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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

domingo, 8 de novembro de 2020

Joe Biden, discurso da vitória: Wilmington, DE, 7/11/2020


Discurso da vitória de Joe Biden como presidente eleito

Democrata pregou a cura da alma dos EUA após eleição tensa

Folha de SP, 7/11/2020

Joe Biden, presidente eleito dos EUA, fez um discurso da vitória na noite de sábado (7), em Wilmington, Delaware. Leia a íntegra a seguir.

"Meus conterrâneos americanos, o povo deste país falou. Ele nos deu uma clara vitória, uma vitória convincente, uma vitória para "Nós, o povo". Nós vencemos com o maior número de votos já dados a uma chapa presidencial na história deste país —74 milhões.

Estou comovido pela confiança e a fé que vocês depositaram em mim.

Prometo ser um presidente que não busca dividir, mas unir. Que não vê estados vermelhos e azuis, mas os Estados Unidos. E que trabalhará com todo o seu coração para conquistar a confiança de toda a população.

Joe Biden durante discurso em Wilmington, Delaware - Jim Bourg/Reuters

Pois isso é do que se trata a América: o povo. E é disso que tratará nosso governo.

Eu quis ter este cargo para restaurar a alma da América. Para reconstruir a espinha dorsal do país —a classe média.

Para fazer a América ser respeitada em todo o mundo novamente e nos unir aqui em casa. É a maior honra da minha vida que tantos milhões de americanos tenham votado nessa visão. E agora o trabalho de realizar essa visão é a tarefa de nossa época.

Como eu já disse muitas vezes, sou o marido de Jill. Eu não estaria aqui sem o amor e o apoio incansável de Jill, Hunter, Ashley, todos os nossos netos e seus cônjuges e toda a nossa família. Eles são meu coração.

Jill é uma mãe —uma mãe militar— e uma educadora. Ela dedicou sua vida à educação, mas ensinar não é só o que ela faz --é quem ela é. Para os educadores da América, este é um ótimo dia: vocês terão uma de vocês na Casa Branca, e Jill vai ser uma ótima primeira-dama.

E eu terei a honra de servir com uma fantástica vice-presidente, Kamala Harris, que fará história como a primeira mulher negra, a primeira mulher de origem sul-asiática e primeira filha de imigrantes já eleita para um cargo nacional neste país.

Isso já devia ter acontecido há muito tempo, e somos lembrados hoje à noite de todos os que lutaram firmemente durante tantos anos para que acontecesse. Mas mais uma vez a América curvou o arco do universo moral em direção à justiça.

Kamala, Doug, gostem ou não, vocês são da família. Vocês se tornaram Bidens honorários e não há como escapar.

A todos os voluntários, que trabalharam nas pesquisas no meio desta pandemia, autoridades eleitorais locais —vocês merecem um agradecimento especial deste país.

À minha equipe de campanha, e todos os voluntários, a todos os que deram tanto de si para tornar possível este momento, eu devo tudo a vocês.

E a todos os que nos apoiaram: orgulho-me da campanha que fizemos e conduzimos. Estou orgulhoso da coalizão que formamos, a mais ampla e diversificada da história. Democratas, republicanos e independentes. Progressistas, moderados e conservadores. Jovens e velhos. Urbanos, suburbanos e rurais. Gays, héteros, transgêneros. Brancos, latinos, asiáticos, americanos nativos.

E especialmente por aqueles momentos em que esta campanha esteve mais frágil, a comunidade afro-americana se ergueu novamente por mim. Eles sempre terão meu apoio, e eu o de vocês.

Eu disse desde o começo que queria uma campanha que representasse a América, e acho que a fizemos. Agora é assim que eu quero que seja o governo.

E, aos que votaram no presidente Trump, eu compreendo sua decepção nesta noite. Eu mesmo já perdi algumas eleições. Mas agora vamos dar uma chance uns aos outros. Está na hora de pôr de lado a retórica dura. De baixar a temperatura. De vermos uns aos outros de novo. De escutarmos uns aos outros de novo.

Para progredir, precisamos parar de tratar nossos oponentes como inimigos. Não somos inimigos. Somos americanos.

A Bíblia nos diz que para tudo há um tempo certo, um tempo para construir, um tempo para colher, um tempo para semear. E um tempo para curar. Este é o momento de curar a América.

Agora que a campanha terminou —qual é o desejo da população? Qual é nosso mandato? Acredito que seja este: os americanos nos chamaram para controlar as forças da decência e as forças da justiça. Para controlar as forças da ciência e as forças da esperança nas grandes batalhas de nossa época.

A batalha para controlar o vírus. A batalha para construir prosperidade. A batalha para garantir tratamento de saúde para sua família. A batalha para conseguir justiça racial e extirpar o racismo sistêmico deste país. A batalha para salvar o clima. A batalha para restaurar a decência, defender a democracia e dar a todos neste país uma chance justa.

Nosso trabalho começa por controlar a Covid. Não podemos reparar a economia, restaurar nossa vitalidade ou desfrutar os momentos mais preciosos da vida, abraçar um neto, aniversários, casamentos, formaturas, todos os momentos mais importantes para nós, enquanto não tivermos esse vírus sob controle.

Na segunda-feira vou nomear um grupo de importantes cientistas e especialistas como assessores da transição para ajudar a pegar o plano Biden-Harris para a Covid e transformá-lo em um plano de ação que começa em 20 de janeiro de 2021. Esse plano será construído sobre um alicerce científico. Será construído com compaixão, empatia e preocupação.

