O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

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domingo, 28 de novembro de 2010

Mudando Indices da Economia: perigo a vista

Todo governo sempre tem um ministro trapalhão. Isso é inevitável. Aliás, quanto maior for a equipe -- e no Brasil chega aos quarenta, mas confesso que perdi a conta --, maior a possibilidade de serem vários os trapalhões.
Quando eles apenas concorrem com os humoristas da TV, nenhum perigo à vista: apenas matéria para os programas de humor e os chargistas dos jornais, justamente. Mas quando eles se metem a reformar o mundo, o Brasil, o Piauí, existe um enorme perigo à vista, como alerta este editorial do Estadão.
Perguntar não ofende: no nosso caso, precisaria ser justamente o ministro da Fazenda?
Esse cargo é, potencialmente, o de maior perigo nacional.
Em complemento, um editorial anterior sobre o mesmo personagem...
Paulo Roberto de Almeida

Mantega ataca de novo


Editorial - O Estado de S.Paulo
Domingo, 28 de novembro de 2010
Perigo à vista: o ministro Guido Mantega teve mais uma ideia. Agora ele propõe uma trapalhada para o próximo governo - usar um índice especial de inflação para baixar os juros mais velozmente. Se essa lambança for executada, as metas oficiais serão desmoralizadas, como ocorreu na Argentina, o combate à inflação será relaxado e toda a estratégia dos próximos quatro anos poderá ser prejudicada. Convidado pela presidente eleita para permanecer no posto, o ministro deu uma entrevista coletiva e prometeu uma gestão séria, renegando implicitamente seu currículo. A mudança foi desmentida rapidamente por ele mesmo.
A ideia é adotar um IPCA sem combustíveis e sem alimentos para servir de referência para a meta de inflação e para a política de juros. Mas o Banco Central (BC), o mercado financeiro e muitas consultorias já dispõem de índices desse tipo. O expurgo do índice permite obter o chamado núcleo de inflação. A exclusão dos itens mais instáveis ou das variações extremas pode ajudar na avaliação da tendência geral dos preços.
A técnica é usada em muitos países. O BC leva em conta esse tipo de informação ao fixar os juros. Mas não se baseia só nesses dados, porque sua missão é atingir um alvo definido em termos do IPCA cheio, isto é, com todos os componentes. Pode-se corrigir qualquer erro de avaliação num prazo curto, porque a política é revista a cada 45 dias. Tem havido muito mais acertos do que erros.
No Brasil, a maior parte dos preços flutua livremente. Uma alta sazonal ou acidental é compensada num prazo razoável por uma queda. Mas é perigoso apostar, sempre, no recuo dos preços de alimentos e de combustíveis. Pode haver longos períodos de alta, não apenas em consequência de mudanças nas condições de produção e de consumo, mas também de alterações financeiras. Produtos agrícolas, petróleo e outras commodities são objetos do jogo financeiro tanto quanto ações, títulos de crédito e moedas.
Núcleos de inflação podem dar informações importantes, quando avaliados com discernimento. Mas concentrar a atenção em dados como esses pode levar a resultados desastrosos. O exemplo mais evidente é o erro cometido pelo Federal Reserve, o banco central americano, ao manter os juros muito baixos por muito tempo. Os condutores da política levaram em conta um número muito restrito de preços, quando deveriam ter dado importância à especulação nos mercados de commodities. Da mesma forma, deveriam ter estado atentos à formação da enorme bolha no setor imobiliário.
O ministro Mantega parece não ter percebido ou interpretado corretamente esses fatos. Para produzir uma boa política monetária e financeira é preciso levar em conta um número maior - e não menor - de informações. O núcleo de inflação só é útil porque é um dado a mais, isto é, porque propicia uma perspectiva adicional para o exame do índice cheio. Não é bom por apresentar menos informações, mas por enriquecer o conjunto. Além disso, as pessoas pagam os preços da inflação cheia, não da expurgada, e um persistente erro de avaliação pode causar muito mal, especialmente aos pobres.
O ministro Mantega tem um longo currículo de trapalhadas e de mágicas desastrosas. Ele tem exercido o seu talento principalmente na tentativa de maquiar as contas do governo e, de um modo especial, o endividamento público. Se cuidasse melhor da política fiscal, contendo a gastança e preservando o Tesouro de operações promíscuas de financiamento, a economia seria mais saudável e seria mais fácil baixar os juros. O caminho é esse. A presidente eleita não deve maquiar a política de preços e de juros, mas promover com urgência o expurgo das más ideias.
Também deve recomendar boas maneiras a seu pessoal. Segundo o ministro Mantega, o economista Alexandre Tombini, escolhido para presidir o BC, "não vai titubear" quando tiver de prejudicar o setor financeiro, por ser funcionário público de carreira. O atual presidente do BC, Henrique Meirelles, dirigiu um banco privado e seu desempenho no governo é muito superior ao do ministro da Fazenda. Essa diferença, reconhecida internacionalmente, talvez explique a descortesia do ministro. Mas não a justifica.
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Promessas de seriedade

Editorial - O Estado de S.Paulo
26 de novembro de 2010
 
Se as promessas tiverem algum valor, a equipe econômica do próximo governo será parcimoniosa no gasto, preocupada com a eficiência e empenhada em aumentar a poupança pública, para elevar o investimento federal e dar mais força e mais espaço à iniciativa privada. Nisto se resumem os compromissos de austeridade anunciados pelos futuros ministros da Fazenda, Guido Mantega, e do Planejamento, Miriam Belchior, na primeira entrevista depois de confirmada sua escolha pela presidente eleita, Dilma Rousseff. Na mesma ocasião, o economista Alexandre Tombini, convidado para presidir o Banco Central (BC), defendeu o regime de metas de inflação e disse haver recebido a garantia de respeito à independência operacional da instituição. Ele ainda terá de mostrar na prática se dará continuidade ao estilo de política monetária dos últimos oito anos, mas seu currículo autoriza um crédito de confiança. Uma expectativa otimista é muito mais difícil no caso dos convidados para a Fazenda e para o Planejamento.
No governo há mais de quatro anos, o ministro Guido Mantega jamais se destacou por qualquer compromisso com a austeridade e com o uso eficiente e criterioso do dinheiro público. Para cumprir suas novas promessas, terá de renegar atos e palavras bem conhecidos. Durante sua gestão, o governo só produziu algum superávit primário - o dinheiro posto de lado para o pagamento de juros - porque a arrecadação cresceu ininterruptamente. Apesar disso, recorreu a artifícios para cumprir a meta. Neste ano, o resultado global só não foi pior graças a dividendos de empresas estatais e a um malabarismo contábil para converter em receita o aporte de capital à Petrobrás.
Seu currículo inclui a criação de um fundo soberano muito peculiar, alimentado com dinheiro de um Tesouro deficitário (o governo acumula déficits nominais, ano após ano, porque o superávit primário nem dá para cobrir o serviço da dívida). A proposta inicial - usar dólares da reserva - foi logo abandonada, porque a aplicação da reserva cambial é regulada por lei. Ele, aparentemente, não sabia disso.
Em mais de quatro anos ele nada fez para conter o inchaço da folha de salários e encargos e nunca se opôs às custosas conveniências político-eleitorais do presidente e do partido. Quando surgiu a crise, concedeu facilidades fiscais a alguns setores e passou recursos do Tesouro ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social para um programa de estímulo ao investimento. O programa deveria ter sido interrompido após alguns meses, mas foi mantido no ano seguinte e envolveu aportes de R$ 180 bilhões. O Grupo Petrobrás foi um dos principais beneficiários. O setor privado, o mais atingido pela crise, teve acesso bem mais limitado aos empréstimos.
Os gastos de custeio continuaram crescendo na crise e a retórica oficial incluiu também essa gastança no bolo da política anticíclica. Mas ações anticíclicas têm ida e volta. Não é o caso dessas despesas, na maior parte incomprimíveis.
Neste ano, o ministro Mantega defendeu os gastos federais ainda falando em combater a crise - terminada no ano passado. Além disso, negou qualquer relação entre a expansão da despesa pública e o aumento da inflação. Terá de renegar também essa conversa, se quiser levar adiante o discurso da seriedade.
Quanto à engenheira Miriam Belchior, escolhida para o Ministério do Planejamento, participou da estruturação do Bolsa-Família, um programa em geral bem-sucedido, e trabalhou com a ministra Dilma Rousseff na Casa Civil, como coordenadora do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Deve ter sido a babá do programa, já que a ministra, segundo o presidente Lula, foi a mãe. Tem reputação de boa administradora, mas terá de provar suas qualidades mais uma vez, porque a gestão do PAC - um dos fracassos mais visíveis do atual governo - empobrece qualquer currículo. Ainda este mês o Tribunal de Contas chamou de precários os balanços do programa e cobrou clareza.
A futura ministra defendeu uma revisão dos gastos de custeio e falou em "fazer mais com menos". Para isso, será preciso renegar os critérios do atual governo e buscar eficiência - uma preocupação condenada como reacionária pelo lulismo.

O Brasil e suas Fronteiras - GSI-Planalto, 7/12/2010

GSI realiza Seminário sobre Perspectivas para a Faixa de Fronteira

O Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República tem a honra de convidá-lo(a) para participar do Seminário Perspectivas para a Faixa de Fronteira. Representantes do Governo, do Congresso e da Academia abordarão aspectos jurídicos, políticos e de integração sobre o tema. As inscrições são gratuitas. Data: 7 de dezembro de 2010.
Horário: 8h30 às 17h30
Local: Palácio do Planalto – Auditório do Anexo I
Inscrições: de 25 de novembro a 3 de dezembro.
Acesse: www.planalto.gov.br/gsi/saei

PROGRAMAÇÃO PRELIMINAR
8h30 às 9h00 - Credenciamento
9h00 às 9h45 - Abertura:
• General Jorge Armando Felix, Ministro-Chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República.
• Alexandre Rocha Santos Padilha, Ministro-Chefe da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República.
• João Reis Santana Filho, Ministro da Integração Nacional.
• Luís Inácio Lucena Adams, Advogado-Geral da União.

09h45 às 10h45 – Painel I – Visão Jurídica (25’ para cada expositor e 10’ de debate):
• Estudos sobre o Direito de Integração no âmbito do Mercosul, Maria Elizabeth Rocha, Ministra do Superior Tribunal Militar.
• A Faixa de Fronteira: estudos realizados no âmbito do Conselho de Defesa Nacional (CDN), Renata de Souza Furtado, Coordenadora-Geral de Assentimento Prévio da Secretaria de Acompanhamento e Estudos Institucionais do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República.
Mediadora: Giovana Costa, Assessora da Secretaria de Acompanhamento e Estudos Institucionais do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República.
10h45 às 11h00 – Intervalo para o café.

