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terça-feira, 22 de outubro de 2013

"O Petroleo e' nosso"?: demonstracao de atraso - Joao Luiz Mauad

Arautos do Atraso

JOÃO LUIZ MAUAD *

Assistimos nesta segunda feira, durante o leilão de privatização do campo de Libra, a mais uma demonstração de nacionalismo tosco do Sindicato dos Petroleiros, da CUT e de mais uma dezena de organizações e partidos de extrema esquerda. A palavra de ordem era “o petróleo é nosso” ou “estão entregando as nossas riquezas aos gringos”.
“A fundação do primeiro centro de defesa do petróleo, na ABI: para atrapalhar os sonhos dos grandes trustes internacionais” [imagem: VEJA na História]
São sintomas da velha xenofobia terceiro-mundista que, aliada à mais profunda ignorância econômica, trata os recursos naturais como riquezas, mesmo antes de serem retirados do seio da “Mãe natureza”. É claro que, embora as palavras de ordem digam o contrário, a maioria está ali para defender interesses individuais e não o interesse coletivo. O problema é que tais manifestações costumam sensibilizar uma boa camada da opinião pública, completamente ignorante economicamente e, por isso mesmo, suscetível a essas falácias. Tentemos, então, desmistificar um pouco a questão.
O Banco Mundial publicou, em 2006, um extenso e detalhado trabalho intitulado “Onde está a Riqueza das Nações”, cujo objetivo foi medir a participação de três diferentes tipos de capitais – natural (recursos naturais), produtivo (bens de capital) e intangível (capital humano e qualidade das instituições) – na produção de riqueza de 120 países.
Os resultados mostram que, quanto mais desenvolvidas (em termos de renda per capta) são as nações, menos elas dependem dos recursos naturais e mais utilizam os chamados capitais intangíveis na produção de suas riquezas. Neste aspecto, a comparação dos índices verificados entre os dez primeiros e os dez últimos do ranking analisado é bastante ilustrativa. Enquanto a participação dos capitais naturais no produto total de nove dos dez países mais ricos varia entre exíguos 0 e 3% (a exceção é a Noruega, com 12%), nos países mais pobres ela nunca é inferior a 25%. Por outro lado, os capitais intangíveis têm um peso médio superior a 80% nas economias avançadas, à medida que navegam por índices que vão de 40 a 60% na maioria dos dez países mais pobres.
Esses resultados reafirmam, empiricamente, algo de que já se suspeitava há muito tempo: a inexistência de correlação entre desenvolvimento econômico e disponibilidade de recursos naturais. Do contrário, como explicar a prosperidade de nações como Japão, Cingapura e Suíça, por exemplo, localizados em regiões geologicamente pobres e geograficamente inóspitas, em contraste com tantas outras onde o subdesenvolvimento persiste, apesar da relativa abundância de riquezas naturais?
Com efeito, não surpreende que, de toda riqueza produzida no mundo, o estudo do BIRD tenha estimado em apenas 5% a contribuição dos capitais naturais, contra 17% dos capitais produtivos e nada menos que 77% dos intangíveis.
Um excelente referencial da superioridade dos capitais intangíveis sobre os demais está no Oriente Médio. Dentre os Estados árabes daquela região, o mais próspero é exatamente aquele cujas reservas de petróleo são ínfimas. O Emirado de Dubai tem hoje uma economia vibrante, baseada num dinâmico entreposto aduaneiro, no turismo e nos serviços financeiros e de alta tecnologia, enquanto os seus vizinhos, donos de reservas petrolíferas imensas, permanecem socialmente estagnados.
Infelizmente, na contramão da moderna teoria econômica encontram-se também diversas nações dessa (cada vez mais) atrasada América Latina. Apesar de todas as evidências acima, alguns de seus líderes – apoiados por boa parte da opinião pública – mantêm uma fé inabalável na velha lenga-lenga nacionalista (temperada com doses cavalares de marxismo) e insistem no extemporâneo receituário da estatização de empresas e recursos naturais, como se aí estivesse a chave do progresso.
Esses verdadeiros arautos do subdesenvolvimento desprezam o exemplo dos países ricos, especialmente no que concerne às instituições e ao ambiente de negócios. Expressões como Estado de direito, previsibilidade jurídica, respeito à propriedade privada, liberdade econômica, cumprimento de contratos, desburocratização, combate à corrupção, eficiência e parcimônia com o gasto público não têm qualquer significado para eles. Além disso, não aceitam o fato de que o grande protagonista do desenvolvimento é a iniciativa privada, não o governo.
* DIRETOR DO INSTITUTO LIBERAL

sexta-feira, 12 de julho de 2013

O Movimento Passe "Livre" e Isaiah Berlin: Joao Luiz Mauad

Passe livre não é direito

RODRIGO CONSTANTINO *
O empresário João Luiz Mauad, colunista do Instituto Liberal, deu uma verdadeira aula sobre liberalismo hoje no GLOBO. Seu artigo explica de forma bastante didática o conceito de liberdade negativa, muito bem desenvolvido por Isaiah Berlin. Mauad argumenta:
Imagine que o leitor entre num ônibus e meia dúzia de passageiros o obriguem a pagar as suas (deles) passagens. Sem alternativa, tendo em vista a visível diferença de força, você cede. Tal fato seria condenado pela maioria das pessoas de bem, certo?

Agora imagine que, em vez de agir diretamente, aquelas pessoas sejam substituídas por um agente do governo, armado pela força da lei, que poderá puni-lo caso você se recuse a bancar as passagens daquela gente. Mudou alguma coisa? Não estou falando da legalidade do ato, mas da moralidade. Uma ação antes imoral e injusta tornou-se moral e justa por conta da intermediação do Estado ou pela força de uma lei imposta pela maioria?
Desde que direitos e obrigações são dois lados inseparáveis da mesma moeda, a melhor forma de saber se alguém tem direito a alguma coisa é perguntar quem está obrigado a fornecê-la. O fato de eu desejar ou necessitar muito algo não diz muita coisa. Quem não adoraria, por exemplo, ter transporte confortável, moradia digna, serviços de saúde eficientes, tudo de graça? O problema é que não nos bastam vontades e/ou carências, é preciso que alguém forneça os bens e serviços de que necessitamos e, normalmente, isso tem um custo.
Cientes disso, os liberais entendem que direitos são conceitos de caráter estritamente negativo. De acordo com essa concepção, o exercício de um direito legítimo não pode requerer que outros sejam forçados a agir para garanti-lo, mas somente que se abstenham de interferir para cessá-lo.
O meu direito de ir e vir não exige que os demais me forneçam o transporte, mas, pura e simplesmente, que não impeçam o meu deslocamento. O meu direito à vida não requer que ninguém a mantenha – além de mim mesmo, com os recursos do meu próprio trabalho -, mas apenas que os demais não atentem contra ela.
Compreender isso é fundamental para os liberais. Nós jamais usamos o termo “direitos” dissociados de “deveres”, como se tais direitos (positivos) caíssem do céu, brotassem da terra, viessem de Marte. Nós sabemos que o “direito” de alguém a um “passe livre” significa, necessariamente, o dever de alguém fornecer esse privilégio. Liberais estimam a igualdade perante as leis, não a ideia de que o estado é o instrumento pelo qual todos viverão à custa de todos.
Fecho com a conclusão de Mauad:
Como sabemos todos, não existe almoço grátis . Qualquer benefício oferecido de graça estará sendo pago forçosamente por alguém, ainda que o Estado seja o intermediário. No meu dicionário, isso não é direito, mas esbulho.
* PRESIDENTE DO INSTITUTO LIBERAL

