O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2022

José Murilo de Carvalho sobre o Bicentenário

 Basicamente correto, com alguns deslizes econômicos: a desigualdade certamente é uma das tragédias brasileiras mais relevantes, consequências do regime oligárquico transformado, no qual vivemos há 509 anos. Mas a desigualdade seria certamente menor se tivéssemos mais educação e menos pobreza e oligarquias.

Alta taxação sobre os rendimentos dos muito ricos pode não significar maior redistribuição de renda e menor desigualdade social se o padrão oligárquico-corporativista do Estado brasileiro continuar como é hoje o nosso caso, no qual o antigo patrimonialismo de extração lusitana se converteu praticamente num patrimonialismo gangsterista.

Paulo Roberto de Almeida 

200 anos de Independência do Brasil: pouco a celebrar, muito a questionar 

JOSÉ MURILO DE CARVALHO 

O Estado de S. Paulo,  2/01/2022


Olhando para a frente, podemos nos perguntar se ainda somos um país viável no sentido de sermos capazes de formarmos uma sociedade includente, sem a enorme marginalização que hoje a caracteriza      

O Brasil não tem sorte com seus centenários. O primeiro, em 1922, teve de conviver com os restos da devastação causada pela gripe espanhola, chegada ao País em 1918. Calculam-se em cerca de 35 mil as mortes causadas no País, concentradas no Rio de Janeiro e São Paulo. Entre elas não estava, como se costuma afirmar, o presidente eleito, Rodrigues Alves, embora tenha morrido antes de assumir. O ano de 1922 foi ainda marcado pela primeira revolta tenentista e pela decretação do estado de sítio pelo presidente Epitácio Pessoa, destinada a garantir a posse do presidente eleito, Artur Bernardes. Nas celebrações, destacou-se a Exposição Internacional de que participaram 14 países. O segundo centenário, a ocorrer ano que vem, virá na cauda de outra pandemia, a da covid-19, chegada ao País em 2020 e que já matou cerca de 620 mil brasileiros, embora também sem matar presidente. Junto com a pandemia, temos hoje um país às voltas com um tumultuado mandato presidencial que gerou dúvidas sobre a solidez de nossa jovem democracia e, mais ainda, com o imenso drama social do desemprego, da desigualdade, da exclusão, da fome. Até agora, não há indicação de que haverá alguma importante celebração oficial, ficando os registros da efeméride a cargo da mídia, das instituições e do meio acadêmico.

Nesses registros, naturalmente, haverá retomadas de temas estritamente históricos, mas é importante que sejam também usados como oportunidade para uma avaliação dos 200 anos de nossa vida independente. Quero dizer com isto examinar a natureza do percurso feito, verificar onde acertamos, onde erramos e como chegamos à situação atual. Baseados neste exame podemos também perguntar sobre o que nos pode esperar no futuro próximo. Mao Tsé-tung dizia ser ainda cedo para avaliar adequadamente o impacto da Revolução Francesa. Para nós, no entanto, que sofremos de Alzheimer coletivo, dois séculos já são tempo suficiente para fazermos um balanço do que fizemos e perscrutarmos nosso futuro próximo.

As mudanças nesses 200 anos foram enormes. Passamos de um país de cerca de 5 milhões de habitantes, dos quais um milhão de escravos e 800 mil indígenas, para outro de 214 milhões; de um país com cerca de 10% de população urbana em 1822 para outro de 85% hoje; de um país de economia totalmente agrícola em 1822 para outro com larga participação industrial hoje; de uma população formada exclusivamente por indígenas, africanos e lusos para outra muito mais diversificada pela entrada de italianos, espanhóis, alemães, sírios, libaneses, japoneses; de uma população concentrada na região costeira para outra que cobre todo o território nacional. No entanto, todos os analistas que se encarregaram do tema de nossa trajetória, como Sérgio Buarque de Holanda, Oliveira Viana, Nestor Duarte, Raimundo Faoro, Gilberto Freyre, Roberto DaMatta, entre outros, reconhecem que há mais continuidades do que rupturas. Somos um país sem revoluções. O que chamamos de revolução, como a de 1930, não passou de ajustes entre grupos dirigentes. O povo só entrou no sistema político a partir da segunda metade do século 20, tendo sido logo contido por uma ditadura.

Quando falo do drama social que desautoriza celebrações me refiro, naturalmente, ao problema da  desigualdade, que é de todos conhecido, mas sobre o qual, a meu ver, mais se fala do que se faz. Lembro alguns dados de amplo conhecimento. Segundo dados do IBGE, o auxílio emergencial criado para atender os mais necessitados, adicionado aos recursos do agora extinto Bolsa Família, abrangeu cerca de cem milhões de pessoas, quase a metade da população. Somos o oitavo país mais desigual do mundo e ocupamos a 84.ª posição no Índice de Desenvolvimento Humano. Em 2010, o 1% mais rico da população detinha 44% da riqueza nacional. Ao mesmo tempo, há três décadas, estamos crescendo a taxas medíocres incapazes de gerar os empregos necessários e viabilizar políticas sociais mais substanciais. No entanto, apesar de termos uma das mais altas franquias eleitorais do mundo ocidental (16 anos), temos sido incapazes de aprovar no Congresso medidas redistributivas de renda, como o aumento do imposto sobre heranças, a taxação de dividendos, a alteração nas faixas do Imposto de Renda. Distribuímos, mas não redistribuímos.

Nossa faixa mais alta de Imposto de Renda é de 27,5%. Nos Estados Unidos, ela é de 37%, no Chile, é de 40%, em Portugal, de 48%, no Japão, de 56%. Estamos acumulando uma enorme massa de desempregados, subempregados e não empregáveis sem perspectiva realista de solucionar o problema. Olhando agora para a frente, mesmo que em prazos mais curtos do que os dos chineses, digamos uns 30 anos, podemos nos perguntar se ainda somos um país viável no sentido de sermos capazes de formarmos uma sociedade includente, sem a enorme marginalização que hoje a caracteriza.

A hipótese pode soar apocalíptica, mas talvez estejamos a brincar, ou a brigar, na praia, alheios ao tsunami que se delineia no horizonte.


Eleições presidenciais de 2022: uma possível plataforma de Ciro Gomes - Nelson Marconi (FSP)

 Ciro Gomes é o candidato que, no momento, apresenta o melhor, talvez o único, programa econômico estruturado e racional. 

Mas, como sabemos, o papel aceita tudo. Seria preciso que não apenas o eleitor comum, mas sobretudo os donos do capital, os representantes do poder político e a classe média comprassem as promessas bonitinhas e aparentemente factíveis do candidato, para que ele tivesse, pelo menos uma vez, a chance de colocar suas ideias em prática.

 Não tenho certeza de que o candidato — mais conhecido por sua metralhadora giratória verbal — seja capaz de convencer gregos e goianos, ou seja, os setores relevantes da opinião pública, para crescer nas preferências eleitorais. Em todo caso, ele deveria ter direito a uma chance nos debates eleitorais, tanto porque é um candidato sério e já provou ser bom administrador. Adelante!