Não pouparei esforços —ou dedicação— para reverter esta pandemia.

Eu disputei como um orgulhoso democrata. Agora serei um presidente americano. Vou trabalhar duro por aqueles que não votaram em mim —assim como para os que votaram. Deixem esta triste era de demonização na América terminar aqui e agora.

A recusa dos democratas e republicanos a cooperar uns com os outros não se deve a uma força misteriosa fora de nosso controle. É uma decisão. É uma opção que fazemos.

E se podemos decidir não cooperar também podemos decidir cooperar. E acredito que isso faz parte do mandato para a população americana. Vocês querem que nós cooperemos.

Essa é a opção que farei. E eu peço ao Congresso —democratas e republicanos igualmente— que façam essa opção comigo.

A história americana tem a ver com a lenta mas constante ampliação das oportunidades. Não se enganem: muitos sonhos foram retardados por um tempo longo demais. Devemos tornar a promessa do país real para todos, não importa sua raça, etnia, religião, identidade ou deficiência.

A América sempre foi moldada por pontos de inflexão —por momentos no tempo em que tomamos decisões difíceis sobre quem somos e o que queremos ser.

Lincoln em 1860 —vindo para salvar a União.

Franklin Roosevelt em 1932 —prometendo um New Deal a um país perturbado.

John Kennedy em 1960 —prometendo uma Nova Fronteira.

E 12 anos atrás —quando Barack Obama fez história— e nos disse: "Sim, nós podemos".

Estamos novamente em um ponto de inflexão. Temos a oportunidade de derrotar o desespero e construir uma nação de prosperidade e propósitos.

Podemos fazer isso, sei que podemos.

Já falei muito sobre a batalha pela alma da América. Devemos restaurar a alma da América. Nosso país é moldado pela batalha constante entre nossos melhores anjos e nossos impulsos mais obscuros. Está na hora de nossos melhores anjos prevalecerem.

Nesta noite, o mundo inteiro está olhando para a América. Acredito que em nosso melhor momento a América é um farol para o mundo. E lideramos não pelo exemplo de nosso poder, mas pelo poder de nosso exemplo.

Eu sempre acreditei que podemos definir a América em uma palavra: possibilidades. Que na América todos devem ter a oportunidade de ir tão longe quanto seus sonhos e a capacidade dada por Deus os levarem.

Vocês veem, eu acredito na possibilidade deste país. Estamos sempre olhando à frente. À frente para uma América mais livre e mais justa. Para uma América que cria empregos com dignidade e respeito. À frente para uma América que cura doenças —como câncer e Alzheimer. À frente para uma América que nunca deixa ninguém para trás.

Uma América que nunca desiste, nunca se rende. Esta é uma grande nação. E nós somos um bom povo. Isto são os Estados Unidos da América. E nunca houve nada que não conseguimos fazer quando o fizemos juntos.

Nos últimos dias da campanha, tenho pensado em um hino que representa muito para mim e minha família, especialmente para meu filho Beau, já falecido. Ele captura a fé que me sustenta e que eu acredito que sustenta a América.

E espero que possa dar algum conforto e alívio às mais de 230 mil famílias que perderam um ser amado para esse vírus terrível neste ano. Meu coração está com cada um de vocês. Espero que este hino lhes dê alívio também.

"E Ele os erguerá com asas de águia,
Os sustentará no sopro do amanhecer,
Os fará brilhar como o sol,
E os segurará na palma de Sua mão."

E agora, juntos — nas asas da águia— embarcamos no trabalho que Deus e a história nos pediram para fazer.

Com corações plenos e mãos firmes, com fé na América e nos outros, com amor pelo país —e sede de justiça—, sejamos a nação que sabemos que podemos ser.

Uma nação unida. Uma nação fortalecida. Uma nação curada. Os Estados Unidos da América.

Deus os abençoe. E que Deus proteja nossas tropas.

Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves.


Biden, o Brasil e a América Latina - Folha de Vitória, Paulo Roberto de Almeida

 https://www.folhavitoria.com.br/geral/noticia/11/2020/biden-um-conhecedor-do-brasil-e-da-america-latina

A matéria me cita, mas não sei quem foi o repórter; em todo caso, a transcrição é correta.

Biden, um conhecedor do Brasil e da América Latina

Joe Biden chega à Casa Branca como um conhecedor do Brasil e da América Latina. Há mais de 40 anos na vida pública norte-americana, ele é reconhecido como um político conciliador e dedicado ao relacionamento internacional. Liderou, como vice-presidente a diplomacia de Barack Obama na América Latina. Presidiu e foi membro do Comitê de Relações Exteriores do Senado dos EUA por 12 anos. E dá nome a um centro de pesquisa na Universidade da Pensilvânia, o Centro Penn Biden para a Diplomacia e o Engajamento Global.

Em 2013, o democrata atuou diretamente na relação com o Brasil. Numa visita a Brasília, Biden ajudou a abrir caminho para uma visita de Estado que Dilma faria, a contragosto de próceres petistas, aos Estados Unidos para melhorar o patamar das relações. Dilma, no entanto, abortaria a viagem. O motivo foi a revelação de que comunicações da presidente e da Petrobras haviam sido bisbilhotadas pela Agência de Segurança Nacional (NSA) norte-americana.

