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sábado, 19 de agosto de 2017

Historia virtual do Brasil: um exercicio intelectual - Paulo Roberto de Almeida (2007)

Mais um desses trabalhos recuperados das catacumbas, e que nunca tinha tido divulgação adequada. Eu adoro história virtual, no sentido de imaginar saídas diferentes nos momentos decisivos de nossa história. Muito, obviamente, é puro exercício intelectual, ou imaginação fútil ou sem fundamento na realidade concreta desses "momentos decisivos", que nunca estão muito claros aos que vivem aquele momento.
Sempre pensamos que os caminhos que foram tomados pelos nossos "estadistas" (vá lá o título) foram os únicos, ou os mais racionais possíveis, em circunstâncias difíceis de decisão, quando as escolhas alternativas apresentariam, se supõe, custos maiores, para os decisores ou para a sociedade. Nem sempre é assim, no entanto, pois muitas decisões são tomadas de maneira totalmente improvisada, sob pressão dos acontecimentos, quando não de maneira deliberadamente distorcida, para produzir resultados outros do que aqueles anunciados publicamente (como estou certo que ocorreu sob os companheiros, que tomaram determinadas decisões para roubar, para extorquir, para fraudar a sociedade, como revelado pelas investigações policiais e judiciais).
Em todo caso, aqui vai um antigo exercício de "história virtual", aplicada ao Brasil.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 19 de agosto de 2017


História virtual do Brasil: um exercício intelectual (2007)

Paulo Roberto de Almeida


Primeira Parte
Questões metodológicas relativas à história virtual

Parece trivial, e sem maiores conseqüências práticas, fazer conjecturas em direção do passado, já que a linha contínua do tempo não nos permite operar qualquer mudança no curso efetivo da história, com a ajuda de alguma máquina do tempo imaginária. Especular é contudo possível em direção do passado, sendo em todo caso menos perigoso do que fazê-lo no presente e ainda menos arriscado do que “contra” o futuro. Um famoso historiador europeu, Johan Huizinga, chegou mesmo a afirmar que o historiador deveria se colocar de um ponto de vista que o permitisse considerar fatos conhecidos como podendo conduzir a resultados diferentes: e se os persas tivessem vencido em Salamina?; e se Napoleão tivesse fracassado em seu 18 Brumário?
Assim, é possível selecionar alguns dos turning points da história para realizar exercícios controlados de imaginação, que não são todavia completamente arbitrários ou puramente aleatórios. Uma das boas regras da história virtual, já explorada por historiadores fecundos como Niall Ferguson, é a de que o novo curso estabelecido deve ser “plausível” ou “possível”, isto é, seus desenvolvimentos poderiam estar inscritos na lógica histórica do momento imediatamente antecedente. De fato, o próprio Ferguson responde à questão de saber quem se importa com desenvolvimentos que nunca ocorreram. Diz ele que, nós mesmos, na vida cotidiana, estamos sempre nos colocando questões “contrafactuais”: por que eu não obedeci aos limites de velocidade?; por que ter aceito aquele último copo?; quanto eu teria ganho se tivesse apostado naquele número? [1]
Nos imaginamos, assim, acertando no milhar, escolhendo uma outra profissão ou simplesmente evitando alguns erros cometidos no passado. Um outro famoso historiador, Thomas Carlyle, via a história como um eterno caos, que o historiador deveria avaliar cientificamente. As conseqüências alternativas poderiam, para ele, levar a resultados totalmente aleatórios, ou divergentes do curso real da história, um pouco como na atual alegoria do bater de asas da borboleta sugerido pela teoria do caos. Seria mesmo assim?
O argumento a favor da história virtual consiste em seu poder de despertar uma certa curiosidade pela própria trama da história real, ao sugerir desenvolvimentos diversos do que aqueles que efetivamente ocorreram e que, segundo o curso sugerido, poderiam ter provocado outras conseqüências, algumas até decisivas do ponto de vista do curso ulterior. Mas a história virtual não é o reino do arbítrio, e sim uma construção cuidadosa sobre as vias alternativas da vida humana, explorando fatores contingentes do processo histórico, onde os homens podem, sim, fazer uma grande diferença, ao contrário da aparente rigidez do determinismo histórico. Desse ponto de vista, a história virtual possui virtudes eminentemente didáticas, pois que ela permite isolar o que é único, especial ou peculiar num determinado evento ou processo histórico, ao imaginar que esse fator ou essa ação particular poderiam ter deslanchado um curso totalmente inesperado (do ponto de vista do que efetivamente se passou), mas que estaria inteiramente inserido na lógica e na trama do curso precedente.
Aos que recusam a utilidade da história virtual pode-se observar que ela está de certa forma contemplada numa vertente mais séria, e quantitativamente embasada, da disciplina, identificada, por exemplo, com a chamada “cliometria”, na qual argumentos contrafactuais são mobilizados para determinar o peso de determinados fatores ou processos históricos. Um dos mais conhecidos utilizadores desse tipo de exercício é, obviamente, o prêmio Nobel americano Robert William Fogel que, numa obra famosa (Railroads and American Economic Growth: Essays in Econometric History, 1964), tenta isolar o papel das ferrovias no desenvolvimento econômico dos Estados Unidos. [2]
Assim, o que teria acontecido com o Brasil – que talvez não fosse nem “Brasil” – se a linha divisória de Tordesilhas, por desatenção dos portugueses ou resistência dos negociadores espanhóis, tivesse ficado lá mesmo onde a tinha colocado a bula do papa Alexandre VI, no meio do oceano? Teriam as Américas permanecido uniformemente espanholas, contentando-se os portugueses com seus domínios apenas africanos? O mais provável é que incursões de conquistadores concorrentes – franceses, holandeses, ingleses, entre outros – tivessem “esquartejado” bem mais cedo o hemisfério ocidental entre reinos e impérios mercantis europeus.
Muitos outros eventos ou processos podem ser sugeridos nessa linha da “história alternativa”. Cursos diferentes para episódios conhecidos devem, contudo, guardar conexão com o desenvolvimento possível ou com o curso efetivo de cada um deles. É o que se poderia chamar de plausibilidade histórica, o que significa que o curso sugerido não pode ser nem “anacrônico”, nem totalmente arbitrário, no sentido em que a alternativa selecionada poderia ter sido efetivamente “oferecida” aos, ou considerada pelos homens que tomaram tal ou tal decisão em momentos por vezes dramáticos para seus países ou para si mesmos.
A idéia da contingência na história, uma das bases da história factual, milita, assim, contra o determinismo histórico, muitas vezes exemplificado pela famosa frase de Marx na abertura do seu 18 Brumário de Luís Napoleão, segundo a qual os homens fazem sua própria história, mas o fazem em condições determinadas por forças que estão fora do controle desses mesmos homens.
Resumindo, idéias virtuais também podem constituir uma “boa” matéria prima para a história real, desde que ela se faça em condições aceitáveis de causalidade e de encadeamento das ações humanas. Afinal, o Rubicão, Waterloo, a batalha da Inglaterra, Stalingrado, poderiam, sim, ter conhecido outros desfechos e ter apresentado outras conseqüências. A relação (sempre ambígua) entre a liberdade e a necessidade nunca está determinada previamente e é isso, justamente, que constitui um dos fascínios da história.