Meu comentário puramente circunstancial ao artigo de Nelson Marconi sobre um possível programa econômico de Ciro Gomes, da série de economistas de candidatos, da FSP.  Merece aprofundamento analítico, mas tem certo estilo Ha-Joon Chang revisitado.

Paulo Roberto de Almeida 


É preciso coragem para mudar o modelo econômico fracassado

Um plano nacional de desenvolvimento pactuado entre os setores público e privado abriria uma nova rota para o crescimento 

Folha de S. Paulo, 2.jan.2022 às 23h15

Nelson Marconi

É professor da FGV-Eaesp, foi coordenador do programa de governo de Ciro Gomes em 2018


A economia brasileira está comendo poeira há muito tempo. Em 1980, nosso PIB per capita era 15 vezes maior que o chinês e 1,6 vez superior ao sul-coreano; em 2020 equivalia, respectivamente, a apenas 79% e 26% do observado nestes países.

O que fizeram os asiáticos? Perceberam que os países mais bem-sucedidos incentivam a indústria e os setores importantes ao redor; logo, ampliaram sua participação no mercado internacional via exportações de manufaturados, usando e abusando de planejamento, boas práticas macroeconômicas, políticas de desenvolvimento científico e tecnológico e educação, focando em áreas estratégicas e sempre defendendo os interesses de seus países.

Por aqui, entregamos nosso mercado interno, de mão beijada, via moeda apreciada, aos produtores de outros países, sem expandir as exportações de manufaturados; enquanto as vendas no varejo, descontada a inflação, hoje são o dobro do que eram em 2003, a produção industrial está no mesmo patamar de 2005.

Criaram-se todas as dificuldades possíveis para os produtores locais eficientes atuarem nos mercados interno e externo: além do câmbio, juros altos, estrutura tributária distorcida, políticas industriais ineficazes, investimento insuficiente em educação e ciência e tecnologia e má qualidade dos gastos públicos.

Como resultado, nos desindustrializamos e hoje sentimos a pior consequência deste processo: deixamos de gerar bons empregos e as pessoas estão tendo que se virar na informalidade, em ocupações muito mais precárias, e o PIB per capita do Brasil atual é igual ao de 2010. Perdemos 11 anos.

É possível reverter esse cenário e voltarmos a gerar bons empregos, que é um de nossos objetivos principais, e estimular o real empreendedorismo? Certamente que sim! Precisamos investir mais em educação? Lógico, e o Ceará de Ciro Gomes e seus sucessores é um exemplo mundial. Precisamos participar mais do comércio internacional? Sim, mas estimulando as exportações, e não aniquilando os produtores locais. Como fazer?

Primeiro, é necessário estruturar um cenário macroeconômico favorável a quem produz: devemos equacionar a questão fiscal a médio prazo, tornando a trajetória da dívida pública sustentável, via redução de subsídios e isenções, da mudança da lógica orçamentária —que premia quem gastou mais no passado, da instituição de tributação progressiva sobre lucros e dividendos, heranças e patrimônio, desonerando compensatoriamente a produção, e da melhoria na qualidade do gasto público. Assim, neutralizam-se as pressões contrárias à queda da taxa de juros, viabiliza-se a manutenção da taxa de câmbio em um patamar competitivo e os investimentos públicos que necessitamos para retomar o crescimento neste momento. Também são fundamentais ações para reduzir a inflação e o endividamento privado.

Do ponto de vista estratégico, vemos que EUA, Alemanha e França criaram planos para recuperar suas indústrias e seu espaço na economia mundial, incluindo elevados gastos em infraestrutura e pesquisa e desenvolvimento. Não há como agirmos de outra forma.

Um plano nacional de desenvolvimento pactuado entre os setores público e privado, nos moldes defendidos por Ciro, é essencial, prevendo tanto o desenvolvimento científico e tecnológico como a redução de desigualdades e a melhoria de indicadores sociais, que se recuperarão com a melhoria na qualidade dos empregos, o avanço educacional e políticas específicas para os mais desfavorecidos. A gestão pública deverá ser reorientada para o alcance das metas deste plano, atuando de forma matricial, monitorando e cobrando resultados e premiando o bom desempenho.

A pauta ambiental constitui uma oportunidade de investimentos: o desenvolvimento de novas fontes de energia, a reorientação do uso do petróleo, as alterações na forma de produzir carnes e outros alimentos, a implantação de uma infraestrutura de baixo uso de carbono e os necessários avanços tecnológicos na área da saúde, por exemplo. Todos esses fatores estimularão a inovação e sofisticação tecnológica, incluindo a microeletrônica, softwares e inteligência artificial. E pensemos em todos os serviços que serão demandados por estas atividades.

Há, sim, muito espaço para retomar o crescimento, os bons empregos e a dignidade do povo brasileiro. Mas é necessária disposição e coragem para mudar o modelo econômico fracassado que impera há décadas.


SÉRIE PENSAMENTOS ECONÔMICOS DOS PRÉ-CANDIDATOS

Artigos de economistas dos pré-candidatos à Presidência discutem principais temas para as campanhas

Domingo (2)

Ciro Gomes (PDT), por Nelson Marconi

Segunda (3)

João Doria (PSDB), por Henrique Meirelles

Terça (4)

Luiz Inácio Lula da Silva (PT), por Guido Mantega

Quarta (5)

Sergio Moro (Podemos), por Affonso Celso Pastore



Apenas imaginando um roteiro machadiano - Paulo Roberto de Almeida

 Apenas imaginando um roteiro machadiano

Paulo Roberto de Almeida 


Se Machado fosse vivo teria farto material para um novo O Alienista

Uma familia de alucinados conduz toda uma população ao asilo de alienados, pretendendo estancar o mal imaginário do “comunismo”, tal como proclamado por um guru expatriado, o subsofista da Virgínia. 

Até o dia em que povo, desperto da ilusão de um populista farsante, os encerre num asilo de loucos e pervertidos, como merecem. 

Seria apenas um exercício de ficção?

Um novo enredo, mais na categoria do “terror político”, já está pronto para a minha série de “clássicos revisitados”.

Mas, como não sou romancista, abro o copyright para candidatos voluntários a esse tipo de escrito.

Paulo Roberto de Almeida

3 de janeiro de 2022


domingo, 2 de janeiro de 2022

José Genoino e a esquerda do PT que se opõe aos ukases do chefão de todos eles - Paulo Roberto de Almeida

José Genoino e a esquerda do PT que se opõe aos ukases do chefão de todos eles

  

Paulo Roberto de Almeida

Diplomata, professor

(www.pralmeida.org; diplomatizzando.blogspot.com) 

 

Leio o seguinte na coluna do sempre bem-informado e levemente irônico jornalista Carlos Brickmann (1/01/2022):

 

Claro, claro

Tudo bem, cada petista pode pensar o que quiser, desde que faça o que seu ídolo máximo, o ex-presidente Lula, determina que seja feito. Mas vale como curiosidade: José Genoíno é um dos petistas que mais resistem à união entre Lula e o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin. Tem prestígio no partido, do qual foi fundador e presidente; quando enfrentou dificuldades enfrentou-as sozinho, não delatou ninguém.