sábado, 30 de junho de 2012

Cada um tem o Lula que merece - João Luiz Mauad

Nota liminar: Mais um da série rascunhos esquecidos. O fato de ser de um ano atrás, não diminui em nada o interesse, pois trata de um problema atual e crescentemente preocupante: a dívida pública americana e seus efeitos para os americanos.
Paulo Roberto de Almeida 


O Lula deles
João Luiz Mauad
O Globo, 13/08/2011


O fato de que estamos aqui hoje para debater o aumento do limite da dívida americana é um sinal de fracasso das nossas lideranças. É um sinal de que o governo dos Estados Unidos não pode pagar suas próprias contas. É um sinal de que agora dependemos da assistência financeira de países estrangeiros para financiar as políticas fiscais irresponsáveis do nosso governo.... O aumento do limite da dívida da América nos enfraquece nacional e internacionalmente. Liderança significa responsabilidade pelas próprias decisões. Em vez disso, Washington está jogando o ônus de suas más escolhas de hoje nas costas dos nossos filhos e netos. A América tem um problema com a dívida e uma falha de liderança. Os americanos não merecem isso. Eu, portanto, sou contra o aumento do limite da dívida.”


Sabe de quem são essas duras palavras, caro leitor? Acredite, o discurso acima foi proferido pelo então senador Barak Obama, ainda em 2006, quando o Congresso daquele país discutia o limite da dívida federal, durante o mandato de George W. Bush. Na época, o aumento aprovado trouxe o teto da dívida para US$ 9 trilhões. Sob a presidência de Obama, o número já fora elevado para US$ 14,3 trilhões. Antes do recente aumento, portanto, a dívida já estava 60% maior do que quando ele sinalizava um suposto "fracasso de liderança", há cinco anos.


Malgrado a enormidade dos números, os políticos norte americanos chegaram a um acordo, ao apagar das luzes, evitando assim que o governo daquele país ficasse inadimplente perante os seus credores internos e externos. Entre mortos e feridos, salvaram-se todos – pelo menos por enquanto.


Durante a longa queda de braço, fomos bombardeados por notícias e comentários - ecoados principalmente do notório New York Times, carro-chefe da mídia liberal (esquerdista) americana, à frente o estridente “nobelado” Paul Krugman - acerca do radicalismo e irresponsabilidade dos conservadores, capitaneados pelos fundamentalistas/terroristas do Tea Party, que insistiam numa postura de prudência e parcimônia – oh! Grande heresia! - em relação aos gastos do governo e, consequentemente, em relação à dívida pública. Aliás, os economistas podem discordar sobre o montante da dívida que um governo pode carregar com segurança, mas há certo consenso de que 100% do PIB é demais, especialmente quando se olha para os efeitos sobre a atividade econômica.


Mas os ditos radicais do Tea Party cometeram o supremo pecado de contrariar São Obama e, principalmente, a visão progressista segundo a qual quanto mais o governo gasta e se intromete na vida privada das pessoas, melhor para todo mundo. Embora seja muito difícil para qualquer pessoa de bom senso entender como é possível que um endividamento constante e progressivo do governo possa ser algo sadio, o que se viu foi o linchamento sem trégua dos atrevidos que se recusavam, constitucional e democraticamente, a dar carta branca para o executivo gastar a vontade.


Neste ponto, pode ser útil esclarecer exatamente sobre o quê estavam discutindo os dois lados. A questão não era propriamente se o governo federal deveria ou não expandir os seus gastos. Quase ninguém em Washington propôs o encolhimento do leviatã. Ao contrário, no final de dez anos tanto os gastos nominais quanto a dívida total serão bem maiores do que são hoje. Tenha-se em mente ainda que esses aumentos virão após uma das mais rápidas expansões de gastos federais na história dos EUA – desde que Obama tomou posse, houve um aumento de aproximadamente 30% em relação ao último ano de Bush.


Ademais, pouco se falou sobre isso, mas durante a maior parte do tempo o impasse esteve ancorado não no radicalismo do Tea Party, mas na intransigência do presidente, que insistia, mesmo contra a opinião majoritária do seu próprio partido, em aprovar limites muito maiores, além de aumentos de impostos.


Finalmente, pode-se discutir o que for, mas não é apropriado dizer que não havia legitimidade do legislativo para debater o tema, afinal eles foram eleitos exatamente para isso. Ao contrário da escatologia do NYT, a verdade é que o Congresso americano deu uma lição de democracia ao mundo, apesar do comportamento malsão de Obama, que, com discursos irresponsáveis, insistia em jogar a opinião pública contra os congressistas. Quisera eu que os nossos políticos discutissem os temas importantes da nação como fizeram os yankees, sem barganhas por cargos, liberação de verbas ou mensalões, mas apenas defendendo o que consideram melhor para o país.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Delenda social-democracia?: o fim de uma epoca - João Luiz Mauad


A festa acabou

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O exemplo de Margareth Thatcher deverá ser seguido, cedo ou tarde, se a Europa quiser retomar o caminho da prosperidade
Muitos analistas, ingenuamente, creditam os atuais problemas europeus ao euro, à especulação, à moderna engenharia financeira e até mesmo ao famigerado neoliberalismo. Embora as evidências saltem aos olhos, costumam ignorar que, muito além de uma mera crise monetária ou de crédito, o que está em xeque é o próprio modelo de bem estar social.
 
Como  bem colocou em recente editorial o The Wall Street Journal,  seja na Itália, na Grécia, na Espanha, em Portugal ou até na França, o welfare state atingiu o limite. Sucessivos governos no continente, tanto à direita quanto à esquerda, têm financiado "direitos" generosos com altos impostos e pilhas enormes de dívidas. Suas economias, porém, não conseguem crescer rápido o suficiente para manter a farra – como prevê a boa teoria econômica. O acerto de contas chegou.
 
