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sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Eleicoes 2014: menu economico a la marinara, ou o sabor do desconhecido

Caro leitor: o Brasil sempre descobre depois que respostas simples a problemas complexos sempre estã equivocadas e invariavelmente costumam dar errado. Parece que esta vai ser mais uma oportunidade para provar o acertado desta tese universal. Pena que o Brasil ainda não aprendeu...
Paulo Roberto de Almeida 

Eleições 2014

O que esperar da equipe econômica de Marina Silva

Candidata prevê aumento de gastos com a saúde e a educação, ao mesmo tempo em que prega o ajuste fiscal e a manutenção do tripé. Como fazer a mágica? Ao que parece, nem ela sabe

Luís Lima e Talita Fernandes
Veja.com, 28/08/2014
Para Marina, formação de equipe está condicionada ao programa de governo, que será apresentado nesta sexta-feira
Para Marina, formação de equipe está condicionada ao programa de governo, que será apresentado nesta sexta-feira(Felipe Cotrim/VEJA.com)
Reduzir gastos do governo, dar início à reforma tributária, zelar pela autonomia do Banco Central (BC) e manter o tripé macroeconômico (composto pelo sistema de metas de inflação, câmbio flutuante e rigor fiscal) são algumas das tarefas que devem ser executadas com urgência pela equipe econômica do próximo governante do Brasil, caso tenha a intenção de recuperar o crescimento e a credibilidade do país. O mercado acredita que o candidato tucano Aécio Neves não deve ter dificuldades em empreender medidas necessárias, dado seu DNA político e a presença do ex-presidente do BC Armínio Fraga em seu governo. No caso da presidente Dilma, o sentimento é de que uma política de ajustes aconteça de forma mais lenta e frouxa. Já Marina Silva, que despontou rapidamente na corrida presidencial, é a candidata que suscita mais dúvidas nesse aspecto. Seu compromisso com a ortodoxia agrada o mercado. Porém, a falta de um time econômico que valide seu discurso provoca desconfiança. A pouco mais de um mês do primeiro turno, o coordenador da campanha de Marina, Walter Feldman, afirmou ao site de VEJA que não há perspectivas de divulgação de nomes nos próximos dias. “Ainda não há, na cabeça da candidata, esse tipo de discussão”, afirmou. Segundo o peessebista, a prioridade ainda é debater o programa de governo. "É um momento para o eleitorado conhecer os candidatos, que serão os protagonistas maiores do novo papel que o Brasil pode ter. Apresentar a equipe é um modelo de ação. Mas nossa prioridade é debater o programa", afirma. O programa de governo do PSB será apresentado na tarde desta sexta-feira em São Paulo. 
Sabe-se que há dois economistas de peso assessorando oficialmente a candidata: o acadêmico Eduardo Giannetti da Fonseca e o ex-presidente do BNDES André Lara Resende, que também foi um dos principais assessores econômicos do presidente Fernando Henrique Cardoso. Alexandre Rands, sócio da consultoria Datamétrica e um dos membros da equipe que montou o programa da ex-senadora, considera que Giannetti passou a ter mais influência na campanha após a morte de Eduardo Campos. “Como Eduardo tinha experiência em gestão pública, acabava ouvindo mais pessoas e não relegava sua avaliação a apenas uma opinião. Suas ideias eram mais diluídas. Como Giannetti é mais próximo de Marina, que não é economista, sua figura sai fortalecida", afirma. Contudo, Giannetti já afirmou, em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, que não vai integrar a equipe de um eventual governo de Marina. Lara, por sua vez, tem circulado nos bastidores da campanha, sem assumir qualquer responsabilidade como porta-voz econômico. 
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Outros nomes, como Marcos Lisboa, vice-presidente do Insper, Bernard Appy, ex-secretário executivo do Ministério da Fazenda, Eduardo Loyo, ex-diretor do BC e Tiago Cavalcanti, professor de Cambridge, são apontados como consultores, mas negam ter vínculo direto com a campanha. Eles colaboraram com artigos e discussões em oficinas temáticas realizadas por Eduardo Campos e Marina em todas as regiões do Brasil, que ajudaram na composição do programa de governo. Neca Setúbal, uma das pessoas mais próximas de Marina atualmente, afirmou ao site de VEJA que a candidata já possui uma equipe gabaritada que dá respaldo ao seu projeto político, o que, segundo ela, é suficiente para o momento. "Não há necessidade em já apresentar ao mercado uma lista de futuros ministros", afirmou Neca, que é uma das herdeiras do Itaú.
O anúncio de um time concreto de economistas, tal como fez Aécio Neves, poderia dissipar grande parte das dúvidas que pairam sobre o discurso econômico da candidata. A necessidade se faz ainda mais presente porque Marina não é economista — e faz questão de criticar o comportamento de 'gerente' de certos governantes. É considerada uma liderança política, não técnica. Situação que colocaria em maior evidência, caso vença as eleições, a figura de seu ministro da Fazenda. “Nesse sentido, Marina se aproxima mais de Lula do que de Dilma e Aécio. Isso aumenta a responsabilidade de sua equipe, que terá um papel fundamental, pois gestores de perfil mais político tendem a delegar mais e interferir menos em temas econômicos”, explicou Bernard Appy, cujo mandato no Ministério da Fazenda ocorreu durante o governo Lula. 
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Segundo economistas ouvidos pelo site de VEJA, o que é possível inferir até o momento, tendo em conta o perfil de Giannetti e declarações recentes da candidata, é que um governo de Marina teria características liberais, com menos intervenção no câmbio e nos preços administrados, como no caso da gasolina e energia. Seu discurso sinaliza ainda uma preocupação com a política fiscal. “Uma defesa clara da Marina é o combate ao inchaço do Estado, que beneficia grupos privados específicos”, afirma Zeina Latif, sócia da Gibraltar Consulting. Para Otto Nogami, professor do Insper, as bandeiras econômicas de Marina guardam bastante semelhança com o programa do PSDB. "Agora, já é hora de a Marina sinalizar, de forma clara e detalhada, como irá fazer para atingir esses fins", destaca.
Contudo, alguns dados de seu discurso exalam ambiguidade. Marina afirmou que uma de suas prioridades é aumentar de 6,9% para 10% do Orçamento da União a verba para a saúde pública. Segundo cálculos do economista Raul Velloso, tal mudança teria grande impacto fiscal. Especialista em contas públicas, Velloso afirma que, se tal elevação tivesse sido feita em 2013, por exemplo, os gastos extras com a saúde representariam nada menos que 29 bilhões de reais, ou 32% do superávit primário daquele ano. Para um governo que prega o rigor fiscal, tal postura acentua as incertezas. A escola em período integral, bandeira levantada por Campos e endossada por Marina, também precisará ser financiada com verba federal. Para tanto, o PSB afirma que não aumentará o orçamento da educação. Mas tampouco apresentou uma saída fiscal para acomodar tal gasto. Já o passe livre para estudantes, outro ponto defendido por Marina, exigirá desembolsos de 12 bilhões de reais ao ano do governo, segundo previsões do próprio partido. 
Junto com tais medidas, Marina promete criar um conselho fiscal sem vínculo com o governo para acompanhar e avaliar a qualidade dos gastos públicos. Na teoria, o plano é perfeito. Mas como empreender cortes para resolver a situação fiscal e, além disso, aumentar gastos em determinadas áreas? O caminho das pedras, dizem assessores da campanha, será apresentado nesta sexta-feira. Mas é fato que sem cortes de gastos profundos e apoio do Congresso, tais projetos tendem a permanecer no papel. "Se Marina quiser os melhores, tem de estar preparada para contar com o apoio de pessoas que hoje estão com Aécio”, afirma Sérgio Lazzarini, professor do Insper. Neste aspecto, Armínio Fraga, escolhido por Aécio, disse em entrevista a VEJA que não aceitará mudar de lado se seu candidato não for eleito.
Para se aproximar de setores da economia mais reticentes à candidatura da ex-senadora, a equipe de Marina tem recorrido a lideranças empresariais. Os coordenadores da campanha têm se dividido de acordo com os meios onde têm mais afinidade. Um deles é João Paulo Capobianco, que orbita o círculo do agronegócio, segmento onde a candidata tem alta rejeição. A intenção é acelerar o ritmo de integração da equipe de Marina à agenda que havia sido estabelecida por Campos para o setor. Nesta sexta-feira, será oferecido, em São Paulo, um jantar para a ex-senadora na casa de Plínio Nastari, presidente da Datagro, consultoria de açúcar e etanol. A agenda tem sido acompanhada também por Beto Albuquerque, o novo vice da chapa do PSB, que transita com facilidade entre os donos de terra. Dialogar com o agronegócio não será tarefa fácil. Se Marina conseguir converter o diálogo em apoio político, será um bom indício de traquejo — faceta até então pouco conhecida da candidata. 

Eleicoes 2014: Brasil, um pais enrolado pelo fervor mistico - Reinaldo Azevedo

Ao que tudo indica, o Brasil está no limiar de se envolver numa aventura ecoteologica sem pé nem cabeça. Pior: sem qualquer racionalidade instrumental.
Os eleitores perderam a razão...
Paulo Roberto de Almeida 