Sem dúvida o partido fará o que Lula quiser. É interessante ler os argumentos de Genoíno (expressos numa live com gente do PSOL) e, mais interessante ainda, entendê-los: "O que está em jogo é se a esquerda socialista será protagonista do enfrentamento do neoliberalismo ou se a esquerda será domesticada, domada para um projeto de melhorismo por dentro de um neoliberalismo com feição progressista”.”

 

PRA: José Genoíno sempre foi e continua sendo um grande quadro da esquerda, não necessariamente por uma vocação política esquerdista e mais por sua postura digna e consequente, em relação ao despotismo pouco esclarecido do grande chefe de todos os petistas e pretendente a líder tirânico de todas as esquerdas e, agora, de todas as vias opostas ao grande psicopata.

Mas ele demonstra, igualmente, uma visão estreita e sectária não só do jogo político — que ele pretende situar limitadamente no campo exclusivo de uma esquerda também sectária —, mas sobretudo no terreno da política econômica, que ele pretende que seja oposta a um “neoliberalismo” que jamais existiu no Brasil, a não ser como slogan totalmente equivocado de uma esquerda que jamais conseguiu renegar sua adesão a um estatismo que sempre serviu maravilhosamente bem aos interesses da burguesia e os de todos os donos do grande capital, na indústria, na agricultura e nos serviços (especialmente os do setor financeiro e bancário). 

Essa esquerda que José Genoíno representa revelou-se incapaz de realizar um aggionamento ao estilo do Bad Godesberg do SPD alemão, do PSF sob Mitterrand e do Labour sob Blair e sempre conduziu o Brasil ao velho estatismo das esquerdas anacrônicas que subsistem no mundo, em especial na AL. 

José Genoíno faz muito bem em se opor aos decretos autoritários e personalistas do chefão mafioso, mas sua visão política e econômica é ainda mais embotada e equivocada do que a do Guia Genial dos Povos, que pelo menos demonstra certo realismo — e evidente oportunismo — com relação ao processo, atualmente em curso no Brasil, de oposição consequente ao horror que representa o projeto bolsonarista para o Brasil. José Genoíno pretende ancorar o PT e as esquerdas ao mundinho limitado dos grupelhos de esquerda, que ainda por cima são totalmente ignorantes em matéria de políticas econômicas avançadas e em relação ao funcionamento da economia global. Eles são o que eram o SPD, o PSF e o Labour antes de suas bem-sucedidas conversões a uma socialdemocracia moderna, arejada e sobretudo destituída dos cacoetes do passado estatista.

Se adesão ao estatismo capitalista funcionasse — em total conluio das esquerdas tradicionais com os mais belos representantes do capitalismo industrial e agrícola— o Brasil e a maior parte da AL seriam exemplos de potências econômicas e de prosperidade social no contexto da economia global, não da miséria social e campeões da desigualdade que efetivamente são e foram, no passado, no presente e no futuro previsível. Essas esquerdas são tudo o que o capitalismo mais predatório e o corporativismo mais exacerbado sempre desejaram para si e para os seus objetivos continuístas limitados ao campo das desigualdades distributivas. Ironicamente e paradoxalmente, elas pensam como o equivocado representante do distributivismo igualitarista que é o economista socialista francês Piketty, para quem a solução da desigualdade social consiste em taxar mais os ricos para distribuir o maná do 1% dos bilionários aos pobres e remediados, como se essa fosse a solução do problema distributivo. É o contrário do que seria a mais nobre missão dos economistas, que seria conceber maneiras eficientes de enriquecer os mais pobres, e não propor formas equivocadas e não funcionais para empobrecer os mais ricos.

 

Paulo Roberto de Almeida

2 janeiro 2022, 2 p.

 

sábado, 1 de janeiro de 2022

A última notícia do ano de 2021 é também a primeira de 2022: ameaça de invasão da Ucrânia pela Rússia

 Biden e Putin alertam para rompimento de relações

Folha de S.Paulo | Mundo
31 de dezembro de 2021


Presidente dos EUA, Joe Biden, fala ao telefone com mandatário da Rússia, Vladimir Putin Adam Schuw/Casa Branca/Reuters
Por telefone, líderes mantiveram tom incisivo em meio a tensões na Ucrânia
WILMINGTON (DELAWARE) E MOSCOU | Reuters 

Em meio ao aumento das tensões em torno da Ucrânia, os presidentes dos Estados Unidos, Joe Biden, e da Rússia, Vladimir Putin, conversaram por telefone nesta quinta-feira (30) e alertaram para um possível rompimento na relação entre os dois países em decorrência da da escalada de ânimos no leste europeu.

EUA e Rússia passam por um dos momentos de maior tensão da história recente depois que Kiev e Washington acusaram Moscou de planejar um ataque contra a Ucrânia após posicionar dezenas de milhares de soldados próximos à fronteira da ex-república soviética. Na ligação, que durou 50 minutos, Biden "deixou claro que os EUAe seusaliadose parceiros responderão de forma decisiva se a Rússia avançar na invasão da Ucrânia", informou a Casa Branca, por meio de um comunicado.

A Rússia anexou em 2014 a península da Crimeia, em resposta a uma revolução pró-Ocidente, que derrubou um presidente alinhado ao Kremlin. Os russos também são acusados de apoiar separatistas ucranianos que lutam contra o governo de Kiev no leste do país. Biden voltou a ameaçar a Rússia com sanções econômicas em caso de ataque, o que Putin chamou de "um erro colossal".

"Nosso presidente respondeu imediatamente [à ameaça] que se o Ocidente decidir, nesta ou em outras circunstâncias, impor estas sanções sem precedentes que foram mencionadas então, isso poderia levar a um rompimento total dos laços entre nossos países e causar o dano mais sério para relações entre a Rússia e o Ocidente ", disse assessor do Kremlin, Iuri Ushakov.

Apesar das tensões de ambos os lados, Ushakov disse a repórteres que o Kremlin estava satisfeito com a conversa e que os os dois líderes pareciam prontos para avançar diplomaticamente.

Moscou nega que esteja preparando uma invasão à Ucrânia, apesar da movimentação militar na fronteira. "Esta não é a nossa escolha [preferida], não queremos isso", disse Putin na semana passada. A Rússia alega que tem direito de mover suas tropas como quiser em seu território.

O Kremlin, porém, não descarta uma resposta militar se a Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), à qual a Ucrânia deseja se integrar, persistir com sua expansão para o leste. O presidente russo ameaçou adotar medidas "militares e técnicas" caso suas reivindicações não sejam atendidas.

Putin quer garantias de segurança no leste europeu por parte do Ocidente, o que foi mencionado no telefonema nesta quinta. Segundo o Kremlin, Biden concordou que Moscou precisa de tais garantias para avançar nas negociações, mesmo que ainda haja diferenças entre os dois países.