Segunda Parte
Momentos decisivos da história do Brasil

Os eventos selecionados abaixo, construídos sem outro cuidado de pesquisa histórica que não o desfilar de datas ao fio da memória, constituem exemplos relevantes dos principais “tijolos construtores” de uma história virtual do Brasil. São eles, em todo caso, que oferecem oportunidades significativa de “distorção” do processo histórico, tal como ele efetivamente ocorreu, em direção de outras possibilidades e alternativas de desenvolvimento do itinerário conhecido, que poderiam ser considerados como possíveis ou plausíveis. Vários outros elementos – e não apenas eventos singulares – poderiam ser considerados como passíveis de “inflexão criativa” no registro dos fatos, tais como processos de mais longa duração, que de toda forma se prestam aos critérios de “opções factíveis” ou de fatores contingentes, em função dos quais o desenrolar do processo, no caso do Brasil, poderia ter assumido contornos absolutamente inéditos em relação aos dados registrados nos anais e crônicas da história oficial.

1494: Tordesilhas (do contrário o Brasil não teria sido português)
1500: Descoberta (mas o Brasil não era ainda Brasil)
1640-1654: Expulsão dos holandeses do Nordeste
1750: Tratado de Madri (e seus sucedâneos, El Pardo e Santo Ildefonso)
1759: Expulsão do jesuitas do Brasil por decreto de Pombal
1763: Transferência da sede do Vice-Reino para o Rio de Janeiro
1792-98: Derrota da inconfidência e decreto de proibição de teares
1808: Abertura dos portos: fim do exclusivo colonial
1810: Tratado de 1810 de Portugal com a Inglaterra: rigidez tarifária
1817: Revolução Pernambucana: primeiro desafio à unidade nacional
1822: Independência (sem abolição da escravatura)
1828: Perda da Cisplatina e nova composição no Prata
1831: Abdicação de D. Pedro I e experiência “republicana” das Regências
1935-45: Farroupilha no Sul: segundo desafio à unidade nacional
1842: Esmagamento da revolução liberal: consolidação conservadora
1844: Nova tarifa e início do experimento protecionista comercial
1850: Lei de Terras inviabiliza a divisão da grande propriedade rural
1854: Início das ferrovias no Brasil: começo da modernização
1865: O Império se descobre frágil com o ataque de Solano Lopez (Tríplice Aliança)
1888: Abolição da escravidão (sem incorporação dos escravos à economia e à sociedade)
1889: Adoção do regime republicano (federalismo na prática, até exagerado)
1891: Constituição republicana (consolida autonomia dos estados, revertida em 1937)
1898: Funding loan e primeira experiência de ajuste fiscal: limites da dívida externa
1902-1912: Configuração das fronteiras nacionais: obra de Rio Branco
1910: Derrota de Rui Barbosa: sistema político de oligarquias-positivistas-militaristas
1922: Início do ciclo tenentista de reforma política brasileira
1930: Revolução “liberal”: fim do regime puramente oligárquico
1931: Suspensão da conversibilidade e início dos controles de capitais (até hoje)
1934: Constituinte corporativa e atração do fascismo
1937: Golpe autoritário: nova centralização e construção do Estado moderno
1938: Derrota do integralismo-fascismo na conquista do Estado
1941: Escolha certa no momento da ofensiva militar nazi-fascista: com os EUA
1944: Brasil vai à guerra e participa de Bretton Woods
1947: TIAR e doutrina da Guerra Fria: adesão à esfera de influência americana
1947-48: Conferência de Havana: sistema multilateral de comércio
1952: Acordo militar com os EUA: só seria terminado em 1977
1955: Primeiras experiências de liberalização cambial
1957: Industrialização e construção de Brasília: interiorização do desenvolvimento
1961: Golpe e parlamentarismo: ciclo de crises político-militares encerra a era Vargas
1964: República “sindical” é derrotada pelo Exército a serviço da burguesia
1968: Brasil recusa o TNP: autonomia nuclear e projeto próprio termina em 1996
1969: Golpe dentro do golpe: o mergulho na ditadura
1973 e 1979: Duas crises do petróleo: grande impacto econômico e na dívida externa
1975: Acordo Nuclear Brasil-RFA: oposição dos EUA
1979: Começo da transição para a democracia, sob crise econômica constante
1982: crise da dívida externa culmina em 1987, com moratória
1985: Fim do regime militar: início da “quinta” república (Constituição de 1988)
1988: Tratado de Integração com a Argentina (em 1991, Mercosul quadripartite)
1992: Brasil aceita Tlatelolco plenamente e faz “impeachment” do presidente
1994: Plano Real de Estabilização Econômica: vencido o ciclo de ajustes fracassados
1999: Desvalorização e regime de flutuação cambial: conseqüências para o Mercosul
2002: Vitória do Partido dos Trabalhadores nas eleições presidenciais: grande mudança?


Terceira Parte
Um exercício de história virtual do Brasil
Tendo já estabelecido uma lista de “momentos decisivos” da história do Brasil (ver acima), permito-me agora selecionar alguns desses “turning points” para realizar alguns exercícios de imaginação, que não são todavia completamente arbitrários ou puramente aleatórios. Uma das boas regras da história virtual, já explorada por historiadores fecundos como Niall Ferguson, é a de que o novo curso estabelecido deve ser “plausível” ou “possível”, isto é, seus desenvolvimentos poderiam estar inscritos na lógica histórica do momento imediatamente antecedente. Suas conseqüências, entretanto, podem levar a resultados totalmente aleatórios, ou divergentes do curso real da história, um pouco como na alegoria do bater de asas da borboleta sugerido pela teoria do caos.
O que teria acontecido com o Brasil – que talvez não fosse nem “Brasil” – se alguns dos eventos ou processos aqui sugeridos tivessem ocorrido? Vou traçar apenas as linhas gerais do que poderia ser uma “história alternativa”, sem pretender agora entrar em longos desenvolvimentos em torno do curso sugerido para cada um deles.
O “copyright” pelas idéias virtuais é meu, mas cada um deve se sentir livre para imaginar seus outros eventos e estabelecer cursos diferentes para os episódios selecionados.

1. Tordesilhas mais a leste, em 1494: uma América do Sul apenas espanhola?

            O que teria acontecido se em Tordesilhas (1494) o negociador português não tivesse conseguido afastar para oeste a linha divisória das terras descobertas em processo de incorporação aos impérios espanhol e português? O Brasil não teria sido brasileiro, obviamente, ou pelo menos poderia não ter “nascido” português, alguns anos mais à frente. Mas, a América do Sul teria permanecido uniformemente espanhola?; provavelmente não, pois esses imensos domínios teriam sido imediatamente contestados pelas demais monarquias européias (França e Inglaterra, sobretudo), como o foram em determinadas partes. Portugal, em todo caso, talvez tivesse ficado restrito a seus domínios africanos e asiáticos apenas, o que poderia ter mudado a face do mundo.
            Tordesilhas foi uma espécie de Ialta no nascimento dos tempos modernos, dividindo o mundo entre Portugal e Espanha, mas à diferença do acordo de Ialta do século 20, que consolidou uma divisão do mundo relativamente estável durante quase meio século, foi um acordo feito entre duas potências relativamente marginais no concerto europeu do Renascimento, não tão poderosas, em todo caso, quanto a França, a Inglaterra elizabetana (que cem anos depois colocaria a Espanha imperial em cheque) ou mesmo alguns reinos mediterrâneos. Assim, a pretensão ao monopólio do mundo não teria sido aceita pelos demais reinos cristãos, sobretudo se a Espanha (por alguma distração do negociador português em Tordesilhas) tivesse abocanhado todo o hemisfério americano.
            Do nosso ponto de vista, cabe apenas registrar que em 1494, a Espanha poderia, sim, ter ficado com todas as terras a 170 léguas de Cabo Verde (e não 370 como depois se fixou), e Portugal estaria assim restrito aos seus domínios africanos e asiáticos. Ainda neste caso, o Brasil poderia ter emergido como “Brasil” (supostamente pela madeira vermelha de suas costas), mas ele teria sido espanhol 80 anos antes da incorporação de Portugal pela Espanha, e talvez nem tivesse permanecido sob dominação da coroa espanhola, nessa época excessivamente preocupada em saquear o ouro e a prata do México e dos Andes e pouco propensa a defender costas indevassadas, povoadas apenas por índios do neolítico, sem qualquer riqueza aparente. Os holandeses talvez tivessem se apossado antes de parte do território brasileiro, ou outros povos: franceses, ingleses. O Brasil em todo caso não seria português e Portugal teria um império africano e indiano.