Marina Silva acaba de conceder a sua entrevista ao Jornal Nacional. Quem presta atenção ao sentido das palavras percebeu o tamanho do desastre. Os entrevistadores quiseram saber o óbvio: como se justifica o discurso da “nova política” quando a rede de empresas fantasmas e laranjas que envolve o avião em que viajavam Eduardo Campos e ela própria é a evidência escancarada da velha política? A candidata, é claro, não conseguiu achar uma resposta porque resposta não há. 
Em nenhum momento, revejam a entrevista depois no site do Jornal Nacional, ela admitiu que crimes óbvios foram cometidos. Mais do que isso: tentou desqualificar, ainda que com aquele seu jeitinho simples, de apelo telúrico, o trabalho da imprensa. Segundo disse, a verdade não virá das reportagens, mas da investigação da Polícia Federal. Como assim? Imprensa, de fato, não é a última instância na apuração de crimes. Nesse caso, no entanto, ela já chegou mais longe do que a polícia. As empresas fantasmas e seus laranjas vieram à luz. Como explicar? Pior ainda: com um discurso oblíquo, Marina sugeriu que a apuração da verdade pode ser um desrespeito à memória de Eduardo Campos.
Até aí, Marina estava na fase da enrolação, mas ainda não havia atingido o patético. William Bonner lembrou que ela e seu  vice, Beto Albuquerque, divergiram sobre algumas questões essenciais, como as culturas transgênicas e a pesquisa com células tronco embrionárias. Como posições inconciliáveis se juntam numa chapa? Isso é “nova política”? Marina, então, se saiu com a cascata de que o jornalista se fixava apenas nas divergências, não nas convergências… É mesmo?
A contradição óbvia estava no ar. Então, quando os adversários da candidata fazem composições entre divergentes, estamos diante da evidência da “velha política”; quando é ela própria a fazê-lo, aí se tem a prova da “nova política”? O que Marina respondeu? Que os jornalistas estavam equivocados. Por que estavam? Ela não disse. Nem tinha o que dizer.
Patrícia Poeta lembrou que, em 2010, Marina ficou em terceiro lugar na eleição em seu Estado, o Acre, que a conhece bem. Mais uma vez, a candidata tentou acusar a ignorância dos jornalistas: “Talvez você não conheça direito a minha trajetória…” Ora, quem não sabe? A agora candidata do PSB saiu-se com uma frase feita: “Ninguém é profeta em sua própria terra…” Ah, entendi: ela é profeta no resto do Brasil, menos no Acre. Listou os interesses que teve de contrariar e coisa e tal. Chegou a sugerir que enfrentou a máquina do governo do Acre. Aí estamos no terreno da piada. Ela participa, por meio de aliados, do governo do Estado desde 1999. É parceira dos Irmãos Viana. Seu marido era secretário de estado até a semana passada.
Na mensagem final, Marina pediu votos e disse que não é do tipo de política que faz a luta do poder pelo poder… Certo! Isso é para os outros. A entrevista terminou, e ficou claro que a tal “nova política” só é explicável com o auxílio da velha enrolação.
TransgênicosQuem não conhece o assunto não se deu conta do tamanho de uma das besteiras que disse. Afirmou que nunca foi contra os transgênicos (o que é falso, mas vá lá), mas que defendia que houvesse áreas livres dessa modalidade de cultura, numa coexistência entre os dois modelos. Felizmente, perdeu a batalha.
Qual é o objetivo dos transgênicos? Aumentar a produção com sementes que já são imunes a determinadas pragas. Ora, imaginem o que aconteceria se, em certas áreas, os transgênicos fossem proibidos e, em outras, permitidos. O resultado óbvio: as terras sujeitas a veto teriam de receber doses cavalares de agrotóxico. Mais: ainda que a proibição atingisse apenas uma parte das terras férteis, é claro que o Brasil não exibiria o robusto desempenho que exibe na agricultura.
Mas eis Marina. Ela se tornou especialista em assuntos sobre os quais ninguém – nem ela própria – entende nada.
Em tempos normais, a entrevista poderia ser devastadora pra ela. Nestes dias… Estamos voando no escuro. A gente sabe em que isso costuma resultar.
Texto publicado originalmente às 21h47 desta quarta

Bobagens petistas na politica externa - Editorial Estadao

O PT fora da conta
Editorial O Estado de S. Paulo, 28/08/2014

O governo terá de renegar as maiores bobagens da diplomacia petista, se quiser seguir a proposta do ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Mauro Borges: fortalecer a relação comercial com parceiros estratégicos, como Estados Unidos, Europa e China. E terá de renegar a incompetência na gestão de projetos de infraestrutura e o populismo na política educacional.
Em princípio, o ministro está certo. É preciso rever as relações comerciais com os principais parceiros e tratar com maior seriedade a palavra estratégia. Os Estados Unidos foram neste ano, até julho, o maior importador de manufaturados brasileiros. Em outros anos, têm ficado em segundo lugar, logo abaixo da Argentina, mas sua política tem sido sempre mais confiável e previsível, sem as barreiras de ocasião e os truques inventados seguidamente na Casa Rosada.
Mas a diplomacia brasileira, sob o terceiro-mundismo instalado no Planalto em 2003, menosprezou a relação com os mercados mais desenvolvidos e definiu como grande objetivo redesenhar o mapa da economia mundial juntamente com novos parceiros ditos estratégicos. Esses parceiros até estavam dispostos a mexer no mapa, mas para cumprir seus objetivos nacionais, sem levar em conta as fantasias do presidente Lula e de seus conselheiros.
O presidente brasileiro, aliado ao colega argentino Néstor Kirchner, manobrou para liquidar o projeto da Área de Livre-Comércio das Américas (Alca). A diplomacia brasileira voltou-se, então, para alianças com países emergentes e em desenvolvimento. Aceitou o protecionismo argentino e acomodou-se em posição defensiva em relação ao mundo rico. Por sua vez, a negociação do acordo de livre-comércio com a União Europeia, iniciada nos anos 90, está emperrada até hoje. Negociar com ricos, só na Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC). Mas essa rodada também emperrou e continua paralisada.
Nesse período, a China converteu-se na maior parceira comercial do Brasil, no papel de maior importadora de matérias-primas. Em rápido crescimento, a China compraria produtos básicos de quaisquer fornecedores, mas o governo brasileiro parece ter sido incapaz de perceber esse fato.
Em sua ânsia para mudar a geopolítica mundial, a diplomacia petista aceitou uma relação semicolonial com a China. Neste ano, até julho, só 3,17% das exportações brasileiras para a China foram de manufaturados e 12,13%, de industrializados. De lá para o Brasil vieram quase só manufaturados. Não foi muito diferente o comércio com outros grandes países emergentes: 11,80% de manufaturados nas vendas para a Índia e 44,31% de industrializados. Para a Rússia, as proporções foram de 7,17% e 20,65%.
O comércio com os velhos imperialistas foi diferente. Manufaturados compuseram 49,96% das exportações para os Estados Unidos. Somados os semimanufaturados, a indústria exportou para lá 69,49% do valor total. Além disso, as vendas para o mercado americano foram 13,5% maiores que as de um ano antes, enquanto as exportações totais foram 0,6% menores. Para a Argentina, o Brasil exportou 22,1% menos que em 2013 - efeito combinado da crise no vizinho e de seu protecionismo. Para a União Europeia, 47,57% das vendas foram de industrializados (33,82% de manufaturados).
Acordos comerciais teriam facilitado o acesso da indústria aos EUA e à Europa, mas isso ficou fora da estratégia petista. Também o investimento - que dinamizaria o setor, aumentando sua competitividade - emperrou nos últimos 12 anos, em parte por mera inépcia administrativa, em parte pela demora do governo em aceitar parcerias com o setor privado.
Quanto à educação - que, como reconhece o ministro, é muito importante para a competitividade e para a inovação -, foi prejudicada pela política populista de apoio ao ingresso no ensino superior. Os níveis básico e médio foram negligenciados e só há pouco o governo descobriu o ensino técnico.
O ministro mencionou insuficiência de ações nos últimos 30 anos. Mas o PT está há 12 no poder. Isso fica fora da conta?

Eleicoes 2014: Arminio Fraga desmantela mentiras lulo-petistas

ELEIÇÕES 2014
 Mitos do PT 
Arminio Fraga
Folha de S. Paulo, 28/08/2014

Arminio Fraga Neto, 57, economista, foi presidente do Banco Central (governo Fernando Henrique). É assessor do candidato à Presidência da República pelo PSDB, senador Aécio Neves (MG)

Populismo e mentira são inimigos da democracia. É preciso melhorar a qualidade do debate público, que deve ser baseado em fatos e dados.
Não é de hoje que o PT adota uma retórica agressiva e populista para marcar suas posições. Em tempos de campanha, esta prática se radicaliza, adquirindo tons cada vez mais berrantes, e chegando frequentemente a se desentender com os fatos. Abaixo alguns exemplos.
O primeiro mito, mencionado em entrevista na televisão pela própria presidente Dilma, é que a culpa do baixo crescimento é da economia internacional. Não é verdade. Nos governos FHC e Lula, o Brasil cresceu a taxas médias muito próximas das da América Latina. Para os anos Dilma, o crescimento projetado está 2% ao ano inferior ao da região, o que demonstra que não foi problema externo, foi interno mesmo.
O segundo diz que "basta estimular a demanda e o resto se resolve". Não tem sido bem assim. Falta investimento, vítima de preconceitos ideológicos e má gestão. A produção e a importação de bens de capital afundaram nos últimos meses. A infraestrutura virou uma barreira ao crescimento. O investimento está flutuando em torno de 18% do PIB há anos, valor insuficiente para acelerar o ritmo de crescimento. É preciso elevar esse porcentual a 24% até 2018, que é a nossa meta.
O terceiro é que os problemas da indústria serão resolvidos com medidas pontuais. Na verdade, a indústria nunca esteve tão mal. As taxas de juros estão para cima e o câmbio para baixo. O complexo sistema tributário é custoso e cumulativo, prejudicando as exportações e o investimento. A logística não está à altura das necessidades do país.
O quarto é o "querem fazer um arrocho", em resposta à posição honesta de que (para voltar a crescer) o país necessita corrigir muitas de suas políticas. A verdade é que a economia está devagar quase parando, amarrada por uma enorme e crescente incerteza sobre seu futuro. As perspectivas para o ano que vem são sombrias, como mostram todos os indicadores de confiança disponíveis. O arrocho, com dispensas e suspensões de contrato de trabalho, já chegou, vamos cair na real.
O quinto é o estridente "vão fazer um tarifaço". Aqui cabe perguntar, antes de mais nada, que situação é essa e como chegamos nela. Falo do irresponsável represamento dos preços de combustíveis e de energia, e da taxa de câmbio. No campo dos combustíveis, sofre a Petrobras asfixiada em seu fluxo de caixa, sofre o setor de etanol, onde as falências crescem, e sofre o meio ambiente, com o absurdo subsídio implícito a combustíveis fósseis. No setor elétrico, um movimento voluntarista de redução de tarifas saiu pela culatra, e vem gerando uma dívida bilionária com as distribuidoras de energia. Por último, a repressão da taxa de câmbio desestimula as exportações e pressiona ainda mais o deficit em conta corrente, hoje em 3,5% do PIB.
Em sexto lugar, há a acusação de que "o governo FHC sempre cortou o gasto social". Acusação falsa, como demonstra Samuel Pessôa em artigo recente nesta Folha. Medido como a soma de INSS, Lei Orgânica da Assistência Social, abono salarial, seguro-desemprego e bolsas, o gasto social cresceu cerca de 1,5 ponto do PIB em cada um dos governos Itamar/Collor, FHC, Lula e Dilma (esta em cerca de 1 ponto até agora). Na verdade, o governo FHC representou uma guinada no foco do gasto público na direção da educação e da saúde, ponto nunca reconhecido pelo PT.
Finalmente, o governo diz que "quebraram o país e nós pagamos o FMI". Em 2002, o Brasil quase quebrou, sim, em função do medo do que faria o PT no poder (e que Lula resolveu, para seu eterno mérito). No segundo semestre de 2002 o governo FHC (com anuência da oposição) tomou um empréstimo com o FMI de US$ 30 bilhões. Cerca de 80% do empréstimo foram reservados para o próximo governo, sendo 20% desembolsados (e não gastos) em dezembro de 2002 e o restante já durante o governo Lula. Portanto os recursos ficaram, na prática, à disposição do governo Lula.
O populismo e a mentira são inimigos da democracia e da boa política. Temos que melhorar a qualidade do debate público, que deve ser baseado em fatos e dados.

O Estado de S. Paulo - Arminio diz que sua ‘nomeação’ reduz ‘nível de incerteza’ / Entrevista

Arminio Fraga, ex-presidente do Banco Central no governo Fernando Henrique

Ex-presidente do Banco Central de FHC, ele foi citado por Aécio como futuro ministro da Fazenda em caso devitória tucana.