As tensões com Kiev levaram as relações Leste-Oeste ao seu pior momento nas três décadas desde o colapso da União Soviética. 

sexta-feira, 31 de dezembro de 2021

Mini reflexão sobre o racismo e racistas, no Brasil e alhures - Paulo Roberto de Almeida

 Mini reflexão sobre o racismo e racistas, no Brasil e alhures 

Paulo Roberto de Almeida

Diplomata, professor

(www.pralmeida.org; diplomatizzando.blogspot.com)

  

O Brasil não é um país racista, mas ainda existem muitos racistas por aqui, embora o racismo não tenha as mesmas características de um país que possuiu um Apartheid LEGAL, como os EUA até os anos 1950-60, e que ainda continua tendo duas culturas, uma branca, outra negra. Diferente é a situação do Brasil, onde não existem – ou não existiam, até recentemente – essas duas culturas, distintas uma da outra. “Nossos” racistas estão sobretudo entre pessoas ignorantes.

O fato é que existe um Apartheid SOCIAL do ponto de vista prático, e ele é realmente deplorável, ainda que não existente institucionalmente, ou legalmente. Ele é um fato de nossa história, cujas lideranças políticas, ao longo do império escravocrata e de uma República indiferente à sorte dos antigos escravizados e seus descendentes. Em minha opinião, essa indiferença deveria ter sido institucionalmente superada, no final do Império e início da República, por uma política ativa de “integração do negro à sociedade de classes”, aproveitando um título de Florestan Fernandes. Mas essa solução já tinha sido pensada desde 1883 por Joaquim Nabuco, e NUNCA foi implementada, sendo que ela se aplicava não apenas aos negros libertos – e os já livres, em geral, que já eram maioria no momento da Abolição –, mas igualmente a todos os brancos pobres, ou a todos, indistintamente da cor ou da condição social: acesso à terra e promoção da educação de massas de qualidade. Isso nunca foi feito em nosso país, até o surgimento do paliativo das cotas raciais (e apenas parcialmente sociais).

 Agora, registre-se a mais recente afirmação entre nós de um assim chamado "afro-brasileirismo", Ele foi artificialmente importado tanto da cultura negra americana, quanto, sobretudo, da atitude hipócrita dos brancos americanos – que passaram das horríveis qualificações do nigger, depois ao coloured people, seguido pelo black people e, finalmente, a um inexistente African-American, aceito e disseminado pelos próprios negros americanos, que ficam buscando "raízes" num continente africano que só existe na imaginação de brancos e negros americanos –, e que precisa ser contextualizado, pois está sendo utilizado de maneira artificial entre nós.

Refiro-me ao fato de que está começando, ou se está pretendendo criar no Brasil uma SEGUNDA CULTURA, essa do afro-brasileirismo, que pode eventualmente nos levar a uma espécie de Apartheid CULTURAL, que não existia até aqui, e que considero especialmente danoso para a superação do racismo subsistente no Brasil. Estimo ser positiva a atitude dos negros e mestiços brasileiros de buscar expressar o orgulho de sua cor e de suas origens, assim como sua imensa, gigantesca contribuição – involuntária, por certo – para a construção desta nação, que nasceu mestiça e misturada, independentes dos preconceitos existentes e remanescente, assim como considero importante a luta que eles sustentam – que é a de muitos brancos também – contra as manifestações ainda numerosas de racismo individual, não institucional. Mas, não creio que o afro-brasileirismo seja uma solução as problemas dos racistas e do racismo subsistente no Brasil – já deslegitimados e em defensiva –, assim como as cotas raciais não são uma verdadeira solução ao problema do Apartheid SOCIAL, que se dirige a todos os pobres, atingindo com mais intensa acuidade os negros e mestiços.

Sou pela integração “racial” – isto é, mistura total de todos os povos aqui presentes –e pela integração cultural plena no Brasil, e não acredito que o afro-brasileirismo seja uma solução a ambos os problemas, do racismo e dos racistas, que possuem dimensões culturais, étnicas, antropológicas e psicológicas profundas, antes de serem essa imensa CHAGA SOCIAL Finalmente, também considero dúbio esse conceito de “racismo estrutural”, que me parece mais uma necessidade da militância antirracista negra de enfatizar o racismo real existente entre brasileiros, até mais do que uma situação de Apartheid institucional, que essa militância acredita existir. Não existe, a despeito de, na prática, termos manifestações racistas um pouco em todas as partes. 

Já escrevi há bastante tempo sobre a “cultura” do afro-brasileirismo –“Rumo a um novo apartheid? Sobre a ideologia afro-brasileira”, 2004; blog Diplomatizzando (link: http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2016/09/a-ideologia-do-afrobrasileirismo-base.html) – e pretendo retornar a essa questão na primeira oportunidade. Meu temor é que ele venha a criar essa segunda cultura até aqui inexistente no Brasil. Abordarei o assunto em outra oportunidade. Vale!

 

Paulo Roberto de Almeida

Uberaba, 4053: 31 dezembro 2021, 2 p.

 

 

quarta-feira, 29 de dezembro de 2021

Famílias mudam estratégia em migração para os EUA e não querem voltar ao Brasil - Raquel Lopes, Ricardo Della Coletta e Pedro Ladeira (FSP)

 Países que "exportam" seus nacionais são países em declínio, ou decadentes. Tem algum outro nome para o caso do Brasil?

Paulo Roberto de Almeida

Famílias mudam estratégia em migração para os EUA e não querem voltar ao Brasil
Perfil dos que deixam o país agora inclui cidadãos qualificados que abandonam carreiras sem intenção de retorno
Raquel Lopes, Ricardo Della Coletta e Pedro Ladeira 

Folha de S. Paulo, 29.dez.2021 às 15h00

Gerente operacional de um hotel em Governador Valadares (MG), Eduardo José Fernandes Ramos, 59, foi para os Estados Unidos e lá ficou por 17 anos, de 1989 a 2006. Nesse período, chegou a morar um tempo no Canadá.

Sua intenção era ficar em território americano por alguns anos e depois voltar para o Brasil para seguir a vida com o dinheiro que guardou —quantia que lhe possibilitou comprar carro e casa no retorno.

"Quando você vai para lá e tem uma vida regrada, consegue fazer um bom dinheiro. Eu juntei algo e trouxe para cá", disse Ramos. Ele tem três irmãs que continuam morando nos EUA e conseguiram regularizar sua permanência no país.

Assim como ele, muitas pessoas de Governador Valadares e municípios da região, que historicamente têm o maior número de emigrantes, ficavam um tempo nos EUA e depois retornavam ao Brasil. Agora, famílias inteiras estão se mudando sem ter planos para voltar.

Isso tem causado, inclusive, o esvaziamento de cidades do leste de Minas Gerais. Em Tarumirim, que tem cerca de 14.500 habirantes, 1.800 famílias deixaram o município neste ano. Já em Alpercata, 5% da população foi embora, cerca de 350 pessoas.

"Esperar que as pessoas voltem só por ser a cidade natal deixou de ser importante. Elas não estão mais criando laços com o município", diz o prefeito de Alpercata, Rafael França.