Coube a Biden voltar ao Brasil, durante a Copa do Mundo de 2014, para apaziguar a relação. Eles já haviam conversado em Santiago meses antes, na posse da presidente chilena Michelle Bachelet. O pretexto era assistir ao jogo em que os Estados Unidos venceram Gana por 2 a 1 na Arena das Dunas, em Natal (RN).

Mas Biden não tinha assim tanto interesse no jogo - ele chegou atrasado ao estádio e perdeu o primeiro gol do atacante Dempsey, antes do primeiro minuto. Logo depois do futebol com a neta e um sobrinho, decolou a Brasília. No dia seguinte, conversou a sós longamente com Dilma. Biden usou da simpatia que conquistou - a presidente disse que ele era "sedutor" - para tentar convencê-la de que Obama ordenou uma "revisão imediata" no programa de vigilância. E que mudaria a abordagem com o Brasil.

Na ocasião, Biden trouxe um presente sob medida para a presidente. O vice de Obama entregou a Dilma um lote de documentos até então secretos dos arquivos dos EUA sobre violações na ditadura militar. Os papéis reforçariam a coleta de provas da Comissão Nacional da Verdade, para irritação de oficiais brasileiros.

Após superar o choque de espionagem, Biden voltaria a Brasília em janeiro de 2015, por ocasião da posse de Dilma no segundo mandato. Numa carta de agradecimento com linguagem diplomática, a presidente registrou que os "laços de amizade e apreço" uniam não só os dois povos, mas "a nós pessoalmente".

Dois anos depois, Biden foi encarregado de receber em Washington o presidente Michel Temer (2016-2018), empossado com o afastamento de Dilma, e dar o sinal de reconhecimento americano a sua legitimidade na presidência. No auge da Operação Lava Jato, Biden criticou escândalos de corrupção no continente e respaldou a transição de poder.

Ele afirmou que "o Brasil seguiu sua Constituição para navegar um momento econômico e político difícil". O embaixador Paulo Roberto de Almeida, ex-diretor do Instituto Brasileiro de Relações Internacionais (Ipri), estudioso da história da diplomacia e crítico da atual gestão do Itamaraty, destaca que as diferenças entre republicanos e democratas são mais de "aparência" na relação com o Planalto.

Ele observa que houve períodos áureos e baixos nas relações entre os dois partidos. "Os Estados Unidos são um império, buscam segurança em primeiro lugar e abertura em segundo. Mas para eles, abertura é quando outros países se abrem para os investimentos e o comércio, os produtos americanos", analisa o embaixador, também adversário de gestões petistas no Itamaraty. "Depois eles impõem restrições, espionam a qualquer um, inimigos ou aliados."

A relação com Brasília sempre passou, nas gestões democratas afeitas ao multilateralismo, pela posição de influência regional do Brasil na América do Sul. Atualmente, Jair Bolsonaro vive em conflito político com a Argentina de Alberto Fernández e a Bolívia, de Luis Arce, ambos de esquerda. De imediato, ele tentará se reconectar aos socialistas bolivianos, ao enviar o chanceler Ernesto Araújo à posse de Arce. Analistas e diplomatas dos dois lados concordam que caberá a Bolsonaro mostrar abertura ao diálogo e moderação para acessar Biden.




sábado, 7 de novembro de 2020

De "Trump e o Ocidente" a "Biden e o Ocidente" ? - Paulo Roberto de Almeida

 Tendo acompanhado a vida política do Brasil e dos Estados Unidos nos últimos anos, estava pensando em algumas coisas:

Imagino, por exemplo, que um oportunista conhecido pode tomar a decisão de "dump Trump", e se dispor agora a escrever um novo artigo:

Biden e o Ocidente

Explico: 

Quem publicou o tristemente famoso "Trump e o Ocidente" fui eu, ainda que a contragosto, nos Cadernos de Política Exterior, em 2017, do qual eu era o editor; não tinha porque fazer censura, a despeito de achar o artigo propriamente ridículo. 

Mas, quem olhar a página de expediente desse número 6, ("Coordenação editorial"), vai constatar que meu nome não figura ali, por essa única vez, pelo tempo em que estive na direção dos Cadernos. Achei melhor me dissociar desse número, mas não por causa desse patético artigo: todo mundo tem o direito de se mostrar ridículo. Só mais tarde, já em dezembro de 2018, foi que soube que o futuro chanceler acidental tinha pego vários número dos Cadernos n. 6 e levado pessoalmente, no primeiro semestre de 2018, para o seu guru da Virgínia, o Rasputin de Subúrbio; aí percebi, ex post, que o oportunista estava construindo sua candidatura. Conseguiu, pelo menos essa...

O que se pode dizer agora é que ele foi muito obediente a todos esses aloprados na tarefa de DESTRUIR o Itamaraty e a política externa brasileira.
Não passará impune no registro histórico, pelo menos não no que depender de mim.

Eu fiz uma análise detalhada desse artigo bizarro (ele nunca seria aceito por qualquer journal sério, com blind peer-review, pois não atenderia a critérios mínimos de um artigo acadêmico, scholarly work), num dos capítulos de meu livro Miséria da Diplomacia: a destruição da inteligência no Itamaraty (2019), como informo abaixo.