11h00 às 12h00 – Painel II – Visão Política (25’ para cada expositor e 10’ de debate)
• Senador Mozarildo Cavalcanti, Presidente da Subcomissão Permanente da Amazônia e da Faixa de Fronteira - Senado Federal.
• Deputado Emanuel Fernandes, Presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional - Câmara dos Deputados.
Mediadora: Giovana Costa, Assessora da Secretaria de Acompanhamento e Estudos Institucionais do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República.

12h00 às 14h00 – Intervalo para o almoço.

14h00 às 15h30: Painel III – A Integração Fronteiriça (25’ para cada expositor e 15’ de debate).
• A Experiência brasileira na integração fronteiriça, Ministro Clemente Baena Soares, Chefe do Departamento da América do Sul II - Ministério das Relações Exteriores.
• Evolução da concepção sobre limites e fronteiras políticas, com ênfase na zona de fronteira como zona de integração e interações espaciais, Profª Rebeca Steiman, Grupo RETIS/Departamento de Geografia - UFRJ.
• Hélgio Trindade, Reitor Pro Tempore da Universidade Federal de Integração Latino-americana (UNILA).
Mediadora: Profª Maria das Graças Rua, Centro de Pesquisa e Pós-Graduação sobre as Américas – CEPPAC/UnB.

15h30 às 15h45 – Intervalo para o café.

15h45 às 17h15 – Painel IV - Fronteira e Realidades Regionais (25’ para cada expositor e 15’ de
debate).
• A Fronteira e a Atuação da Universidade Federal de Roraima, Prof. Roberto Ramos Santos, Reitor da Universidade Federal de Roraima.
• A Fronteira e a Atuação da Universidade Federal de Pelotas, Prof. Antônio César Gonçalves Borges, Reitor da Universidade Federal de Pelotas.
• Geopolítica da Faixa de Fronteira e a experiência de Mato Grosso do Sul, Prof. Tito Carlos Machado de Oliveira, Centro de Análise e Difusão do Espaço Fronteiriço - UFMS.
Mediadora: Profª Gladys Bentancor, pesquisadora e colaboradora do Núcleo de Estudos Fronteiriços – UFPEL.

17h15 às 17h30 – Encerramento.

Brasil-Iran: revendo a politica de bons amigos...

Dilma deve rever a política para o Irã
O Estado de S.Paulo, Domingo, 28 Novembro 2010

A presidente eleita Dilma Rousseff deve rever a estratégia de aproximação do Brasil com o Irã, grande alvo de críticas da política externa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo interlocutores da petista, ela avalia que a atitude em relação a violações aos direitos humanos no Irã foi "equivocada" e "causou desgaste desnecessário". Para Dilma, associar-se a um regime que apedreja mulheres e aprisiona opositores foi um "enorme erro", dizem esses interlocutores.
O governo brasileiro reluta em condenar a sentença de apedrejamento da viúva Sakineh Ashtiani, acusada de adultério, e se abstém nas votações de resoluções da ONU contra essas práticas, e não condena a opressão a opositores. Um dos motivos para a não manutenção do chanceler Celso Amorim no cargo seria sua atuação no caso do Irã.
Seu desempenho nas negociações da Alca foi considerado um sucesso. Mas ele teria caído em desgraça por causa do Irã. Para fazer um recomeço, seria preciso ter um novo chanceler e Amorim ficou muito identificado com a iniciativa. Além disso, a química de Amorim com Dilma não seria das melhores - os dois tiveram algumas rusgas quando ela era ministra da Casa Civil.
Dilma já havia indicado que se opunha à atitude não intervencionista na questão iraniana. "Acho uma coisa muito bárbara o apedrejamento da Sakineh. Mesmo considerando usos e costumes de outros países, continua sendo bárbaro", disse Dilma em entrevista no dia 3 de novembro.
Para assessores próximos da presidente, a percepção é de que a aproximação com o Irã pode ter custado ao presidente Lula o Nobel da Paz por seu avanço em reduzir a pobreza.

Diplomacia brasileira: um balanco para a Foreign Policy

The Soft-Power Power
Susan Glasser, Foreign Policy's editor in chief, met Foreign Minister Celso Amorim in Brasilia for a wide-ranging conversation on Brazil's role as the rest rises. Below, the edited excerpts.
INTERVIEW BY SUSAN GLASSER | DECEMBER 2010

Susan Glasser: What is the big idea, as far as you see it, for Brazil's role in the world? Some people have argued that Brazil is a negotiating power, or a symbol of the emerging world order. What is your view?
Celso Amorim: I would say, of course it's a negotiating power. But it would be very simplistic to think Brazil always looks for consensus for consensus's sake. We also have a view of how things should be, and we tend to work in that direction. We struggle to have a world that is more democratic, that is to say, more countries are heard on the world scene -- a world in which economic relations are more balanced and of course in which countries in different areas can talk to each other without prejudice. And that's what we try to do in our foreign policy.
But of course Brazil is also a big country with a big economy, a multitude of cultures, and in a way similar to the United States -- but also in some ways different because the way people got here and the way they mixed was slightly different. So, Brazil has this unique characteristic which is very useful in international negotiations: to be able to put itself in someone else's shoes, which is essential if you are looking for a solution.

SG: What does Brazil want from the world right now, and what are you prepared to give to get it?
CA: Well, we give engagement. We give our minds, our thoughts. This costs quite a lot. I could be using -- President Lula, myself, and all others could be using our brains for other purposes, political or economic or whatever.
Brazil still has many problems. Inequality is still very big. It diminished a lot during President Lula's government, but it's still very big. So there is a long way to go. We know our shortcomings. If you look around, you'll see more women ambassadors and so on; you'll see some black people; but there is still a long way to go. But in any case, we have also this capacity to discuss and to have dialogue which was helpful in our own evolution and has helped in our relations with South America, and I think can help with the world at large.
I'll give you an example. One time, when I was ambassador to the U.N., they were looking for someone to take care of the sanctions committee on the former Yugoslavia. I received a call from the president of the Security Council. I was on a 10-day vacation -- a very rare thing -- in Greece somewhere, and he said, "No, no, it has to be you, Celso. It has to be Brazil because Brazil is the only one that both the Americans and the Russians will accept." Because the others either were seen as very partial or, let us face it, too weak to be able to stand the different pressures.

SG: You make a great case for Brazil as a sort of global negotiator with hopes for a permanent seat on the U.N. Security Council. But to what extent is that a strategy for your country, or is it really a tactic?
CA: Well, having a seat at the table is a means to have your voice heard and to have your ideas heard -- because we believe in them. In the same way that you believe in the American Dream, we believe in the Brazilian Dream and also how the Brazilian example can be useful for others. And maybe because we came after we can do that maybe with some more humility, which helps. We'll never have the military power that gets near to that of -- not even to speak of the United States -- but Russia or China. We'll have to have some military power because that is essential for any state as long as the nation-state exists. But we are aware that it cannot be at that level.
In the present-day world, military power will be less and less usable in a way that these other abilities -- the capacity to negotiate based on sound economic policies, based on a society that is more just than it used to be and will be more just tomorrow than it is today -- all these are things that help. I don't think there are many countries that can boast that they have 10 neighbors and haven't had a war in the last 140 years.

SG: So you're the ultimate soft-power power.
CA: There have to be some hard elements in it, as well: economic growth, as I mentioned, and we have to have some military power, some deterrent military power. Not because of the region; we don't think anything can happen, actually. [Latin America is] quickly becoming what I choose to call a "security community" in which war becomes inconceivable. But if other conflicts happen between other countries, we have to be prepared that it doesn't come to us. So some modicum of military power is necessary. It's not totally soft. People also say we have our music; I won't say our beautiful women because that would sound not very like a --

SG: Retro, not the future.
CA: Exactly.

SG: The Brazilian example in the world sounds so similar to what President Barack Obama campaigned on: the embrace of multilateralism, the sense that new institutions of global governance are needed, talking to one's enemies and not just one's friends.
CA: At some point he even said: "It's good," he said to President Lula, "that you can talk to some people I cannot talk to."
In ideological terms, I think we are very close to President Obama. We feel a lot of identification and actually saluted and welcomed the election of President Obama in a very strong way. Even though President Lula had a very pragmatic relationship with President Bush, the fact is that precisely because of the reasons that you mentioned -- because of what he represents in terms of fighting for equality, fighting inside his country, and also fighting for a more multilateral democratic world -- we felt very much at ease, and I would say that this is still the case. It's not for me to judge, but I do believe that maybe some hard facts of reality imposed themselves on President Obama. So it's up to him to see how he can deal with them.

SG: What of your experience with multilateralism do you think is useful to the United States? What are the limits of a multilateral world?
CA: It's more useful to think about the limits of unilateralism. Because when we see the situation in Iraq, what is the country that has benefited the most from the Iraq invasion? It's probably Iran. Nowadays Iran is seen as the biggest enemy. It's a strange situation.
So unilateralism also has its limits. But with multilateralism, it's like asking, "What are the limits of democracy?" Of course democracy has its limits. Of course sometimes I would like to have things done in one month and they take one year because you have to discuss them with other ministries, with NGOs, with trade unions, with the business class, and so on. So it takes a long time. And sometimes it doesn't happen in the way I have thought precisely. But still it's much better than having an autocrat acting very quickly, even if it's an autocrat with good intentions. I would say that multilateralism is for international politics, at the stage at which we live today, more or less the equivalent of what democracy represents inside states. And people could say the same thing of multilateralism that Churchill said of democracy.

SG: The worst system except for all the others?
CA: Yes.

SG: Tell me about your new partnership, or alliance, with Turkey. How did that come about? With your joint action on Iran, you must, I think, have built a close working relationship with your counterpart, Ahmet Davutoglu.
CA: Yes. Let me say, we, as part of our diversification of partners, we already had made some approaches to Turkey and vice versa because I think they were more or less in the same process. So there was an exchange of presidential visits, which had never taken place before.

SG: Yes, it's such an unlikely couple.
CA: Well, you know, sometimes unlikely couples are the most interesting ones!
What happened is that we both were trying to see how we could help in this problem of Iran. I think Turkey has its extra motives -- it's a neighbor of Iran and a Muslim country and so on and so forth. But let me tell you about the case of Brazil.
We were last year about to become a nonpermanent member of the Security Council. We think that when we are in the Security Council, whether permanent or not, we have to contribute to peace and security in the world and not just deal with our own interests.
I have followed this subject for a long time, and it was a problem that I always thought had no solution until I heard about the swap agreement. I discussed the [nuclear material] swap agreement with [then EU foreign-policy chief Javier] Solana -- which was proposed, you understand, by the United States as a reply to Iran's request to buy fuel. So I had these discussions with Solana, with [former International Atomic Energy Agency head Mohamed] ElBaradei, and I found there was a possibility of working for something. And I thought maybe a country like Brazil, which has this capacity for dialogue with several countries, could somehow help.
And so I discussed this subject with the Iranians. President Ahmadinejad came here. And I made trips to Iran, and I really found that it was in principle possible to pursue that role.
I had, just by chance, a trip to Turkey at the beginning of this year. When we compared notes in relation to Iran, I found out that both of us were trying to do the same thing and work along the same lines to use the swap agreement that was proposed by the United States, which was almost accepted by Iran. We saw that that was a possibility. So we found out that we were doing more or less the same thing, and we tried to coordinate our acts. And both being countries that look to have, how should I say, a more creative role in the world.