2. O Brasil holandês do século 17: uma feliz tropicologia da ética protestante?

E se os holandeses não tivessem sido expulsos do Nordeste em 1654: a ética do protestantismo teria conseguido transformar a lógica da plantação escravocrata?; um Brasil menos brasileiro teria sido bem sucedido?: provavelmente não, e o Brasil estaria mais perto de uma Indonésia do que de uma pujante democracia mercantil.
Imaginemos, por um instante, que Calabar tivesse sido bem sucedido, que Guararapes tivesse representado uma derrota para os luso-brasileiros ou que, por artes da diplomacia (e da pressão militar), Portugal simplesmente tivesse concedido “vender” sua franja nordestina do Brasil à Companhia das Índias ou diretamente à república dos holandeses. Poderíamos ter tido um Nordeste menos “subdesenvolvido” do que atualmente, uma vibrante economia mercantil, marcada pelo “iluminismo” protestante e pela ética do trabalho desse capitalismo nascente do norte do Escalda?
Duvidoso que esse cenário bem sucedido ocorresse no sentido do progresso europeu protagonizado pelo primeiro país moderno da Europa, o protótipo do capitalismo “à face humana” e apenas incomodado pelo “desconforto da riqueza”. Provavelmente estaríamos mais perto da Indonésia (sem a diversidade multicultural) do que da metrópole holandesa. Não é certo que esse cenário puramente colonial se reproduzisse, uma vez que, à diferença da Indonésia, os holandeses teriam de toda forma de ocupar e preencher demograficamente o território brasileiro, escassamente povoado por índios pouco afeitos a uma economia mercantil.
Assim, a forte presença judia (e de “cristão-novos” de modo geral) talvez tivesse operado algum “milagre” de desenvolvimento econômico com forte inserção nos fluxos mundiais de transações de bens e serviços, inclusive capitais. Entretanto, a colônia holandesa do Brasil ainda assim teria conhecido a escravidão, o regime de plantações e alguns problemas de infra-estrutura que dificultariam sua inserção exitosa na economia mundial, de maneira autônoma, quero dizer. Os imponderáveis de um Brasil holandês não se limitam ao próprio território americano, uma vez que a Holanda talvez tivesse no Brasil uma grande base de abastecimento para enfrentar não apenas a Espanha dos Habsburgos, mas a própria Inglaterra do mercantilismo triunfante.
Ou seja, o Brasil continuaria como colônia por um certo tempo mais, mas o jogo de alianças seria outro, e o futuro estaria mais aberto do que sob o exclusivismo colonial português. Quanto ao seu desenvolvimento sócio-econômico, ele dependeria não apenas dos próprios holandeses, mas de uma eventual classe dominante local que poderia ou não estimular traços inovadores na estrutura básica (inclusive humana) desse Brasil nordestino. A ética protestante não seria em todo caso garantia de êxito absoluto…

3. Um tratado de Madri bem sucedido: uma América do Sul mais brasileira?

Se o acordo conseguido por Alexandre de Gusmão em 1750 não tivesse sido invalidado pela realidade das disputas luso-castelhanas e por seus sucedâneos de El Pardo e Santo Ildefonso, como seria o mapa do Brasil atualmente? O Império do Brasil teria sido uma Rússia tropical?
O tratado de Madri representou, efetivamente, uma grande negociação para Portugal (e o Brasil), mas ele infelizmente não vigorou, ou pelo menos não foi totalmente incorporado na realidade do terreno e depois na configuração das fronteiras sulinas. Se os demarcadores tivessem continuado a sua obra de implementação do tratado e se conflitos na própria península ibérica não tivessem interferido com seu traçado ulterior, o território brasileiro teria sido um pouco diferente do que foi nos séculos 18 em diante. Nesse caso, muitas das disputas ainda pendentes no final do século 19 e início do 20 não teriam razão de ser, diminuindo a glória futura de um Rio Branco, que permaneceria como um obscuro cônsul em Liverpool.
Como teria sido isso? Um pouco de cartografia – pouco prática, neste momento – nos faria ver como. O território das “missões” talvez tivesse resultado num Paraguai muito maior (se ele não tivesse dado início ao mais sangrento conflito da América do Sul). A Amazônia brasileira seria um pouco menor do que é hoje, certamente.

4. Vitória da Inconfidência: o Brasil brasileiro não teria sido prematuro?

            A indústria teria sido desenvolvida (sem decreto de proibição de teares)?; Os escravos teriam sido libertados?; Os jesuítas continuariam a prover ensino? O Brasil seria uma repetição dos EUA, ou seguiria a experiência dos caudilhos hispânicos?
            Não pretendo desenvolver todas as minhas hipóteses aqui, mas ouso apenas sugerir que um processo de independência naquele momento, com estruturas sociais e políticas tão pouco desenvolvidas no Brasil, com ausência quase completa de uma população educada – já não digo alfabetizada, mas “ilustrada” tecnicamente em artes da manufatura e de ofícios simples – e de bases sociais para a democracia local, poderia ter resultado num Estado inoperante, claudicante e candidato ao fracasso administrativo e financeiro.
            Classes dominantes decididas também podem ser um requisito indispensável à emergência de uma nação autônoma, e talvez o Brasil não estivesse preparado, naquele momento, para a independência. Recorde-se apenas que a “inconfidência” se deu mais por exação fiscal do Estado português do que por vibrante movimento autonomista guiado por uma ideologia iluminista como pode ter ocorrido na América do Norte (que já tinha mandado seus “representantes” a Londres, na pessoa de Benjamin Franklin, por exemplo). Em lugar de uma nação autônoma trinta anos mais cedo, poderíamos ter tido um arquipélago de mini-estados separados pela geografia e pela economia. Ou seja, um mosaico de repúblicas mais ou menos caudilhescas, como ocorreu depois com a América espanhola.