PS1: Quem quiser ler o artigo original do então "candidato clandestino" à chancelaria pode acessar aqui:

PS2: Quem quiser ler o meu capítulo 2, no livro Miséria da Diplomacia: a destruição da inteligência no Itamaraty, pode fazê-lo no livro completo, como abaixo, ou neste arquivo destacado:

2. O Ocidente e seus salvadores: um debate de ideias 

     1. A decadência e o Ocidente: algum perigo iminente?

     2. Quais são as “teses” principais de “Trump e o Ocidente”?

     3. O grande medo do Ocidente cristão: realidade ou paranoia?

     4. Contradições insanáveis no projeto de salvamento do Ocidente cristão


Coloquei o capítulo em minha página na plataforma Academia.edu, e quando fui dar chamada para o nome de chanceler acidental, descobri que ele tem "ZERO seguidores". Este é o link para o capítulo:


O livro completo está disponível nos seguintes links:

e

O novo mapa da diplomacia bolsolavista - Adriana Erthal Abdenur

 O novo mapa da política externa brasileira: isso dá, para o chefão do bolsolavismo, quatro viagens internacionais, como naquela famosa letra do Aldir Blanc: “são dois pra lá, dois pra cá” e “um torturante band-aid no calcanhar”. Sobrou isso.

Paulo Roberto de Almeida



Em direção de um mundo orwelliano? Não necessariamente - Fortune, on Chinese surveillance system

Será que o mundo vai caminhar para um Estado orwelliano? 

Não acredito. Os instintos de liberdade são mais poderosos do que quaisquer tentações totalitárias, mesmo vindas do famoso, longevo, tradicional, "despotismo oriental", que um dia deixará de sê-lo, pelas mãos e decisão do próprio povo chinês, não por pressão "ocidental".

Paulo Roberto de Almeida  

INTERNATIONALCHINA

The world’s largest surveillance system is growing—and so is the backlash

BY GRADY MCGREGOR

Fortune, November 3, 2020 12:38 PM GMT-3

https://fortune.com/2020/11/03/china-surveillance-system-backlash-worlds-largest/

 

China already has the world’s largest surveillance network; it deploys over half of all surveillance cameras in use around the world. Now, a new report shows just how fast that system is expanding.

From 2010 to 2019, government procurement orders for equipment like facial recognition cameras and maintenance services related to surveillance increased nearly 1,900%, according to a report from ChinaFile, a publication of the Asia Society’s Center on U.S.-China Relations. In 2019 alone, the report found, nearly one-third of all Chinese counties purchased surveillance-related equipment.

 

ChinaFile, which operates as a nonprofit organization and works with a network of China-focused analysts and researchers, published the stand-alone State of Surveillance report after reviewing 76,000 publicly available government procurement orders of surveillance technologies from 2004 to May 2020. The report provides a comprehensive look at the scale of China's surveillance program; Beijing does not widely publicize such information through other means.

Subscribe to Eastworld for weekly insight on what’s dominating business in Asia, delivered free to your inbox.

The report showcases China's yearslong push to become a global surveillance superpower.

China’s facial recognition cameras and surveillance systems are now being used to conduct seemingly innocuous tasks, such as monitoring visitors at tourist sites and conducting security checks at airports, and for more invasive purposes, like predictive policing and helping carry out repressive policies. Authorities in the western province of Xinjiang, for example, have deployed widespread surveillance systems to collect facial recognition, smartphone, and other tracking data to monitor and detain members of the region's minority Uighur population.

At the same time, local-level backlash to the new technologies is prompting legislation that may introduce new data privacy standards in a country with relatively few to speak of.

 

Sharp Eyes

Multiple news reports in recent years have detailed how Beijing uses tech surveillance in Xinjiang to repress its Uighur population. But China's efforts to track its citizens on a mass scale and introduce tech-enabled practices like predictive policing appear to have gone nationwide.

In Xiqiao, a city of roughly 300,000 in southern China, for example, officials have installed more than 1,400 video cameras and over 300 facial recognition cameras since 2006, ChinaFile found. The report said officials have blanketed most of the city's public spaces with the cameras to address "the difficult problem of how to control people," according to a government document obtained by ChinaFile.

Mass surveillance in lower-profile cities and territories reflects the 2018 launch of China's Project Sharp Eyes, an ambitious attempt to equip 100% of Chinese public spaces—street corners, parks, train stations—with video-monitoring capabilities and amass the data into one central platform. China's government says the project is aimed at improving public safety and security, but it's seen outside China as a means for more state control.

Still, surveillance is not universally used in China. The country faces significant bureaucratic barriers in coordinating its surveillance and data-sharing efforts among city, provincial, and central-level authorities, the report found.

 

A backlash

At least some Chinese citizens appear to be wary of the technological intrusion.

This week, Hangzhou, a city in eastern China that's home to Chinese tech giant Alibabapublished a draft law that would ban property managers from deploying facial recognition cameras in residential compounds without permission from local residents.

The proposed legislation follows a first-of-its-kind lawsuit over facial recognition technology filed in Hangzhou. In that case, Guo Bing, a professor at Hangzhou's Zhejiang University, sued a local wildlife park after it tried to subject him to new, mandatory facial scans months after he had purchased a yearlong pass.

He claims the park violated his consumer rights when it failed to refund his ticket after he objected to the new policy. A park official told Chinese media that the policy was intended to make the experience more convenient for customers. The park later changed its policy to give customers the option of using a fingerprint registration system. Guo, however, does not appear to have dropped the lawsuit. He's said his complaint is about challenging the "abuse of facial recognition technology" and not about a refund. As of Oct. 29, his case was still pending.