O visionário Aléxis de Tocqueville foi talvez quem melhor definiu o que viria a ser, mais tarde, a "social-democracia", ainda que não tenha vivido para testemunhá-la. Na obra A democracia na América, ao imaginar sob que possíveis novas características poderia reaparecer no mundo a tirania que tanto desprezava, ele anteviu uma espécie de "escravidão disciplinada, moderada e serena", a qual, sob a égide da igualdade, seria aceita e até desejada.
 
Segundo Tocqueville, os futuros governantes, movidos pela compaixão para com seu povo, tratariam de "prover sua segurança, antecipar e satisfazer suas necessidades, dar gosto a seus prazeres, resolver suas principais inquietudes, dirigir seu trabalho ". O tirano moderno, diz o mestre, controla toda a vida social por meio de uma rede de normas secundárias e complexas. " Não anula a vontade das pessoas, mas a refreia, a inclina e a dirige; raramente ordena atuar, mas frequentemente inibe as iniciativas; não destrói nada, mas impede que se criem muitas coisas; não é em absoluto despótico, mas obstrui, reprime, debilita, sufoca e embrutece, a ponto de transformar os povos num mero rebanho de animais medrosos...".
 
Malgrado sua concepção eminentemente coletivista e inibidora da liberdade, a experiência social-democrata que floresceu na Europa Ocidental após a Segunda Guerra manteve o modelo econômico capitalista, pelo menos no sentido de que a propriedade privada dos meios de produção era permitida, ainda que altamente concentrada nas mãos de uns poucos.
 
O arquétipo do "capitalismo selvagem" foi substituído por um sistema híbrido, que combina grandes conglomerados industriais e financeiros, frequentemente patrocinados e tutelados pelo Estado, uma agricultura altamente subsidiada, além de empresas miúdas – quase sempre comerciais ou de prestação de serviços.  Fora isso, a hipertrofia dos governos formou um enorme contingente de funcionários públicos, que em alguns países chegou perto de 50% da população economicamente ativa.
 
O advento da social-democracia europeia ocorreu em meio à Guerra Fria, em um período marcado pela limitação à livre movimentação de pessoas, de capitais e de produtos, quase sempre mediante rígidos controles burocráticos e a imposição de barreiras tarifárias. 
 
Com a queda do Muro de Berlim e, em especial, a aceleração do processo de globalização – consequência direta da profusão de novas tecnologias, que permitiram a movimentação muito mais dinâmica da informação, dos capitais, dos produtos e do próprio trabalho – as sociedades europeias se viram, da noite para o dia, numa sinuca de bico, obrigadas a  uma reavaliação profunda do modelo, algo até então impensável.
 
Essa mudança traumática de rumo, notadamente para aqueles que se acostumaram a ter e almejar privilégios "sociais" abundantes à custa do trabalho alheio, ocorre muito mais por falta de opção do que por escolha.  E não é para menos: enquanto a taxa de natalidade não para de cair e os velhos vivem cada vez mais, crescem os gastos com saúde e aposentadorias. Por outro lado, a relação entre trabalhadores ativos e inativos diminui rapidamente, tudo em meio ao baixo crescimento, que  já dura décadas.
 
Margareth Thatcher foi uma das primeiras a entender que as políticas da social-democracia precisavam ser revistas . Ela compreendia a natureza da armadilha econômica em seus dois aspectos principais. Em primeiro lugar, não é possível manter um mercado de trabalho baseado na estabilidade do emprego, especialmente em vista da evolução tecnológica, que cria e destrói ofícios e profissões numa velocidade tremenda. Em segundo lugar, as instituições de proteção social, concebidas fundamentalmente para compensar o fracasso individual, fomentam  a ineficiência, num mundo cada vez mais competitivo.
 
Thatcher concluiu, há 30 anos, que as premissas do "marco social" – que imperou a partir da 2ª Guerra – haviam sido derrubadas e, a menos que a social-democracia se transformasse profundamente, seria varrida pelo furacão da globalização. As reformas liberalizantes que seu governo produziu, no entanto, se deram algum fôlego à economia britânica, por algum tempo, já foram completamente revertidas pelos governos esquerdistas que a sucederam – preocupados, como sempre, não com os baixos índices de crescimento e produtividade, mas com a demagogia do "bem comum".
 
Evidentemente, a derrocada do welfare state não se dá de forma uniforme. Dependendo da cultura, é mais lenta ou mais rápida. O modelo é mais resistente, por exemplo, nos países nórdicos e anglo-saxões, de ética protestante e valorização do trabalho, do que nos países mediterrâneos, mais afeitos ao patrimonialismo e à cultura de privilégios. Mas não se iludam: mesmo na forte Alemanha, mais dia, menos dia, mudanças de rumo terão de ser feitas, nos moldes das  feitas pela Dama de Ferro inglesa.

segunda-feira, 28 de março de 2011

Fascismo corporativo: de Mussolini ao PT

Parece que não mudou muito, ou não mudou nada...

Mentalidade Fascistóide
João Luiz Maua
março 28, 2011

Durante a crise de 2008, em meio a uma queda acentuada dos preços de seus produtos e de uma forte retração da demanda internacional, o presidente da Vale do Rio Doce, Roger Agnelli, teve a ousadia de, em nome dos interesses dos acionistas, tomar algumas decisões que contrariavam os interesses políticos do Governo Lula, como a demissão de pessoal, o corte de investimentos e a aquisição de navios no exterior. Dali em diante, mesmo que de forma dissimulada, sua substituição passou a ser uma questão de honra para os áulicos petistas.

Semana passada, finalmente, a máscara caiu e o ministro Guido Mantega pediu formalmente a cabeça de Agnelli ao comando do Bradesco, maior acionista privado da companhia. Apesar dos excelentes resultados obtidos pela Vale durante a gestão do executivo, quando o valor de mercado saltou de US$ 9 bi para incríveis US$ 176 bilhões, dificilmente o governo não sairia ganhando com a chantagem, ainda que contra a vontade da maioria dos acionistas e funcionários.

O capitalismo de compadres (talvez “comparsas” fosse uma alcunha mais adequada) que vigora atualmente em terras tupiniquins tornou a maior parte das empresas, notadamente as que atuam em setores fortemente regulados, como o bancário, reféns dos humores de políticos e burocratas (embora, a bem da verdade, elas não tenham muito do que reclamar, já que os benefícios que tiram desta relação incestuosa com o governo não são desprezíveis). Exemplo claro de que a bajulação e o compadrio muitas vezes chegam às raias da indecência foi a recente demissão de Alexandre Schwartsman do Banco Santander, ocorrida logo depois que o economista teve o atrevimento de afirmar, na cara do presidente da Petrobras, algo que todo mundo já sabia: que as contas do governo são elaboradas através de malabarismos e artifícios contábeis.