SG: For many people it was a sign of "the rise of the rest," that there was a different world order in which there would be other players and not just a small handful involved in negotiating major world solutions.

CA: I don't think we had an objective to show that. But that's really true, I believe, and that will happen more and more. Of course, we keep aspiring to be a permanent member of the Security Council. But in any case, what was clear is that the nonpermanent members of the Security Council in an important case like that didn't have any say whatsoever. We were invited to see the resolution after it was really ready. I came to know it through the news agencies. Only later on were we invited to make suggestions. Of course, it was suggestions that had no importance whatsoever, so we preferred not to make any. So I think it's a good lesson also on the lack of transparency of the Security Council. What I saw in this case, and I say that very openly and without any resentment of any kind, is that the fact that you have five permanent members with veto powers discussing only among themselves lends itself to all kinds of bargaining, which is not the best kind. Negotiation is natural. Of course you have to negotiate. But you know, if I am looking for exemptions for my own firms, this is not good for world order.

SG: Did the experience leave a lasting bad taste, do you think, between Brazil and the Obama administration?

CA: No, I don't think there is any bad taste. Of course, we were disappointed because we thought we were doing precisely what was, at least in spirit, the role that was being sought. So we were disappointed that there was no time even for examination. Actually, in Brazil you have a saying for when you don't like something, a book for instance; you say, "I haven't read it, but I didn't like it." So that was what happened with the Tehran declaration. Before it was at least analyzed in all its implications, it was refused.
And another moment was when, after I think three or four weeks, the Vienna group -- the United States, Russia, and France -- wrote back to the International Atomic Energy Agency. They didn't wait for Iran's reply. They presented their letter in the morning, and before midday they were adopting the sanctions. So, again, even if Iran would say, which of course would be unlikely, they said something like, "We'll accept everything," still the sanctions would be there. I think there was this haste to approve the sanctions that we didn't like.
But this is natural. We don't take that with resentment. But of course we cannot accept when people say, "Well, you knew that it would not be sufficient" or "You knew that we would not accept" because that did not correspond to the signals we received. Now, even Ahmadinejad is already saying that he's ready to interrupt the 20 percent enrichment if there is a swap agreement. As I said, the P5 [the five permanent Security Council members] was, I think in the latest meeting, during the General Assembly, they said that they were prepared to look at the revised swap agreement -- you don't even need to call it revised. We won't charge copyright.

SG: If there's one persistent criticism of President Lula's foreign policy, it has been the surprise at his unwillingness to criticize violators of human rights. It's one thing perhaps to negotiate with President Ahmadinejad over nuclear proliferation issues, but --
CA: I don't agree with that criticism. Because first, it's not true. We have criticized very often. But we don't think that just pointing your finger at someone will actually improve human rights on the ground. So, you know, it's a different view. And we are a very strong proponent, as you know, of the Universal Periodic Review, in which everyone will be analyzed: Brazil, Sudan, the United States, Germany, everyone. What we don't like is singling out one country. We have been critical; we have made recommendations to Iran; we have made recommendations to Cuba -- we have ongoing political dialogue with Cuba in which no subject is taboo. But that's the way we act. There are things we are able to say to them that we would not be able if I just go to the world podium and say, "Here I am; I'm a great guy. I'm a self-righteous guy. And you have to do what I say."
President Lula, as you know, went very publicly, for instance, on the story of the stoning of the lady in Iran, even to the point that it might sound like a little bit of interference to our Iranian friends. But we thought in that case it was justifiable and that we had, let us say because of our good relations with them and what we had tried to do, we had the moral authority to do so. Others don't, to be quite honest. They won't be heard. They may think they have the moral authority, but they won't be heard. President Lula is heard. How many foreign ministers, how many countries can have meetings on the same day with Bill Gates and President Ahmadinejad?

Celso Amorim is Brazil's foreign minister.
Susan Glasser is editor in chief of Foreign Policy.

Volta ao mundo em 25 ensaios: dominação e exploração

Uma série que vem sendo publicada em Ordem Livre e em Via Política (não necessariamente na mesma ordem, ou talvez em "ordem livre"), sobre temas diversos da realidade mundial e nacional.
Vou fazer um post com links para todos os ensaios, na ordem sequencial.

Volta ao mundo em 25 ensaios:
Preeminência, hegemonia, dominação, exploração: realidades ou mitos?
.
Por Paulo Roberto de Almeida
www.pralmeida.org


Caricatura (escolhida por Via Política) mostra ambições inglesas por novos territórios

Admitamos desde o início e de modo incontroverso: preeminência, hegemonia, dominação, exploração são realidades concretas (com perdão pela redundância); todas essas situações e interações fazem parte do mundo como ele é, desde o início dos tempos até nossos dias. O ‘mundo como ele é’ foi e é justamente feito dessas realidades desagradáveis, até brutais, que não devem ser travestidas por qualquer visão ‘panglossiana’ da história das civilizações humanas. Os mitos, entretanto, começam quando se pretende explicar o mundo como ele é apenas por meio dessas realidades tangíveis, algumas até ‘intangíveis’, ou seja, existentes virtualmente, quase despercebidas materialmente.

‘Intelectuais’, assim proclamados, acreditam que a dominação ‘ideológica’ dos países avançados sobre os periféricos é ainda mais insidiosa e totalitária do que a dominação econômica, tecnológica ou militar. Devem ser pessoas que não acreditam na força da cultura ou que superestimam a capacidade dos países ricos de moldar os ‘corações e mentes’ dos povos dos países ‘dominados’ à sua imagem e semelhança. Seria desdenhar muito da fraqueza destes últimos e sobrevalorizar à outrance o poder de sedução dos primeiros.

De um ponto de vista puramente histórico e sociológico – abstraindo, portanto, as implicações políticas, militares e até culturais daqueles fenômenos ou processos envolvidos nos conceitos expressos no título deste ensaio, todos eles envolvendo primazia, sujeição e até a dominação a mais brutal de alguns povos sobre outros –, deve-se reconhecer que essas situações foram e são muito comuns na história da humanidade.

Não se deve esquecer, por exemplo, que nove décimos da história humana registrada foram transcorridos sob a marca de instituições tão brutais – e, no entanto, tão ‘normais’ no plano das realidades efetivas – quanto a escravidão, a eliminação (e mais frequentemente ainda a mutilação física) dos vencidos na guerra, a sujeição de mulheres e crianças ao poder dos conquistadores, a ocupação e apropriação violenta de espaços e recursos, enfim, toda sorte de exações e arbitrariedades que ainda permanecem conosco em grande medida, a despeito de todos os progressos humanitários e no plano do direito internacional realizados desde um século ou mais. Infelizmente, o mundo ainda não é o que gostaríamos que fosse.

Mas, tampouco, o mundo permanece aquele campo aberto de caça à disposição dos imperialistas, como ele se apresentava ainda cem anos atrás: os tempos de disputa pela África e de “grande jogo” na Ásia central já se encerraram há muito tempo, embora as fragilidades dessas regiões sejam persistentes e os centros atuais de poder estejam projetando seus novos interesses sobre velhos e novos provedores de recursos estratégicos. A China, por exemplo, tem exercido uma ofensiva em direção desses países, dotados de matérias primas e recursos estratégicos, que se parece muito com a antiga “diplomacia do dólar”, conduzida pelos EUA desde os tempos de William Taft e Theodore Roosevelt, no início da projeção imperial da grande República.

Por outro lado, a emergência do direito internacional, como matriz condutora – ainda que não a força decisiva – das relações internacionais desde a criação da ONU, tem atuado para refrear os impulsos imperiais e os projetos de dominação. Embora velhos e novos impérios continuem a existir – muitos deles virtuais, baseados no livre comércio e nos investimentos, como é o caso dos EUA, eventualmente garantidos por bases militares e por ameaças e pressões ocasionais – eles já não mais podem ditar soberana e exclusivamente as condições segundo as quais a comunidade internacional irá organizar sua estrutura institucional e sua agenda de trabalho: é preciso agora fazer um esforço mínimo de construção de consenso e de aprovação de resoluções, por mais que muitas delas sejam desrespeitadas no momento seguinte (como no caso da invasão do Iraque, que careceu da legitimidade tão buscada pela potência invasora). Não se pode esquecer, também, que o último resquício do velho colonialismo, a Comissão de Tutela da ONU – burocrática herdeira de algumas possessões coloniais vindas da Liga das Nações – já deixou de existir, por falta absoluta de “clientela”.

Nada disso diminui a força do poder e o poder da força nas relações internacionais, mas reduz consideravelmente a latitude de ação dos velhos poderes imperiais do passado. Alguns desses poderes, dos tempos presentes, são, pelo menos, obrigados a atuar dentro de alguns parâmetros que respeitam, ainda que formalmente, a soberania e a independência das novas nações independentes. Se não o fazem, eles são constrangidos em sua ação internacional pela ausência de legitimidade intrínseca conferida às suas iniciativas em várias outras áreas. Os países ‘vítimas’ da violência imperial já não são mais inermes, como no passado, na medida em que dispõem de instrumentos do direito internacional e instâncias de apelo que não existiam antes da criação da ONU, ou mesmo dos tribunais da Haia e outras cortes especializadas.

Em qualquer hipótese, os princípios westfalianos têm vigência absoluta, posto que estamos lidando com Estados constituídos, não com territórios indefinidos, estes na completa ausência de estruturas governamentais reconhecidas pela comunidade internacional. Mesmo a alegada capacidade das empresas multinacionais mais poderosas, em face da fragilidade de pequenos Estados, sempre aventada pelos mesmos ‘intelectuais’ como fator de pressão e mesmo de dependência em favor dessas empresas ou de seus Estados de origem não se sustenta levando em conta a capacidade normativa do mais modesto país da região mais pobre do mundo.

Concretamente isso quer dizer que o país mais miserável da Terra, cujo PIB nacional representa, hipoteticamente, menos de 10% do faturamento da maior empresa multinacional – não importa o produto ou serviço – pode, se assim o desejar, proibir completamente as operações dessa empresa em seu território soberano, por meio de uma simples medida normativa ou até de caráter administrativo.

Independentemente, porém, dos progressos, mesmo relativos, do direito internacional e da arquitetura institucional em construção, a verdade é que os conceitos destacados no título se referem a uma realidade e, sobretudo, a uma filosofia em larga medida inadequadas ao mundo atual. Não que os fenômenos e processos neles contidos tenham desaparecido por completo do cenário internacional; mas é que eles estão largamente contidos pelos efeitos combinados da evolução da institucionalidade internacional, da construção de Estados e do desenvolvimento da interdependência contemporânea; a previsão é que eles se tornem cada vez mais raros.