If the proposed legislation in Hangzhou passes, the law would be China’s first ban on the mandatory use of facial recognition technology on private citizens. Chinese state media, which often acts as a messaging tool for Beijing, suggests that it may become model legislation for cities across China.

The legislation may align with Chinese public opinion.

A December 2019 survey of 6,000 people by the Nandu Personal Information Protection Research Centre in Beijing found that 57% of respondents said they were concerned about their movements being tracked, and 74% said they would opt for analog identification methods over facial recognition.

China's government may have already built the world's largest mass surveillance system, but its citizens appear ready to impose some limits.

 

O cronista misterioso do Itamaraty fazendo sucesso nas redes: crônicas do Itamaraty bolsolavista

 A plataforma Academia.edu me manda uma nota: 

Hi Paulo Roberto, 

Congratulations! You uploaded your paper 2 days ago and it is already gaining traction. 

Total views since upload: 

You got 131 views from Brazil, the United States, Germany, Belgium, Canada, Nicaragua, Chile, Ireland, and Cyprus on "Um Ornitorrinco no Itamaraty: cronicas do Itamaraty bolsolavista - Ereto da Brocha (2020)". 

Thanks,
The Academia.edu Team


Descarregar aqui: 

Trump contra Deus e o mundo - José Augusto Guilhon Albuquerque

Trump contra Deus e o mundo
José Augusto Guilhon Albuquerque
6/11/2020

Ainda tenho que estudar melhor os casos e precisar as hipóteses mas, neste momento, posso dizer que é preciso desmontar a máquina do Executivo e envolver os demais poderes. 
No populismo pós-Guerra Fria, Chávez obteve a adesão do Legislativo, graças à omissão da oposição, mais a adesão direta do Judiciário, e desmontou ou comprou a máquina executiva, inclusive as Forças Armadas. 
Trump desmontou o Departamento de Estado, as Agências de Inteligência, o Ministério da Justiça, sem falar nas áreas de Saúde e Meio ambiente, Comércio Exterior, Educação, etc, e tentou, até agora sem sucesso total, envolver a Defesa. 
No Legislativo, conseguiu paralisar em grande medida a Câmara, contando com  um misto de omissão  e adesão do Senado. E operou por iniciativa do Presidente do Senado, Mitch McConnell, a maior operação de nomeações de novos  juízes federais escolhidos dedo a dedo - graças à omissão do governo Obama.
Isso permitiu sua absolvição pelos crimes de alta traição que cometeu, graças ao Senado, que o declarou inimputável. 
Mas não teve tempo para obter a adesão integral do Judiciário, mas bem que tentou, por isso está perdendo a eleição. 
Se ganhasse o segundo mandato, iria tentar se perpetuar no poder, como fizeram Chavez, Evo, e Ortega, sem falar nos que tentaram, mas desistiram a tempo.

Dr.José Augusto Guilhon Albuquerque
Professor of International Relations, University of São Paulo (USP)
Senior Fellow, USP Research Center for International Relations (NUPRI)
Director, Brazilian Society for the Study of Transnational Enterprises and Globalization
Senior Research Fellow, Wong Center for the Study of Multinational Corporations
+55.11.4704.1627(ho)  +55.11.99890.5568 (cel)

Derrota de Trump interrompe delírios internacionais de Bolsonaro - Eliane Cantanhede


 

COLUNISTA

Eliane Cantanhêde

Caindo na real

Se Trump perder, arrasta junto a política externa e os delírios internacionais de Bolsonaro

Eliane Cantanhêde, O Estado de S.Paulo

06 de novembro de 2020 | 03h00

O Brasil é o Brasil, o presidente Jair Bolsonaro é o presidente Jair Bolsonaro. O que é bom para o Brasil não é necessariamente bom para Bolsonaro e a recíproca é verdadeira. Aliás, muitas vezes é o oposto. O risco de derrota de Donald Trump é também de Bolsonaro, com sua política externa e seus delírios ideológicos, mas não para o Brasil, que lucra com um mundo melhor.

Com Trump e os Estados Unidos era uma coisa, sem ambos é outra. O projeto de um mundo de extrema direita vira um sonho (ou pesadelo) de uma noite de verão. É hora de acordar e cair na realidade – que, aliás, não está fácil, com pandemia, economia quebrada, dívida pública descontrolada e milhões de desempregados. O caos não é ideológico, é real.

Em 2018, após a vitória do pai, o deputado Eduardo Bolsonaro patrocinou a Cúpula Conservadora das Américas, em Foz do Iguaçu, como contraponto ao Foro de São Paulo, das esquerdas, mas a sociedade não deu bola para um nem para o outro. Em 2019, no primeiro ano de governo, ele voltou à carga, anunciando “o maior evento conservador do mundo” em São Paulo, mas só se ficou sabendo que o filho 03 foi recebido aos gritos de “mitinho” e que o seu guru só apareceu no telão, direto da Virgínia.

O 03 orna a parede da sala de jantar com um rifle (ou sei lá o que é aquilo), fritou muito hambúrguer nos EUA, desfilou com o boné da reeleição de Trump e passou vergonha ao ser indicado pelo papai para ser embaixador em Washington. Por sorte (dele e do Brasil), os senadores avisaram que era um pouco demais.