5. Conseqüências da não abertura dos portos em 1808: um Brasil industrial?

Se, em 1808, não tivesse havido o decreto de abertura dos portos (que significou o fim do exclusivo colonial) e se, em 1810, não tivesse sido assinado o tratado de comércio de Portugal com a Inglaterra (que acarretou rigidez tarifária e abertura comercial), como poderia ter sido o desenvolvimento econômico e industrial do Brasil? Teríamos reproduzido o modelo americano como pretendem alguns historiadores?
Minha hipótese é a de que o atraso português – sem o desafio da presença hegemônica inglesa, entenda-se – teria sido simplesmente transplantado para o Brasil, que seria, sim, um bem sucedido exportador de café e de outros produtos tropicais, como ele o foi de fato, mas não necessariamente teria acompanhado o curso da primeira e da segunda revolução industrial (o que ele fez com enorme atraso). Ou seja, nada de muito diferente de alguns países mediterrâneos, que mantiveram o atraso social e econômico já bem entrado o século 20. Um capitalismo hamiltoniano teria muito poucas chances de se desenvolver no Brasil, em vista dos enormes diferenciais técnicos e de educação entre a Nova Inglaterra e o Brasil das plantações. Observe-se que nada impediria, nesse caso, o desenvolvimento de indústrias têxteis no Brasil, como sugerem alguns historiadores (se não tivesse havido tratado de 1810, por exemplo), mas elas seriam mais suscetíveis de serem operadas por escravos negros do que por trabalhadores brancos europeus.
Em outros termos, um capitalismo servil e escravocrata, sem qualquer democracia (ou apenas uma democracia restrita aos patrícios, como no sul dos EUA) e sem qualquer estímulo inovador para a geração de um processo endógeno de desenvolvimento econômico e social. Como diria Braudel, as estruturas sociais são lentas a serem transformadas, resistindo a muitos movimentos políticos superficiais, como aquele resultante de um Brasil português não dominado pelo mercantilismo britânico.

6. Um arquipélago de repúblicas lusófonas: a independência fragmentada?

            Episódios como o da Revolução Pernambucana de 1817, que representou o primeiro desafio à unidade nacional, o da própria Independência (em 1822, sem abolição da escravatura) com algumas lutas de retaguarda na Bahia e no norte, o excessivo centralismo da administração de Pedro I, que redundou no ato de abdicação (em 1831) e na experiência “republicana” das Regências, sem falar nas muitas revoltas regionais desse período, a começar pela Farroupilha no Sul (1835-45), o segundo grande desafio à unidade nacional, todos eles poderiam, combinados ou segundo um encadeamento que deixaria algum espaço ao acaso histórico, redundar no esfacelamento da unidade brasileira, surgindo em seu lugar uma miríade de estados portugueses mais ou menos caracterizados pela completa independência econômica.
            Uma economia política da regionalização brasileira na passagem da vaga napoleônica na Europa (que deixou em crise quase terminal as duas monarquias ibéricas) seria suscetível de demonstrar essa fragmentação do Brasil em três ou quatro estados autônomos na conjuntura dos anos 1820 a 1840.

7. O fracasso da República e a decadência do Império: a monarquia no século 20?

            O Império certamente era frágil (o ataque de Solano Lopez o demonstrou em 1865), mas os republicanos eram ainda mais fracos e desorganizados. Imaginemos, por um momento, que a abolição da escravidão não tivesse sido feita em 1888 (e que ela ocorresse apenas dez anos depois, sem incorporação dos escravos à economia e à sociedade, como de fato ocorreu em qualquer circunstância), e que as crises militares desse período tivessem redundado num golpe falho, que produzisse rejeição do militarismo e do republicanismo e uma aversão completa à anarquia política prometida pelo federalismo exacerbado dos republicanos ideológicos.
            A monarquia teria então sobrevivido alguns anos mais, até a morte de D. Pedro (nessas circunstâncias em torno de 1896 ou 97), e que a sucessão tivesse sido realizada na pessoa da inepta e insegura Isabel, com seu marido francês e financiamento inglês. Os faustos da era vitoriana, em 1900, talvez pudessem ter sustentado o regime monárquico alguns anos mais, provavelmente ultrapassando o próprio monarquismo português (que veio a perecer quando o Brasil conheceu um novo surto de militarismo, com a eleição de Hermes da Fonseca) e dando-lhe uma aura de diferente, de estável (numa América Latina cada vez mais agitada por golpes e revoluções) e mesmo progressista (teríamos “conseguido” libertar os escravos em 1898, pouco antes de Cuba) e inaugurado o século 20 com grandes promessas de constitucionalismo britânico. Rui Barbosa teria sido várias vezes presidente do Conselho de Ministros, Pinheiro Machado um bom tribuno monarquista e o Barão do Rio Branco faria um grande chanceler monarquista.
Os exageros do federalismo republicano teriam sido evitados e o Brasil talvez tivesse tido uma trajetória de responsabilidade fiscal e de solvabilidade externa que teria evitado vários constrangimentos com os credores externos. O desenvolvimento industrial talvez tivesse sido menor, mas o Estado talvez pudesse até mesmo ter encontrado o seu reformista bismarckiano. Algum sucessor de Isabel poderia ter conduzido o Brasil monárquico até bem passada a Primeira Guerra Mundial, mas os apelos anarquistas e bolcheviques talvez tivessem provocado alguma tragédia à la russa.

8. Os tenentes no poder desde 1922: uma república socialista-positivista?

            O início do ciclo tenentista de revoltas políticas no Brasil, em 1922, poderia ter resultado numa coalizão de forças progressistas suficientemente homogênea para derrubar do poder Artur Bernardes (ou o último monarca dos Braganças). Ela teria dado a partida a um processo de reformas que tornariam desnecessária a revolução “liberal” de 1930, tendo dado um fim antecipado ao regime puramente oligárquico prevalecente na República de 1891 (ou mesmo na monarquia anterior). Os apelos “totalitários” desse período teriam feito o Brasil atravessar mais cedo um novo processo de centralização política e de modernização econômica, misturando apelos fascistas-integralistas com um vago apelo positivista-progressista.
            Nesse mesmo processo, uma constituição corporativa poderia ter precedido o “Estado novo” salazarista em Portugal, mas provavelmente não adquiriria os contornos racialistas e abertamente fascistas de um Estado totalitário como o nazista. A crise de 1929 e a depressão subseqüente já encontrariam o Brasil preparado para os novos tempos: ele teria operado bem antes de 1931 a suspensão da conversibilidade da moeda e o início dos controles de capitais (aliás mantidos até hoje), assim como a construção do Estado moderno. Integralistas e comunistas não precisariam se lançar à conquista do Estado em 1935 ou em 1938, uma vez que eles já teriam sido incorporados aos grupos modernizantes radicais dos anos 1920 (Prestes seria um governador eficiente em alguma província amazônica e Getúlio Vargas seria um dos chefes da ala civil do movimento).
            A indústria teria sido estimulada, mas a ideologia fascizante dos líderes civis poderia ter levado o Brasil a algumas escolhas erradas nas grandes convulsões do final dos anos 1930, como agora veremos.

9. O Brasil aposta errado em 1941: fica do lado dos derrotados e ocupados

            A viabilidade de um regime integralista-fascista moderado no Brasil, desde o início dos anos 1920 conduziu o Brasil a uma grande aliança com as potências nazi-fascistas da Europa e da Ásia na década seguinte. Ainda que situado fora do teatro de conflagrações militares européias e asiáticas, e mantendo boas relações com seus vizinhos sul-americanos (inclusive os fascistas mais radicais da Argentina, com a qual tinha sido criado uma união aduaneira com propensão a abarcar todo o cone sul, desde o final dos anos 1930), o Brasil faz as escolhas erradas no momento das ofensivas militares nazi-fascistas contra os EUA, a Rússia soviética e diversos outros alvos europeus. Mesmo declarando sua neutralidade no conflito europeu (e asiático), ele se habilita como um dos principais fornecedores de matérias primas estratégicas para as potências do Eixo, provocando a ira dos EUA.
            Uma recusa adicional de ceder bases no Nordeste para utilização das forças aerotransportadas americanas a caminho do norte da África, conduz à ocupação forçada de amplos trechos da costa nordestina por forças dos EUA. O governo de Washington oferece um armistício, sob ameaça de bombardeio aéreo e naval contra o Rio de Janeiro, o que o primeiro ministro Góes Monteiro (atuando num governo de coalizão entre partidos fascistas e republicanos brasileiros) se vê obrigado a aceitar. Tem início um longo processo de ocupação de bases “extra-territoriais” no Nordeste que só terminaria em 1952, com a assinatura de um acordo de “assistência” militar, ao mesmo tempo em que os EUA devolviam a soberania “formal” ao Japão e à Alemanha (mas ainda mantinham forças militares nesses países). O regime civil-militar do Brasil se converte paulatinamente em aderente de uma vertente menos autoritária do capitalismo de estado.