Débora Bergamasco

Enquanto a candidata Marina Silva (PSB) gera dúvidas sobre a condição de sua eventual política econômica, o concorrente ao Planalto do PSDB, Aécio Neves, anunciou na noite de anteontem que, se eleito, o economista Arminio Fraga será seu ministro da Fazenda. A ideia é se diferenciar da adversária e passar um clima de previsibilidade ao mercado. O ex-presidente do Banco Central falou ontem ao Estado e reafirmou sua política ortodoxa – no início do ano, chegou a dizer que o salário mínimo do Brasil havia subido demais. Nesta entrevista, disse que a responsabilidade fiscal é compromisso dos tucanos para reduzir “o nível de incerteza” no País.

O que haverá no seu ministério da Fazenda que não existe na pasta atualmente?
Um compromisso firme com a Lei de Responsabilidade Fiscal. Essa foi uma grande conquista que não aconteceu da noite para o dia, mas que foi cristalizada na Lei de Responsabilidade Fiscal. Com certeza, nós estamos assumindo o compromisso de ter metas bem definidas, calculadas de maneira transparente, sem uso de artifícios ou de despesas não recorrentes. De forma que isso dê tranquilidade para que as pessoas aqui no Brasil reduzam o nível de incerteza e que isso ajude a construir as condições para termos no País uma taxa de juros mais normal e para valer, de maneira sustentável, não voluntarista. Isso contribuiria muito para fazer essa economia funcionar melhor. O tema da transparência também é muito importante. Precisamos ter o orçamento que seja um só. Que não tenhamos orçamentos espalhados por outras áreas de governo, como em bancos públicos. Que ele seja computado de uma forma que cumpra com seu papel político e democrático. Ser um fórum – e apenas um – de discussão da sociedade, sobre o que fazer com os recursos. Isso dá a eficiência do ponto de vista econômico e dá também uma melhor governança para o País.

Com o que o senhor se compromete, o que não terá no seu ministério?
Falta de transparência, criatividade contábil, decisões que propõem muito peso no curto prazo em detrimento do bem maior a médio e longo prazo. Um exemplo que vem acontecendo é desenhar os leilões de concessões de uma forma para maximizar receita em vez de ter uma visão mais completa de longo prazo. É preciso observar a eficiência do preço na economia como um todo e, obviamente, também em relação ao que é bom para o consumidor.

Há uma crítica de que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, não teria autonomia suficiente para conduzir a pasta por causa da ascendência da presidente Dilma Rousseff sobre o ministério. Em um eventual governo Aécio o senhor, como ministro, teria mais liberdade para trabalhar?
Todos os ministros se reportam ao presidente, trabalhando com aquilo que ele determinar. No dia a dia da gestão do ministério haveria, sim, independência, mas muitas das decisões são de natureza política. É evidente que o presidente definiria quais seriam as metas, como por exemplo de superávit primário e outras mais qualitativas, como de reforma tributária. Caberia ao Ministério da Fazenda tratar de atingir essas metas. É um aspecto absolutamente central de uma democracia que o orçamento seja discutido dentro do Executivo e do Legislativo também. O Ministério da Fazenda faz muitas outras coisas, como agenda de reformas microeconômicas importantes para o crescimento. Elas seriam conduzidas pela Fazenda e também com outros ministérios. Como por exemplo, temas do mundo do crédito, várias dimensões do custo Brasil, itens da infraestrutura, mercado de capitais etc..

Como o senhor escalaria a sua equipe no Ministério da Fazenda?
Vamos ter gente com experiência de fato comprovada em várias dessas áreas que são notoriamente difíceis, como Tesouro, área internacional, áreas de política econômica. Precisamos ter pessoas com competência, energia e com um alinhamento de visão do mundo, uma visão moderna, século 21. Além da experiência, trazer pessoas mais jovens. Tem muita gente na faixa dos 30 e dos 40 anos que traz energia, uma perene abertura para ideias novas. Estou em contato com gente que quer colaborar, não só com sugestões, mas que quer arregaçar as mangas e ir para Brasília.

Como seria a política do salário mínimo do governo Aécio?
A política de aumento real do mínimo continua ( com o atual modelo, que leva em conta o PIB ). São palavras do próprio Aécio.

O Globo – Arminio: ajuste seria virtuoso e não recessivo

Ex-presidente do BC, que Aécio anunciou como ministro, diz que não governa com Marina.

Cássia Almeida, Ana Paula Ribeiro E Rennan Setti

Ministro da Fazenda se o candidato à Presidência pelo PSDB, Aécio Neves, ganhar a eleição, Arminio Fraga diz que o ajuste nas contas públicas que propõe é “não recessivo” e que até trará algum crescimento. Diz ainda que só trazer de volta a transparência das contas públicas terá efeito positivo e que esse ajuste fiscal seria feito ao longo de dois anos:
— A total transparência das contas gera um ajuste virtuoso. É clara a perda de disciplina fiscal, há uma perda de transparência grave. O Orçamento é uma peça crucial da democracia. Temos usos de artifícios contábeis e receitas não recorrentes. Temos gordura para cortar, lógico que não seriam atingidos os programas sociais. Uma parte virá de algum crescimento. Com a recuperação da confiança, já há uma melhora.
Arminio também afirma que é “100% Aécio” e não aceitaria um cargo no governo de Marina Silva, que apareceu em segundo lugar na pesquisa Ibope e ganharia no segundo turno se a eleição fosse agora:
— Não considero. Respeito muito a Marina, a história de vida dela, mas não considero ir para o governo.
O ex-presidente do Banco Central, no segundo governo de Fernando Henrique Cardoso, não cravou prazos para trazer a inflação para a meta de 4,5%, que atualmente está em 6,5%, no teto do compromisso do governo. Há o temor de que se repita o que houve em 1999, quando Arminio, no Banco Central, subiu os juros para 45% ao ano. O país vivia uma crise cambial:
— Existem preços represados, que precisam ser colocados dentro das regras do mercado. Não seria recomendável trazer a inflação para a meta logo de cara; isso precisa ser feito num período não muito longo.
Ele afirma que, em 1999, as condições eram muito diferentes, com crise cambial aguda:
— Esperava-se uma inflação entre 20% e 50% e queda de 4% do PIB (Produto Interno Bruto, conjunto de bens e serviços). Teve como respaldo um ajuste fiscal que começou no final de 1998. O ajuste acabou não sendo recessivo, crescemos um pouco.
Ele acusa o governo de “pregar no peito da oposição que haverá perda de postos de trabalho”. Arminio diz que só a mudança de governo trará a confiança de volta, e que o mercado de trabalho não vai sofrer:
— A incerteza aumentou muito. Indicadores antecedentes (números de atividade econômica que saem antes do resultado do PIB) estão deprimidos. Temos que arrumar a casa, se não for arrumada, coloca o país em grave risco.
Perguntado se acabaria com as desonerações e os repasses para o BNDES, que empresta a juros negativos, Arminio preferiu não antecipar decisões. Ele afirma que, na Fazenda, fará uma revisão completa nessas políticas.
— Soluções paliativas de desoneração não têm muita lógica econômica. Queremos um ambiente em que o empresário não precise se proteger do que o governo faz — disse.
Efeito No Mercado Foi Pequeno
O anúncio do nome de Arminio Fraga como ministro da Fazenda teve pouco efeito no mercado financeiro. Para Raphael Figueredo, da corretora Clear, Aécio já tinha conquistado o apoio do mercado:
— Aécio estava guardando a formalização disso como uma carta na manga, mas recorreu a ela porque foi mal no debate, na minha opinião. O mercado gosta do Arminio, então Aécio tentou reafirmar seu alinhamento com esse setor. Só que ele já tinha conquistado esse apoio antes.
A queda para terceiro lugar nas pesquisas também diminuiu o efeito do anúncio.
— Não trouxe nenhum impacto porque a possibilidade de segundo turno para o PSDB está menor — disse Adriano Moreno, da Futura Invest.

Venezuela bolivariana vai importar petroleo: uma realizacao inedita...

Venezuela estuda, pela 1ª vez, importar petróleo
Guilherme Russo, Enviado Especial / Caracas
O Estado de S. Paulo, 28/08/2014

Documento obtido pela 'Reuters' diz que produto argelino, mais leve do que o venezuelano, seria usado para reduzir custo do refino
O governo da Venezuela está considerando importar petróleo cru pela primeira vez na história do país e poderá usar o produto vindo da Argélia, mais leve, como uma mistura para estimular as vendas do petróleo venezuelano, pesado. A informação consta de um documento obtido na quarta-feira, 27,pela agência de notícias Reuters.
Apesar de o país latino-americano ter as maiores reservas de petróleo do mundo, a Petróleos de Venezuela (PDVSA), estatal responsável pela exploração petrolífera no território venezuelano, tem comprado um volume crescente de subprodutos refinados do insumo, como nafta, para misturar com o petróleo pesado extraído da bacia do Orinoco, sua maior região produtora.
Isso é feito para tornar o produto venezuelano exportável, enquanto a extração de petróleos de teor mediano e leve - que também têm sido usados como diluentes - tem diminuído no país.
O nafta tem sido importado por altos valores atualmente, o que tem prejudicado o fluxo financeiro da PDVSA, a maior fonte de dólares do governo da Venezuela. A compra de petróleo leve da argelina Sonatrach seria uma forma de o governo tentar diminuir o custo de exportação de seu petróleo.
A possibilidade de a Venezuela importar petróleo cru de outro país havia sido classificada neste ano pelo ministro do petróleo, Rafael Ramírez, como o "último recurso" para diluir a produção local.
Além do documento obtido pela Reuters, uma fonte com informações da PDVSA e da Sonatrach, confirmou a intenção de Caracas adquirir petróleo leve.
Inflação. A Federação de Câmaras e Associações de Comércio e Produção da Venezuela (Fedecámaras) declarou nesta quarta que a inflação acumulada entre junho de 2013 e junho de 2014 no país se elevou em 62,1%. "É a inflação mais alta do planeta", afirmou o presidente da entidade, Jorge Roig, citando dados comparativos do Fundo Monetário Internacional (FMI).
De acordo com dados do Instituto Nacional de Estatísticas da Venezuela, organismo do governo, em maio, a inflação anualizada se situava em 60,9% no país. No ano passado, a elevação no Índice Nacional de Preços ao Consumidor venezuelano chegou a 56,2%.
Em uma entrevista coletiva em que pediu transparência do governo em relação aos dados da economia, o presidente da Fedecámaras ressaltou que, entre 2003 e 2014, a inflação registrada na Venezuela chegou a 1.239% - no mesmo período, o aumento inflacionário relativo ao preço dos alimentos foi de 2.277%. "Essas cifras não têm precedentes", disse Roig.
O presidente da Fedecámaras lembrou que, segundo o último levantamento do Banco Central da Venezuela (BCV) a respeito da escassez de produtos no mercado venezuelano, entre fevereiro e março, foi registrada falta em 29,4% dos itens comercializados no país. "Desde então, o BCV não voltou a publicar a estatística. Um país não pode se planejar sem a transparência e a oportuna publicação das cifras oficiais (da economia)."
De acordo com o estudo da entidade, o Produto Interno Bruto (PIB) da Venezuela caiu 4% no primeiro semestre deste ano.
A Federação Farmacêutica Venezuelana (FFV) pediu uma "política de emergência" ao governo para combater a escassez de medicamentos no país e culpou a não concessão de divisas por parte do governo para a importação de medicamentos pela atual crise.