Mas voltemos a Agnelli. Uma fonte do Governo Dilma, ouvida pela Agência Reuters sob a condição de anonimato, resumiu toda a questão de forma simples e direta. Segundo ela, a Vale “é a maior exportadora do Brasil e não pode se comportar de forma que não esteja de acordo com os interesses nacionais” (seja lá o que isto queira dizer). A mesma fonte admitiu ainda certo ciúme governamental, proveniente de uma suposta influência da Vale na China, de longe o maior importador de minérios do mundo e grande potência econômica emergente. Nas suas palavras, “Agnelli tem mais poder de persuasão sobre os chineses do que o embaixador brasileiro ou, até mesmo, a presidente”.

Aquela curta entrevista deixou patente a mentalidade fascistóide reinante nas entranhas do governo petista. No livro “Fascismo de esquerda”, Jonah Goldberg sustenta com propriedade que muitos esquerdistas estão corretos quando lamentam a cumplicidade entre governo e grandes corporações. O que eles são totalmente incapazes de compreender, no entanto, é que este é o sistema que eles mesmos abraçaram. Um sistema no qual o governo consente que os empresários permaneçam à frente dos negócios e, numa demonstração de cooperação e unidade, até mesmo lhes garante muitos benefícios e privilégios de toda sorte. Em troca, espera apenas que eles concordem com sua agenda política – e, de preferência, o ajude a implementá-la.

Arranjos como esse não foram raros ao longo da História. Desde o fascismo de Mussolini, passando pelo Nazismo de Hitler ou o New Deal de Roosevelt, até os dias de hoje, inúmeros governos mundo afora praticaram – e ainda praticam – esse “capitalismo” de Estado. No nazismo, por exemplo, os empresários provavam a sua lealdade ao Fuher sendo bons “cidadãos corporativos”, exatamente como fazem muitos hoje. Segundo Goldberg, a maneira de demonstrar lealdade difere significativamente – e o conteúdo moral das diferentes agendas também. É evidente a diferença entre o que o regime nazista esperava dos “bons empresários alemãos” e o que o petismo espera das nossas lideranças empresariais, como Agnelli, Eike Batista ou os banqueiros do Bradesco e do Santander. Isto, no entanto, não altera algumas semelhanças fundamentais.

Muito embora existam correntes socialistas radicais dentro do próprio PT que pregam isso abertamente, não há razões para acreditar que o governo atual pretenda reestatizar a Vale. O que ele quer, repito, é atrelar a Vale à sua agenda política e social. “A Responsabilidade social corporativa”, costumam dizer os esquerdistas, “é a pedra angular do desenvolvimento econômico e social sustentável”. Não é preciso ser nenhum George Orwell para decifrar o que isso quer dizer em “novilíngua”.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

O besteirol do Forum Social Mundial: uma observacao certeira

Sou um observador crítico, há dez anos, das bobagens disseminadas em TODOS os eventos do Fórum Social Mundial.
Acabo de publicar um livro dedicado precipuamente a esta finalidade:

Globalizando: ensaios sobre a globalização e a antiglobalização
(Rio de Janeiro: Lumen Juris Editora, 2010, xx+272 p.; ISBN: 978-85-375-0875-6).

Mas confesso que já não tenho mais paciência, nem tempo, de ficar lendo tanta bobagem que se escreve e se diz nesses piqueniques inúteis da antiglobalização.
Assim, com exceção de um artigo mais recente, de caráter genérico, abordando tanto o Fórum Econômico de Davos quanto o de seus oponentes, este aqui:

Fórum Econômico e Fórum Social: dois mundos impossíveis e contraditórios?
Brasília, 7 fevereiro 2011, 5 p.
Comentários sobre o WEF e o FSM, criticando ambos.
Mundorama (8.02.2011).
Relação de Originais n. 2244; Publicados n. 1022.

nem procurei saber o que acontecia em Dacar, tal a quantidade de bobagens que normalmente é debitado, em quantidades monumentais, nesse tipo de encontro.
Mas um colega de lista destacou dois trechos primorosos de um dos documentos que circulou por lá e fez um diagnóstico preciso, necessariamente cruel:

Seminário A busca de paradigmas de civilização alternativos e a agenda da transformação social
Dakar, Senegal – 7 a 10 de fevereiro de 2011

Nota conceitual do Grupo de Reflexão e Apoio ao Processo FSM (GRAP-FSM)

"O Fórum Social Mundial 2011 enfrenta o desafio de auxiliar atores e movimentos que resistem à globalização neoliberal a construírem um horizonte de superação sistêmica da ordem capitalista, capaz de conectar e potencializar uma grande multiplicidade de lutas dando-lhes um sentido de transição para uma ordem mundial sustentável social e ambientalmente – ou, o que é o mesmo, um mundo de justiça ambiental e social.

(...)

O capitalismo lucra com todas as formas de desigualdade, deslocando a produção para onde seus custos são mais baixos, criando um mundo ao mesmo tempo muito mais globalizado e fragmentado. O crescimento dos chamados “emergentes” amplia o numero de assalariados em centenas de milhões e das classes médias em dezenas de milhões, isto é, integra como consumidores novas parcelas da população mundial. A máquina capitalista move-se na lógica de crescer mais, ampliar exportações e importações, produzir e consumir mais bens industriais e criar e utilizar serviços cada vez mais complexos, mercantilizar tudo numa dinâmica de obsolescência planejada, uso privado, desperdício e descartabilidade. Na medida que centenas de milhões de pessoas mais perseguem a felicidade através do modo de vida consumista, demandam cada vez mais recursos: energia barata, matérias primas industriais, alimentos e serviços ambientais."

Comentário final e definitivo:
O primeiro parágrafo é um primor. O redator conseguiu juntar quase todos os chavões esquerdopatas em apenas quatro linhas. O resultado é quase ininteligível. No último parágrafo os arautos do subdesenvolvimento LAMENTAM a entrada dos mais pobres na "sociedade de consumo".
É uma confissão clara de que, se dependesse deles, a miséria seria eternizada na face da terra.
Haja estômago para o pensamento dessa gente.

João Luiz Mauad

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Não preciso acrescentar mais nada...
Paulo Roberto de Almeida

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Algumas frases simples (e necessárias) sobre Estado e governo - João Luiz Mauad

O bom governo
João Luiz Mauad
O Globo, 6 de fevereiro de 2010

Sempre gostei de aforismos. Encanta-me a capacidade de certas pessoas para, em poucas palavras, transmitir mensagens para as quais eu precisaria de algumas laudas. Nietzsche disse certa vez: "minha ambição é dizer em dez frases o que outro qualquer diz num livro, o que outro qualquer não diz nem num livro inteiro". A coletânea de citações abaixo é dedicada aos novos governantes do país, na esperança de que este pequeno resumo do pensamento liberal possa, se não servir-lhes de guia, ao menos fazê-los refletir sobre o real significado de governar.