10. Exageros da “República sindical” levam o Brasil à democracia burguesa em 1964

            Sem ter participado da guerra e ausente de Bretton Woods e da conferência de San Francisco, em 1944 e 1945, o Brasil adere tardiamente às mais importantes organizações onusianas, permanecendo num casulo corporativo e estatista, no plano interno, e sendo estreitamente vigiado pelos EUA no plano externo. Esse relativo isolamento das correntes mais dinâmicas do crescimento econômico mundial no pós-guerra, conduz a uma certa estagnação social e ao descontentamento da classe média, que se deixa seduzir pela idéias democráticas e liberais de Seleções do Reader’s Digest e pelas belas fotografias de Life, com a versão edulcorada do american way of life.
            Em todo caso, a revolta surda contra o “estado novo” tropical que vigorava desde meados dos anos 20, explode quando um líder republicano sindicalista, João Goulart, promete “mudar tudo” nas eleições de 1960, radicalizando ainda mais as promessas distributivistas feitas pelos líderes tenentistas dos anos 1920 mas nunca realmente cumpridas. Isso era demais para a classe média ameaçada em seu estilo de vida e seduzida pelo efeito demonstração produzido nos EUA, onde um jovem líder progressista, John Kennedy, também queria mudar tudo, mas no sentido de maior bem estar econômico e promessa de direitos civis para toda a população. Aliada a militares sensatos, líderes social-democratas afastam o presidente populista com um golpe de estado pacífico e instauram, pela primeira vez na história, uma democracia burguesa no Brasil. Imediatamente reconhecido pelos EUA, o novo governo, dirigido pelo jovem líder trabalhista (democrata) Franco Montoro, assina um acordo com o FMI para colocar a economia do Brasil em novas bases, abrindo o país ao capital estrangeiro, privatizando as estatais criadas nos anos 1930 e 40, e inserindo o Brasil na economia mundial, via redução tarifária e liberalização comercial.
É o começo da voga de regimes civis em toda a América Latina, que sai definitivamente do isolamento das ditaduras autárquicas e ingressa numa era de rápido crescimento econômico, igual ou superior ao do Japão e da Alemanha. Tendo feito reforma agrária e operado uma verdadeira revolução educacional, o Brasil galga postos altos na corrida tecnológica mundial, ganhando vários prêmios Nobel em pesquisa científica, sobretudo nas áreas biológica (e agrícola) e física (aplicada à eletrônica).

11. Crise econômica mundial dá ao Brasil status de grande potência nos anos 1970

            As duas crises do petróleo (em 1973 e 1979), encontram o Brasil mais forte do que nunca, com sua democracia burguesa ainda na infância (pouco mais de uma década) e ainda vibrante de entusiasmo reformista. O grande impacto econômico provocado em outros países dependentes da importação de petróleo não se reproduz no Brasil, que tinha desenvolvido sua indústria petrolífera com base em investimentos privados nacionais e estrangeiros desde o início dos anos 1960 (descobrindo novos campos e passando a exportador moderado de petróleo). O relativo conforto nas reservas e na dívida externa, inclusive permite ao País emprestar recursos aos EUA, que atravessavam a pior fase da crise econômica iniciada com os grandes investimentos estatais da era Kennedy (seu governo tinha sido uma decepção total: quando o Brasil começou a imitar o exemplo americano, os EUA passaram a imitar as receitas fracassadas do Brasil e de outros “capitalismos estatizados”).
            Tendo contribuído para solucionar por meios pacíficos a crise do petróleo e os enfrentamentos bélicos do Oriente Médio (apoiando a criação de um Estado palestino laico e neutralizado militarmente, uma espécie de Uruguai da região), o Brasil se qualificou para ocupar o status de membro permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas, o primeiro país não nuclear a assim fazer. Exemplo de estabilidade econômica e de influência democrática e humanitária nos vizinhos e mesmo em direção do continente africano, o Brasil consegue suplantar a França e a Grã-Bretanha como provedor de assistência oficial ao desenvolvimento para muitos países africanos, a maior parte antigos “fornecedores” de escravos durante seu período colonial.
            Exemplo único de país alçado da condição de periférico ao status de grande potência mundial em pouco mais de duas décadas, o Brasil igualou seu potencial econômico ao da França e do Japão, superou a Itália e a Grã-Bretanha, e passou a discutir de igual para igual com os EUA, mesmo não sendo detentor de armas atômicas. No início dos anos 1980, quando já eram visíveis os sinais de derrocada do antigo sistema socialista, o Brasil tinha emergido como grande modelo bem sucedido de transição econômica do capitalismo estatal para a democracia burguesa e o capitalismo liberal.
No final dessa década, um líder operário saído da região mais atrasada do Brasil, consegue se eleger à presidência e dá continuidade aos esforços de modernização social e tecnológica do País. Pelos seus esforços em favor da integração do continente africano à economia mundial e como resultado dos grandes investimentos realizados na educação e saúde de vários povos africanos, ele ganha o Prêmio Nobel da paz.

Conclusão: a história virtual não se faz apenas com batalhas e tragédias…

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 29 de novembro de 2007 



[1] Ver Niall Ferguson, “Introduction, Virtual History: Towards a ‘chaotic’ theory of the past” in Niall Ferguson (ed.), Virtual History: Alternatives and Counterfactuals (New York: Basic Books, 1997), pp. 1-90, cf. p. 2.
[2] Cf. R. W. Fogel, “The New Economic History: its findings and methods” in Fritz Stern (ed.), The Varieties of History: From Voltaire to the Present (New York: Vintage Books, 1973), pp. 456-473.

A arte de ser contrarianista - Paulo Roberto de Almeida (2007)

A gente vai redescobrindo coisas "do arco da velha".
Muitas são descartáveis, por conjunturais ou momentâneas, mas outras são permanentes, como esta aqui, por exemplo, de dez anos atrás:


A arte de ser contrarianista

Paulo Roberto de Almeida

Já me defini, em algum trabalho anterior, como um “contrarianista”, isto é, alguém que procura ver as “coisas da vida” com um olhar cético, sempre interrogando os fundamentos e as razões de por quê as coisas são daquele jeito e não de outro, ou de como elas poderiam ser ainda melhores do que são, aparentemente a um menor custo para a sociedade ou atendendo a critérios superiores de racionalidade e de instrumentalidade. Ou seja, em linguagem da economia política, o contrarianista é um indivíduo que está sempre procurando aumentar as externalidades positivas e diminuir as negativas, sempre efetuando cálculos de custo-oportunidade do capital empregado, sobre o retorno mais eficiente possível, adequando os meios disponíveis ao princípio da escassez.
O contrarianista não é, a despeito do que muitos possam pensar, um ser que sempre é “do contra”, um caráter negativo ou pessimista. Ao contrário, trata-se, para ele, de buscar otimizar os recursos existentes, indagando continuamente como fazer melhor, eventualmente mais barato, com os parcos meios existentes. Esta é a minha concepção do contrarianismo, uma arte difícil de ser exercitada, mais difícil ainda de ser compreendida. Eu a definiria, segundo uma lição que aprendi ainda na adolescência, como um exercício de “ceticismo sadio”, ou seja, o espírito crítico que não se compraz, simplesmente, em negar as “coisas” como elas são, mas que se esforça, em toda boa vontade, para que elas sejam ainda melhores do que são, questionando sua forma de ser atual e propondo uma organização que possa ser ainda mais funcional do que a existente.
Por isso mesmo, pretendo, neste curto ensaio, tecer algumas considerações sobre a arte de ser contrarianista, o que, confesso, não é fácil. Sempre nos arriscamos a ser incompreendidos, em aparecer como puramente negativos ou derrotistas, quando o que se busca, na verdade, é reduzir o custo das soluções “humanamente produzidas” (elas sempre são falhas). Talvez, a melhor forma de se demonstrar, na prática, a arte do contrarianismo, seria elaborar uma série de manuais de sentido contrário, isto é, em lugar dos How to do something, escrever sobre “como não fazer” determinadas coisas. Como eu exercito muito freqüentemente a resenha de livros, creio que não seria difícil oferecer algumas observações sobre essa prática corriqueira da vida cotidiana. Aliás, já o fiz, num dos primeiros posts de meu blog “Book reviews” dedicado aos livros, post nº 2, “A arte da resenha” (link: http://praresenhas.blogspot.com/2006/01/02-arte-da-resenha.html).
Existem, de fato, muitos manuais e guias sobre a arte ou a maneira de se fazer isto ou aquilo, sendo os mais conhecidos, justamente, aqueles americanos que seguem as regras usuais do gênero “how to do this or that...”. Aperfeiçoando o gênero surgiram os “beginners’ guide to...” e os “idiot’s guide for...”. Antes dessa era de proliferação infernal de guias para todos os idiotas existentes, eu cheguei a consultar, quando estava elaborando a minha tese de doutoramento, um guia de um desses americanos do self-help, que se chamava, exatamente, How to complete, and survive... a doctoral dissertation: foi útil, confesso, ao menos em diminuir o stress com os ciclos ascendentes (eufóricos) e descendentes (que podem ser depressivos, para alguns candidatos) do longo périplo na direção do final da tese.  Talvez, um dia, eu faça um manual sobre “Como não exercer a diplomacia”, para o que eu mesmo teria muito material primário – autoproduzido – a ser processado e apresentado a eventuais candidatos e outros incautos da profissão.
Esperando que este dia chegue, vejamos quais poderiam ser algumas regras simples do contrarianista profissional, aquele que leva esse método a sério, considera o exercício válido do ponto de vista das best practices e pretende aperfeiçoar os procedimentos e instrumentos para elevar essa prática ao estado de “arte”, se ela já não o é. Uma simples listagem, a ser detalhada em trabalhos posteriores, poderia compreender os seguintes pontos:

1) Questione as origens:
Toda vez que for apresentado a um novo problema, ou uma questão não corriqueira, veja se consegue detectar as origens daquele problema, por que ele surgiu dessa forma neste momento e neste local. Saber a etiologia de algum fenômeno, assim como saber a etimologia das palavras, sempre ajuda a detectar as razões de sua irrupção num dado contexto em que você é chamado a intervir. As origens e fundamentos de um processo qualquer podem contribuir para determinar seu possível desenvolvimento e eventual itinerário. É assim que procedem os epidemiologistas e, creio também, os linguistas, sempre preocupados em detectar os mecanismos fundamentais de criação de um fenômeno ou processo. Portanto, não tenha medo em perguntar: “de onde surgiu isso?; como é que isso veio parar aqui?; qual é a origem desse treco?”. Pode ajudar um bocado.

2) Determine se o que está sendo apresentado é realmente a essência da coisa:
Muitas vezes somos enganados pelas aparências, como já dizia um velho humorista. As coisas podem ter mais de uma dimensão – usualmente três, mas alguns apostam em dimensões “desconhecidas” – ou em todo caso todos os lados e facetas daquele problema podem não estar imediatamente visíveis ou serem perceptíveis da posição na qual você se encontra. Por isso, não hesite em fazer como Aristóteles e ir buscar a essência da coisa, sua natureza real. Na maior parte das vezes não é preciso bisturi ou serrote, apens um pouco de reflexão ou de exame mais acurado do que lhe é apresentado. Antes de qualquer pronunciamento, vire a coisa pelo avesso...

3) Pergunte por que aqui e agora?:
As coisas não surgem do nada, está claro, e, justamente, nos assuntos da alta política, da economia ou da diplomacia, elas deitam raízes lá atrás, em movimentos tectônicos que talvez tenham passado despercebidos aos contemporâneos, mas que já se moviam na direção que vieram a assumir na atualidade. O fato de estarem sendo colocadas na agenda neste momento significa que seu movimento natural as trouxe à superfície ou que alguém tenha interesse em que essas coisas sejam agora tramitadas e eventualmente resolvidas. Examine o contexto da “aparição”, determine as condições sob as quais elas estão sendo apresentadas e prepare-se para interrogar, você mesmo, as coisas surgidas na agenda. Essas medidas de caução são sempre importantes para evitar alguma reação precipitada ou incontornável, que possa comprometer seus próximos passos no tratamento dessas coisas.

4) Examine e avalie, preventivamente, todas as opções disponíveis:
Nunca existe uma única solução para qualquer problema humanamente concebível. Os problemas podem ser encaminhados por diferentes vias, seja quanto ao método (procedimentos), seja quanto à sua substância (a matéria em questão). As vias alternativas apresentam diferentes custos e produzem efeitos muito diversos, imediatos ou delongados. Sempre existe aquilo que os economistas chamam de trade-offs, isto é, uma maneira (supostamente racional) de se obter algo valioso cedendo alguma outra coisa, alegadamente menos importante para nós. O contrarianista pergunta, sempre, se a solução apresentada é a de menor custo possível, naquelas circunstâncias, e quais seriam os retornos esperados ou presumíveis da via adotada. Os custos devem sempre ser pesados em face dos ganhos esperados, ou de um emprego alternativo dos recursos disponíveis.
Por isso, é sempre recomendável fazer simulações, avaliar custos e oportunidades, enfim proceder de modo utilitário – como os velhos filósofos ingleses ensinaram –, afastando nossos preconceitos e as idées reçues. O instinto pode até ser bom conselheiro, mas isso só vale para pessoas anormalmente sapientes ou dotadas de muita experiência de vida. Os simples mortais, como a maioria de nós, precisam se basear em algum estudo acurado da situação para poder determinar, justamente, se a solução proposta deliver the best available outcome, ou retorno. Isso só pode ser determinado após exame do problema e determinação do menor sacrifício a ser concedido, um pouco como no jogo de xadrez (aliás, recomendável para contrarianistas de todo o gênero).