Mandarins da Republica empenhados em afundar a republica (que ja anda cambaleando)

Só num país como o Brasil, um presidente de um banco estatal, suspeito de fraude, e possivelmente de corrupção (quem é que paga um apartamento em dinheiro????), paga multa e continua no cargo.
Significa que os superiores são coniventes com esse tipo de prática e recorrem a ela igualmente.
E quem é que paga imediatamente uma multa de mais de 120 mil reais, sem pestanejar?
Alguém muito rico, não é mesmo. Por que ele ainda trabalha? Para ficar mais rico, talvez...
Inacreditável, não é mesmo?
Paulo Roberto de Almeida

Presidente do BB paga multa à Receita para se livrar de investigação
Compra de apartamento em espécie despertou suspeita da Receita, mas Bendine nunca explicou a origem do dinheiro (leia mais)

Só num país como o nosso, os supreminhos acham que ganham pouco, com quase 15 mil dólares por mês (isso só em remuneração, sem contar todos os penduricalhos, mordomias, casa e comida de graça, que não entram na conta e que já poderiam elevar o salário a níveis bem maiores).
O pior é que todos os outros mandarins da República torcem para que isso seja rapidamente aprovado, pois vai provocar um formidável efeito cascata, com dezenas de milhares de outros beneficiários. O povo paga a conta, e nem sabe que está sendo lesado pelos marajás do nosso serviço público. Não tenho nenhuma ilusão de que isso seja corrigido any time soon.
O Brasil chega a me envergonhar.
Paulo Roberto de Almeida

Ministros do STF querem salário de R$ 35,9 mil


Proposta aprovada pela Corte com o novo valor será enviada ao Congresso; salário hoje é de R$ 29.462


Chefe do BB pagou multa para se livrar de investigação
Receita questionou evolução do patrimônio de Aldemir Bendine em 2010
Executivo não informou origem de recursos usados para comprar apartamento pago com dinheiro em espécie
Leonardo Souza
Folha de S. Paulo, 28/08/2014

O presidente do Banco do Brasil, Aldemir Bendine, pagou multa de R$ 122 mil à Receita Federal para se livrar de questionamentos sobre a evolução de seu patrimônio pessoal e um apartamento pago com dinheiro vivo em 2010.
Bendine foi autuado por não comprovar a procedência de aproximadamente R$ 280 mil informados em sua declaração anual de ajuste do Imposto de Renda. Na avaliação da Receita, o valor de seus bens aumentou mais do que seus rendimentos declarados poderiam justificar.
Dirigente da maior instituição financeira da América Latina, Bendine tem por hábito declarar que mantém dinheiro vivo em casa, de acordo com documentos aos quais a Folha teve acesso. Ele informou em suas declarações à Receita ter recursos em espécie quatro anos seguidos, entre 2009 e 2012, no valor de pelo menos R$ 400 mil.
Bendine entrou no radar da Receita Federal em 2010, quando a Folha revelou que ele comprara um apartamento no interior de São Paulo pelo valor declarado de R$ 150 mil, pagos integralmente em espécie. O executivo também declarou ter feito obras no imóvel no valor de R$ 50 mil.
Ao justificar a legalidade da transação imobiliária, ele informou que declarou à Receita possuir R$ 200 mil em dinheiro vivo em casa, guardados desde 2009.
Em 2012, os auditores da Receita enviaram a Bendine um extenso questionário sobre suas despesas em 2010, perguntando quanto ele gastara com seus cartões de débito e crédito, com saúde, educação e outras despesas.
O executivo prestou as informações solicitadas, mas não convenceu. Em novembro de 2012, foi autuado em R$ 151 mil, incluindo multa e juros. Ele não contestou a autuação e pagou o auto à vista, ganhando um desconto. Assim, a conta caiu para R$ 122.460.
Bendine diz que não discutiu com a Receita a origem dos recursos usados na compra do apartamento e diz que o auto de infração resultou de um mero erro em sua declaração à Receita. Mesmo depois de identificar o erro, ele não retificou a declaração.
Questão Familiar
Questionado pela Folha, Bendine não quis falar sobre o dinheiro, alegando tratar-se de uma questão familiar.
Não é crime comprar imóveis com recursos em espécie. Assim como não é crime guardar dinheiro embaixo do colchão. Mas essas práticas são consideradas pelo Fisco como sinais de sonegação de tributos e por isso despertam a curiosidade dos auditores.
O dinheiro passado de mão em mão, sem circular pelo sistema bancário, não pode ser detectado pelos controles da Receita Federal e do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).
"Que razões haveria para alguém guardar uma alta soma em vez de pôr numa conta bancária, numa aplicação?", pergunta o diretor de Relações Institucionais do Instituto Justiça Fiscal, Dão Real Pereira dos Santos, ex-superintendente da Receita Federal no Rio Grande do Sul.
Ele fez uma análise do caso a pedido da Folha, sem ser informado do nome do contribuinte. "É uma situação em que naturalmente se inverte o ônus da prova", afirmou. "Numa situação normal, o Fisco teria que correr atrás das provas. Nessa situação, não. Cabe ao contribuinte explicar por que tem esse dinheiro guardado em casa."
Não foi apenas em 2009 que Bendine declarou ter R$ 200 mil em casa. No ano seguinte, ele voltou a informar ter a mesma quantia em espécie, após a aquisição e a reforma do apartamento. Ou seja, ele passou a ter novamente R$ 200 mil em dinheiro. Em 2011, declarou ter R$ 100 mil. Em 2012, R$ 50 mil.
O presidente do Banco do Brasil afirmou que adotou esse procedimento por considerá-lo na época a melhor maneira de corrigir o erro cometido no preenchimento de sua declaração, mas reconheceu que o correto teria sido apresentar uma declaração retificadora à Receita Federal.
Como determina a lei, o pagamento imediato do auto de infração, como fez Bendine, obriga a Receita a arquivar o caso, o que elimina a possibilidade de comunicar ao Ministério Público Federal a prática de eventuais crimes fiscais cometidos pelo contribuinte. O caso de Bendine foi arquivado em janeiro deste ano.

Destravar a politica externa - Sergio Amaral

É hora de destravar a política externa
Sérgio Amaral
Folha de S. Paulo, 20/08/2014

A economia brasileira é, hoje, uma das mais fechadas do mundo, com o comércio representando cerca de 20% do Produto Interno Bruto
Afora os Brics (grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) e as relações com Pequim, a política externa brasileira travou, inclusive em setores prioritários --como Mercosul, América do Sul e comércio exterior.
O Mercosul está paralisado, se não em retrocesso. Em pouco mais de uma década, as vendas brasileiras para o grupo declinaram de 17% a 8% das nossas exportações. Os investimentos também caíram, enquanto as instituições do Mercosul não fizeram qualquer progresso significativo.
Chegou a hora da verdade para o Mercosul. Os países-membros do grupo terão de tomar decisões fundamentais: querem consolidar o livre-comércio? Pretendem manter a união aduaneira? Querem continuar a proteger bens intermediários, em detrimento da integração das cadeias produtivas?
Quaisquer que sejam as opções, o importante será cumprir as regras acordadas, de modo a restaurar a credibilidade que o Mercosul perdeu. Com a adesão da Venezuela ao grupo, inclusive a cláusula democrática virou letra morta.
Na América do Sul, em vez de caminharmos para a integração, marchamos a passos firmes para a desintegração, com o traçado de uma nova linha de Tordesilhas que separa o Mercosul, a leste, da Aliança do Pacífico, a oeste. O último grupo representa 34% do PIB e 51% do comércio da América Latina.
Em três anos, a Aliança do Pacífico avançou, em vários setores, mais do que o Mercosul. A busca de uma convergência entre os dois grupos encontra, no entanto, a resistência do Brasil.
Por fim, em comércio colocamos todas as fichas na OMC (Organização Mundial do Comércio). Com o fracasso, provavelmente definitivo, da Rodada Doha, ficamos a ver navios, pois não negociamos os acordos de comércio, bilaterais e regionais, que a maioria de nossos parceiros já concluiu.
O acordo entre o Mercosul e a União Europeia, o mais importante deles, ainda não foi finalizado --pela resistência da Argentina em aceitar concessões que os seus parceiros no Mercosul já fizeram, e pela recusa do Brasil em prosseguir nas negociações sem a Argentina, como, de fato, pode e deveria.
O custo para o Brasil será alto. Como relembrou José Manuel Durão Barroso, presidente da Comissão Europeia, o Brasil poderá perder, entre outras vantagens, o acesso privilegiado ao mercado europeu de carne, caso as negociações com Washington avancem rapidamente, pois serão concedidas aos Estados Unidos as quotas que poderiam beneficiar o Brasil.
A abertura da economia é precondição para a retomada do crescimento. Assim como as reformas econômicas são um requisito para que a indústria possa competir.
A economia brasileira é, hoje, uma das mais fechadas do mundo. O comércio representa cerca de 20% do PIB --no caso da China, este percentual é de 53%. O presidente chinês, Xi Jinping, em sua visita recente ao Brasil, declarou que seu país não seria o que é hoje não fossem a abertura do comércio e as reformas da economia -- e Xi Jinping é insuspeito de inclinações neoliberais.
O travamento da política externa não ocorre apenas em setores prioritários. O comércio com a África continua a representar 5% de nossas exportações, como há várias décadas. As relações com Washington estão num ponto morto, exatamente no momento em que os Estados Unidos promovem uma revolução energética como prelúdio para um processo de reindustrialização, que abrirá oportunidades novas para cooperação e comércio.
É preciso não confundir visitas diplomáticas e comunicados conjuntos generosos com programas e parcerias efetivas. Infelizmente, temos sido pródigos na retórica e modestos nos resultados.

SERGIO AMARAL, 70, embaixador, foi ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (governo Fernando Henrique Cardoso)

quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Eleicoes 2014: mercado ja comprou Marina e formou uma bolha...