Os governos existem para proteger os legítimos direitos à vida, à liberdade e à propriedade. (John Locke).

Devemos dizer ao povo o que ele precisa saber e não o que ele gostaria de ouvir. (J.F.Kennedy).

O maior cuidado de um Governo deveria ser o de habituar, pouco a pouco, os povos a dele não precisar. (Alexis de Tocqueville).

As leis abundam em Estados corruptos. (Tácito).

Não se deve confundir Estado forte com Estado grande. (Roberto Campos).

Quando os cidadãos temem o governo, temos uma ditadura; quando o governo teme os cidadãos, temos liberdade. (Thomas Jefferson).

Se pudermos evitar que o governo desperdice o trabalho das pessoas sob a pretensão de ajudá-las, o povo será feliz. (Thomas Jefferson).

Se tivesse que decidir se devemos ter governo sem imprensa ou imprensa sem governo, eu não vacilaria um instante em preferir o último. (Thomas Jefferson)

Mesmo o melhor dos governos não é mais que um mal necessário. (Thomas Paine)

Não há nada mais inútil do que fazer eficientemente aquilo que não se deveria fazer. (Peter Drucker).

O governo é um mau gerente. (Peter Drucker).

O menos ruim dos governos é aquele que se mostra menos, que se sente menos e a quem se paga menos caro. (Alfred de Vigny).

Dinheiro público é como água benta: todos querem colocar a mão. (Provérbio Italiano).

A inflação é um imposto que se aplica sem que tenha sido legislado. (Milton Friedman).

Um governo é bom ou mau não só pelo que faz ou deixa de fazer, mas pelo que permite ou impede que se faça. (Jerry Brown).

Se os homens fossem anjos, nenhum governo seria necessário. (James Madison).

Pouco mais é necessário para elevar um Estado do mais baixo nível de barbarismo ao mais elevado grau de opulência do que paz, impostos leves e uma razoável administração da justiça. (Adam Smith).

Todo Poder corrompe, o Poder absoluto corrompe absolutamente. (Lord Acton).

Quanto mais proibições impuserem, menos virtuosas serão as pessoas. (Lao Tse)

É estúpido deixar as decisões sobre economia àqueles que não pagarão preço algum por equivocar-se. (Thomas Sowell)

O mercado não é uma invenção do capitalismo... É uma invenção da civilização. (Mikhail Gorbachov)

Todo governo que ousa fazer tudo, acaba fazendo nada. (W. Churchill)

O vício inerente ao capitalismo é a divisão desigual das riquezas. A virtude inerente ao socialismo é a repartição igualitária da miséria. (W. Churchill)

A diferença entre um estadista e um demagogo é que este decide pensando nas próximas eleições, enquanto aquele decide pensando nas próximas gerações. (W. Churchill)

Não onere os negócios com custo alto ou com muitas regulamentações. O resultado será o desemprego. (Margaret Thatcher).

O governo não pode dar nada ao povo que primeiro dele não tenha tirado. (Richard Nixon).

As leis inúteis debilitam as necessárias. (Montesquieu).

O governo não pode fazer os homens ricos, mas pode empobrecê-los. (Ludwig von Mises).

A lei não é o refúgio do oprimido, mas a arma do opressor. (Frederic Bastiat)

O governo e os negócios devem manter-se independentes e separados. (Calvin Coolidge)

Onde há muitas leis específicas é sinal de que o Estado está mal governado. (Isócrates).

A diferença entre um Estado benfeitor e um Estado totalitário é questão de tempo. (Ayn Rand).

O melhor governo é aquele em que há o menor número de homens inúteis. (Voltaire).

terça-feira, 19 de outubro de 2010

A "guerra cambial" do ministro Mantega (3): enxugando gelo...

O governo anda feito barata tonta.
Limito-me a transcrever um artigo perfeitamente racional sobre um assunto que o governo trata de maneira completamente irracional.
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Paulo Roberto de Almeida

A questão cambial: enxugando gelo
João Luiz Mauad
Diário do Comércio, 18/10/2010

A solução do problema do câmbio passa longe de pacotes intervencionistas, como o aumento do IOF recentemente divulgado, que não enfrenta o cerne da questão. Na tentativa de estabilizar a taxa cambial, o governo acaba contribuindo para que esta valorização se acentue.

Ainda bem que as pessoas não saem por aí desafiando a lei da gravidade, tal qual insistem em pôr à prova a velha lei econômica da oferta e da demanda. Fico imaginando indivíduos usando as janelas dos edifícios, no lugar das escadas e dos elevadores, ou saltando de aviões em pleno voo. Seria uma catástrofe, sem dúvida.

A alguns, esta pode parecer uma comparação descabida – afinal afrontar a lei da oferta e da demanda não mata (pelo menos não instantaneamente). No entanto, em determinadas circunstâncias, pode provocar danos consideráveis. Vejamos, abaixo, um caso bastante atual.

Todos os dias, chova ou faça sol, abrimos os jornais ou ligamos a TV e nos deparamos com a infalível choradeira de empresários, políticos, ministros de Estado, economistas e outros opinantes por causa do câmbio. Lamentam, com certa razão, que a taxa estaria defasada. Entretanto, prisioneiros do velho credo protecionista – que remonta à era mercantilista, mas vem sendo alimentado com maciças doses de nacionalismo, tanto pela esquerda quanto pela direita –, não enxergam que a solução do problema passa longe de pacotes intervencionistas, como o aumento do IOF recentemente divulgado pelo governo, que não enfrenta o cerne da questão.

Qualquer pessoa de bom senso sabe que enquanto a oferta de moeda estrangeira continuar maior do que a demanda, seja em função dos superávits comerciais, seja por conta da afluência de investimentos externos, o real permanecerá apreciado. Sabemos também que, em condições de livre mercado, quando há excesso de oferta, a consequente queda dos preços a desestimulará e aquecerá a demanda, até que as duas se equilibrem num novo patamar. O problema é que as soluções espontâneas do mercado não funcionam quando os governos interferem no jogo. E este é, exatamente, o caso em questão. Na tentativa de estabilizar a taxa de câmbio, o governo acaba contribuindo para que ela valorize ainda mais.

Só os ingênuos podem acreditar, por exemplo, que as nossas vendas externas são superiores às compras porque temos alguma vocação exportadora natural ou porque o resto do mundo precisa mais dos nossos produtos do que nós dos deles. Nada poderia ser mais falso. Nossa balança comercial é (ainda) superavitária simplesmente porque os bens e serviços exportados são isentos de impostos, enquanto os importados são taxados de todas as formas possíveis. Os tão festejados superávits são, por conseguinte, induzidos por uma penca de ardis protecionistas.