20/11/2010

Fonte: ViaPolítica/O autor

Brasília, 7 de janeiro de 2010.
Revisão: Shanghai, 14/4/2010

Ensaios preparado para OrdemLivre.org

Paulo Roberto de Almeida é Doutor em Ciências Sociais e diplomata de carreira.

Da série Volta ao Mundo em 25 Ensaios, leia também em ViaPolítica:
“Países ou pessoas ricas o são devido a que os pobres são pobres?”
“Orçamentos públicos devem ser sempre equilibrados?”
“Competição e monopólios (naturais ou não). Como definir e decidir?”
“Políticas ativas pelos Estados funcionam? Se sim, sob quais condições?”
“Duas tradições no campo da filosofia social, o liberalismo e o marxismo”
“Individualismo e interesses coletivos: qual a balança exata?”
“Como organizar a economia para o maior (e melhor) bem-estar possível”

Mais sobre Paulo Roberto de Almeida

Diplomacia brasileira: no meio do caminho tinha uma China...

Destaque cético: Antônio Azeredo da Silveira, chanceler de Ernesto Geisel, dizia que "o Brasil pode renunciar a tudo, menos à sua grandeza."
Que grandeza?

Celso Amorim: 'Precisamos repensar nossa relação com a China'
Patrícia Campos Mello, enviada especial a Brasília
O Estado de S.Paulo, 27 de novembro de 2010

Em balanço de sua gestão, chanceler rebate críticas por omissão do País em temas polêmicos

BRASÍLIA - O chanceler Celso Amorim se prepara para deixar o circuito das grandes questões mundiais e se recolher à ponte aérea entre Brasília, onde vive sua mulher, e a Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde pretende dar aulas quando acabar o governo Lula. Dizendo se sentir "realizado" com sua atuação à frente da política externa do governo Lula durante oito anos, o chanceler admite não ter "planos muito claros" sobre o que vai fazer daqui para frente. Amorim tem apenas uma autocrítica em relação a seu mandato no Itamaraty - falta de uma estratégia mais clara para lidar com a China, concorrente e, ao mesmo tempo, aliada do Brasil no Brics. "Esse será um grande desafio", diz.

Quanto ao envolvimento do Brasil em questões polêmicas como a omissão do governo brasileiro em relação a violações contra direitos humanos em Cuba e no Irã, ele não recua nem um milímetro. "Nós não somos ‘soft’ em direitos humanos, só não condenamos porque a grande maioria dos países que condenam é de ex-potências coloniais que estão purgando os seus complexos de culpa", disse. "Não dá certo fazer as duas coisas (conversar privadamente enquanto condenam publicamente)."

Amorim acha que a maior visibilidade do Brasil no cenário internacional veio para ficar. "Como o Brasil quer ser membro do Conselho de Segurança, não podemos nos omitir dessas (grandes) questões", afirma o chanceler. "Não vamos fazer uma nova política de isolacionismo, só cuidar do nosso. Como dizia o Silveira (Antônio Azeredo da Silveira, chanceler de Ernesto Geisel), o Brasil pode renunciar a tudo, menos à sua grandeza."

O Itamaraty argumenta que é melhor não fazer condenações públicas de violações a direitos humanos para manter o canal de comunicação aberto e influenciar os países dessa maneira. Não dá para fazer as duas coisas ao mesmo tempo, evitando desgastar a imagem da democracia brasileira?
Não dá certo fazer as duas coisas. Se você ficar condenando, você se descredencia como interlocutor. Precisamos ter uma atitude que propicie o diálogo e nossa estratégia deu certo.
No caso da francesa Clotilde Reiss (civil francesa que estava presa no Irã, acusada de espionagem, e foi libertada), não há dúvida. As críticas são totalmente injustas. Ontem mesmo o responsável por direitos humanos no Irã disse que o país está revendo a sentença de morte por apedrejamento de Sakineh. Até que ponto isso se deve à pressão internacional e até que ponto aos apelos do presidente Lula e de outras pessoas que tenham diálogo direto com ele, eu não sei, essas coisas são difíceis de medir.

O Brasil se alinhar com países que têm histórico antidemocrático não compromete nosso "soft power", poder de influenciar sem recorrer à força bruta?
Eu não acho que o nosso "soft power" tenha sido comprometido ao longo desses anos, nem essa é a opinião de nenhum comentarista internacional. Não somos "soft" em direitos humanos, só não condenamos porque a grande maioria dos países que condenam é de ex-potências coloniais que estão purgando os seus complexos de culpa. E não quer dizer que nós privadamente muitas vezes não falemos. E se eu quisesse posar de amiguinho do Irã ia votar contra, ia dizer que a resolução (da ONU) não tem cabimento. Nós nos abstivemos.

Olhando para esses últimos oito anos, o que o senhor teria feito de diferente?

Pode parecer presunçoso, a minha tendência é ver acertos, os historiadores terão visão mais equilibrada. Eu não me arrependo da Alca (negociação que não avançou).

O sr. acha que a atribuição de comércio exterior tem de ficar no Itamaraty ou deve ser criado um escritório comercial subordinado à Presidência, como nos EUA?
Pergunte à Fiesp o que eles acham - à Fiesp mesmo, não a ex-diplomatas que estão na Fiesp. Nós temos uma visão de País mais completa, levamos em conta outros fatores que não são aqueles de ganho imediato.

Um problema que está ganhando cada vez mais importância é a competição da China. Não deveria haver maior assertividade em relação à China, além de defesa comercial?
Nós estamos com superávit de quase US$ 7 bilhões com a China.

Mas o que exportamos são commodities.
Quando chega a hora de defender o interesse do etanol, do açúcar, é muito importante, mas quando está dando certo, aí tudo vira commodities. Dito isso, eu não quero dizer que não tenhamos de ser mais assertivos em relação à China. Esse é um desafio.

O Brasil é muito mais enfático ao criticar a política monetária americana, dentro da guerra cambial, do que a desvalorização do yuan. Isso não é ideológico?
A China adotou uma política que nos prejudica, mas a raiz do problema está na política monetária dos EUA, não tenho dúvida sobre isso. Como estou em final de governo, estou de saída, dou minha opinião: se um país quer ser tratado como economia de mercado, não pode ter política cambial que não seja de mercado. Essa política de constante desvalorização nos atinge. Eu acho que o relacionamento com a China será um dos maiores desafios do Brasil daqui para a frente.

A China está entrando em áreas de influência nossa, como América do Sul e África. Mas a China segue um modelo de negociação sem impor condições com Zimbábue, por exemplo, país notório por violações.
Vamos competir com nossos méritos, o Brasil transfere conhecimento da maneira que eles não transferem, em agricultura tropical, por exemplo. Não queremos seguir o modelo chinês, em absoluto, não perco uma oportunidade de conversar com meus interlocutores do Zimbábue sobre o que eu acho que eles deveriam fazer, que envolve tratamento adequado da oposição. Mas não somos a favor de isolamento comercial, algo que não dá resultado.

Quais são os grandes desafios em política externa do próximo governo?
Precisamos dar uma forma importante ao relacionamento com a China. Não desenvolvemos um conceito pleno de como vai ser nossa relação com a China. Essa é uma autocrítica. Não deu tempo. Precisamos pensar mais profundamente nisso.

E com os EUA, em que pé estamos?
Estamos bem. Nossa cooperação no Haiti foi muito boa, há vários países onde cooperamos no etanol.

Seria positivo a presidente eleita Dilma Rousseff se encontrar com o presidente americano Barack Obama em Washington antes de sua posse?
Ah, esse conselho eu só dou a ela se ela me pedir. E ela não me pediu. Mas, na minha opinião, indispensável não é. Ela terá tempo de ir depois, receber o Obama aqui depois. É mais importante ela ir à Argentina, porque simboliza as realizações com a América do Sul.

Os EUA têm a visão certa do papel do Brasil no mundo?
Há uma visão mais aproximada, apesar de tropeços. Em uma matéria recente, a própria (secretária de Estado) Hillary Clinton falou da necessidade de intensificar as relações com China, Índia e Brasil.

Mas, por enquanto, intensificou com a Índia.
A Índia tem para eles um valor estratégico em função da região onde está, ao lado da China e Rússia.

Seria esperado, quando o presidente Obama vier pra cá, que ele manifeste apoio à pretensão do Brasil a um assento permanente no Conselho de Segurança (CS) da ONU, como fez com a Índia?
Ah, eu esperaria, se o presidente Obama vier pra cá, depois de ter ido à Índia, seria normal ele dizer a mesma coisa do Brasil.

Apesar dos nossos percalços com os EUA nos últimos tempos.
Sim, seria normal. Se o preço para entrar no CS é dizer sim a tudo, pode até não valer a pena.

Em Trinidad Tobago em 2009, na Cúpula das Américas, Obama fez um discurso prometendo uma nova política para a América Latina. Ele correspondeu às expectativas de mudança da política americana para a região?
O governo republicano (do presidente George Bush) cometeu muitos erros em relação à América Latina - pôs Cuba no eixo do mal, apoiou o golpe na Venezuela. Mas em outros casos o governo Bush agiu de maneira mais sensata, ouviu o Brasil em muitas coisas. Nós tínhamos uma enorme expectativa com o presidente Obama, mas ele teve de se concentrar em outros problemas, internos e do Oriente Médio. Algumas vezes isso não é mau. A melhor política que os americanos podem ter para a América Latina é a "negligência benigna".

O que o sr. pretende fazer quando acabar o governo Lula?
Não tenho nenhum plano muito claro, tenho vários convites vagos, para fazer seminários, cursos, o mais específico é para dar aula na UFRJ. Pretendo fazer isso, vou morar entre Brasília e o Rio, minha mulher mora aqui.

O sr. teria gostado de permanecer no governo Dilma?
Dizer não soaria arrogante, dizer sim parece que estou pleiteando alguma coisa. Eu me sinto realizado. Os nomes que ouço falar todos são de pessoas boas.

O sr. acha que haverá continuidade na política externa?
Eu não creio que haja mudanças de curso muito importantes, mas desafios novos sempre aparecerão, a China é uma relação que terá de ser pensada.

O sr. vê o mesmo tipo de atuação intensa em questões controversas, como Oriente Médio e Irã?
O Brasil é percebido como um interlocutor válido no Oriente Médio, eu recebi pedidos para receber autoridades da Síria, da Autoridade Palestina, de Israel. Independentemente de quem seja o presidente, o Brasil é um país que tem um peso. Essas situações vão se repetir caso a gente queira ou não queira, e a gente não pode fugir delas. Como o Brasil quer ser membro do CS, mesmo não permanente, não podemos nos omitir dessas questões. Não vamos fazer uma nova política de isolacionismo, só cuidando do nosso. Como dizia o Silveira (Antônio Azeredo da Silveira, chanceler de Ernesto Geisel), o Brasil pode renunciar a tudo, menos à sua grandeza.

sábado, 27 de novembro de 2010

Pausa para...grandes arquitetos e suas obras maravilhosas...