A ideia morreu, mas o delírio conservador – e autoritário – sobreviveu. Em fevereiro deste ano, o chanceler Ernesto Araújo – que definiu Trump como o único Deus capaz de salvar o Ocidente – foi a Washington para a criação, com EUA, Hungria e Polônia, de uma “Aliança Internacional pela Liberdade Religiosa”. O carimbo de “religiosa” escamoteava algo muito mais ambicioso.

O passo seguinte seria a ida do próprio presidente Bolsonaro à Hungria e à Polônia, ainda neste segundo semestre, para consolidar a aliança da extrema direita. Por ironia, a pandemia de Covid 19, tratada com igual ignorância por Trump e sua réplica brasileira, impediu a empreitada. Sem a reeleição de Trump, o que Bolsonaro poderia fazer agora em Budapeste e Varsóvia? Só chorar as mágoas.

O democrata Joe Biden não tem nada de socialista, diferentemente do que disse Trump e os cubanos e venezuelanos da Flórida engoliram. Biden é um liberal na economia, antirracista, defensor de minorias, direitos humanos, meio ambiente Acordo Climático de ParisONUOMC OMS. Eleito, interromperá as investidas de Trump e dos Bolsonaro, calcadas em ódios e armas, sob inspiração do mentor da extrema direita internacional, Steve Bannon, que nem Trump aguentou e anda às voltas com a polícia.

Sem Trump e EUA, evaporam o projeto ultra conservador e política externa de Bolsonaro. Bolsonaro chutou China e Europa porque tinha Washington na retaguarda, mas, agora sozinho, repete o muxoxo de que as potências querem nos tomar a Amazônia e empurrar a América do Sul para a esquerda. Não tem pé nem cabeça tanto que, sob a perspectiva de vitória de Biden, as Bolsas subiram, o dólar caiu no Brasil. Esse mercado está cada vez mais socialista...

Com a cabeça no lugar, o vice-presidente Hamilton Mourão trata a China com pragmatismo e lembra que a relação entre Brasil e EUA é entre Estados, não entre pessoas. É um claro contraponto a Bolsonaro, tão candidato a perdedor quanto Trump. O Brasil, porém, não perde nada com o equilíbrio político e pessoal de Joe Biden e a obrigação de voltar fazer política externa. Bolsonaro e Ernesto Araújo são capazes de fazer?

*COMENTARISTA DA RÁDIO ELDORADO, DA RÁDIO JORNAL E DO TELEJORNAL GLOBONEWS EM PAUTA

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sexta-feira, 6 de novembro de 2020

As eleições americanas e a diplomacia bolsolavista - Reinaldo Azevedo (O Globo); Lauriberto Pompeu (Congresso em Foco)

 Para diplomatas, posts de Eduardo sobre eleição dos EUA mostram despreparo

Reinaldo Azevedo
Colunista do UOL
06/11/2020 14h13
https://noticias.uol.com.br/colunas/reinaldo-azevedo/2020/11/06/para-diplomatas-posts-de-eduardo-sobre-eleicao-dos-eua-mostram-despreparo.htm

Integrantes do Itamaraty avaliam que, se ainda restava dúvidas sobre o despreparo do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) para ocupar o posto de embaixador do Brasil nos Estados Unidos, estas acabaram de vez, durante a eleição presidencial entre Donald Trump e Joe Biden.

A atuação do filho "02" do presidente Bolsonaro, que resolveu questionar a legitimidade da apuração nos EUA, sem provas, reproduzindo o discurso de Trump, foi descrita como uma grande "gafe" para quem já teve (ou tem) a ambição de ocupar um posto diplomático. A avaliação de diplomatas é que Eduardo fere um princípio básico da boa diplomacia, de não interferir na política de outro país.(...) 
Leia íntegra em O Globo.

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Ex-chanceleres defendem que Bolsonaro mude política externa por Biden

Por Lauriberto Pompeu 
Congresso em Foco, 06 nov, 2020 - 15:20
https://congressoemfoco.uol.com.br/governo/ex-chanceleres-defendem-que-bolsonaro-mude-politica-externa-por-biden/

Os ex-ministros das Relações Exteriores Aloysio Nunes e Celso Amorim defenderam, em entrevista ao Congresso em Foco  que o governo brasileiro mude sua atual política externa e ambiental para ter uma relação de respeito com o provável novo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden.

Aloysio Nunes, que comandou o Itamaraty durante o governo de Michel Temer (MDB), afirmou que mudar os atuais ministros do Meio Ambiente, Ricardo Salles, e das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, não bastaria para que o governo brasileiro se adaptasse à gestão de Biden, que tem cobrado o compromisso do Brasil de preservar a Amazônia e ameaçado sanções ao país caso isso não aconteça.

"A política externa é do presidente. Para sua formulação, nos seus aspectos mais polêmicos, concorrem o ministro [das Relações Exteriores, Ernesto Araújo], o deputado Eduardo Bolsonaro e o assessor Filipe Martins, mas quem manda é o presidente e essa política, com suas obsessões, é importante para o apoio da ala mais radical de sua base social", afirmou o tucano.

Nunes afirmou que a atual política ambiental de Bolsonaro pode trazer riscos à economia brasileira.

"Uma resolução recente da Comissão de Orçamento da Câmara [dos EUA], de maioria democrata, dá bem a medida da zona de atrito com a administração Biden: disposição de barrar novos acordos econômicos com o Brasil caso seja mantida a postura do nosso governo na área ambiental. Não nos esqueçamos que Biden mencionou a Amazônia no debate crucial com Trump. Por aí virão pressões muito fortes."