Digo bolha porque não existem razões racionais que expliquem, pelo menos para o chamado mercado, esse entusiasmo com uma representante da floresta que sequer explicou o que pretende fazer na economia. O encantamento do povo se entende por razões emotivas, mas o do mercado soa artificial.
Não que ele seja irracional. Não é isso.
Minha interpretação é a seguinte: o mercado não aprecia especialmente a Marina pelo que ela é, pois é completamente desconhecida enquanto dirigente econômico, mas se sabe que é anticapitalista, como todos os petistas de coração, o que ela nunca deixou de ser.
Só que o mercado tem ainda mais horror da Dilma, e o Aécio não estava sendo considerado em condições de derrotá-la.
A Marina parece ser a única em condições de derrotar a soberana, e além de ter o apoio do povão, que quer algo diferente (mas isso é puramente emotivo e não tem nenhuma fundamentação na realidade), passou a gozar da simpatia do mercado por outras razões, ou pelo menos, pelas razões negativas.
Isso significa que a mediocrização cresceu celeremente sob o lulo-petismo, e estamos nos aproximando da Argentina...
Triste constatar isso, mas é como vejo: estamos com políticos medíocres, despreparados, e uma população que não consegue mais distinguir entre o que seria o certo e o puramente emotivo, irracional.
Acho que temos longos anos de decadência educacional e cultural pela frente.
Infelizmente...
Paulo Roberto de Almeida

O mercado financeiro celebra a onda Marina Silva

A Bolsa de Valores subiu com a pesquisa, e os agentes econômicos já dão como certa a vitória da candidata do PSB

São Paulo
El País, Econômico,  28 AGO 2014


Marina durante ato de campanha em São Paulo. / PAULO WHITAKER (REUTERS)

O Brasil dormiu Dilma Rousseff e acordou Marina Silva nos últimos dias com a reviravolta nas pesquisas eleitorais. A pesquisa do instituto Ibope de quarta-feira, que revelou um salto no número de seus potenciais eleitores, virou o humor o país. Marina, do Partido Socialista Brasileiro (PSB), tem 29% das preferências, a petista Dilma tem 34%, enquanto Aécio Neves, do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), 19%. Se nas redes sociais se estabeleceram os debates contra e a favor do avanço da ambientalista, na Bolsa de Valores de São Paulo ela já é tida como a próxima titular no Palácio do Planalto. A bolsa fechou nesta quarta-feira em 60.950 pontos, seu melhor resultado desde janeiro de 2013. Os analistas atribuem o desempenho à divulgação da pesquisa eleitoral, que colocou Marina num movimento ascendente, com capacidade de bater Rousseff no segundo turno. “A Marina é o nosso Obama”, diz Tony Volpon, chefe de Pesquisas para Mercados Emergentes da Nomura Securities.
A comparação com o presidente dos Estados Unidos diz respeito à eleição dele em novembro de 2008, quando os Estados Unidos começavam a ver o fim do sonho americano da opulência financeira, e buscavam uma nova referência. “A Marina está com esse impulso de capitalizar o sentimento de mudança no Brasil. Ela está se colocando como uma agente de mudanças segura e confiável”, completa Nomura. Isso porque em suas aparições como candidata oficial, desde a semana passada, ela tem deixado claro que vai respeitar os compromissos assumidos por Eduardo Campos.
E porque as pessoas que colaboram com o seu programa de Governo, como o economista Eduardo Gianetti da Fonseca, têm falado a linguagem das finanças. Nesta segunda-feira, Fonseca concedeu uma entrevista ao jornal Folha de S. Paulo anunciando que a equipe de Marina vai restabelecer o tripé macroeconômico [câmbio flutuante, meta de inflação e disciplina fiscal], estabelecido no segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso, que perdurou até o primeiro governo Lula e, ainda, que vai reduzir o teto da meta inflacionária.
A Marina é o nosso Obama
Tony Volpon, da Nomura Securities
Dar esse norte para o futuro é saciar a fome de previsibilidade do mercado financeiro. Assim, ao mesmo tempo que Marina capta a insatisfação dos mais desiludidos com a política –jovens e indecisos– a sua candidatura cativa os economistas. O mercado financeiro, entretanto, pode até reagir com oscilações nos índices de bolsa, ou alta do câmbio, como aconteceu durante o primeiro mandato do Governo Lula, quando o dólar, hoje em 2,26 reais, chegou a 4 reais pelo temor de mudanças radicais no cenário. Era o trauma da passagem de Fernando Collor de Mello, que confiscou a poupança em 1990. O PT foi obrigado a escrever uma cartilha de combinados, a Carta ao Povo Brasileiro, anunciando as diretrizes do governo que previa, por exemplo, o respeito às regras já estabelecidas.
Zeina Latif, economista chefe da XP Investimentos, diz que a verdade é que o mercado financeiro não tem ideologia. “Num cenário, em que Dilma ganhe e ela anuncie que fará um governo indicando um determinado ministro, e que faria uma gestão parecida com o do primeiro governo Lula, o mercado ia celebrar”, diz Latif.
Quanto mais clara a sinalização de que haverá ajuste de contas públicas, e as preocupações para o controle de inflação, maior o apoio. Por isso, havia um bom humor com Aécio Neves, esclarece a economista da XP Investimentos. “Ele já tem um time mais definido, já sabe quem será ministro, quem será o nome para a pasta da Fazenda, e assim por diante”, completa Latif.
Curiosamente, uma pesquisa informal, elaborada pelo jornal Valor Econômico, num evento com empresários na noite de segunda-feira, mostrou que se o eleitorado fosse composto somente pelos empresariado, Aécio Neves, candidato do PSDB, venceria de cara no primeiro turno, com quase 70% dos votos, enquanto Rousseff teria 14%, e Marina Silva, 12%. Neste caso, o setor empresarial se mostra mais conservador que o mercado financeiro em apoiar a candidata do PSB porque Silva ainda não detalhou seu programa de Governo e não se sabe exatamente como ela vai operar diante da necessidade, por exemplo, de aumentar investimentos ou de ampliar os acordos internacionais.
Tivemos muitos embates enquanto trabalhamos juntos, mas sempre acabamos em acordos. E ela [Marina] está muito mais aberta hoje do que naquele tempo
Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura
Já o mercado do agronegócio se mostra dividido diante da nova perspectiva eleitoral. Roberto Rodrigues, por exemplo, ex-ministro da Agricultura de Lula, que trabalhou ao lado de Marina, quando ela era titular da pasta de Meio Ambiente, confia que a presidenciável do PSB respeitará os compromissos firmados por Eduardo Campos. “Eu mesmo estive em várias reuniões dele com lideranças rurais e ele foi muito claro e positivo, defendendo a importância do agronegócio. Mas que fosse feito com sustentabilidade”, conta Rodrigues.
O ex-ministro da Agricultura diz que conhece muito bem o estilo de Marina Silva, e embora haja desconfianças sobre a sua postura, ele acredita que a presidenciável se rende fácil ao diálogo e à negociação. “Tivemos muitos embates enquanto trabalhamos juntos, mas sempre acabamos em acordos. E ela está muito mais aberta hoje do que naquele tempo”, elogia.
A senadora Kátia Abreu, do PMDB do Estado de Tocantins, tida como uma forte porta-voz do agronegócio, entretanto, não esconde suas reservas. Em entrevista recente à revista Época, Abreu disse que a candidata socialista faz da questão ambiental “um dogma, uma religião”. E que Silva “se recusa a dialogar e a abrir sua mente para outras situações que a sociedade demanda”.
Ainda é muito cedo para falar em derrota da presidenta Dilma Rousseff. Apesar de todas as questões econômicas, ela consegue dar respostas
Elizabeth Johnson, da Trusted Sources
Mais imediatista, os investidores de curto prazo captam o movimento do presente, seguindo a popularidade crescente de Marina Silva. Já é dado como certa que uma nova pesquisa que será divulgada neste final de semana terá a presidenciável na frente inclusive de Rousseff. Por isso, o mercado já incorpora “É só ela não tropeçar, não fazer besteira que ela ganha”, avalia Volpon, da Nomura Securities, que tem conversado com pessoas do mundo econômico e político nos últimos dias. “Está difícil encontrar alguém que não acredite na vitória da Marina”, completa.
Elizabeth Johnson, diretora de pesquisa para o Brasil da consultoria britânica Trusted Sources, prefere manter a cautela, mesmo com as mudanças no humor do eleitorado. “Ainda é muito cedo para falar em derrota da presidenta Dilma Rousseff. Apesar de todas as questões econômicas, ela consegue dar respostas”, afirmou.

FHC: Dilma entende pouco de economia... (acho que ele foi generoso)

Entender pouco é um exagero de generosidade. O ex-presidente é um homem cortês...
Alem de não entender nada de economia, os companheiros são mentirosos. Não apenas com essa conversa de que o governo tucano quebrou o Brasil três vezes, o que é mentira pura e simples.
A esse propósito transcrevo um trecho do que disse Armínio Fraga em artigo na Folha de SP deste mesmo dia:
….o governo diz que “quebraram o país e nós pagamos o FMI”. Em 2002, o Brasil quase quebrou, sim, em função do medo do que faria o PT no poder (e que Lula resolveu, para seu eterno mérito). No segundo semestre de 2002 o governo FHC (com anuência da oposição) tomou um empréstimo com o FMI de US$ 30 bilhões. Cerca de 80% do empréstimo foram reservados para o próximo governo, sendo 20% desembolsados (e não gastos) em dezembro de 2002 e o restante já durante o governo Lula. Portanto os recursos ficaram, na prática, à disposição do governo Lula.
A compulsão pela mentira, pela fraude, pela empulhação é muito forte nos companheiros.
Além dos crimes econômicos que continuam comentendo, é verdade.
Vou fazer a lista. 
Paulo Roberto de Almeida

Dilma entende pouco de economia. Perdeu credibilidade.
Fernando Henrique Cardoso,
Observador Político, 27/08/2014

Agora vejo o motivo pelo qual a presidente Dilma Roussef não conseguiu obter grau de pós-graduação na Unicamp: ela entende pouco de economia. E mesmo de números. Disse no debate de ontem (26/8), na Band, que o Brasil “quebrou três vezes” no governo do PSDB. De onde tirou tal falsidade?
O Brasil estava em moratória desde o final do governo Sarney (será que é a isso que ela se refere quando diz “quebrado”). Desde quando assumi o ministério da Fazenda, no governo Itamar, começamos a refazer a credibilidade do país. Em outubro de 1993 assinamos uma renegociação da dívida externa e voltamos aos mercados internacionais. Fizemos em 1994 o Plano Real, sem apoio do FMI, e erguemos a economia. Começava o período de construção da estabilidade, que durou todo meu primeiro mandato, passando por crises bancárias, Proer, renegociação das dívidas dos estados e municípios etc.
No início do segundo mandato, depois das consequências da crise da Ásia (1997), da crise argentina e toda sorte de dificuldades externas e internas –graças a atos políticos irresponsáveis da oposição e à incompletude do ajuste fiscal – sofremos forte desvalorização cambial em janeiro de 1999, apesar de havermos assinado em 1998 um acordo de empréstimo com o FMI (será que é isso que a Presidente chama de “quebrar o país?). A inflação não voltou, apesar das apostas em contrário, e antes do fim do primeiro semestre de 1999 já havíamos recuperado condições de crescimento, tanto assim que em 2000 o PIB cresceu 4,7%.
Nova dificuldade financeira, a despeito das restrições na geração de energia, só ressurgiu no segundo semestre de 2002. Por que? Devido ao “efeito Lula”: os mercados financeiros mundiais e locais temiam que a pregação do PT fosse para valer. Sentimos o efeito inflacionário (os 12% a que a Presidente sempre se refere, que devem ser postos à conta do PT). Aí sim, recorremos ao FMI, mas com anuência expressa de Lula e para permitir que seu governo reagisse em 2003, como fez. Do empréstimo, 20% seriam para usar no resto de meu mandato e 80% no de Lula… Não houve interrupção do fluxo financeiro internacional, nem quebradeira alguma.
É mentira, portanto, que o governo do PSDB tenha quebrado o Brasil três vezes. Por essas e outras, o governo Dilma Roussef perdeu credibilidade: em vez de informar, faz propaganda falsa.