ARTS - INTERACTIVE FEATURE
Architects Take On Museums in Doha and Abu Dhabi
I.M. Pei, Frank Gehry, Norman Foster and Jean Nouvel discuss their work in the Persian Gulf.

The New York Times, November 27, 2010

Two Cities, Four Architects

Two cities on the Persian Gulf, Doha and Abu Dhabi are the settings for vast construction projects, including major new museums designed by some of the world's most celebrated architects.

I.M. Pei

spoke about the simple geometric forms that make up his Museum of Islamic Art in Doha, and he described the clarity of the desert sunlight as a central influence.

Frank Gehry

is building a branch of the Guggenheim that is 12 times the size of its New York headquarters. He spoke of an intuitive design approach. GUGGENHEIM MUSEUM, ABU DHABI

Norman Foster

is designing the National Museum in Abu Dhabi. His project is built on Saadiyat Island, and he talked about history as a guide to sustainable structures in a hot environment.

Jean Nouvel

has projects in both cities. His branch of the Louvre in Abu Dhabi is covered by a huge dome. His other project, in Doha, is the National Museum of Qatar. It was inspired by the shape of local sand roses.


Photographs by: Gehry Partners; DigitalGlobe via Google Earth,; Agence France-Presse; Reuters; Chris Ramirez for The New York Times

Norman
Foster

is designing the National Museum in Abu Dhabi. His project is built on Saadiyat Island, and he talked about history as a guide to sustainable structures in a hot environment.
SITE OF NATIONAL MUSEUM, ABU DHABI
Photographs by: DigitalGlobe via Google Earth, Foster & Partners, Horst Neumann/Image Bank via Getty, Sajid Shafique/Getty Images

Jean
Nouvel

has projects in both cities. His branch of the Louvre in Abu Dhabi is covered by a huge dome. His other project, in Doha, is the National Museum of Qatar. It was inspired by the shape of local sand roses.
LOUVRE, ABU DHABI; NATIONAL MUSEUM, DOHA
Photographs by: DigitalGlobe via Google Earth, Ateliers Jean Nouvel; Ed Alcock for The New York Times; Stephanie Kuykendal for The New York Times; Sean Gallup/Getty Images; Ernest H. Schoedsack; Owen Oxley
Credits: Erin Aigner, Xaquín G.V., Mika Gröndahl, David Nolen, Sergio Peçanha and Zach Wise; videography by Brent McDonald and David Clair, Stefania Rousselle, Marcus Yam for The New York Times

Protecionismo argentino: continuidade assegurada...

Desde a segunda metade dos anos 1980 -- não considerando as travas anteriormente existentes no que se refere a açúcar e automóveis, que continuam existindo até hoje -- a Argentina impõe restrições ilegais aos produtos brasileiros, e contra ele erige barreiras para-tarifárias (salvaguardas, antidumping, todos ilegais e abusivos), numa total contravenção às regras da zona de livre-coméricio e de união aduaneira que deveriam, supostamente, reger o Mercosul.
Antes do "nunca antes", o governo brasileiro reagia, por meio do mecanismo próprio de solução de controvérsias ou até recorrendo às instâncias do GATT-OMC, o que é inacreditável, sabendo que se trata de dois membros de uma mesma união aduaneira. Com a entrada do "nunca antes", nunca mais o Brasil reagiu à altura, sendo tolerante com os desmandos argentinos e até colaborando com o protecionismo deslavado, pedindo "compreensão" aos empresários exportadores brasileiros, a pretexto de colaborar com o esforço argentino de recuperação econômica e de reindustrialização.
O Brasil do "nunca antes" aceitou passivamente os argumentos completamente equivocados em torno de supostas "assimetrias" entre os dois países, o que é também um indício que as cabeças supostamente pensantes na política econômica externa do Brasil na verdade não pensam, pois aceitam argumentos totalmente falsos quanto à natureza da relação bilateral e dos fatores de competitividade nacional.
Continua sendo assim, como evidencia este editorial do Estadão, que destaca que a integração, na verdade, vem dando passos atrás, com a conivência ativa do governo brasileiro, que proclama promovê-la e defendê-la.
Pode-se considerar que seja apenas inconsciência, embora alguns observadores admitem que se trata de burrice, mesmo, parte de um projeto ilusório de liderança na região.
Paulo Roberto de Almeida

Maus modos, velhas práticas

Editorial O Estado de S.Paulo, 26 de novembro de 2010
 
O que há de novo nas recentes ameaças do governo argentino de criar barreiras à entrada de produtos brasileiros são os maus modos com que elas foram transmitidas pelo secretário de Comércio Interior do governo Kirchner, Guillermo Moreno, ao embaixador do Brasil em Buenos Aires, Ênio Cordeiro.
Utilizando um tom agressivo, como informou o jornal Valor, e ignorando o fato de que "um embaixador, por definição, é representante de algo que excede sua pessoa" e de que, no caso de Cordeiro, "por trás dele há um país quatro vezes maior e mais poderoso do que a Argentina, que dificilmente deixará que o episódio se dilua sem nenhum custo", como registrou o jornal Clarín, de Buenos Aires, Moreno se excedeu nas grosserias. Isso transformou o assunto num incidente diplomático, que certamente exigirá a interferência do presidente Lula, que ainda se avistará duas vezes com a presidente argentina Cristina Kirchner.
Novidade para muitos brasileiros, o estilo truculento de Moreno é, porém, conhecido do setor empresarial argentino. O secretário de Comércio Interior tem sob seu comando o órgão oficial encarregado de medir a inflação argentina, o Instituto Nacional de Estatísticas e Censo (Indec), acusado de manipular dados. Como responsável pelo comércio interno, Moreno tem ameaçado empresários de vários setores, que convoca a seu gabinete para forçá-los a baixar os preços. Segundo participantes desses encontros, às vezes os recebe com uma pistola sobre sua mesa.
Foi dele, em maio, a iniciativa de avisar os dirigentes de supermercados argentinos de que, a partir daquele momento, proibiria a entrada no país de produtos alimentícios não frescos procedentes do Brasil que concorressem com o similar nacional e puniria as empresas que desrespeitassem suas ordens. Era uma barreira apenas verbal, mas que, pelos métodos e pelo poder de Moreno - é considerado fiel cumpridor das determinações de Kirchner -, foi levada a sério.
Na época, houve notícias de filas de caminhões brasileiros na fronteira, pois sua entrada na Argentina estava sendo impedida. Após encontro com Lula, a presidente Cristina Kirchner negou publicamente que seu governo tivesse imposto restrições à entrada de produtos brasileiros.
No dia 5 de novembro, Guillermo Moreno se reuniu com o embaixador Ênio Cordeiro, na presença do ministro da Economia, Amado Boudou, ao qual está subordinado - mas, na prática, responde diretamente à presidente Kirchner. O pretexto da reunião, segundo o jornal Valor, foi a importação de tubos de metal fabricados no Brasil que caracterizaria a prática de dumping (esse produto passou a ser sobretaxado na Argentina). Além disso, Moreno afirmou que o governo argentino prepara "contramedidas" eficientes e não ortodoxas para conter a importação de produtos brasileiros.
Se, para as autoridades brasileiras, a falta de educação do funcionário argentino pode ser novidade, suas ameaças são velhas conhecidas. Sempre que o comércio entre os dois países registra um aumento expressivo do saldo em favor do Brasil, a Argentina ignora os acordos e tratados que regem o Mercosul e impõe barreiras de diferentes tipos à entrada no país de produtos brasileiros.
É o que ocorre no momento. Apesar das desvantagens dos produtos brasileiros no exterior por causa da valorização do real em relação ao dólar, o Brasil conseguiu acumular, nos primeiros dez meses deste ano, um saldo de US$ 2,9 bilhões no comércio com a Argentina. E esse superávit foi alcançado a despeito do aumento de cerca de 30% das exportações da Argentina para o Brasil, o que, argumentam os brasileiros, contribui para assegurar mais da metade dos 80 mil empregos da indústria automobilística argentina.
Quando o governo argentino investe contra os produtos brasileiros, o governo Lula, ao contrário do que diz a imprensa argentina - segundo a qual dificilmente o Brasil deixa de reagir -, tem aceitado as medidas com tolerância que beira a passividade. O que talvez o tenha incomodado no caso é o estilo de Guillermo Moreno. As agressões argentinas praticadas com luvas de pelica foram sempre toleradas.

Politica externa: continuidade assegurada...

Dizem que um dos lemas do Itamaraty é saber renovar-se na continuidade. Bem, em termos de continuidade, ele não precisa mais se preocupar...
Aliás, na Defesa também, como registra a matéria na sequencia.
Paulo Roberto de Almeida

Dilma mantém Marco Aurélio Garcia, assessor de Lula
Tânia Monteiro
O Estado de S.Paulo, 26.11.2010

A presidente eleita Dilma Rousseff decidiu manter o assessor especial internacional do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Marco Aurélio Garcia, no mesmo cargo que ocupa hoje.
A manutenção da Garcia na cozinha do Planalto é um forte sinal da continuidade de política de boa vizinhança do Brasil com os países vizinhos, como a Venezuela, que rendeu muitas críticas à política
externa do presidente Lula. A própria Dilma, embora não tenha explicitado como pretende conduzir a política externa brasileira, já manifestou apoio ao Mercosul e foi celebrada pelo venezuelano Hugo
Chávez. Será uma reedição da dobradinha Garcia-Itamaraty, que o governo considera que deu certo na administração da política externa sob Lula.
Mas, a ajuda de Marco Aurélio à Dilma não se restringe à política externa. Garcia, que foi um dos coordenadores da campanha da petista, ajudará a presidente eleita também na relação com o PT.
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Convencida por Lula, Dilma irá se reunir com Jobim
Gerson Camarotti e Geralda Doca
 O Estado de S.Paulo, 27.11.2010

Dilma já considera possível mantê-lo no Ministério da Defesa

Depois das recomendações do presidente Lula, a presidente eleita, Dilma Rousseff, já diminuiu as resistências para manter no cargo o ministro da Defesa, Nelson Jobim.
Terá uma conversa definitiva com ele depois do dia 4 de dezembro, quando ele estará de volta ao Brasil de uma viagem a Itália, Sérvia, Polônia e Espanha. Oficialmente, a conversa será para tratar da compra dos caças para a Força Aérea Brasileira.
Lula tem dito a Dilma que Jobim é fundamental para evitar crise numa área delicada.
Na sua avaliação, o presidente vai além: hoje haveria poucos quadros preparados como Nelson Jobim para ter autoridade e conhecimento para comandar as Forças Armadas.
Todos os antecessores de Jobim enfrentaram crise e foram desestabilizados. Dilma analisou outros nomes para a Defesa. Até o do deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP), que irá para a Justiça, chegou a ser avaliado.
Mas cresce o consenso de que qualquer nome enfrentaria dificuldades. Para diminuir as resistências de Dilma, uma saída seria manter Jobim por um período determinado, até acabar a reestruturação do Ministério da Defesa. Mas Lula tem dito que o melhor seria mantê-lo por todo o mandato.
Confirmada a permanência de Jobim, devem continuar nos cargos os comandantes das Forças Armadas: brigadeiro Juniti Saito, da Aeronáutica; almirante Moura Neto, da Marinha, e general Enzo Perri, do Exército.
Ontem, a atuação de Jobim no enfrentamento ao crime organizado no Rio foi elogiada no Planalto, o que contou pontos para sua permanência.
Ao saber das resistências ao seu nome, Jobim mandou sinais de que não tinha interesse em permanecer no posto. Isso preocupou Lula, que decidiu priorizar o assunto.
"Até Jobim, a Defesa foi um dos maiores problemas do meu governo", disse Lula para Dilma.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Unasur e a clausula democratica: e quando o "golpista" é o proprio dirigente?