E completou: "Se houver mudança na política ambiental do governo Bolsonaro isso não seria um 'prejuízo' nem para o Brasil nem mesmo para o presidente que lucraria se atirasse essa pesada carga ao mar".

De acordo com o ex-ministro, mesmo com a afinidade com as ideias de Donald Trump, Bolsonaro pode estar disposto a ter uma boa relação com Jon Biden.

"O fato de Bolsonaro segurar a alça do caixão de Trump, de quem ele se considera amigo, não impedirá relações positivas com o novo morador da Casa Branca. O Brasil é um país relevante, nossa diplomacia é muito competente e saberá identificar pontos de convergência, e o novo presidente [dos EUA] terá dores de cabeça suficientes na agenda internacional e na agenda interna e não creio que vá buscar mais sarna para se coçar."

O ex-chanceler Celso Amorim, que foi ministro das Relações Exteriores durante os governos de Itamar Franco e Lula, defende que haja uma política exterior de respeito mútuo entre Bolsonaro e Biden.

"Eu esperaria que essa atitude de submissão possa ser substituída, não tem que buscar uma relação igual porque ela não era boa, era ruim para o Brasil, não era uma relação de um país soberano, o que tem que procurar é uma relação mutuamente respeitosa", declarou.

Amorim sugeriu mudanças na política ambiental brasileira e não vê problemas do país seguir as orientações de Biden, desde que não sejam violadas a decisões soberanas brasileiras.

"Nem de submissão, nem de agressão. Por exemplo na questão do clima, se os Estados Unidos quiserem cooperar com o Brasil na mudança do clima, na Amazônia, acho que é perfeitamente razoável desde que obedeça, siga os projetos brasileiros decididos soberanamente pelo Brasil".

O ex-ministro das Relações Exteriores mencionou o período entre de 2003 a 2008, quando Lula era presidente do Brasil e o republicano George W. Bush presidia os Estados Unidos. Amorim afirmou que havia uma relação respeitosa entre os dois países mesmo com as diferenças ideológicas.

"Tem que encontrar uma maneira de ter uma relação de trabalho que seja uma relação mutuamente proveitosa sem submissões, que aliás foi o que aconteceu no governo Lula e o governo Bush. Qual a afinidade ideológica que havia entre eles? Nenhuma, nós condenamos a invasão do Iraque, não mudamos nossas votações, mas cooperamos. Tanto em assuntos bilaterais quanto em outros da região."

Na mesma linha de Aloysio Nunes, Amorim disse que o papel dos atuais ministros das Relações Exteriores e do Meio Ambiente é de obedecer o projeto de Jair Bolsonaro. De acordo com ele, uma mudança nos ministérios poderia sinalizar uma alteração de rumo nas áreas, mas essa alteração teria que partir de Bolsonaro.

"Eles seguem orientações. Não tenho nenhuma razão para defender nenhum dos dois, de jeito nenhum, mas acho que não pode situar o problema neles. Pode haver uma mudança neles para dar um sinal, mas o problema é que eles apenas aderiram oportunisticamente a uma agenda, mas a agenda vem de cima, é óbvio, ou de fora, dependendo de como você quiser ver, fora do Brasil até, da extrema direita norte-americana", declarou.

"Isso a gente terá que mudar e como a extrema direita norte-americana tem uma relação forte quanto ao governo brasileiro, com o presidente, também com o ministro, mas não é só com o ministro, ministro é um instrumento. Quando você muda a política às vezes tem que mudar o ministro, agora é preciso ter desejo de mudar a política, isso não depende só do ministro". completou.



Um ornitorrinco no Itamaraty - Paulo Roberto de Almeida

 Alguns questionaram a capa de uma coletânea de "crônicas" de cronista misterioso, sobre o Itamaraty bolsolavista, cujo animal representado, o ornitorrinco, não figura em nenhuma das crônicas do nosso resistente do Itamaraty. 

A ilustração tinha sido feita para eventualmente ilustrar a capa de meu livro, a partir de um de seus capítulos, mas que acabou adotando outro título: O Itamaraty num labirinto de sombras. 

Abaixo reproduzo o artigo original, que não deixa de ser uma espécie de distinção, pois que esse animal é o mais estranho de todos, como pode acontecer em outros habitats, com certos seres bizarros...

Paulo Roberto de Almeida

Um ornitorrinco no Itamaraty

 

Paulo Roberto de Almeida

 

O ornitorrinco – nome científico: ornithorhyncus anatinus; em inglês, duckbilled platipus; em francês, ornythorinque; em alemão, Schnabeltier; em grego, platypodas – é um animal absolutamente único na natureza: mamífero, como os primatas, exibe, no entanto, um bico de pato, sendo, como esta ave, um palmípedo, o que já estava evidente pelo seu nome em grego. Os ornitorrincos vivem em paragens distantes do resto do mundo, botam ovos, mas alimentam os seus descendentes, não pelo leite extraído de mamilos, mas por meio de glândulas. A despeito de se parecer com um castor, o ornitorrinco não possui dentes, e não usa os sentidos tradicionais para caçar o seu alimento – olfato, audição ou visão – e sim por meio de vibrações elétricas, o que fica evidente por certo tremelicar no comportamento desse animal bizarro. 