A peemedebizacao da politica brasileira - Marcos Nobre (revista piaui)


por Marcos Nobre
Revista Piaui, agosto de 2014
Nada de PT ou PSDB: a verdadeira força hegemônica da política brasileira é o pemedebismo.
A partir das eleições de 2006, a disputa pelo título de “melhor governo da história deste país” foi politicamente decidida a favor de Lula, contra a era FHC. Já o debate acadêmico, em sentido contrário, parecia se encaminhar para entronizar (para o bem ou para o mal, dependendo da avaliação) o Plano Real como marco de um novo período da história brasileira. Foi quando o cientista social André Singer, num artigo publicado em 2009 na revista Novos Estudos do Cebrap, resolveu comprar a briga e estabelecer o lulismo como momento inaugural de uma nova era.
Segundo suas análises, o governo Lula construiu um programa político ao longo de dois mandatos, cuja base social estaria na massa popular desorganizada que conquistou, nesse período, substanciais melhorias em seu padrão de vida. Lula teria realizado uma operação política de troca de sua base eleitoral e de apoio entre as eleições de 2002 e de 2006. Conforme a tese, ele abandonou a base tradicional na classe média em favor de um “subproletariado”, caracterizado por um profundo e disseminado conservadorismo.
Foi nesses termos que Singer deu corpo e densidade à expressão até então vaga do “lulismo”, levando a discussão a outro patamar.

Em textos mais recentes, Singer deu a esse suposto conservadorismo de massa profundidade histórica, em registro local e internacional, por assim dizer. O lado nacional conecta a nova base social de Lula a uma corrente social subterrânea que o levaria a Getúlio Vargas e à “herança populista dos anos 1940/1950” e que estaria ligada, no presente, a um “povo lulista que deseja distribuição de renda sem radicalização política”, como afirmou em artigo publicado na Folha de S.Paulo.

Já é suficientemente inquietante a aproximação com um paternalismo avesso à democracia. Tanto mais que Singer nem mesmo distingue entre o Getúlio Vargas da ditadura do Estado Novo e o presidente eleito da década de 50. Mas a complicação fica ainda maior quando aproxima o lulismo do New Deal dos Estados Unidos da década de 30, como fez em ensaio publicado na edição de outubro de piauí.
Essa comparação com um momento passado da história norte-americana pretende, na verdade, apontar para o futuro – para o Brasil que teria sido inaugurado pela era Lula e que teria como imagem a formação da nova classe média dos Estados Unidos depois do período do presidente Franklin D. Roosevelt.

A comparação com o New Deal parece deslocada por várias razões. A começar pelo fato de que, nos Estados Unidos, ele se seguiu a nada menos do que a crise de 1929. Ao contrário de Obama agora, Roosevelt chegou três anos depois da maior catástrofe econômica da história do capitalismo em tempos de paz e encontrou o terreno propício – não obstante a derrota histórica nas eleições legislativas de 1938 – para alcançar um novo grande acordo social. Sem falar no fato elementar de que o patamar de desenvolvimento social, econômico e democrático dos Estados Unidos pré-1929 não tem base de comparação com o Brasil de 2002. E, tudo somado, um vaivém entre o New Deal, Lula e o Estado Novo nem de longe pode ser considerado como uma operação inofensiva.


Seja como for, está ausente a referência à democracia e a uma cultura política democrática – tanto no caso dos Estados Unidos como no caso do Brasil. Como se a presença ou ausência da tradição e da prática democráticas não fosse elemento estrutural para pensar qualquer aproximação ou comparação entre situações sociais e históricas distintas. De maneira crua, o que se tem na argumentação de Singer é o suposto de que aumentar a renda da população pobre tem resultados conservadores. Um pressuposto, aliás, que não é demonstrado. Surge como um economicismo de novo tipo. Não apenas por ignorar o papel das instituições e de uma cultura política democrática – fenômenos “superestruturais”, como se costumava dizer no velho jargão marxista –, mas por reduzir a política ao reflexo de uma população que compra e consome.


Com essa redução, desaparece do horizonte também a crítica. Desaparece todo o universo de obstáculos à efetiva democratização da sociedade que caracteriza a política do país. Desaparece a imagem de uma sociedade amputada por uma representação política excludente, como é o caso da brasileira. Supor conservadorismo sem examinar as condições políticas concretas do desenvolvimento da democracia naturaliza esse mesmo conservadorismo.

A situação é outra quando se olha tanto o período FHC como o período Lula do ponto de vista mais amplo do processo de redemocratização iniciado nos anos 80. Dessa perspectiva, tanto o marco representado pelo Plano Real quanto aquele representado pelo governo Lula se apresentam como momentos de inflexão em uma linha de desenvolvimento que os precede e, em boa medida, os determina. Ao mesmo tempo, é apenas essa ampliação do horizonte que permite enxergar a cultura política mais duradoura que caracteriza a sociedade brasileira, juntamente com sua forma mais relevante e estrutural de obstrução democrática.
A essa cultura política herdada dos anos 80 dou o nome de “pemedebismo”.

É possível ver o desenvolvimento da política do país desde então como uma sequência de tentativas de lidar com esse fenômeno fundamental, seja para combatê-lo, seja para neutralizá-lo, seja para dirigi-lo. De maneiras diferentes, tanto o Plano Real como o “lulismo” foram tentativas de controlar o pemedebismo de fundo da política brasileira. Por isso, por mais importantes que pareçam e de fato sejam, são momentos de inflexão em uma linha de força muito mais duradoura e consistente.


A pemedebização não tem a ver apenas com o crescimento ou a eventual hegemonia de um partido dentro de um governo. Tem a ver com uma lógica. A título de exemplo, basta pensar que uma figura como Aécio Neves pode perfeitamente ser pensado nesse registro. Se tiver a oportunidade e as condições políticas para isso, certamente ele será um símbolo do pemedebismo, mesmo que nunca se transfira partidariamente para o PMDB e continue no PSDB.


O pemedebismo significa uma lógica, portanto. Lógica que, sim, se formou e se consolidou a partir da configuração concreta do PMDB na década de 80, nas condições específicas em que se deu a redemocratização. Mas que se autonomizou em relação ao partido, mesmo que este continue ainda hoje a ser o seu fiel depositário na política brasileira.

Para entender esse movimento, é preciso voltar três décadas e puxar o fio da meada desde lá. O que é um exercício bem distante de ser óbvio no momento atual, em que a euforia da irresistível ascensão do país à condição de potência mundial deixa ver com dificuldade o fato elementar de que períodos de crise não foram a exceção, mas a regra, no quarto de século que vai de 1978 a 2003.


Com a reforma partidária de 1980, o MDB, já então PMDB, ganhou o importante problema de saber como não se esvaziar, de como manter dentro da mesma legenda correntes, tendências e mesmo partidos inteiros que tinham poucas afinidades além da unidade da luta contra a ditadura. Com o pluripartidarismo, parecia que o sentido do MDB também havia se esgotado.


Ocorre que não só o MDB guardava um capital político de altíssimo valor. Dispersar forças naquele momento poderia significar também colocar inteiramente nas mãos dos militares a transição democrática. Pois a antiga Arena tinha se tornado o PDS e conseguira manter a maior parte de seus quadros. Se a oposição se dispersasse naquele momento, o Colégio Eleitoral de 1985 poderia eleger um nome civil do PDS como presidente da República, em lugar de Tancredo Neves.


Para conseguir manter dentro de um mesmo partido correntes e tendências tão heterogêneas, a nova sigla aperfeiçoou um sistema interno de regras de disputa que já funcionara durante a década de 70 e que, a partir de 1983, precisava também incluir figuras de uma nova ordem de grandeza: governadores de estado. Esse sistema pode ser descrito de maneira simples como um sistema de vetos. (Coisa muito diferente – e ainda mais complicada – seria a de circunscrever a “base social” desse pemedebismo, de tão impressionante longevidade e vitalidade na política nacional, uma tarefa que não cabe aqui).


É um modo de fazer política que franqueia entrada no partido a quem assim o deseje. Pretende, no limite, engolir e administrar todos os interesses e ideias presentes na sociedade. Em segundo lugar, garante a quem entrar que, caso consiga se organizar como grupo de pressão, ganhará o direito de vetar qualquer deliberação ou decisão que diga respeito a seus interesses. Foi assim que o PMDB se organizou a partir da década de 80. Como se o partido fosse, em si mesmo, um governo de união nacional.

Foi uma resposta tipicamente conservadora ao brutal descompasso entre uma democracia sem instituições e a altíssima participação popular nos anos 80, especialmente visível no período da Constituinte. Em lugar de democratizar aceleradamente as suas instituições, a política brasileira, liderada pelo PMDB, construiu um sistema de filtros, obstáculos e vetos que procurava represar e atender seletivamente à verdadeira enxurrada participativa que se viu naqueles tempos, inédita na história do país.


O essencial da cultura política inaugurada pelo PMDB na década de 80 é o fato de que, desde o declínio da ditadura militar, sua identidade deixa de se construir por oposição a um inimigo, real ou imaginário, e passa a ser construída com base em um discurso inteiramente anódino e abstrato, sem inimigos, cujo sentido mais importante é garantir o sistema de ingresso universal e de vetos seletivos.

Reafirma-se, então, a visão realista de que a democracia não passa do exercício da capacidade de bloquear o oponente, não de enfrentá-lo abertamente no espaço público. Pressupõe que maiorias não se formam positivamente em favor de políticas determinadas, mas sim porque se mostram capazes de desviar, contornar ou neutralizar vetos. No mais, é uma cultura política que aceita mecanismos de participação e deliberação democráticos. Desde que não ameacem seriamente o sistema de vetos.


Mas essa lógica, digamos, inclusiva do pemedebismo tem seus limites. A política simplesmente deixa de funcionar quando a polarização desaparece. Quando todos estão, por assim dizer, incluídos, quando estão aPTos e organizados para vetar, em algum momento vem a paralisia, uma tendência inscrita no próprio pemedebismo.

Na década de 80, a paralisia política coincidiu com a desorganização econômica. Produziu uma Constituição que contém muitas e diferentes constituições dentro de si – o que, por razões que não vêm ao caso aqui, acabou por ser positivo para a sua consolidação. E culminou com uma inflação inteiramente fora de controle e com a humilhante derrota de Ulysses Guimarães na eleição presidencial de 1989.