A Unasur aprovou uma "clásula democrática", como informa a matéria abaixo. Muito bom, muito bem.
Mas ela se aplica apenas em tentativas ou iniciativas de derrubadas de regimes regularmente eleitos por meios violentos, ou seja, golpes de Estado "clássicos" (se o termo se aplica).
E quando são os próprios dirigentes a minar a democracia em seu país? Nada a fazer?
Pois é isso o que vem fazendo alguns dos líderes políticos presentes na reunião da Unasur: eles vem minando, na verdade destruindo, a democracia por dentro. Sem golpes, apenas na base de decretos, de mudanças constitucionais e legais, algumas delas conseguidas por via plebiscitária, quando o líder cesarista, ou candidato a autocrata, exerce todos os seus poderes efetivos para convencer uma maioria de votantes (que podem não ser suficientemente esclarecidos) de que aquelas mudanças vão melhorar a vida desses votantes.
Contra esses "golpes legais" a cláusula da Unasur não serve para nada. Melhor ficar com a resolução democrática da OEA, a declaração de Lima (2001), muito mais exigente em termos de requerimentos democráticos.
Paulo Roberto de Almeida

Unasul aprova cláusula democrática

Protocolo estabelece sanções diplomáticas e comerciais a tentativa ou golpe de Estado na região

estadão.com.br, 26 de novembro de 2010 | 19h 20


GEORGETOWN  - Os países da União de Nações Sul-Americanas (Unasul) aprovaram nesta sexta-feira, 26, um protocolo para responder de forma conjunta, ou inclusive prevenir, tentativas de golpes de Estado na região. 

"Já assinamos", disse o presidente da Venezuela, Hugo Chávez em Georgetown, na Guiana, onde a reunião ocorre.
O protocolo estabelece sanções diplomáticas, políticas e comerciais a qualquer tentativa ou golpe de Estado nos países membros. "Quem tentar um golpe de Estado, ou chegar ao poder por meio de um governo de facto, saberá que terá de enfrentar o ostracismo total da região", disse o presidente do Equador, Rafael Correa.

Inflacao na China, e no Brasil

Revoltas contra os aumentos de preços costumam ser violentos na China, como relata esta pequena matéria da Economist. Mas não adianta culpar os americanos pelo aumento de preços na China, pois como também indica a matéria o aumento do meio circulante na China foi muito mais importante do que nos EUA, para uma economia duas ou três vezes menor.
Seria interessante conhecer de quanto aumento o M2 brasileiro, uma vez que o governo vem aumentando o crédito e os gastos de maneira quase irresponsável. Não se deveria reclamar, em seguida, se o BC aumentar os juros, em virtude de a inflação estar superando não apenas o centro da meta, mas ameaçando ultrapassar a banda fixada (que vai até 6,5%, cabe lembrar).

The canteen vigilantes
The Economist, November 26th, 2010, 10:05
by S.C. | HONG KONG
FORGET the bond-market vigilantes. In China, rising inflation has invited swift and terrible retribution from over a thousand rampaging schoolkids, who trashed their canteen in Guizhou province after the school raised the price of school dinners and bottled water. The South China Morning Post has the story (subscription required) and the pictures.
The disagreement among China-watchers about the roots of the country’s inflation is almost as violent. Like the company running the school canteen, many economists blame the rising price of vegetables and fruit. But this is “a lot of guff”, argues Arthur Kroeber of Dragonomics, an economics consultancy. “Food prices,” he says, are “an expression of inflation, not its cause.”
I wouldn’t go that far. But I share his scepticism about the other excuse Chinese officials like to offer: the Fed. They trash its monetary policy as enthusiastically as the schoolkids trashed their canteen. Its easy money, they argue, has raised global commodity prices and spurred hot-money inflows.
But despite its best efforts, the Fed has only succeeded in raising America’s broad money supply (as measured by seasonally-adjusted M2) to about $8.8 trillion. China’s central bankers, on the other hand, have increased China’s M2 to almost 70 trillion yuan, or $10.5 trillion. As Mr Kroeber points out, China has a greater quantity of money circulating in an economy a third of the size. Who is calling whom easy?

Tentando entender a politica externa brasileira (e nao conseguindo)...

Li, e peço que leiam, a nota seguinte:

Ministério das Relações Exteriores
Assessoria de Imprensa do Gabinete
Nota à Imprensa nº 682
23 de novembro de 2010

Tensão na Península Coreana
O Governo brasileiro tomou conhecimento, com preocupação, dos incidentes ocorridos na ilha de Yeonpyeong, entre a República da Coréia e a República Popular Democrática da Coréia, dos quais resultaram vítimas fatais sul-coreanas.
Ao solidarizar-se com as famílias das vítimas, o Governo brasileiro conclama ambas as Partes a absterem-se de medidas que possam agravar ainda mais a tensão na Península Coreana e a buscarem uma solução negociada, com participação das Nações Unidas.


Ao que tudo indica, quem bombardeou a ilha sul-coreana foi a artilharia norte-coreana. A nota passa por cima desse fato, como se os obuses tivessem vindo de "alienígenas" ou terceiras partes. A nota ainda pretende que os sul-coreanos abstenham-se de tomar qualquer medida de defesa nacional?
Ainda estou tentando entender...

OI Movel: passe longe dessa companhia vagabunda

A OI tem um excelente serviço "policial", ou de investigações "criminosas", mas é uma péssima companhia telefônica, ou uma companhia de crédito desqualificada.

Estou no Brasil há três dias, depois de oito meses no exterior. Pois acabo de receber um telefonema em meu celular de Brasília, que pertence a outra companhia telefônica, cobrando-me um débito de mais de 800 reais, relativo a uma compra feita no Rio Grande do Norte em dezembro de 2006.
Alguns dados correspondem: meu nome, data de nascimento e CPF, o que não é difícil de descobrir, pois o CPF vem impresso em cada talão de cheque.
Mas o endereço é de Natal, no RN, cidade e estado onde jamais estive, assim como jamais mantive qualquer tipo de relação contratual com essa companhia vagabunda, a OI, que ousa me telefonar a Brasília para cobrar um débito de origem fraudulenta.
O mais inacreditável é que essa companhia concedeu um cartão de crédito a esse suposto alter ego meu, nordestino, sem jamais exigir uma carteira de identidade, com foto, nem verificou antecedentes, endereço real, nomes de pai e mãe, etc... Asi no más, vão dando crédito a qualquer bandido que aparece (esse com o meu nome, mas não é a primeira vez, devo dizer).

Efetuei uma reclamação no SAC -- que tem um nome algo incômodo para o atendimento a não clientes -- mas se a companhia vagabunda voltar a me incomodar novamente pretendo processá-los por assédio indevido e danos morais.

Em todo caso, fica aqui o alerta: companhias vagabundas não merecem o crédito de clientes...

Paulo Roberto de Almeida

Populismo cambial e farra dos importados: Brasil tem o Guiness...

O Brasil conseguiu se distinguir num concurso econômico internacional: é o país onde as importações cresceram mais rapidamente, de todos os membros da OMC. Os exportadores -- outros países da OMC -- agradecem e pedem para continuar essa "abertura irresponsável e unilateral".
Nossos parceiros na OMC adoram todas as nossas "práticas econômicas nefandas", todo esse "populismo cambial", que "destrói a indústria nacional", "remete empregos para o exterior", cria um "desequilíbrio insustentável na balança comercial" e "compromete gravemente o saldo de transações correntes" do Balanço do Pagamentos.
Todo esse quadro é "inaceitável", só explicável num "governo antinacional", "submisso aos interesses estrangeiros", e que arrisca "comprometer nossa soberania nacional". Tudo isso é consequência do "neoliberalismo da política econômica", de uma visão "mercadista exagerada", que acredita na "ilusão de que os mercados são capazes de auto-correção", que afasta a "necessária ação do Estado na manutenção de um bom ambiente econômico interno", se necessário por algumas "medidas de proteção justificadas", em face da "deslealdade comercial" de vários parceiros externos.
"Tudo isso é inaceitável", e "não pode continuar assim".

Calma, calma, não penso nada disso. Tudo o que está entre aspas são frases, reais, pronunciadas por vários dos que nos comandam ou que nos representam atualmente, quando essas personagens estavam na oposição ao governo anterior, social-democrata, e quando eles acusavam o governo de ser antinacional e vendido aos interesses estrangeiros.
Pois bem: os atuais dirigentes estão fazendo exatamente o que foi feito anteriormente: uma abertura "irresponsável", um "populismo cambial" e outros atos perversos contra a economia nacional.
Não vejo os protestos que deveriam existir nessas circunstâncias.
Será que estou vivendo em outro país?
Paulo Roberto de Almeida

CÂMBIO DÓLAR-REAL É INSUSTENTÁVEL! IMPORTAÇÕES SOBEM 46%
O Estado de S.Paulo, 25/11/2010

1. Brasil é o país onde as importações mais cresceram desde o início do ano. Volume cresceu 46% entre dezembro de 2009 e setembro deste ano; variação é a maior entre 70 países avaliados pela OMC. A invasão de importados no Brasil bate todos os recordes. Segundo dados oficiais de 70 governos, o País está sofrendo a maior expansão de importações em 2010 entre todos os membros do G-20 e entre todas as economias do mundo que tiveram seus dados compilados pela Organização Mundial do Comércio (OMC).

2. Setembro bateu recorde em volume de importações no País. Em comparação com a média dos meses de 2006, o valor é três vezes maior. Em relação a setembro de 2009, o Brasil também tem a maior taxa de expansão, de 43%. Na China, a alta havia sido de 24%, ante 34% na Rússia.  Nenhuma das 70 economias avaliadas teve variação tão grande como a do Brasil entre dezembro de 2009 e o fim do terceiro trimestre de 2010.