Eles têm certa dificuldade em caminhar, apesar dos pés de pato, o que os leva a passar a maior parte do tempo enfurnados em alguma caverna, que constroem para si mesmos. Com toda a sua aparência inocente, ele pode ser um animal perigoso, pois tem um veneno terrível nos esporões de suas patas, o que é suficiente para matar outros pequenos animais. Mais curioso ainda, o ornitorrinco não possui estômago, o que os cientistas acreditam ser o longo resultado do processo evolutivo, o que acabou criando uma ligação direta entre o esófago e o intestino; tem também uma pele impermeável, o que o habilita a conviver em diferentes ambientes sem problemas aparentes, entre a terra e a água, com desenvolturas diferentes em cada um desses meios.

Na classificação zoológica, trata-se da única espécie de seu gênero, sendo ainda monotípica, ou seja, não tem subespécies ou variedades reconhecidas. Os cientistas ocidentais, no século XVIII, ao receberem um primeiro exemplar, trazido por visitantes da distante Austrália, pensaram tratar-se de uma fraude, ou seja, um animal semelhante a um castor, ao qual tinha sido costurado um bico de pato, e por isso, um desses cientistas denominou-o de Ornithorhynchus paradoxus. Verificou-se também que sua temperatura média era de apenas 32 graus, bem abaixo dos 37 normais nas espécies placentárias. O fato de ser um dos poucos, talvez o único dos mamíferos venenosos o torna, uma vez mais um animal absolutamente estranho entre os membros do seu gênero dos monotremados. 

Será que ele se sente solitário na natureza, pois que diferente de todos os outros animais? Provavelmente, mas ele não deve discutir esse tipo de questão filosófica. Em todo caso, para o que nos interessa, o Brasil do presidente Bolsonaro também é um país solitário no mundo, praticamente sozinho em determinadas políticas que o fazem sentir-se como um continente à parte, à deriva dos demais, talvez uma jangada de pedra, à maneira de José Saramago. Vive uma fase de transformações culturais que poderia ser apropriadamente chamada de EA, a Era dos Absurdos. Nada é tão mais conforme a essa designação do que a sua política externa e a sua diplomacia, aparentemente sob a condução, mas apenas aparente, de Ernesto Araújo. Ele é o verdadeiro ornitorrinco num governo feito de vários outros animais estranhos. 

Registre-se que as bizarrices começaram antes mesmo da posse do governo, pois que o chanceler, em plena campanha presidencial – o que, em princípio, deveria refrear ardores políticos de funcionários de Estado –, já deblaterava, num blog simbolicamente chamado Metapolítica 17: contra o globalismo, contra colegas que teriam se deixado seduzir pelo marxismo, o petismo, pelo esquerdismo, de modo geral. Depois de algumas décadas de carreira, ele já deveria ter aprendido que os diplomatas não são marxistas ou esquerdistas, e sim carreiristas, embora alguns sejam oportunistas (como, aliás, ele próprio, que se forjou uma identidade olavista para conquistar o cargo). Levantou sua lança contra o multilateralismo, contra um desconhecido “climatismo”, contra um mais estranho ainda “comercialismo”, mas sobretudo – para satisfazer o guru expatriado da Virgínia que o empurrou para cima – contra essa paranoia de conspiracionistas malucos que se chama “globalismo”, o que é propriamente estarrecedor para um diplomata. 

Desde o primeiro dia do governo, antes mesmo de assumir formalmente, já tinha declarado seu servilismo ao império, apoiando a instalação de uma base dos EUA no Brasil, no que foi imediatamente rechaçado pelos militares. Depois da posse – em latim, grego e tupi-guarani, sem expor sua “política externa para o povo” –, eles continuaram a controlar seu ímpeto adesista na tentativa de juntar-se ao projeto eleitoreiro de Trump, de forçar uma mudança de regime na Venezuela, incorporando o vice-presidente Mourão numa das reuniões do Grupo de Lima, para obstar qualquer aventura militar contra a ditadura chavista. Mas ordenou a imediata retirada do Brasil do Pacto Global das Migrações, uma imitação canhestra da postura xenófoba de líderes de extrema direita, quando esse acordo não ameaça em nada a “soberania” de um país que possui muitos mais emigrantes do que imigrantes. A suprema bizarrice foi atribuir ao asfalto a elevação dos termômetros usados pela “turma” do aquecimento global. Essa foi forte!

Uma obsessão doentia por agradar o seu chefe fez com que ofendesse o então candidato nas primárias argentinas, ambos alertando contra a emigração maciça dos hermanos ao Brasil se ganhasse a “esquerdalha”. O chefe, por sua vez, conseguiu brigar contra importantes chefes de governo da Europa, com a retirada de importantes suportes financeiros a programas de sustentabilidade ambiental e mais de uma vez a ministra da agricultura teve de amenizar posturas dos dois que ameaçavam as relações comerciais com a China e com países muçulmanos. Outro exemplo recente foi mais uma tentativa de agradar o chefe ao pretender demonstrar que a “maioria” do G20 não aplica políticas de isolamento na luta contra o Covid-19, o que eventualmente pode torná-lo cúmplice de uma das mais temerárias atitudes de um chefe de Estado no mundo. Ian Bremmer, do Eurasia Group, chegou a dizer que, perto de Bolsonaro, Trump parece um Churchill. 

Se esse é o critério, o ornitorrinco do Itamaraty tem como padrão o chanceler do governo militar Juracy Magalhães, para quem “o que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil”. Na verdade, a Casa de Rio Branco não conhece precedentes ao estranho animal que intimida pela truculência os colegas diplomatas...

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 29 de março de 2020