A desorganização econômica tinha nome e sobrenome conhecidos. Chamava-se inflação, “inflação inercial”. Teve papel central na manutenção do pacto de desigualdade brasileiro dos anos de nacional-desenvolvimentismo, entre as décadas de 30 e 80. Nos limites rígidos de uma economia fechada e, na maior parte do século XX, de regimes autoritários e/ou coronelistas, a inflação auxiliou na promoção de desenvolvimento econômico rápido e intenso sem alterar fundamentalmente os padrões desiguais de distribuição de renda. Um pacto que pretendia se sustentar na melhoria geral dos padrões de vida. Não foi por acaso que um dos primeiros atos da ditadura militar de 1964 tenha sido o de institucionalizar a inflação sob a forma da “correção monetária”.


Em um determinado momento, entretanto, a inflação deixou de ser o mecanismo mais eficiente para a manutenção do pacto de desigualdade que caracteriza a história brasileira, revelando divisões e disputas potencialmente desagregadoras no interior dos próprios estratos sociais privilegiados. Esse foi não apenas o momento em que a inflação se tornou hiperinflação. A hora histórica coincidiu também com o declínio da ditadura militar, com a redemocratização e com o esgotamento do modelo chamado nacional-desenvolvimentista. Foi esse nó social que coube ao pemedebismo não desatar.

A coincidência histórica de hiperinflação e redemocratização moldou um sistema político programado para o quanto possível impedir a formação de blocos hegemônicos capazes de impor perdas definitivas a terceiras partes. E não é difícil ver que a tarefa de superar simultaneamente a hiperinflação e o modelo nacional-desenvolvimentista sem regressão autoritária não é factível em uma configuração política como essa.


Para mostrar isso, basta lembrar que, até 1994, governos estaduais tinham no Brasil relevantes instrumentos para fazer política econômica, independentemente do chamado governo central. E que os tímidos ensaios de abertura econômica da década de 80 – como a abertura para o investimento, por exemplo – foram feitos na margem e por políticas específicas de ministérios e órgãos da área econômica.


Dito de outro modo, a resposta pemedebista canônica é a do adiamento permanente de soluções definitivas. Normalmente considerada como o período do “ajuste estrutural” à nova etapa do capitalismo mundial, a década de 80 foi, na verdade, a do adiamento do ajuste mediante a manutenção da hiperinflação e do fechamento da economia. Não é de estranhar, portanto, que esse adiamento estrutural leve, mais cedo ou mais tarde, à paralisia.


O que explica também, do lado oposto, que a década tenha se encerrado com a opção antipemedebista por excelência, com a eleição de Fernando Collor. A paralisia pemedebista trouxe seu oposto para o centro da arena política: Collor, com uma única bala, queria matar a inflação e o nacional-desenvolvimentismo. No fundo, a oscilação entre os extremos da paralisia pemedebista e do cesarismo alucinado de Collor colocou as bases para o surgimento da nova versão do pacto de desigualdade brasileiro representado pelo Plano Real.


A reorganização que veio com o Plano de 1994 não alterou substancialmente a lógica pemedebista – o que, aliás, não surpreende, se lembrarmos que o próprio FHC se formou na política partidária dentro do MDB/PMDB. Mas o novo modelo de gerenciamento político do período FHC deu ao pemedebismo direção e sentido, submetendo essa cultura política a um sistema bipolar que o conteve em limites administráveis.


Em lugar dos dois extremos – pemedebismo ou Collor – FHC colocou a ponta seca do compasso em um novo centro político, estabelecendo a partir daí dois polos no sistema, um liderado pelo PSDB, o outro pelo PT. Além dos aliados históricos de cada um dos lados, a regra seria construir uma coalizão de “A a Z” sob a liderança do polo no poder.

Como já deve estar claro a esta altura, controlar a inflação significava ao mesmo tempo controlar a tendência pemedebista da política brasileira. É nesse sentido que a aliança PSDB/PFL foi, literalmente, a outra face da moeda, do Real. Controlar a inflação não dependia apenas de um aprendizado técnico-econômico com os sucessivos fracassos dos planos anti-inflacionários de 1986 a 1991: Cruzado (I e II), Bresser, Verão, Collor (1 e 2). Dependia ao mesmo tempo da construção de um bloco político capaz de superar a crise estrutural de hegemonia da redemocratização que é chamada aqui de pemedebismo.
Ou seja, há um vínculo interno entre a “inflação inercial” e a “política inercial” que se cristalizou sob a forma de sistema político a partir da década de 80.

Ao se aliar ao PFL e, posteriormente, a quem mais estivesse disponível, o governo FHC estabeleceu um campo de forças em que ao PT só restariam duas possibilidades: permanecer indefinidamente na oposição ou fazer um movimento em direção ao centro político, com uma nova e mais “flexível” estratégia de alianças.

No caso de um movimento do PT em direção ao centro, a condição propriamente partidária imposta pelo modelo era uma só: o partido conseguiria vir a governar o país se, além dos parceiros históricos, viesse a se aliar ao PMDB. O que efetivamente aconteceu no governo Lula, ainda que somente depois do cataclismo do “mensalão”. “Mensalão”, aliás, que marca o ponto de chegada e o apogeu da engenharia política do Plano Real. Foi quando, pela primeira vez em 25 anos, uma crise política não afetou a economia.


Mas a história ainda não chegou a 2005. Para chegar ao primeiro mandato de Lula é preciso ainda lembrar de pelo menos mais uma das mudanças estruturais decisivas introduzidas pelo Plano Real e que marcou o ocaso do poder dos governadores de estado, tradicionais candidatos a gerentes do condomínio político pemedebista brasileiro. O primeiro movimento de neutralização veio com a própria estabilidade da moeda, que teve um efeito devastador sobre a dívida pública. Sem o permanente adiamento representado pela inflação, os governadores se viram em dificuldades orçamentárias intransponíveis e, do outro lado, encontraram no governo federal um duro negociador na reestruturação das dívidas estaduais.


O segundo movimento foi concomitante. Retirando do âmbito dos estados praticamente toda e qualquer possibilidade de praticar política fiscal e monetária – o que era comum no período inflacionário – o governo federal garantiu o monopólio da irresponsabilidade fiscal, julgada então necessária para alcançar a estabilização econômica pretendida. A mesma irresponsabilidade que negou aos estados. Não por acaso, foi o tempo mais quente da chamada “guerra fiscal”, em que os governadores lançaram mão dos parcos e únicos recursos que lhes restaram para obter investimentos em troca de isenções e benefícios tributários e fiscais.

A concentração dos principais instrumentos de política fiscal e monetária nas mãos do governo federal foi essencial para neutralizar essa que foi uma das principais fontes de alimentação do pemedebismo na década de 80. E seu episódio inaugural e mais marcante ocorreu antes mesmo da posse de FHC como presidente: a intervenção no Banco do Estado de São Paulo, o Banespa, realizada às vésperas da posse do governador do estado, até então principal líder do PSDB, Mario Covas.


Depois de perder sua segunda eleição presidencial em 1994, Lula tomou a decisão de fazer mudanças significativas no PT, reorientando radicalmente sua estratégia. Tinha chegado à conclusão de que o Plano Real havia alterado profundamente a lógica da política brasileira, a começar pelo fato de ter resolvido o principal problema nacional, a inflação. Foi nesse momento que começou a ser construída tanto uma maioria partidária disciplinada como uma nova política de alianças partidárias e eleitorais.

O movimento inaugural nessa direção foi a eleição de José Dirceu para a presidência do PT. A partir de 1995 – e não sem conflitos com o próprio Lula, diga-se – Dirceu implementou à risca o plano, isolando ou mesmo expulsando militantes e grupos políticos inteiros que se opunham à nova orientação, construindo um sólido bloco de apoio majoritário, e buscando estabelecer pontes com partidos e figuras políticas até então consideradas como inimigos. O ápice dessa estratégia se deu na eleição de 2002 e seu símbolo é a candidatura a vice-presidente na chapa de Lula do empresário José Alencar, então senador do hoje extinto PL.


Lula ganhou a eleição sem o apoio formal do PMDB. Mas não conseguiu estabilidade para governar até o momento em que cumpriu o destino que lhe tinha sido reservado pelo arranjo imposto pelo Plano Real. Não que Lula não tenha tentado fugir a essa camisa de força herdada. Ao contrário, escolheu inicialmente construir novas alianças apenas com a miríade de pequenos e médios partidos à disposição e fazer acordos individuais com parlamentares do PMDB, não com o partido como um todo, ou pelo menos com a porção dele que pudesse ser atraída para a base do governo.


Nesse momento de seu primeiro mandato, Lula operava ainda como árbitro do PT e não como presidente da República. O governo estava dividido essencialmente entre facções do partido que continuavam a se digladiar por espaço como antes. E Lula continuava a ocupar a posição de “último recurso” que sempre ocupou nas disputas internas do partido, interferindo diretamente apenas quando o seu próprio prestígio estava em causa.

Essa situação fez com que as figuras de José Dirceu e de Antonio Palocci se sobressaíssem e passassem como que a canalizar todas as disputas internas ao governo em duas facções concorrentes. Dirceu apoiado no PT, Palocci como porta-voz de outras forças partidárias dentro do governo e do mercado financeiro. Por essa época, as negociações políticas eram extremamente delicadas, já que Lula não autorizava (nem desautorizava, ao mesmo tempo) ninguém a negociar em seu nome.


Foi essa instabilidade estrutural que o levou a recusar, em 2004, o acordo com o PMDB construído durante meses por José Dirceu. Entre outras coisas, porque isso significaria também, nesse contexto, dar poder demais a Dirceu na disputa interna. O resultado foi o abismo do “mensalão”. E a consequente aliança formal com o PMDB, em 2005, momento em que Lula finalmente assumiu a Presidência da República e o papel de articulador político de seu próprio governo.

E, quando parecia que o scriPT traçado em 1994 estava sendo seguido à risca, Lula deu o troco. Em lugar de apenas se limitar a trazer o PMDB e o estritamente necessário para a sustentação política do governo, passou a ampliar sistematicamente o centro político estabelecido a partir do Plano Real e a tornar quase impossível a vida de um oposicionista. Com taxas de aprovação popular jamais vistas, Lula investiu contra a lógica da polarização que organizava todo o sistema. Manteve-a apenas nos limites do necessário para alcançar os efeitos eleitorais pretendidos. Mas, de fato, roubou o chão do polo liderado pelo PSDB.


Lula esteve em condições de ampliar de tal maneira o centro político que a polarização praticamente desapareceu. Deu à oposição a alternativa de aderir ou de se encantoar na extrema-direita. Ou seja, não lhe deu alternativa. Ou lhe deu uma alternativa ainda mais estreita do que aquela que lhe tinha sido imposta por FHC.

Esse movimento solapou de tal maneira as bases do sistema político do Plano Real que é difícil imaginar como elas poderiam ser hoje recompostas. O acordo selado em torno do centro político se tornou de tal maneira amplo que toda e qualquer polarização parece artificial. Artificialismo, entretanto, que tem sua utilidade eleitoral, sem dúvida. E que explica também por que a eleição de 2010 ficou entre o chocho e o abstruso, sem nada de realmente relevante entre as duas coisas.