5) Uma vez determinada a “solução”, engaje-se no resultado, mas criticamente:
No curso da vida, como diria Benjamin Franklin, só existem duas coisas inevitáveis: a morte e os impostos. Mas, mesmo estes podem ser modificados, ainda que não, helàs, evitados. Por isso, em matérias humanas, cabe se engajar em todo e qualquer empreendimento com alguma porta de saída, ou via alternativa. Determinada the best option for this problem, caberia engajar-se resolutamente na sua consecução, e seguir atentamente o desenvolvimento dos procedimentos. As muitas variáveis que interferem num determinado problema nem sempre são absolutamente determinadas pelos parceiros no jogo, podendo haver interferências externas, circunstâncias fortuitas e eventos imprevisíveis que alteram o curso ou o resultado final. Por isso mesmo, se deve acompanhar qualquer problema com olho crítico, vigiando cada etapa do processo, para ver se cabe ainda manter as premissas originais e o investimento efetuado naquela solução.

6) Reconsidere todo o processo e pratique um pouco de história virtual:
Todos já leram, ou pelo menos já ouviram falar, de hipóteses não realizadas no curso real da história mas que teriam sido possíveis em outras circunstâncias: “o que teria acontecido se, em Waterloo, Napoleão não tivesse sido derrotado?”; e se Churchill isto e Hitler aquilo?, ou seja, o imponderável resumido na pergunta clássica da história virtual “What if?”. O contrarianista deve ser, antes de mais nada, um praticante da história virtual e considerar todos os outcomes possíveis num determinado processo, pois eles poderiam ter efetivamente ter acontecido.
Minha pergunta básica, para um exercício espiritual e prático de todos os contrarianistas aprendizes, para os candidatos a “céticos sadios”, seria esta: “por que o Brasil não é um país desenvolvido?” Respostas tentativas para o meu e-mail, por favor...

Brasília, 1717: 3 de fevereiro 2007, 4 p.; revisto em 6 de abril de 2007.

Cartas a um jovem diplomata: como seria se eu escrevesse um livro - Paulo Roberto de Almeida

Por acaso, respondendo hoje ao "enésimo" questionário submetido por jovens estudantes de relações internacionais, e supostamente candidatos à carreira diplomática, deparei-me com questões muito semelhantes às que venho encontrando anos a fio, desde muito tempo, submetidas por outras gerações de candidatos (possivelmente alguns já diplomatas atualmente, outros tendo enveredado por outras carreiras, profissões e trabalho nessa imensa área não especializada).
Assim, para não ficar repetindo o que eu já tinha respondido anos atrás, fui buscar o que eu já tinha feito anteriormente, numa lista muito incompleta de trabalhos descobertos, ou "redescobertos", entre eles este aqui, que reproduzo mais abaixo, pois jamais recebeu desenvolvimento textual (por falta de tempo e por falta de editora que o encomendasse).

1837. “Cartas a um Jovem Diplomata: conselhos a quem já se iniciou na carreira e dicas para quem pretende ser um dia”, Brasília, 17 novembro 2007, 1 p. Esquema de um novo livro, sobre a base do trabalho 800 (Novas Regras de Diplomacia). Nunca desenvolvido.

Pois bem, fica aqui exposto, aguardando desenvolvimento num futuro indefinido.
Paulo Roberto de Almeida 
Brasília, 19 de agosto de 2017


Cartas a um Jovem Diplomata

Conselhos a quem já se iniciou na carreira e dicas para quem pretende ser um dia



Paulo Roberto de Almeida




Esquema



Prefácio

1. Por que ser diplomata?

2. O que é um diplomata e o que faz, exatamente?

3. Conselhos a um jovem diplomata

1. Sirva à pátria, mais do que os governos, conheça profundamente os interesses permanentes da nação e do povo aos quais serve; tenha absolutamente claros quais são os grandes princípios de atuação do país a serviço do qual se encontra.

2. Tenha domínio total de cada assunto, dedique-se com afinco ao estudo dos assuntos de que esteja encarregado, aprofunde os temas em pesquisas paralelas.

3. Adote uma perspectiva histórica e estrutural de cada tema, situe-o no contexto próprio, mantenha independência de julgamento em relação às idéias recebidas e às “verdades reveladas”.

4. Empregue as armas da crítica ao considerar posições que devam ser adotadas por sua delegação; pratique um ceticismo sadio sobre prós e contras de determinadas posições; analise as posições “adversárias”, procurando colocá-las igualmente no contexto de quem as defende.

5. Dê preferência à substância sobre a forma, ao conteúdo sobre a roupagem, aos interesses econômicos concretos sobre disposições jurídico-abstratas.

6. Afaste ideologias ou interesses político-partidários das considerações relativas à política externa do país.

7. Antecipe ações e reações em um processo negociador, preveja caminhos de conciliação e soluções de compromisso, nunca tente derrotar completamente ou humilhar a parte adversa.

8. Seja eficiente na representação, conciso e preciso na informação, objetivo na negociação.

9. Valorize a carreira diplomática sem ser carreirista, seja membro da corporação sem ser corporatista, não torne absolutas as regras hierárquicas, que não podem obstaculizar a defesa de posições bem fundamentadas.

10. Não faça da diplomacia o foco exclusivo de suas atividades intelectuais e profissionais, pratique alguma outra atividade enriquecedora do espírito ou do físico, não coloque a carreira absolutamente à frente de sua família e dos amigos.

4. Como se tornar um diplomata



 Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 17 novembro 2007

Políticas Comerciais da Administração Trump: Mark Langevin, IPRI (24/08, 15h30)

Convite para a Mesa-Redonda "Políticas Comerciais da Administração Trump: Situação Atual e Perspectivas"  
Prezado (a) Senhor (a),

1. Gostaria de convidá-lo (a) para a Mesa-Redonda "Políticas Comerciais da Administração Trump: Situação Atual e Perspectivas" na quinta-feira 24/08 às 15h30 no auditório Paulo Nogueira Batista, no anexo II do Ministério das Relações Exteriores.

2. A primeira palestra é do professor Mark Langevin, da Universidade George Washington, à qual se seguirão intervenções do Diretor do Departamento dos Estados Unidos, Canadá e Assuntos Interamericanos, Ministro Ernesto Fraga de Araújo, e do Diretor do Departamento Econômico, Ministro Pedro Miguel da Costa e Silva. Após isso, o debate será aberto aos demais participantes. O evento será em português, mas os membros da mesa poderão também responder a perguntas em inglês.

3. Professor da Elliott School of International Affairs da Universidade George Washington, Mark Langevin leciona também em universidades brasileiras, como convidado. Ele tem diversos estudos sobre setores como agricultura e energia, bem como sobre contenciosos comerciais e relações Brasil-Estados Unidos. Suas publicações estão disponíveis clicando aqui.

4. As vagas são limitadas. Inscrições devem ser feitas no website oficial da FUNAG.

sexta-feira, 18 de agosto de 2017

O "milagre" de Hong-Kong e o seu autor - livro biografia sobre John Cowperthwaite