O movimento de famílias que deixam o Brasil tem sido percebido por pesquisadores, autoridades políticas e policiais e por quem acolhe essas pessoas nos Estados Unidos. A Folha publicou reportagens nos últimos dias que permitem compreender esse cenário.

Sandra Nicoli, historiadora e mestra em gestão integrada do território, explicou que a emigração em Governador Valadares começou na década de 1960. Essa "cultura da migração" foi se espalhando para os municípios da região a partir do final da década de 1970.

Os anos 1980 registraram um grande crescimento no movimento de pessoas que escolhiam deixar o país devido à crise econômica brasileira —o período ficou conhecido como a "década perdida". À época, a maioria das pessoas que migravam era jovem, viajava sozinha e pensava em retornar ao Brasil.

Atualmente, o movimento de migração é caracterizado por um número maior de famílias se organizando para morar em definitivo nos EUA. O perfil predominante é de pessoas que buscam serviço braçal, mas há também cidadãos que deixam cargos públicos, empresas e microempresas para trás.

A decisão do retorno não está mais incluída no projeto migratório. Em muitos casos, as pessoas entram de forma irregular, mas há famílias com acesso legal aos Estados Unidos.

"São famílias que possuem uma condição financeira mínima, têm casa, carro, uma pequena empresa, propriedade rural, mas não enxergam uma perspectiva de futuro se continuarem vivendo no Brasil. A ideia do retorno não está permeada no projeto migratório, [as famílias] querem migrar e ficar", explicou a pesquisadora.

Nicoli apontou ainda que, depois do pico da emigração na década de 1980, o crescimento voltou a partir de 2015 devido a um cenário econômico, político e ambiental que acarretou essa decisão. No entanto, segundo a especialista, o auge desse movimento se deu a partir do ano de 2018.

Governador Valadares e municípios ao redor que fazem parte da bacia hidrográfica do Rio Doce foram afetados, em 2015, pela lama da Samarco, após o rompimento da barragem de rejeitos de minérios em Fundão, no distrito de Bento Rodrigues, em Mariana (MG).

Com o agravamento da atual crise econômica e política no Brasil, o crescimento do fluxo migratório continuou em 2019, mas foi reduzido em 2020 devido à crise sanitária e às medidas restritivas decorrentes da pandemia de Covid-19. No entanto, quem havia decidido emigrar e não o fez nesse período já estava se preparando para deixar o país em 2021, que registrou um salto no número de migrantes.

Nicoli acrescentou que, apesar de a maior parte dos migrantes brasileiros escolherem os EUA, desde os anos 2000 há outros destinos em alta, como Portugal, Itália e Inglaterra. Em território americano, Massachusetts ainda é o estado que abriga a maioria dos brasileiros no país.

Vivendo em Middlesex, no estado de Nova Jersey, Marcos Silva, 21, não pensa em voltar ao Brasil. Ele tem pai e dois irmãos morando legalmente nos EUA. Trabalhando no ramo de construção civil, chega a receber semanalmente US$ 1.120 (R$ 6.333) mesmo estando em situação irregular.

"Eu não vejo mais o Brasil como uma morada. Aqui [EUA] é totalmente diferente e a gente tem muito mais oportunidade, estou conseguindo viver tranquilamente", disse.

Silva chegou ao país no ano passado e contou com vantagens que nem todos os migrantes possuem quando tentam ir aos EUA: familiares em situação legal e uma estrutura mínima para recomeçar a vida.

Os que não podem contar com essa possibilidade frequentemente acabam contraindo dívidas enormes ao entrarem no país de forma irregular. Isso porque chegam a pagar até US$ 25 mil (R$ 141,3 mil) para pessoas que promovem a migração clandestina.

O cônsul-geral do Brasil em Boston, Benedicto Fonseca Filho, explicou à Folha que as famílias recém-chegadas aos EUA acabam se hospedando com parentes e amigos em condições precárias. "Muitas vezes em violação às regras de ocupação e de segurança locais, o que tem multiplicado os casos de ameaça de despejo", disse.

As pessoas que promovem a migração sempre arrumam um "jeitinho" para que o "cliente" consiga entrar em território americano. Fernandes Ramos conseguiu entrar "legalmente" em 1989 como turista, porém com um passaporte falsificado.

"Eles [agentes que promovem a migração irregular] tinham o passaporte com visto. Essa página foi colocada no passaporte que tem minha foto. Cheguei por vias legais e fiquei nessa situação até o tempo que o turista pode permanecer no país", contou Ramos.

Assim como ele, o produtor rural Aldair Martins, 70, entrou com o passaporte falsificado, embora tenha viajado para uma estadia temporária. No seu caso, os dois filhos já estavam nos EUA. "Hoje eu não penso em ir para lá. Um dia, quem sabe, posso tentar [conseguir legalmente] o visto. Na época, queria ver minhas netas e tinha vontade de ir para conseguir mais alguma coisa", explicou.

O delegado da Polícia Federal Cristiano Campidelli explicou que é praticamente impossível falsificar o passaporte desde que um novo modelo do documento passou a ser utilizado. Além de vários mecanismos de segurança, a versão atual possui um chip que impõe obstáculos aos falsificadores.

A atualização, no entanto, não impede estratégias para entrar nos EUA que independem da tecnologia. Campidelli explicou que ainda são muitas as pessoas que atravessam o deserto, pulam cercas e muros e cruzam rios de barco ou a nado de forma encoberta para não serem pegas pelas autoridades.

Depois que o ex-presidente Donald Trump determinou o fim da separação de famílias de imigrantes, porém, as pessoas que promovem a emigração passaram a usar crianças.

Dessa forma, cresceu o interesse pelo "cai cai", sistema em que a pessoa vai acompanhada de um parente em primeiro grau menor de idade, entrega-se às autoridades americanas e é liberada para responder ao processo em liberdade.

"Houve um 'boom' do 'cai cai' em 2019, na época do ex-presidente Donald Trump. Mas essa moda antiga, transpondo a fronteira seja pelo rio, deserto ou pulando cerca, nunca parou, também porque muitas pessoas não têm uma criança para levar", afirmou o delegado.

Há também quem se entrega sozinho aos agentes americanos para fazer uma solicitação formal de asilo. Nesses casos, é comum que os responsáveis por promover a emigração ilegal ensinem aos "clientes" táticas para convencer as autoridades. A estratégia mais comum é a alegação de que o solicitante está sendo ameaçado de morte no Brasil ou foi torturado por agentes públicos, como policiais e políticos.

https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2021/12/familias-mudam-estrategia-em-migracao-para-os-eua-e-nao-querem-voltar-ao-brasil.shtml

Mini reflexão sobre a visível deterioração da vida no Brasil - Paulo Roberto de Almeida

 Mini reflexão sobre a visível deterioração da vida no Brasil 

Paulo Roberto de Almeida

O fato é o seguinte: a despeito do continuum difuso na escala social — contrariamente a essas visões simplistas, ancoradas no passado, sobre a luta de classes como “motor da História” —, existe um fosso, enorme no Brasil, entre aqueles, como eu e a maioria dos que me leem neste momento, privilegiados que somos, e uma grande maioria de brasileiros que precisam lutar diariamente pela sua existência, pela sua simples sobrevivência. Nós, os happy fews, não conhecemos verdadeiramente o que é fome e miséria, não temos a ameaça, o cuidado e o perigo de saber o que dar de comer aos nossos dependentes. Não estamos ameaçados em nossas casas e na geladeira, no conforto e na segurança, a despeito de termos eventualmente reduzido nossas expectativas de ganhos constantes: ainda conseguimos nos manter. Mas, e os milhões dos que foram lançados na rua da amargura, ao flagelo da fome e das doenças? 

