindo "o chefe", referindo-se ao presidente Bolsonaro. O ministro ainda mencionou que havia gostado muito do livro "O Jardim das Aflições", mas confessou que achou "muito denso".
Quando o jantar foi finalmente servido, Olavo de Carvalho se sentou à direita de Bolsonaro. Após um brinde convocado pelo embaixador, o presidente Bolsonaro fez um discurso de cerca de três minutos em que fez uma deferência especial ao escritor, a quem chamou de um de seus "grandes inspiradores".
"Em grande parte, devemos a ele a revolução que estamos vivendo", disse o presidente.
Questionado pelo embaixador Sergio Amaral sobre a atual situação política no mundo, Olavo de Carvalho citou a  eleição de Bolsonaro, de Trump, o Brexit, e o movimento coletes amarelos na França como "uma revolução popular contra as elites", mas que, para "a surpresa dos progressistas, o povo é extremamente conservador e rejeita as ideias e os valores progressistas das elites".
Em sua fala, o escritor ainda atacou a mídia, dizendo que jornais influenciam apenas a elite, "que continua numa bolha e não entende a revolução popular que ocorre diante dos olhos dela".
Todos os ministros falaram no jantar, mas a noite se encerrou com uma discussão sobre as relações com China, levantada pela ministra da Agricultura, Tereza Cristina. Steve Bannon e o assessor internacional da Presidência, Filipe Martins, defenderam que uma política que priorize a China se voltará contra o Brasil. 
A palavra final sobre o assunto coube a Olavo de Carvalho, que disse que o instinto do presidente é "impecável" por ter defendido ao longo da campanha que era preciso "deixar a China comprar no Brasil, mas não o Brasil".
"A culpa não é dos chineses, mas dos brasileiros que não pensam estrategicamente sobre o assunto", arrematou o guru do Planalto.
Nesta terça-feira, Bolsonaro se encontra com Donald Trump na Casa Branca. O americano tenta atrair o Brasil para uma política de contenção à China, importante parceiro comercial para o mercado brasileiro. Militares e integrantes da área econômica veem com cautela o apoio aos Estados Unidos numa cruzada contra os chineses. Resta saber quem será ouvido pelo presidente Bolsonaro.

sábado, 16 de março de 2019

Um cenario desolador na principal potencia ocidental: retrocessos mercantilistas a perder de vista - Carlos Gustavo Poggio

Boa relação com Trump é suficiente para garantir acordo comercial?