3. O Brasil já aparece nas estatísticas americanas como o parceiro comercial com o qual os Estados Unidos têm o maior superávit. Com a Europa, a situação se repete. O superávit que o Brasil tinha com os europeus desde 1999 foi zerado no terceiro trimestre. O resultado contrasta com os números de 2007, quando o País havia obtido saldo positivo de 11,5 bilhões, amplamente favorável às contas nacionais.

4. Em 2010, o Brasil foi ainda a economia que teve a maior expansão de importação de produtos europeus em todo o mundo. O crescimento das vendas europeias ao Brasil foi de 54% de janeiro a agosto. Segundo os dados da OMC, China e Rússia também tiveram alta em suas importações em 2010. Mas em nenhum deles a expansão ocorreu no mesmo ritmo que a do Brasil.

Contra a politizacao dos direitos humanos...

Essa mania dos americanos de manipularem resoluções nos órgãos de direitos humanos é de fato insuportável e precisa de uma resposta ousada. Justamente como certas pessoas pensam que é o correto como postura internacional. Não se pode deixar os países politizarem questões à vontade, praticamente sozinhos. Que coisa...

Abstenção pró-Irã
Editorial Folha de S.Paulo, 25/11/2010

Ao abster-se na votação de uma resolução das Nações Unidas contra as violações dos direitos humanos no Irã, aprovada na última sexta-feira, a diplomacia do governo Lula manteve-se coerente com sua política de confrontação com os Estados Unidos.

Se os norte-americanos manobram contra moções que firam seus aliados, então os brasileiros recusam-se a votar reprimendas a adversários da grande potência, mesmo que sentenciem mulheres a morrer apedrejadas ou se envolvam em campanhas genocidas.

O Brasil deve assumir atitude altiva em suas relações com os EUA, mas já são suficientes os contenciosos com aquela nação para que se amplie desnecessariamente as frentes de conflito.

Ao justificar a abstenção na resolução sobre o Irã, o representante brasileiro queixou-se de que os direitos humanos são tratados na ONU de forma "seletiva e politizada". São termos, aliás, que definem bem a atual política do Itamaraty, em contraste com a melhor tradição brasileira.

O governo Lula condenou, por exemplo, "de forma veemente" o golpe hondurenho. Interveio nos assuntos internos, cedendo a embaixada para a volta do presidente banido e, num extremo de intransigência, ainda recusa-se a aceitar o resultado da eleição que, goste ou não, superou o impasse.

Ao mesmo tempo, evitou manifestar-se sobre os conflitos no Irã, onde divergências políticas foram - e continuam sendo - tratadas com prisões, mortes e expurgos.

No ano passado, o ditador do Sudão, Omar al Bashir, já havia dito que tinha o "apoio do presidente Lula". O Brasil se eximira de condenar o governo sudanês por sua responsabilidade na campanha de "limpeza étnica" que chegou ao auge em 2004 e custou a vida de milhares de pessoas.

Incongruências dessa espécie só servem para minar a credibilidade de nossa diplomacia.

A política externa deve ser um instrumento de defesa dos interesses econômicos do país, colocando-se a favor da resolução negociada e pacífica de conflitos e de princípios como direitos humanos e autodeterminação.

No caso do Irã, não havia laços comerciais relevantes a atenuar a abstenção - que, dado o histórico recente, ganhou sabor de um renovado apoio ao governo de Mahmoud Ahmadinejad.
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Addendum (para destacar um comentário e minha resposta):
felipe disse...
Olá PRA, Afinal, o que você acha que tem mais efeito prático ? As sanções impostas pela ONU, ou o meio do diálogo, que o Brasil tem colocado em pauta atualmente ? Gostaria de ouvir um pouco "a voz da experiência". Obrigado, Felipe França

Meu comentário em retorno (PRA):
Felipe,
Em primeiro lugar, uma coisa (as sanções coletivas, decididas num órgão multilateral) não se opõe à outra (o diálogo bilateral).
Em segundo lugar, o diálogo bilateral raramente traz soluções ou constitui um meio eficaz de pressão, a menos que seja numa situação de assimetria tão grande que o grande consiga fazer pressões (neste caso ilegítimas) contra o suposto pequeno, para trazer resultados tangíveis para o que se pretende.
No caso da Coréia do Norte, por exemplo, sanções multilaterais não surtem nenhum efeito. Mas a China, se desejar, pode estrangular o país em pouco mais de uma semana. O mesmo não se aplicaria ao Irã, que depende muito pouco de um grande vizinho e menos ainda dos órgãos multilaterais. Mas as sanções multilaterais são indispensáveis se se desejar resolver a questão pelo lado prático, independente de qualquer diálogo bilateral.
Portanto, nesse caso, a "experiência" recomendaria, sanções, primeiro, e bem fortes, depois "diálogo", seja lá o que isso significar.
Trogloditas do cenário internacional (e ainda existem vários) são dificilmente enquadráveis pela voz da razão: apenas sanções fortes (e que infelizmente prejudicam o povo do país) ou um grande porrete unilateral podem trazer resultados.
Mas, os países precisam ter coerência: não se pode deixar de sancionar o Irã e pretender sancionar Honduras, por exemplo.
As simples as that...
Paulo Roberto de Almeida

Capitalismo de compadres (onde mais poderia ser?)

Política Industrial II : JBS/Friboi, etc. e as condições privilegiadas de acesso ao  BNDES  das tais "empresas campeãs"
Mansueto de Almeida, do IPEA
25 de novembro de 2010

Hoje, o presidente do grupo JBS deu entrevista ao Estado de São Paulo e reclama do tratamento que a empresa vem recebendo do mercado e da imprensa que, entre outras coisas, faz matérias negativas sobre o grupo. O título da matéria (será que joguei pedra na cruz?) mostra a indignação do executivo com as matérias da imprensa e com o comportamento dos investidores privados que penalizam o valor de mercado do  JBS (valor de mercado despencou em mais de 30% este ano e está abaixo do valor patrimonial), que seria uma das companhias brasileiras mais bem sucedida aqui e lá fora.

Já falei sobre esse assunto várias vezes, mas como já está em gestação no BNDES a mais nova versão da política industrial, a Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP) na sua segunda versão, que agora vai focar em sub-setores ou “elos das cadeias produtivas”, acho que vale a pena voltar ao assunto e, claro, o JBS sempre entra na discussão porque essa empresa em 2008, 2009 e 2010 esteva na lista dos maiores empréstimos diretos do BNDES ao setor industrial.

Em 2008, o JBS pegou R$1,1 bilhão de empréstimos com o BNDES, em 2009, mais R$ 3,5 bilhões, e mais R$ 200 milhões em 2010. Como JBS comprou o grupo Bertin, que tinha recebido R$ 2,5 bilhões de empréstimos diretos do BNDES, em 2008, e mais R$ 200 milhões em 2009, todos esses empréstimos totalizam R$ 7,5 bilhões em um prazo de três anos.

Além desses empréstimos diretos, O BNDESpar comprou participação no JBS e no grupo Bertin que hoje são a mesma empresa. De acordo com o balanço patrimonial do BNDES de junho de 2010, o BNDES possuía 17,32% do JBS; algo como R$ 3,9 bilhões (participação societária do custo de dezembro de 2009). Essa participação  coloca o JBS entre aquelas empresas nas quais o BNDESpar aposta muito dinheiro, grupo formado pela Eletrobrás (R$ 4,3 bilhões), Vale S/A (R$ 3,7 bilhões), Valepar (R$ 2,6 bilhões) e FIBRIA (R$ 2,3 bilhões) entre outras.

Assim, a relação BNDES-JBS é mais do que um simples empréstimo para o BNDES. É uma aposta de política industrial que o banco fez no grupo para que este pudesse se consolidar como um grande player no mercado de carnes global. O BNDES fez a mesma aposta com a Fibria (30,4% do capital) para o setor de celulose e com o frigorífico Marfrig, no qual o banco detém 13,9% (R$ 987 milhões) do capital.

Dito isso, seguem alguns esclarecimentos.

(1) Ganho Privado versus Ganho Social: o grupo JBS adotou a estratégia correta de crescimento do ponto de vista privado. Eu como empresário teria buscado o BNDES como parceiro e fonte de recursos. O que se questiona não é o JBS, mas sim o BNDES que nunca explicou claramente os critérios para apostar tanto em um setor no qual o Brasil já tinha uma clara vantagem comparativa. Qual o ganho social dessa aposta?  O crescimento da empresa decorreu mais do acesso ao BNDES ou do mérito dos seus administradores?

O JBS fez o jogo correto, quem teria que se explicar deveria ser o BNDES que se restringiu a falar que precisamos criar empresas globais. OK, mas por que o setor público tem que estar por trás dessa estratégia em companhias que já são competitivas? por sinal, há algumas semanas o economista Josér Roberto Mendonça Barros publicou na sua coluna no Estado de São Paulo (clique aqui)uma avaliação dos impactos do crescimento do JBS na economia brasileira.

(2) Banco de Fomento versus Operações de Socorro: Na entrevista de hoje ao jornal estado de São Paulo, o presidente do JBS deixa escapar que:

“….Sabe o que ninguém lembra? É que o Bertin tinha R$ 4 bilhões de dívida com Itaú, Bradesco, Santander, Banco do Brasil. Por que ninguém pergunta: o Bradesco te pediu para comprar? O BNDES tinha R$ 2 bilhões. O fato é que naquele momento ninguém tinha balanço para comprar o Bertin. Eu acho que ajudei o Bradesco, ajudei o Santander. Quando eu converso com o Fábio (Barbosa, do Santander), eu digo: olha, você lembra, né? Eu poderia até levar vantagem em cima disso. Mas eu nunca faria isso.”

O curioso é que este não foi o único caso. Como já cometei neste blog sobre matéria de outubro na revista Piauí no caso da venda da Sadia para Perdigão:

“Nildemar Secches, antigo presidente da Perdigão e atual presidente do conselho da Brasil Foods, acha que, sem a intervenção do BNDES, teria comprado a Sadia por um preço muito mais baixo. “A Sadia não ia quebrar, quem ia quebrar eram os acionistas”, disse ele a um amigo. “Nós ficaríamos com a empresa por um preço muito menor.”

E exatamente as mesmas observações valem para o caso da venda da Aracruz celulose, que tinha como acionistas os mesmos controladores do Banco Safra,  para a Votorantim Celulose para formar a Fibria. Os empréstimos do BNDES, além de facilitar as vendas, “salvou” os empréstimos dos bancos privados (ou de seus acionistas).

Essas operações nunca foram devidamente explicadas. De qualquer forma, aqui e acolá acaba-se descobrindo que os bancos privados também foram favorecidos pela posição mais ativa que o BNDES adotou desde a crise do final de 2008.