Por que, como, em quais condições chegamos a isto que vemos todos os dias nas ruas e nos semáforos: pobres reduzidos à condição degradante de ter de pedir alguns tostões para simplesmente sobreviver?

E o que fazemos?

Continuamos impotentes, debatendo esses problemas, e outros mais triviais, nas redes sociais? Sem qualquer consequência prática ou solução para os problemas apontados?

Quando foi que nos degradamos a esse ponto? Onde foi, quando foi que o Brasil se perdeu? Creio que desde sempre, desde a origem da nação independente.

Repito Mario de Andrade: “progredir, progredimos um tiquinho, que o progresso também é uma fatalidade”.

Mas, como foi, quando foi que começamos a regredir?

Como vocês repararam, neste final de ano estou no modo angustiado com a nossa situação como nação.

Paulo Roberto de Almeida 

Brasília, 29/12/2021

terça-feira, 28 de dezembro de 2021

Brasil volta ao Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU) - Rubens Barbosa (OESP)

 BRASIL VOLTA AO CONSELHO DE SEGURANÇA DA ONU

Rubens Barbosa

O Estado de S. Paulo, 28/112/2021

 

A partir de janeiro, no biênio 2022-2023, o Brasil voltará a ocupar um assento não permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas. O Conselho de Segurança é formado por 15 países com direito a voto, cinco membros permanentes com poder de veto (Estados Unidos, França, Grã-Bretanha, China e Rússia) e dez não permanentes.

Será a 11ª vez que o país integrará, como membro temporário, o mais importante órgão responsável pela segurança coletiva internacional. A última vez foi no biênio 2010-2011. Nunca o Brasil ficou tanto tempo fora do CSNU. No governo do PT, pelo pouco interesse nos trabalhos da ONU, o Itamaraty não trabalhou para sua reeleição como um dos representantes da América Latina. O período de ausência do Brasil iria até 2033, não fossem as gestões do Itamaraty em 2018 para que Honduras trocasse sua vez com o Brasil, para permitir a volta antecipada para o próximo ano. 

Segundo declarações do ministro Carlos França, em 2022 e 2023, o Brasil balizará sua participação no Conselho de Segurança por sete prioridades: Prevenir e Pacificar; Manutenção Eficiente da Paz; Resposta Humanitária e Promoção dos Direitos Humanos; Avanço da Agenda de Mulheres, Paz e Segurança; Coordenação com a Comissão de Consolidação da Paz; Articulação com Organizações Regionais; e Por um Conselho de Segurança Mais Representativo e Eficaz. A atuação do Brasil no Conselho de Segurança, nos próximos dois anos, deverá seguir, em linhas gerais, as posições tradicionais defendidas pelo Itamaraty. Como não poderia deixar de ser, a defesa das liberdades fundamentais, será defendida para a busca da paz, assentada sobre a democracia e a justiça. Para tanto, o Brasil deveria defender a mediação, a diplomacia preventiva e seu papel de construtor da paz.  O Brasil deverá continuar a defender as operações de manutenção da paz e as missões políticas especiais da ONU, com mandatos que respaldem a interdependência entre segurança e desenvolvimento. Ao longo dos últimos 70 anos, o país participou de mais de 50 missões de paz, com mais de 55 mil militares e policiais. Exerceu o comando da Missão das Nações Unidas para a Estabilização no Haiti por treze anos e o comando da Força-Tarefa Marítima da Força Interina das Nações Unidas do Líbano por quase dez anos, além da participação na Missão da ONU para a Estabilização na República Democrática do Congo. O respeito aos Direitos Humanos deverá ser defendido para resguardar as liberdades individuais e às garantias fundamentais, em conflitos armados e pelo Conselho de Segurança na imposição de sanções e de outras medidas de apoio à paz e à segurança internacional. De conformidade com o Plano Nacional de Ação sobre Mulheres, Paz e Segurança, criado em 2017, o Brasil promoverá a valorização da agenda de mulheres, crianças e idosos, na busca de paz e segurança, como aplicação prática da relação entre manutenção e consolidação da paz.  O Brasil permanecerá como defensor da prevenção e resolução de conflitos e da manutenção e consolidação da paz e deverá defender que a paz não significa simplesmente a ausência de conflitos armados, mas exige, igualmente, de forma estrutural, o respeito às liberdades fundamentais e à dignidade humana, inclusive a liberdade de expressão e a liberdade religiosa. Como presidente da Comissão de Consolidação da Paz, em 2014, o Brasil promoveu a participação de países em desenvolvimento e de organizações regionais e sub-regionais africanas nas atividades da Comissão e buscou o engajamento entre a PBC e o CSNU.

Assumindo um assento no CSNU, com a ONU politicamente esvaziada (as crises na Síria, no Iraque, na Crimeia não foram examinadas pela ONU), o Brasil poderá estimular as negociações sobre a reforma do conselho, para aumentar a sua legitimidade diante dos múltiplos e complexos desafios enfrentados pela comunidade internacional. Na última Assembleia Geral da ONU, em setembro, os países do G4, formado por Alemanha, Brasil, Índia e Japão, defenderam a urgência da reforma do Conselho de Segurança por meio do aumento do número de assentos permanentes e não permanentes, para torná-lo “mais legítimo, eficaz e representativo, ao refletir a realidade do mundo contemporâneo, incluindo países em desenvolvimento e os principais contribuintes”. Os países do G4 são candidatos a uma cadeira permanente e vão trabalhar para o lançamento das negociações e de um documento único, que servirá de base para projeto de resolução. 

Crises localizadas (como Rússia-Ucrânia) ou que possam ser geradas pela disputa entre EUA e China (como Mar do Sul da China e Taiwan), questões concretas (embargo a Cuba) e outras relacionadas com restrições financeiras (perda de voto pelo não pagamento), o meio ambiente, mudança de clima, democracia e direitos humanos, refugiados e, em especial, com a agenda de costumes, colocarão à prova a ação diplomática brasileira em sintonia com os princípios fundamentais da Carta da ONU. O grande desafio hoje do Itamaraty será o de conseguir manter as posições tradicionais da diplomacia brasileira para que, em algumas dessas prioridades, não haja uma drástica reversão da política multilateral, caso haja mudança de governo com as eleições presidenciais em 2023.

 

 

Rubens Barbosa, presidente do IRICE e membro da Academia Paulista de Letras.

segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

Desgoverno de Bolsonaro e Guedes quer retirar o Brasil do mundo, e da região: Fábio Pupo (FSP)

 Guedes manda o ônibus da globalização (e da regionalização) parar e quer desembarcar o Brasil do mundo...