A boa notícia para Bolsonaro é que a relação pessoal com Trump deve fluir de forma positiva. A má notícia é que isso não deve ter muita importância.
Um fator que não pode ser negligenciado em qualquer negociação com os Estados Unidos é a importância do Congresso americano em questões de política externa. Acordos que necessitam de aprovação do Congresso têm um tempo próprio. É extremamente comum serem iniciados com um presidente e finalizados por outro.
As negociações para o NAFTA, por exemplo, começaram por iniciativa do presidente mexicano Carlos Salinas em 1990, mas o tratado foi assinado nos estertores do governo do Republicano George Bush em 1992 e ratificado pelo Congresso apenas sob o Democrata Bill Clinton, em 1993. Importante notar que, mesmo após anos de negociação e apoio de dois presidentes de partidos diferentes, o NAFTA foi aprovado com uma margem de apenas 34 votos na Câmara dos Representantes, que conta com 435 membros.
Da mesma forma, Peru e Colômbia iniciaram conversas com os Estados Unidos sob a presidência de Bush-filho, mas esses acordos foram implementados apenas durante o governo Obama. O caso do Chile é ainda mais gritante. Desde 1992 os chilenos almejavam um tratado comercial com os Estados Unidos, e Bill Clinton chegou a concordar em incluir o Chile no NAFTA. Porém, Clinton encontrou dificuldades no Congresso e o Chile acabou assinando acordos separados com o Canadá e com o México, mas não com os Estados Unidos. Apenas em 2003, com Bush, o Chile finalmente conseguiria assinar um acordo comercial com o país norte-americano.
A menção a esses casos passados também serve para ilustrar as dificuldades na comparação com o atual contexto. Quando o NAFTA foi aprovado, Clinton estava em seu primeiro ano de mandato e contava com sólida maioria Democrata na Câmara e no Senado. Além disso, o Democrata foi eleito com um discurso que enfatizava as virtudes do livre-comércio. Mesmo nessas condições, menos da metade dos Democratas nas duas casas legislativas votaram a favor do NAFTA.
O principal crítico do acordo durante a campanha presidencial de 1992 era Ross Perot, um milionário populista sem experiência política que se vendia como um “outsider” e concorreu como candidato independente. Perot acabou tendo a melhor performance da história entre os candidatos independentes à presidência dos Estados Unidos ao angariar quase 20% dos votos naquela eleição. O bom desempenho de Perot, tirando votos sobretudo dos setores mais conservadores do eleitorado, é considerada uma das principais razões pela não-reeleição de Bush.
Desde 2016, o cenário é bastante distinto. Os Republicanos elegeram um presidente que lembra mais Perot que Bush. O partido Democrata, por outro lado, está cada vez mais distante das visões liberais de Clinton, com um número crescente de apoiadores que se auto denominam socialistas. Dentre os candidatos do partido que têm se apresentado para as eleições de 2020, poucos defendem abertamente o livre-comércio.
Em 2016, Hillary Clinton encontrou dificuldades para bater Bernie Sanders pela nomeação do partido Democrata. Sanders teve como uma de suas principais bandeiras de campanha naquele ano a rejeição ao Tratado Transpacífico (TPP), negociado por Obama com o apoio de Clinton. Sanders já está novamente em campanha e suas posições são hoje mais populares no partido do que as de Hillary Clinton, que por sua vez já anunciou que está fora da disputa pela presidência.
As eleições de 2020 podem ser as primeiras da história recente dos Estados Unidos sem nenhum candidato dos principais partidos a empunhar a bandeira da liberalização comercial.  Nesse contexto, as condições para um acordo do Brasil com os Estados Unidos são muito menos auspiciosas que as encontradas pelos países Latino-Americanos mencionados acima. E o Brasil, ao contrário de México, Peru, Colômbia e Chile, ainda teria que equacionar restrições impostas pelo Mercosul.
Além disso, o grau de polarização no atual ambiente político nos Estados Unidos é consideravelmente mais alto do que no passado recente, o que tem levado a constantes paralisias no governo americano e cada vez menos cooperação entre os dois partidos no Congresso.
Um exemplo para se prestar atenção é o caso do novo NAFTA (rebatizado como USCMA), renegociado por Trump e atualmente parado no Congresso com poucas chances de ser aprovado sem modificações relevantes. Já circulam comentários em Washington que a líder do partido Democrata e presidente da Câmara Nancy Pelosi não facilitaria a aprovação do acordo, isto que isso seria visto como uma vitória de Trump. Isso é uma pequena ilustração de como a polarização política tem impedido a construção de consensos domésticos nos Estados Unidos.
A conclusão óbvia é que, se o governo brasileiro considerar que seu único interlocutor é Trump, estará cometendo um erro colossal. Adicionalmente, se levarmos em conta o histórico da atual presidência americana em termos de negociações comerciais, o governo brasileiro deveria ter razões adicionais para ser cauteloso. Trump tem uma visão basicamente mercantilista das relações internacionais, que interpreta a existência de déficits comerciais como uma evidência de que os demais países tiram vantagens dos Estados Unidos.
Um alerta para o Brasil nesse sentido foi a recente decisão do governo Trump de suspender o tratamento tarifário preferencial dado à Índia por fazer parte do Sistema Geral de Preferências (SGP), que beneficia países em desenvolvimento, e do qual o Brasil também é parte. A alegação da administração Trump foi que a Índia não teria sido capaz de assegurar aos Estados Unidos, que tem um déficit comercial de mais de 20 bilhões de dólares com o país, um “acesso razoável e equitativo” ao mercado indiano. Isso, apesar de o país ser um importante aliado dos Estados Unidos e o primeiro-ministro Narendra Modi ter boa relação pessoal com Trump.
A vantagem de Bolsonaro é que os Estados Unidos possuem um superávit comercial com o Brasil que mais do que dobrou entre 2016 e 2018. Mas isso não vai adiantar de nada se o presidente não agir estrategicamente e priorizar relações pessoais de curto prazo.
*Carlos Gustavo Poggio é professor dos cursos de relações internacionais da FAAP e da PUC-SP, do Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais San Tiago Dantas, e coordenador do NEPEU – Núcleo de Estudos sobre a Política Externa dos Estados Unidos.