Para que a taxa de câmbio passe espelhar o efetivo poder de compra do real em relação às outras moedas, é preciso acabar com os artificialismos hoje existentes, o que só será possível se liberarem as amarras das importações. Falo de redução e corte de impostos, desburocratização aduaneira e outras medidas que tornem atraentes as compras no exterior (algo não só possível hoje em dia, como desejável, já que a nossa dívida externa encontra-se perfeitamente equacionada e as reservas suficientes para administrá-la com tranquilidade).
O problema é que, para pôr em prática essa solução, seria necessário, primeiro, remover o ranço protecionista incrustado na cultura econômica brasileira, resultado do trabalho árduo, zeloso e dedicado da velha guarda nacionalista, estimulada e financiada por empresários ineficientes que se dizem capitalistas, mas têm ojeriza à concorrência e ao livre mercado.

Uma eventual abertura aos importados, além de beneficiar o consumidor com a oferta de mercadorias baratas e de qualidade, deteria a desvalorização do dólar . E seria especialmente benéfica para o controle da inflação –a concorrência costuma fazer cair os preços –, facilitando, inclusive, a redução da taxa básica de juros pelo BC. Isso sem falar no enorme incentivo que tal medida traria ao crescimento econômico do País, pois muito mais que o superávit comercial, o que realmente estimula o crescimento é a soma das correntes de comércio com exterior.

Outra coisa que o governo poderia fazer, urgentemente, é parar de operar no mercado de câmbio, comprando dólares a rodo para tentar estabilizar a taxa em patamares que os tecnocratas, do alto de sua enorme arrogância, entendem mais correta para o Brasil.

Adquirir divisas e engordar as nossas já inchadas reservas tem um custo muito alto, além da imensa diferença entre os juros pagos pelo Tesouro para captar recursos no mercado interno e os juros que remuneram as reservas brasileiras no exterior, o aumento da dívida pública contribui para a manutenção dos juros internos em patamares sempre elevados.

E nunca é demais lembrar que a alta remuneração dos títulos públicos tem sido um atrativo poderoso para os capitais especulativos, especialmente agora, com o mercado internacional altamente líquido, depois que os países do primeiro mundo inundaram as respectivas economias na tentativa de deter a recessão.

Se mantiver as atuais políticas, o governo vai continuar enxugando gelo e, pior, jogando fora o dinheiro dos pagadores de impostos.

João Luiz Mauad é empresário e colunista do site www.midiaamais.com.br

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Multiplicando a pobreza (o esporte favorito de politicos e alguns economistas...)

Opinião
O (sub)desenvolvimento não se improvisa
João Luiz Mauad
Diário do Comércio, 12/9/2010

No campo da liberdade econômica, somos reféns de uma mentalidade avessa ao lucro e temos alta admiração pelo intervencionismo.

Adam Smith, considerado o pai da moderna economia, deu à sua mais famosa obra, ainda em pleno século 18, o nome de Uma investigação sobre a Natureza e as Causas da Riqueza das Nações. Dono de uma mente brilhante, não perdeu seu precioso tempo investigando as causas da pobreza das nações. Sabia que esta não tem causas, pois é o estado natural do ser humano e, consequentemente, das nações.

Durante a maior parte da história, a pobreza foi a regra, a condição existencial de nossos antepassados. Extraordinária mesmo sempre foi a riqueza. Infelizmente, entretanto, muita gente, ainda hoje, não compreendeu esta singela verdade, e continua perguntando, equivocadamente, o que causa a pobreza. Vários livros já foram escritos a respeito.

As respostas mais frequentes para esta falsa questão costumam ser completas falácias: Fulano é pobre porque Beltrano é rico ou a nação X é rica porque explora a nação Y. O raciocínio – se é que há algum – por trás destas enormidades, é que existe uma quantidade fixa de riqueza na natureza, da qual os ricos ficam com a maior parte.

Partidário dessa teoria, o senador Aloizio Mercadante lançou o nome de Luiz Inácio Lula da Silva para o Prêmio Nobel da Paz de 2011. O principal argumento do parlamentar é o suposto sucesso do programa de transferência de renda, o Fome Zero, no combate à pobreza.

Nada poderia ser mais equivocado. Se tivesse lido Adam Smith e outros bons economistas, Mercadante saberia que o combate à pobreza se dá através da geração de riqueza, a qual é criada e multiplicada pelo homem através do empreendedorismo, da especialização, da divisão do trabalho e, acima de tudo, do mecanismo de trocas voluntárias.

Isso quer dizer que aqueles mais bem preparados para construir casas serão construtores; aqueles mais bem equipados para tratar os doentes serão médicos; uns fabricarão roupas, outros alimentos; uns darão aulas, outros serão policiais. E por meio do comércio voluntário todos acabarão se beneficiando.

Por isso, quem realmente desejar melhorar a condição de vida dos mais pobres deveria, em lugar de tentar tomar a riqueza dos ricos e distribuí-la aos pobres, pensar em estabelecer as condições necessárias para que o maior número possível de indivíduos possa juntar-se ao mundo dos criadores de riqueza.

A única forma de vencer a pobreza é criar o ambiente propício para o enriquecimento das sociedades, de forma que os ricos se tornem mais ricos e os pobres se tornem mais ricos. Tal ambiente requer um cenário com poucas restrições à atividade econômica privada e um sistema institucional que proteja, de maneira firme e intransigente, o direito de propriedade e o respeito aos contratos, gerando na sociedade um clima de confiança recíproco.

Nesse ambiente, a fortuna é privilégio daqueles que melhor e mais rapidamente identificam os desejos dos consumidores, produzem bens e serviços para atendê-los e administram com maior eficiência e zelo os seus negócios.

Por que a confiança interpessoal é fundamental? Ora, toda transação econômica é feita por meio de acordos de vontade que visam a adquirir, resguardar, transferir ou conservar direitos de propriedade. Os contratos podem ser expressos ou tácitos, porém a expectativa subjacente é o cumprimento do pactuado, já que, caso contrário, a contratação não teria nenhum sentido.

Com efeito, em sociedades onde o imperativo ético não é regra, as relações pessoais tendem à desconfiança, e as transações econômicas tornam-se complicadas e caras.

É claro que uma sociedade de confiança não nasce do nada. Os indivíduos precisam ser incentivados a confiar uns nos outros. É aí que entra o fundamental papel do governo, pois nós só estaremos propensos a confiar nos demais se tivermos certeza de que, em caso de necessidade, basta chamar a polícia ou apelar à Justiça e elas agirão com presteza em nossa defesa e na defesa das nossas propriedades. Eis por que, no sistema capitalista, a segurança pública, a segurança jurídica e o Estado de Direito são tão importantes para a prosperidade de qualquer nação.