Brasil avalia deixar órgãos multilaterais de economia por falta de dinheiro
Com restrição orçamentária, time de Guedes quer sair de fundos do Mercosul e da bacia do Prata, que demandam R$ 500 mi
Fábio Pupo | Folha de S. Paulo, 26.dez.2021 às 23h15

O Ministério da Economia defende a revisão da participação do Brasil em diferentes organismos internacionais. A falta de dinheiro é a justificativa do time de Paulo Guedes.

O movimento ocorre enquanto o país acumula dívidas com colegiados multilaterais e o Itamaraty faz alertas sobre o risco de perda de voto em entidades como a ONU (Organização das Nações Unidas).

Em análises sobre o tema, a equipe econômica identificou que o Brasil sofre desvantagem em alguns organismos e participa de certas entidades de forma redundante.

Entre os organismos que se enquadram nesse cenário estão o Focem (Fundo para a Convergência Estrutural do Mercosul) e o Fonplata (Fundo Financeiro para o Desenvolvimento da Bacia do Prata). Os dois órgãos demandam por ano mais de R$ 550 milhões.

O Focem entrou em operação em 2006 e faz os países com maior PIB (Produto Interno Bruto) do Mercosul ajudarem os demais. O dinheiro é destinado principalmente a obras de infraestrutura.

Para a equipe econômica, o Brasil paga muito ao fundo e recebe pouco. Dos US$ 100 milhões (R$ 567 milhões) a serem depositados no Focem anualmente, o país precisa aportar 70%; a Argentina, 27%; o Uruguai, 2%; e o Paraguai, 1%. Por ano, são R$ 396 milhões.

Entre os organismos que se enquadram nesse cenário estão o Focem (Fundo para a Convergência Estrutural do Mercosul) e o Fonplata (Fundo Financeiro para o Desenvolvimento da Bacia do Prata). Os dois órgãos demandam por ano mais de R$ 550 milhões.

O Focem entrou em operação em 2006 e faz os países com maior PIB (Produto Interno Bruto) do Mercosul ajudarem os demais. O dinheiro é destinado principalmente a obras de infraestrutura.

Para a equipe econômica, o Brasil paga muito ao fundo e recebe pouco. Dos US$ 100 milhões (R$ 567 milhões) a serem depositados no Focem anualmente, o país precisa aportar 70%; a Argentina, 27%; o Uruguai, 2%; e o Paraguai, 1%. Por ano, são R$ 396 milhões.

No caso do Fonplata, a conclusão é similar à do Focem. O Brasil é o país que menos recebe empréstimos, mas tem maior compromisso de pagamentos.

O fundo, estabelecido por Argentina, Bolívia, Brasil, Paraguai e Uruguai em 1977 para emprestar aos signatários, demanda do Tesouro Nacional US$ 27,6 milhões (R$ 156 milhões) por ano.

Ao todo, o país precisa aportar no fundo um total de US$ 100,6 milhões (R$ 570,4 milhões) até 2026. Em comparação, o Brasil recebeu em média US$ 16,4 milhões (R$ 93 milhões) anualmente em empréstimos nos últimos quatro anos.

Por outro lado, o Ministério da Economia conclui que, em alguns órgãos, a participação do país é vantajosa mesmo demandando altos valores dos cofres brasileiros. É o caso da CAF (Corporação Andina de Fomento), que funciona como um banco multilateral e do qual o Brasil participa desde 1995.

Embora a CAF exija um total de US$ 445 milhões (R$ 2,5 bilhões) do Brasil de 2022 a 2026, o país recebe mais em empréstimos. Em 2019, por exemplo, a CAF enviou US$ 1,1 bilhão (R$ 6,7 bilhões) em crédito ao país.

Além disso, a CAF reúne países de forma abrangente e, inclusive, engloba países que compõem Focem e Fonplata.

Em meio à restrição orçamentária, o Itamaraty também tem tentado demonstrar esforço para rever participações internacionais.

Recentemente, por exemplo, decidiu por se retirar do Sela (Sistema Econômico Latino-Americano e do Caribe), que tem sede na Venezuela.

Outro movimento foi feito na relação com organismos internacionais.

Guedes comunicou ao FMI (Fundo Monetário Internacional) que o governo não tinha mais interesse em um escritório local do fundo. O FMI decidiu, então, se retirar do país.

O Ministério da Economia espera que a análise aprofundada sobre a participação em organismos internacionais seja feita de forma mais ampla pelo governo para racionalizar o uso dos recursos.

Para isso, vai propor também a recriação de uma comissão interministerial diretamente ligada à Presidência da República para rever a participação em organismos, fundos e instituições financeiras internacionais.

O órgão, que agora seria formado por integrantes do Ministério da Economia e do Itamaraty, foi criado em 2016 (durante o governo Dilma Rousseff, do PT) com composição mais ampla.

O grupo foi eliminado em 2019, já no governo Jair Bolsonaro (PL) por um decreto que promoveu uma extinção em massa de colegiados.

Reportagem da Folha publicada em novembro mostrou que, no total, o Itamaraty estima que o país deve R$ 8,8 bilhões a organismos internacionais.

https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2021/12/brasil-avalia-deixar-orgaos-multilaterais-de-economia-por-falta-de-dinheiro.shtml


As estranhas reações à indicação de André Mendonça para o STF - Vladimir Passos de Freitas (Conjur)

 Defendendo a reputação do "acusado": 

Segunda Leitura

As estranhas reações à indicação de André Mendonça para o STF

Por 

https://www.conjur.com.br/2021-dez-26/segunda-leitura-estranhas-reacoes-indicacao-andre-mendonca-stf

O presidente da República, em 13 de julho deste ano, indicou André Luiz de Almeida Mendonça para o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal, conforme determina o artigo 84, inciso XIV, da Constituição Federal. Para fazê-lo, seguiu as exigências do artigo 101, que exige dos integrantes da Corte mais de 35 e menos de 65 anos de idade, notável saber jurídico e reputação ilibada.

O indicado tem 48 anos de idade, portanto, dentro dos limites constitucionais. Seu saber jurídico é notável, bastando lembrar, entre outras coisas, que é doutor e mestre em Direito pela Universidade de Salamanca, Espanha, foi pesquisador e professor visitante da Universidade de Stetson, Estados Unidos, é professor do curso LL.M em Direito: Compliance, da FGV-Rio, do programa de mestrado e doutorado em Direito da Instituição Toledo de Ensino de Bauru e do Programa de Pós-Graduação "stricto sensu" do Centro de Estudos de Direito Econômico e Social-Cedes, em São Paulo. Finalmente, é detentor de reputação ilibada, pois, na sabatina a que se submeteu no Senado, não se disse uma só palavra que pudesse desaboná-lo.

Portanto, cumprindo todos os requisitos constitucionais, era de se esperar que sua indicação transcorresse sem grandes sobressaltos. No entanto, o que aconteceu foi o oposto. Somente em 1º de dezembro ele foi inquirido e aprovado no Senado, tendo que aguardar quatro meses em espera plena de ameaças de rejeição.