As dúvidas do mercado não são se este ou aquele empresário “atirou pedra na cruz”, mas sim do que estar por trás do crescimento de várias empresas brasileiras, se uma maior facilidade de acesso a recursos públicos ou a competência excepcional dos seus administradores. Como ninguém se dá o trabalho de explicar a “real política industrial”, fica-se com a impressão que nossas grandes empresas crescem rápido devido a condições excepcionais de acesso a recursos do BNDES

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

IBRI-RBPI: Seminario sobre a insercao internacional do Brasil na UnB (6/12/2010)

O Instituto Brasileiro de Relações Internacionais – IBRI e o Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais da Universidade de Brasília convidam para o Seminário “A inserção global do Brasil: um Balanço da Política Externa na era Lula”, por ocasião do lançamento da edição especial da Revista Brasileira de Política Internacional – RBPI, Emerging Brazil under Lula: an assessment on International Relations (2003-2010). No seminário se fará uma avaliação geral da ação internacional do Brasil ao longo dos últimos anos – as suas linhas de força, as suas grandes ambições, as metas realizadas e os projetos frustrados.
O evento terá lugar no Auditório Joaquim Nabuco do prédio da FACE, no Campus Universitário Darcy Ribeiro, Universidade de Brasília, Asa Norte, no dia 6 de dezembro de 2010, a partir das 9h30min. Informações adicionais podem ser obtidas pelo telefone (61) 31070756. Inscrições, gratuitas, podem ser realizadas aqui e será emitido certificado de participação.

Programa

09h30min – 10h – Mesa de Abertura
  • Eiiti Sato, diretor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB;
  • José Flávio Sombra Saraiva, professor titular de Relações Internacionais da Universidade de Brasília e coordenador do Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais da UnB;
  • Amado Luiz Cervo, professor emérito da Universidade de Brasília –  UnB;
  • Antônio Carlos Lessa, professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB e editor da Revista Brasileira de Política Internacional – RBPI.
10h – 10h40 min – Mesa 1 – O Brasil e o mundo – uma visão geral
  • Moderador: Tânia Maria Pechir Manzur, professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB.
  • A ascensão do Brasil no cenário internacional: o Brasil e o mundo – Amado Luiz Cervo, professor emérito da Universidade de Brasília –  UnB e co-organizador da edição especial Emerging Brazil under Lula: an assessment on International Relations (2003-2010).
10h45 min – 12h10min – Mesa 2 – Um perfil internacional em transformação: meio-ambiente e segurança internacional
  • Moderador: Pio Penna Filho, professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB
  • Quando países emergentes reformam a governança global das mudanças climáticas: o Brasil sob Lula – Ana Flávia Granja e Barros Platiau, professora do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB
  • Questões de segurança no governo Lula: da perspectiva reativa para a afirmativa – Rafael Duarte Villa, professor do Departamento de Ciência Política da Universidade de São Paulo – USP
14h – 16h – Mesa 3 – O sistema de relações bilaterais: inflexões, continuidades e renovações
  • Moderador: Danielly Silva Ramos, professora do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB
  • Um novo diálogo estratégico: As relações Brasil-Estados Unidos na Presidência Lula (2003-2010) – Cristina Soreanu Pecequilo, professora do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal de São Paulo – Unifesp
  • Política externa brasileira para a América do Sul durante o governo Lula: entre América do Sul e Mercosul – Míriam Gomes Saraiva, professora do Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ
  • A Nova África e o Brasil na era Lula: o renascimento da política atlântica brasileira – José Flávio Sombra Saraiva, professor titular de Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB
16h – Debate
16h30min – Encerramento – Lançamento da edição especial da Revista Brasileira de Política Internacional – RBPI, Emerging Brazil under Lula: an assessment on International Relations (2003-2010), pelos seus organizadores
  • Amado Luiz Cervo, professor emérito da Universidade de Brasília –  UnB;
  • Antônio Carlos Lessa, professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB e editor da Revista Brasileira de Política Internacional – RBPI.

Comercio Exterior: o Brasil as vesperas de adotar as solucoes erradas

Leiam a matéria abaixo da Agência Brasil, que traduz a preocupação dos setores industriais, majoritariamente concentrados na FIESP, mas igualmente representados na CNI, com a chamada "desindustrialização" da economia brasileira e a alegada "commoditização" da pauta de exportações.
As importações crescem continuamente -- obviamente, pois os produtos externos são baratos e produzir no Brasil é um ato heróico, ou de loucura microeconômica -- e o desequilíbrio vai se refletir, em algum momento, nas preocupações dos chamados investidores internacionais -- que alguns chamam de especuladores -- com a sustentabilidade das transações correntes e a manutenção das atuais regras do jogo. Em função disso, pode começar uma saída de capitais que precipitará uma crise.
Para evitar esse quadro, o governo que entrar em janeiro de 2011, vai tentar ser mais "ativista", mas ele o fará, provavelmente, no pior sentido da expressão: adotando os remédios errados, que vão paliar temporariamente a situação, mas que vão se refletir mais adiante, numa situação insustentável no plano cambial e fiscal, e que se traduzirá em menor bem estar para a população, pois que refletida em maior desemprego setorial e menor crescimento da renda.
Em lugar de atacar os problemas reais -- que são o custo Brasil, refletido na tributação excessivamente excessiva, se me permitem a redundância, e o desequilíbrio das contas públicas, que se refletem nos juros altos -- o governo vai fazer aquilo que querem os empresários (que são aqueles que o financiam): vai atuar sobre o câmbio, para desvalorizá-lo, e sobre os juros, para baixá-los, ambos politicamente.
Isso sem falar que vem aí nova rodada de protecionismo explícito: novas tarifas, novas salvaguardas, novos antidumpings, que só refletem o desespero de industriais e burocratas governamentais (supostamente legitimados pela concorrência desleal do exterior).
A única concorrência desleal que existe no Brasil é da carga tributária extorsiva, que simplesmente torna poucos competitivos os produtos manufaturados brasileiros nos mercados internacionais. O paliativo de subsídios e incentivos fiscais é a outra falsa solução, de caráter setorial, que o governo vai oferecer, introduzindo novas distorções num cenário produtivo já suficientemente confuso e caótico.
Ou seja, o Brasil vai adotar as soluções erradas para os problemas percebidos.
Posso apostar que, com exceção da politização dos juros -- pois o Banco Central vai resistir a isso -- todos os demais pecados serão cometidos pelo governo brasileiro que tomar posse em 1. de janeiro.
Poderia até apostar se tivesse dinheiro, mas vou preferir investir o que tenho em bons livros...
Paulo Roberto de Almeida

Importações continuam crescendo acima das exportações, aponta Fiesp
Alex Rodrigues
Agência Brasil, 18/11/2010

São Paulo - O consumo interno de produtos importados continua crescendo em um ritmo acima das exportações brasileiras. Segundo cálculos da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), entre julho e setembro deste ano, os importados atenderam a 22,7% do consumo interno, ante os 20,7% calculados no segundo trimestre. Esse é o maior valor registrado desde 2003, quando a entidade começou a calcular o coeficiente de importação trimestral, mas analistas da federação acreditam que desde a década de 1990 os importados não obtêm uma participação tão expressiva.
As exportações brasileiras no período também aumentaram, atingindo um resultado (19,2%) próximo aos registrados nos dois últimos trimestres de 2008 (antes da última crise econômica mundial, no fim de 2008), em torno de 20%. Apesar disso, a diferença entre a participação dos produtos importados e as exportações se ampliou.
Desde o terceiro trimestre de 2009, quando o coeficiente de importações e o de exportações calculado pela Fiesp era praticamente o mesmo (respectivamente 18,1% e 18,2%), o consumo de produtos estrangeiros aumentou 4,6 pontos percentuais. Já as exportações, após diminuírem nos últimos três meses de 2009 e praticamente estagnarem durante o primeiro semestre de 2010, fecharam o último período com uma alta de apenas 1 ponto percentual. Ou seja, entre julho de 2009 e o fim de setembro deste ano, a participação dos importados cresceu mais de quatro vezes acima das exportações brasileiras.
Segundo o diretor titular do Departamento de Relações Internacionais e Comércio Exterior da Fiesp, Roberto Giannetti da Fonseca, a tendência é que o volume de importados continue aumentando enquanto a atual taxa de câmbio for mantida e o real permanecer valorizado ante o dólar. Essa situação cambial, segundo o economista, também faz com que os empresários brasileiros prefiram importar bens e produtos do que fabricá-los aqui, causando um desequilíbrio nas contas internas e levando ao fechamento de postos de trabalho devido à falta de investimento na produção.
"Não podemos aceitar que o país assista passivamente ao declínio das nossas exportações de produtos manufaturados", disse Giannetti, para quem o dólar a R$ 2 seria um bom valor de equilíbrio. Ele também destacou que, hoje, a lista de produtos exportados pelo Brasil se constitui basicamente de commodities, bens primários como minérios e grãos de baixo valor agregado.
No terceiro trimestre de 2010, os setores exportadores com melhor desempenho foram os de alimentos e bebidas e de automóveis, caminhões e ônibus. Já o aumento das importações, muito mais generalizado, foi motivado principalmente pelo setor de máquinas e equipamentos industriais e comerciais, mas também no de produtos químicos, refino de petróleo e automóveis, caminhões e ônibus.
Para demonstrar o fenômeno que classifica como a "primarização da pauta exportadora", o economista aponta para o fato de que, dos dez produtos brasileiros mais vendidos no exterior entre janeiro e setembro deste ano, apenas um (automóveis de passageiros) é manufaturado, ao passo que, no mesmo período de 2006, a mesma lista continha quatro manufaturados contra seis produtos primários. Além do mais, Giannetti também critica a concentração das exportações em poucos produtos primários, já que, atualmente, apenas quatro itens (minério de ferro; óleo bruto de petróleo; soja e açúcar de cana) respondem por um terço das vendas internacionais. Em 2006 era preciso somar todos os dez itens mais vendidos para chegar a um terço das exportações brasileiras.
Para Giannetti, os resultados divulgados hoje (18), em São Paulo (SP), atestam o que a Fiesp vem alertando há tempos: está em curso um processo de desindustrialização e o governo, segundo ele, vem adotando medidas inócuas, com base no argumento de que a balança comercial é avitária, o que, de acordo com o economista, só tem sido possível graças à exportação das commodities, sobretudo para a China. Além disso, Giannetti também afirma que, com a queda das exportações, a produção industrial brasileira tem crescido graças ao aumento da renda nacional e do crédito, fatores que, segundo ele, não irá se sustentar.
"Podemos estar batendo às portas de uma recessão já em 2012", diz o economista. "Temos que tomar uma vacina tríplice, mexendo no câmbio, devolvendo todos os créditos tributários nas mãos de exportadores e desonerando os investimentos em logística, além de melhorar a gestão da política de comércio exterior", afirmou.