No Brasil, infelizmente, estamos ainda muito longe desse ambiente ideal. No campo da liberdade econômica, somos reféns de uma mentalidade francamente avessa ao lucro e nutrimos grande admiração pelo intervencionismo.

Paralelamente, a economia informal avança sem barreiras. A falsificação e a pirataria correm soltas, sem que as autoridades, os prejudicados e a população em geral tomem qualquer atitude. Basta percorrer as ruas das principais capitais do País para verificar a total impunidade com que camelôs vendem mercadorias pirateadas, quando não contrabandeadas ou roubadas.

Como o respeito aos contratos e o próprio Estado de Direito não estão plenamente assentados, nem em termos das instituições formais (leis e Justiça) nem das informais (ética), a insegurança jurídica grassa, fazendo com que os custos de transação no Brasil estejam entre os maiores do mundo. A consequência mais nítida disso tudo é a nossa baixíssima competitividade no mercado global.

Como dizia Nelson Rodrigues, de quem "roubei" o título acima, "o subdesenvolvimento não se improvisa; é obra de séculos".

Malgrado a jactância dos atuais governantes em torno dos supostos resultados econômicos e sociais do País, o fato é que ainda temos um longo caminho a percorrer, até que consigamos deixar a pobreza e o subdesenvolvimento definitivamente para trás.

João Luiz Mauad é empresário e colunista do site www.midiaamais.com.br

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Contas Nacionais: de volta a uma pequena equacao enganosa

Uma pequena aula de Economics 101...

As importações e o PIB: o que se vê e o que não se vê [*]
João Luiz Mauad
Ordem Livre, 12 de Agosto de 2010

Foi anunciada, há duas semanas, a primeira estimativa do PIB norte-americano para o segundo trimestre do ano em curso, indicando uma alta de 2,4% (anualizada) em relação ao período imediatamente anterior. O número veio mais ou menos dentro do esperado pelo mercado, e o que chamou atenção mesmo foram algumas análises e comentários dele decorrentes, vindos, inclusive, de gente bem pensante e informada.

A jornalista de economia de O Globo, Mirian Leitão, por exemplo, estampou em seu blog o seguinte comentário:

Setor externo puxa desaceleração da economia americana
A economia americana desacelerou no segundo trimestre. A redução do ritmo foi impulsionada pelo setor externo, em decorrência da forte aceleração das importações. Entre abril e junho, o PIB (Produto Interno Bruto) teve alta de 2,4% em relação aos primeiros três meses do ano, quando a economia havia crescido 3,7%. O número ainda pode ser revisado, mas veio abaixo das expectativas (2,6%).


Na mesma linha, o jornal Folha de São Paulo publicou a notícia, em sua página na internet, nos seguintes termos:

Importação tem maior alta em 26 anos e desacelera expansão dos EUA no 2º tri
O crescimento no trimestre passado foi contido por um aumento de 2,8% nas importações, que ofuscou a elevação de 10,3% nas exportações. Isso gerou um déficit comercial que tirou 2,78 pontos percentuais do PIB, a maior subtração desde o terceiro trimestre de 1982.


Já o site de economia do UOL publicou a seguinte matéria, quase nos mesmos termos:

Importações desaceleram expansão dos EUA no 2o tri
A expansão do segundo trimestre foi contida por um salto de 28,8 por cento das importações, que ofuscou o avanço de 10,3 por cento das exportações. Isso gerou um déficit comercial que tirou 2,78 pontos percentuais do PIB, a maior subtração desde o terceiro trimestre de 1982.


Outros veículos seguiram a mesma linha.

Qualquer pessoa menos informada, que se depare com tais notícias, sairá com a impressão de que, quanto mais um país importa, menor será o seu PIB. Importar, portanto, seria algo análogo a destruir riqueza. Se acreditarmos no que dizem os analistas, sairemos certos de que, ao comprarmos um produto importado, estaremos contribuindo para a ruína de nosso país.

O fulcro desta falácia econômica, disseminada, muitas vezes até involuntariamente, está na famigerada identidade contábil abaixo, utilizada, mundo afora, para o cálculo do PIB:

PIB = C + I + G + X – M

O problema não está na fórmula em si. Como método de aferição do Produto Interno Bruto, ela é largamente aceita. O volume do PIB é equivalente ao somatório do consumo das famílias e empresas (C), dos investimentos (I), dos gastos do governo (G) e do saldo de comércio com o estrangeiro (X-M).

A confusão é provocada exatamente pelo sinal de subtração antes das importações (M), o que induz a pensar que elas diminuem o valor do PIB. Aquele sinal (-), no entanto, está ali justamente para fazer com que as importações tenham peso neutro no cálculo do Produto INTERNO Bruto, afinal elas já estão inseridas (com sinal positivo) tanto em C (consumo), quanto em I (investimento) ou X (exportações), e até mesmo em G (gastos públicos).

Suponha que eu resolva utilizar minhas economias e adquira R$ 100.000,00 em bicicletas, com objetivo de revenda no mercado interno. No final do negócio, vendi todas as bicicletas por R$ 120.000,00, obtendo um lucro de 20% sobre o investimento. No cálculo do PIB, estes R$ 120.000,00 farão parte de “C” – Consumo das famílias –, embora os produtos consumidos não tenham sido fabricados dentro do país. Para corrigir esta distorção, já que o PIB deve espelhar somente a riqueza gerada domesticamente, o volume de importações aparece com sinal negativo na fórmula de cálculo.

Fica claro, portanto, que as importações não reduzem o valor do PIB. Pelo contrário, ao gerar lucro, criam riqueza – no exemplo em tela, estamos falando de R$ 20.000,00. Mas alguém poderia indagar que, se eu não houvesse importado as bicicletas, elas teriam sido produzidas internamente, aumentando o valor do PIB em R$ 200.000,00. Certo? Errado!

Se eu produzo uma mercadoria a um custo X e vendo pelo mesmo valor X, o incremento do PIB é nulo. O que gera novas riquezas e aumenta o PIB é o valor adicionado. Para adquirir as bicicletas, seja no exterior ou no mercado interno, eu (comerciante) precisarei mover recursos de algum lugar. Se eu compro (ou produzo) e vendo as mercadorias pelo mesmo valor, apenas transfiro recursos de uma variável para outra, sem que haja incremento algum. Assim, eu posso “destruir” riqueza fabricando bicicletas no mercado interno a R$ 130.000,00 e vendendo-as a R$ 120.000,00, bem como, de modo inverso, criar riqueza comprando bicicletas a R$ 100.000,00 no exterior e vendendo-as a R$ 120.000,00 no mercado interno.