Em uma sociedade que – por muito boas razões, diga-se – não acredita em consensos, o primordial é tentar garantir não ser atropelado por um dos propalados “consensos” do momento. Como por toda a América Latina, as eleições da última década significaram a ascensão de pobres e remediados à condição de representados políticos.


O que talvez seja específico do caso brasileiro é a maneira como ocorre a “inclusão”. Também no caso da representação do que André Singer chamou de subproletariado, tento mostrar aqui que é o mesmo mecanismo característico da cultura política brasileira que se encontra em ação: o de igualar “estar incluído” com “ter poder de veto”.

Lula representa quem nunca teve verdadeiramente representação, não porque simbolize um conservadorismo que seria próprio aos excluídos políticos, mas porque é o fiador de que não haverá retrocesso nesse avanço democrático à brasileira. Ao contrário da ladainha conservadora, ser representado não é apenas ser objeto de políticas públicas; é igualmente acreditar que não será atropelado por mais um dos muitos “consensos” que o país produz de quando em quando.


É por tudo isso que penso que André Singer tem razão em dizer, no ensaio de piauí, que “durante um tempo longo o norte da sociedade será dado pelo anseio histórico de reduzir a pobreza e a desigualdade no Brasil”. Como me parece ter razão ao acrescentar em seguida: “Em que grau e velocidade, a luta de classes dirá.” Ocorre que a determinação do “grau e velocidade” depende também de análises políticas concretas, que sejam capazes de mostrar as tendências do sistema. Depende de uma análise política capaz de vincular esse movimento à própria lógica da democracia brasileira, com os potenciais e os obstáculos ao seu aprofundamento. Do contrário, a posição do lulismo como pretenso momento inaugural de uma era perde o gume analítico e seu eventual poder explicativo.


O que tento mostrar aqui é que há uma tendência à paralisia no sistema político brasileiro cuja lógica chamo de pemedebista, cujas raízes devem ser buscadas na década de 80, no início da redemocratização brasileira. Tento mostrar também que essa tendência intrínseca impõe dificuldades estruturais à produção de polarizações consistentes e duradouras. E que o momento atual é de enfraquecimento da polarização, um momento em que a paralisia pode suplantar uma vez mais o sistema bipolar instituído pela lógica política do Plano Real.


No caso da reviravolta política de Lula examinada aqui, por exemplo, o alargamento do centro político e o enfraquecimento da polarização tiveram por consequência trazer para o primeiro plano justamente o pemedebismo, até então subordinado e subterrâneo. E essa novidade é um elemento determinante do “grau e velocidade” em que poderão se dar ou não as transformações no país.

O marco do novo surto pemedebista pode ser representado pela resistência de José Sarney na presidência do Senado apesar de uma saraivada de denúncias, em 2009. O apoio decisivo de Lula à permanência de Sarney na presidência do Senado selou a aliança com o PMDB para a eleição presidencial de 2010 e, ao mesmo tempo, marcou a volta do pemedebismo à disputa pela hegemonia da gramática política brasileira.
Ao contrário de casos anteriores, que resultaram em renúncia ou cassação de mandatos, a permanência de Sarney mostrou que o centro político ganhou tal amplitude e poderio que pode em grande medida ignorar protestos sistemáticos e generalizados da sociedade.

Uma contraprova do caráter determinante dessa cultura política de fundo pemedebista está em que, desde o primeiro mandato, Lula caminhou justamente por onde não encontrou vetos: nos aumentos reais do salário mínimo, na ampliação dos programas sociais, nas reformas microeconômicas do crédito. Mas isso estava ainda longe da política desenvolvimentista do segundo mandato, que induziu a criação de oligopólios nacionais com pretensões de internacionalização.

Na nova política, os grupos escolhidos pelo governo como vencedores tinham todas as razões para comemorar, assim como os demais tinham motivo de sobra para se recolherem, evitando possíveis represálias.
Além disso, o crescimento econômico expressivo e praticamente contínuo tornou os reais perdedores apenas residuais. Seja por que razão for, o fato é que a nova orientação desenvolvimentista não encontrou resistência social e política relevantes. E, coincidência ou não, esse desenvolvimentismo movido a subsídios, desonerações e subvenções só deslanchou com a entrada definitiva do PMDB no governo, depois do “mensalão”.

Tão ou mais importante que isso, a chegada do PMDB ao governo Lula trouxe ainda um elemento novo ao modelo de liderança bipolar herdado da engenharia política imposta por FHC. Lula criou onde e como pôde políticas sociais compensatórias. Só que repartiu de maneira desigual os seus dividendos políticos.


O PT ficou com a formulação, com o controle dos projetos e com o crédito de paternidade (ou maternidade, como se queira). E o PMDB recebeu a maior parte da execução das políticas – justamente a parte que contempla o poder local e abastece a política miúda. O programa Luz para Todos, não por acaso criado por Dilma Rousseff quando ministra das Minas e Energia, pode ser visto como caso exemplar dessa lógica lulista de repartição de dividendos políticos.

É justamente essa lógica de repartição de dividendos políticos que está ameaçada de agora em diante. E não apenas porque a própria repartição terá de ser negociada. O sucesso do Plano Real e a popularidade de Lula conseguiram ainda contrabalançar, conter e direcionar em alguma medida o pemedebismo. Mas são eventos passados e irrepetíveis.


Quanto mais se radicalizou a polarização entre PT e PSDB, tanto mais o pemedebismo se impôs. Não se trata de dizer sem mais que a polarização é falsa e que não há diferenças entre os dois polos. Mas, quanto mais o pemedebismo avança, mais a polarização é amplificada artificialmente, servindo à manutenção de uma lógica política profunda que não é nem petista nem tucana.


Durante dezesseis anos, o sucesso do Plano Real e os altíssimos índices de aprovação do governo Lula permitiram manter sob certo controle a tendência do sistema à pemedebização. Parece que não mais. A possível oposição se encontra hoje entrincheirada justamente em governos estaduais, o lugar político menos propício para enfrentar as coalizões de “A a Z” que caracterizam os governos desde FHC. Além disso, um Congresso ainda mais fragmentado serve de caldo de cultura política ideal para a expansão do pemedebismo.

A ironia e a tragédia da história estão em que o pemedebismo encontrou na “blindagem” da economia contra “interferências políticas” o elemento que lhe faltava para voltar a disputar a hegemonia política, para sair de sua posição de relativa subordinação de mais de quinze anos para um novo protagonismo.
Note-se, aliás, que o fiel depositário do pemedebismo, o partido que lhe deu origem, procurou mesmo se mostrar fiador dessa “blindagem”, filiando quadros tão importantes e incongruentes entre si como Henrique Meirelles e Delfim Netto. O resultado regressivo desse processo é visível a olho nu: uma política que tende a se descolar da sociedade, uma política que tende a se fechar sobre si mesma. E que, no limite, pode levar à paralisia.

Tornado aliado em sentido enfático nas eleições de 2010, o PMDB vai levar a disputa entre situação e oposição para dentro do governo. É por isso também que o tamanho nominal da bancada parlamentar que apoia o governo tem menos importância do que as matérias específicas em pauta, do que o estado da disputa interna ao governo. Ou seja, a mais importante disputa política será entre o PMDB e o pemedebismo, de um lado, e o PT e seus possíveis aliados, de outro.


Não será uma briga bonita de ver. As fábricas de dossiês vão se multiplicar como nunca. Já durante a eleição de 2010, a ministra-chefe da Casa Civil, Erenice Guerra, foi a primeira baixa, o prenúncio do que virá. Sua queda dá uma pálida ideia de como serão os embates futuros.

A primeira das duas batalhas decisivas será uma vez mais a eleição municipal – a mesma, aliás, que esteve na origem do “mensalão”, é importante lembrar. Depois de 2012, a segunda batalha acontecerá na data limite para parlamentares trocarem de partido sem penalidades, na segunda metade de 2013. Enquanto isso, o PMDB fará de tudo para colocar sob sua órbita de influência o maior número possível de parlamentares de outros partidos.


A primeira escaramuça – que de maneira alguma será decisiva – acontecerá na eleição para a presidência da Câmara e do Senado, no início de 2011. Sendo que a figura de José Sarney é aqui emblemática: o atual presidente do Senado e candidato à recondução ao cargo foi justamente o presidente no auge do pemedebismo da década de 80. Sabe muito bem o que significa estar nas mãos de um Congresso que funciona segundo essa lógica.

Não é nem um pouco fácil imaginar o lugar que poderá ter a oposição durante o governo Dilma. Há quem confie em supostas leis da política e ache que é assim mesmo, que a oposição vai se reorganizar e acabar aparecendo. Mas não são muitos esses otimistas científicos.


No momento, resta à oposição formal hibernar. Aliás, tudo indica que também a disputa pela liderança do PSDB será duríssima. Aécio Neves decidiu ir para o tudo ou nada contra a pretensão de Serra de presidir o partido. Se perder para o grupo paulista, Aécio não permanecerá no PSDB senão o tempo suficiente para encontrar um solo alternativo para suas pretensões presidenciais.


Mas, mesmo quando conseguir se reorganizar, a oposição pode, no máximo, servir de massa de manobra na disputa entre PT e PMDB. E manter a esperança de que o pemedebismo afinal vença e venha a produzir a paralisia que lhe é própria. Isso seria capaz de dar novo fôlego à oposição, talvez em aliança com o próprio PMDB. Mas também esse não é um cenário alentador para a democracia brasileira. Porque, no fundo, o jogo político não vai se dar entre situação e oposição, mas entre a crise de um sistema organizado em polos e a pemedebização.


Uma eventual hegemonia do pemedebismo tenderia a levar a uma situação semelhante ao estado de paralisia política dos anos 80. Em termos concretos, poderia comprometer seriamente a Copa do Mundo ou as Olimpíadas, por exemplo, já que as obras de infraestrutura são as primeiras a serem afetadas por uma crise política profunda. Marcaria o retorno da concomitância entre crises políticas e abalos na economia.


Seja como for, se não é possível prever os resultados de uma regressão política dessa magnitude, é pelo menos possível dizer que, no médio e longo prazo, sua efetiva ocorrência exigirá uma reorganização de grandes proporções. Porque o sistema político não sobrevive sem polarização. E a polarização dos últimos quinze anos não tem mais densidade suficiente para organizar e estruturar o sistema.

Um sistema em estado de não polarização é o elemento do pemedebismo. E, se um cenário regressivo não se deixa ver hoje em toda a sua possível amplitude e gravidade, pelo menos suas marcas mais gerais são bem visíveis: um tempo de bonança, desigualdade e pequena política. Ou até que uma nova polarização se produza para superar uma vez mais a paralisia pemedebista.





Agradecimento


Maria Cristina Fernandes não tem nenhuma responsabilidade pelo que escrevi acima, mas sem suas sugestões e críticas o texto simplesmente não seria o que é.