Mas então, se preenchia André Mendonça, com facilidade, os requisitos constitucionais, qual a razão de sua tormentosa espera? Ser pastor evangélico da Igreja Presbiteriana do Brasil. 

Segundo consta, "A Igreja Presbiteriana do Brasil é uma federação de igrejas que têm em comum uma história, uma forma de governo, uma teologia, bem como um padrão de culto e de vida comunitária. Historicamente, a IPB pertence à família das igrejas reformadas ao redor do mundo, tendo surgido no Brasil em 1859, como fruto do trabalho missionário da Igreja Presbiteriana dos Estados Unidos" [1]. Ela foi trazida ao Brasil por Ashbel Green Simonton, na cidade do Rio de Janeiro, em 1859. 

Totalmente entranhada na vida nacional (p. ex., o Instituto Presbiteriano Mackenzie), a IPB desenvolve diversas atividades. Seus pastores, tal qual os padres da Igreja Católica Apostólica Romana, têm por missão auxiliar as pessoas a conduzir-se de acordo com os ensinamentos da Bíblia.

Mas, afinal, o que isto significa de tão perigoso, de modo a despertar temor tão grave? 

A resposta é uma mescla de ideias e sentimentos paralelos, envolvidos por disputas políticas, onde a paixão irracional dá o tom do raciocínio. Neste caldeirão entram desde uma frase dita pelo chefe do Executivo, no sentido de que escolheria um ministro "terrivelmente evangélico", até ocorrências com Igrejas pentecostais sem qualquer tradição, fundadas aleatoriamente com objetivos pouco claros.

No centro da rejeição ao nome de André Mendonça estaria um temor de que os seus julgamentos viessem a ser feitos com fundamento na Bíblia e não na Constituição do Brasil. Em outras palavras, da formação de um Estado Teocrático, como, na atualidade, alguns no Oriente Médio. Implícito a tal suposição, vinha um receio de medidas contrárias às conquistas sociais mais recentes, o que representaria um retrocesso, todas tomadas com fiel obediência ao Presidente da República que o indicou.

Há fundamento para tais suposições?

A primeira observação é a de que o indicado ser cristão significa, exclusivamente, seguir os ensinamentos de Jesus Cristo. Estes, perenizados nas palavras dos apóstolos no Novo testamento da Bíblia, nada mais são do que buscar a conversão interior, cultivar a humildade, repelir a vaidade, cultivar a solidariedade, a paz, para, a partir delas, mudar o mundo. Toda a civilização ocidental vem pautada por seus princípios e, se muitos erros foram e continuam sendo cometidos, é porque nós, seres humanos, somos imperfeitos e necessitamos perseguir permanentemente o nosso aprimoramento.

Entretanto, abstraindo o fato de ser cristão, que muito longe de ser defeito é virtude, há outros aspectos que ataques irrefletidos e carregados de conotação política não levaram em conta.

Um deles é o de que, sejam quais forem as previsões ou as promessas feitas para alguém sondado para ocupar uma vaga no STF, jamais será possível ter-se, a respeito, certeza absoluta. As razões são várias, mas entre elas está a de que as pessoas podem mudar suas posições a partir do conhecimento da realidade, do amadurecimento e da avaliação dos fatos sob um panorama nacional e não local.

Outro é a forma como se encara a suposta lealdade. Para uns, ela consiste em uma servil obediência a quem fez a indicação. Aqui há um erro de foco. Se algum ministro procedeu ou vier a proceder de tal forma, o problema será de caráter e não de "lealdade". Gratidão deve haver, por óbvio. E isto deve traduzir-se em atos de atenção e solidariedade ao longo da vida. Julgar de acordo com o desejo de quem fez a indicação é outra coisa. Isto está mais para um pacto de sangue da máfia siciliana do que para o nobre sentimento de lealdade. Grandes ministros, como Teori Zavascki (indicado pela presidente Dilma Rousseff) e Cezar Peluso (indicado pelo presidente Lula da Silva), nunca votaram pagando o "favor".

Ainda, os presidentes da República atuam por mandato. Portanto, um indicado estará mais próximo de quem indica apenas por um período que, por vezes, pode ser curto e, em outras, no máximo, dobrado por uma vez. E depois terá décadas de afastamento formal.

A partir da discreta personalidade do ministro André Mendonça, vejamos se há indicadores de que venha a agir incorretamente. E aí temos o terceiro requisito para alguém que ocupe a mais elevada posição do Judiciário brasileiro: moral ilibada. 

Do ponto de vista de antecedentes, é impossível encontrar máculas na vida do indicado. Sua vida, como pode imaginar o mais ingênuo dos brasileiros, foi vasculhada de cima a baixo pelos contrários à sua indicação. E nada foi encontrado. Se tivesse feito uma malcriação à professora do segundo ano primário na pequena Miracatu (SP), certamente isto teria vindo à tona.

O fato é que o novo ministro tem longa trajetória como membro da Advocacia-Geral da União (desde 2000), chegando à posição máxima na hierarquia, qual seja, ministro Advogado-Geral da União, sem qualquer mácula.

E mais. Em um país em que a corrupção dá mostras de forte resistência, conseguindo expressivas seguidas vitórias, traz o novo ministro larga experiência no seu combate [2]. Com efeito, foi ele assessor especial do ministro da Transparência e Controladoria-Geral da União, coordenou a negociação do acordo com o Grupo OK, relacionado ao conhecido caso da construção do TRT de SP, gerando expressiva recuperação de ativos, coordenou as equipes de negociação dos acordos de leniência celebrados pela CGU e AGU nos casos relacionados com a Operação Lava Jato e é autor do livro Negociación en casos de corrupción: fundamentos teóricos y prácticos [3]. Portanto, é um experto no assunto.

Ao final, na falta de dados concretos, sobrevieram outras acusações contra o indicado, como a de mau uso da Lei de Segurança Nacional quando à frente do Ministério da Justiça e Segurança Pública. Ora, a lei estava em vigor e usá-la era praticar ato de ofício.

Em suma, em boa hora o Senado aprovou a indicação de André Luiz de Almeida Mendonça para o cargo de ministro do STF. Supremo absurdo seria o fato de ser cristão prejudicá-lo, não sendo demais lembrar que o preâmbulo da Constituição, explicitamente, reconhece ser ela promulgada sob a proteção de Deus e o artigo 5º, inciso VI, assegura a todos a liberdade de crença. Nada melhor que o período de Natal para que isto seja lembrado.

O passado do novo integrante da Corte, sua simplicidade, habilidade conciliatória, aversão ao exibicionismo, dão a certeza de que bem cumprirá sua nobre missão. É o que o Brasil precisa.


[1] Disponível em: https://ipb.org.br/ipb/história. Acesso em 22 dez. 2021.

[2] Informações obtidas a partir de consulta feita em Busca Textual - Currículo Lattes (cnpq.br). Acesso em 23 dez. 2021.

[3] MENDONÇA, André Luiz de Almeida. Valencia: Editora Tirant lo Blanch, Espanha, 2018.