A coisa fica ainda mais perigosa quando alguns "espertinhos", geralmente keynesianos, cismam de utilizar a mesma fórmula como ferramenta teórica para demonstrar supostos benefícios econômicos do aumento dos gastos públicos. Não é raro, por exemplo, encontrar economistas defendendo o aumento dos empregos públicos ou das transferências de renda como formas eficientes de fomentar (eles adoram esta palavra) o crescimento do país.

A falha dessa “teoria” está no fato de que quaisquer aumentos em G decorrem necessariamente de reduções equivalentes nas demais variáveis, principalmente C e I – de onde provêm, inevitavelmente, os recursos dos impostos e dos empréstimos que o governo toma da sociedade. Portanto, os gastos dos governos são recursos que deixaram de ser utilizados pelos consumidores, investidores e produtores. Há apenas uma redistribuição forçada desses recursos, cujo resultado é a alocação ineficiente dos mesmos.

Os keynesianos, de forma geral, acham que seus modelos matemáticos e gráficos possuem vida própria, independente das ações e vicissitudes dos agentes econômicos (seres humanos), os quais, no fim das contas, são a força motriz que dá direção e intensidade às variáveis econômicas. Também se recusam a admitir o princípio da escassez e o conseqüente custo de oportunidade de qualquer ação econômica. É lamentável que esse pensamento encontre-se tão disseminado entre nós.

[*] Apud Bastiat.

domingo, 2 de maio de 2010

Uma segunda grande aula sobre o mercado...

Bem, já que estamos nesse ofício didático, melhor reproduzir textos de qualidade, como este que segue abaixo.
Tenho ouvido com certa frequência, inclusive de "sumidades" como o Prêmio Nobel Joseph Stiglitz, que a tal de "mão invisível", ou não existe, ou não funciona.
Pois apreciaria que alguém, qualquer alguém, inclusive o próprio, desmentisse o que vai aqui dito sobre esta frase memorável de Adam Smith...
Paulo Roberto de Almeida

Eu vi a Mão Invisível
João Luiz Mauad
O Globo, abril de 2010

Quem nunca entrou num supermercado, apinhado de gente, em pleno sábado à tarde? Para muitos, trata-se de um programa de índio. Eu mesmo procuro evitá-lo a todo custo, inclusive persuadindo minha mulher de que vale a pena fazer as compras pela internet, ainda que por um preço um pouco mais salgado.
Naquela tarde, entretanto, minha sensação ao adentrar aquele estabelecimento foi diferente. Senti-me diante de um milagre. Não um milagre de Deus, mas um milagre do engenho humano. Havia ali centenas - talvez milhares - de pessoas, das mais diversas classes sociais, enchendo carrinhos e esvaziando prateleiras recheadas de mercadorias, desde alimentos frescos até equipamentos eletrônicos sofisticados, passando por roupas, utensílios do lar, cosméticos e uma infinidade de outros produtos. Nenhum daqueles consumidores fez qualquer pedido prévio ao gerente do supermercado, nem tampouco deu qualquer indicação sobre os produtos de que precisaria. Eles simplesmente apareceram lá, no dia e hora de sua conveniência, certos de que encontrariam os itens de sua preferência, nas quantidades desejadas.

Para que isso fosse possível, convergiram (ao longo de meses) os esforços de inumeráveis agentes, de diferentes empresas, responsáveis pela produção, transporte, distribuição, armazenamento, etc. O mais impressionante, especialmente para um administrador acostumado a conceitos como planejamento, organização, direção e controle, é o fato de que ninguém coordenou todas aquelas atividades. Parafraseando Leonard Read em seu excepcional ensaio “Eu, O Lápis”, nenhum superburocrata, montado num plano mirabolante e minucioso, foi chamado para articular tudo aquilo. Baseadas somente nos sinais de preço e lucro emanados pelo mercado, empresas e respectivos profissionais esmeraram-se para satisfazer as necessidades de milhares de pessoas que, naquela tarde, dali saíram com suas sacolas cheias.

Para explicar esse poder misterioso que leva os homens, cada qual trabalhando exclusivamente em busca do próprio ganho, a promover o interesse de muitos, Adam Smith - ainda num tempo em que os mercados eram infinitamente menos complexos – cunhou a famosa metáfora da “mão invisível”. Segundo ele, se cada consumidor puder escolher livremente o que comprar e cada produtor escolher o que e como produzir, esse “jogo de interesses” será capaz de maximizar a produção e distribuição de bens e serviços, em benefício de todos.

Embora testemunhemos milagres semelhantes todo santo dia, muita gente ainda considera que o sistema de livre mercado é ineficiente, entre outras coisas porque nele imperaria uma suposta "anarquia". Essa falácia sustenta que o capitalismo carece daquelas panacéias apelidadas pelos intervencionistas (entre eles muitos administradores) de "planejamento estratégico", "planejamento integrado" ou simplesmente "planificação econômica".

Nada poderia ser mais equivocado. Como bem notou o austríaco F. V. Hayek ao analisar os modelos de livre mercado, de um aparente caos envolvendo milhões de transações privadas, descentralizadas e descoordenadas, emerge uma inesperada “ordem espontânea”, capaz de produzir uma quantidade de mercadorias e serviços tão imensa e extraordinária que a própria mente humana é, muitas vezes, incapaz de divisar.

De fato, o livre mercado é um sistema extensivamente planejado. Só que tal planejamento ocorre de forma pulverizada, através da atuação auto-interessada de cada agente. Quem quer que pense numa determinada ação econômica que lhe possa ser benéfica, assim como nos aspectos operacionais da sua consecução, estará realizando uma pequena parcela da "planificação" de uma economia de mercado. As pessoas planejam comprar imóveis, automóveis, eletrodomésticos, alimentos, roupas e tudo mais. Planejam que tipo de profissão abraçar e, conseqüentemente, que trabalhos pretendem realizar, de acordo com habilidades específicas que possuem. As empresas, por sua vez, planejam produzir novos produtos ou descontinuar os atuais; planejam reduzir custos investindo em novas tecnologias; planejam abrir filiais ou fechar as existentes; planejam contratar trabalhadores ou demiti-los; aumentar seus estoques ou liquidá-los; fazer novos investimentos ou distribuir os lucros...

Ao contrário dos modelos de planificação centralizada, o planejamento ocorre em todas as partes e a todo instante nos sistemas de livre mercado. E essa diferença é vital: no primeiro caso, a escassez é freqüente, enquanto no último impera a abundância.

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Creio que não preciso acrescentar mais nada.
Adam Smith agradece o "ajutório"...