Na verdade, não tem nenhum milagre. Apenas Adam Smith aplicado na prática, e constantemente.
Muito tempos antes que o World Economic Forum ou o Insead, ou a Heritage Foundation e o Fraser Institute, começassem a fazer os seus rankings e classificações de liberdade econômica, de competitividade, de bom ambiente para negócios, Milton Friedman já tinha detectado o sucesso que era e estava se tornando Hong Kong, um monte de pedras, algumas ilhas, que não tinham absolutamente nada em cima, a não ser uma boa localização no sul da China, perto do enclave português, bem mais antigo, que era Macau.
Pois bem: depois que a colônia inglesa (que tinha sido atribuída à Grã Bretanha por cem anos, de acordo com os tratados desiguais do século XIX) foi libertada da dominação japonesa ao final da Segunda Guerra -- um dos que ficaram presos ali foi o militar Charles Boxer, futuro historiador do império marítimo português -- sua renda per capita era menos da metade da renda per capita da metrópole. Bem antes da colônia ser devolvida à China, a renda já tinha ultrapassado a da metrópole, e atualmente é mais de 30% superior, e isso a despeito, desde os anos 1950 (pós-revolução comunista no continente), de um afluxo constante de refugiados e emigrados de várias partes da Ásia, buscando simplesmente liberdade para empreender, pessoas miseráveis, chegando sem qualquer pertence, muitas delas dormindo em cortiços na cidade (que ainda existem) ou em sampans no rio ou na sua embocadura. São essas pessoas miseráveis que criaram a riqueza de Hong Kong, como aliás dizia Adam Smith, seguida pelo administrador inglês da colônia, o homem que criou a sua prosperidade, e que é objeto desta biografia resenhada nesta matéria.
O que dizia Adam Smith, além da sua famosa frase sobre a "mão invisível", que muitos equivocadamente elevam à condição de teoria, quando é uma simpes imagem. Adam Smith disse o seguinte:

Little else is requisite to carry a state to the highest degree of opulence from the lowest barbarism, but peace, easy taxes, and a tolerable administration of justice; all the rest being brought about by the natural course of things. All governments which thwart this natural course, which force things into another channel, or which endeavor to arrest the progress of society at a particular point, are unnatural, and to support themselves are obliged to be oppressive and tyrannical.

E não venham me dizer que esses princípios só se aplicam em situações especiais, em países pequenos, em cidades-Estado, como Cingapura e Hong-Kong, justamente.
Não: princípios de governo se aplicam em quaisquer circunstâncias, qualquer que seja o tamanho do país, por mais pobre que ele seja. O Brasil podia aprender com isso.
Elementar, não é?

Paulo Roberto de Almeida​
Brasília, 18 de agosto de 2017


The man behind the Hong Kong miracle



I have just finished reading Neil Monnery’s new book, Architect of Prosperity: Sir John Cowperthwaite and the Making of Hong Kong. This fascinating account of the rise of Hong Kong as a global economic powerhouse is well written and, as such, easy to read and understand. I’m happy to recommend it wholeheartedly to CapX’s discerning readership.
I first became interested in the story of Hong Kong in the late 1990s. The emotional handover of the colony from the United Kingdom to China, for example, is deeply impressed on my memory. But also, as part of my doctoral research at the University of St Andrews, I read a number of essays about the rise of Hong Kong written by the Nobel Prize-winning economist Milton Friedman. Friedman, an advocate of the free market and small government, believed that individuals, when left unmolested, will strive to improve their lives and those of their families. Prosperity will follow.
His was similar to Adam Smith’s insight:
“Little else is requisite to carry a state to the highest degree of opulence from the lowest barbarism, but peace, easy taxes, and a tolerable administration of justice; all the rest being brought about by the natural course of things. All governments which thwart this natural course, which force things into another channel, or which endeavor to arrest the progress of society at a particular point, are unnatural, and to support themselves are obliged to be oppressive and tyrannical.”
No country in modern history has come as close to Smith’s ideal as Hong Kong. The territory that the British Foreign Secretary Viscount Palmerston described as “a barren island with hardly a house upon it” was once very poor. In the immediate aftermath of World War II and Japanese occupation, its per capita income was about a third of that in the United Kingdom.
By the time British colonial rule ended, Hong Kong was 10 per cent richer than the mother country. Last year, the former colony was 37 per cent richer than the UK. It is, therefore, apposite that the man credited with Hong Kong’s success should be a Scottish civil servant, a University of St Andrews alumnus, and a devotee of Adam Smith: Sir John Cowperthwaite.
As Monnery explains, Cowperthwaite was not the first small government advocate to oversee the colony’s economy and finances. A succession of colonial governors and their financial secretaries ran a shoe string government. But, they did so out of financial necessity, rather than deep ideological commitment to small government.
As Financial Secretaries, Geoffrey Fellows (1945-1951) and Arthur Clarke (1951-1961) established a regime of low taxes and budgetary surpluses, and free flow of good and capital. To those foundations, Cowperthwaite (1961-1971) added not only the vigour of his convictions, but also a handpicked successor, Philip Haddon-Cave (1971-1981). By the time Haddon-Cave departed, the success of Hong Kong’s experiment with small government was undeniable not only to the British, but also to the Chinese. Margaret Thatcher embarked on her journey to dismantle British socialism in 1979, while Deng Xiaoping started undoing the damage caused by Chinese communism in 1978.


And that brings me to the most important reason why Cowperthwaite, rather than Fellows and Clarke, deserve to be credited with the rise of Hong Kong. Basically, he was the right man at the right place in the right time – the 1960s. It was all well and good to run a small government when the colony was still poor. By the 1960s, however, the colony was prospering and demands for higher government spending (as a proportion of GDP) were increasing. As an aside, the government’s nominal spending increased each year in tandem with economic growth. To make matters much worse, socialism, be it in its Soviet form (i.e., central planning) or in its more benign British form (state ownership of the commanding heights of the economy) was ascendant.
In fact, just before departing from Hong Kong, Clarke appears to have had a sudden crisis of confidence in the colony’s economic model, noting:
“We have, I think, come to a turning point in our financial history … There seem to be two courses we can follow. We can carry on as we are doing … Or we can do something to plan our economy … Which course should we adopt?”
Mercifully, Cowperthwaite was able to articulate the reasons for staying the course. In his early budget debates, he noted:
“I now come to the more general and far-reaching suggestion made by Mr Barton and Mr Knowles, that is, the need to plan our economic future and in particular, the desirability of a five-year plan. I would like to say a few words about some of the principles involved in the question of planning the overall economic development of the colony.
“I must, I am afraid, begin by expressing my deep-seated dislike and distrust of anything of this sort in Hong Kong. Official opposition to overall economic planning and planning controls has been characterised in a recent editorial as ‘Papa knows best.’ But it is precisely because Papa does not know best that I believe that Government should not presume to tell any businessman or industrialist what he should or should not do, far less what he may or may not do; and no matter how it may be dressed up that is what planning is.”
And:
“An economy can be planned, I will not say how effectively, when there unused resources and a finite, captive, domestic market, that is, when there is a possibility of control of both production and consumption, of both supply and demand. These are not our circumstances; control of these factors lies outside our borders. For us a multiplicity of individual decisions by businessmen and industrialists will still, I am convinced, produce a better and wiser result than a single decision by a Government or by a board with its inevitably limited knowledge of the myriad factors involved, and its inflexibility.


“Over a wide field of our economy it is still the better course to rely on the nineteenth century’s ‘hidden hand’ than to thrust clumsy bureaucratic fingers into its sensitive mechanism. In particular, we cannot afford to damage its mainspring, freedom of competitive enterprise.”
It is not clear whether Cowperthwaite ever read Friedrich Hayek’s 1945 essay, “The Use of Knowledge in Society”, which posits that allocation “of scarce resources requires knowledge dispersed among many people, with no individual or group of experts capable of acquiring it all”, or whether he came to the same conclusions as the Austrian Nobel Prize-winning economist on his own. But, even if he were consciously or sub-consciously influenced by Hayek, it speaks much of Cowperthwaite “the thinker” that he took Hayek’s insights to heart, unlike so many decision-makers around the world, who succumbed to the Siren calls of socialism.
And so it was with considerable amazement that, towards the end of my first year at St Andrews, I discovered Cowperthwaite and I were neighbours. His house on 25 South Street was a few hundred feet away from Deans Court, the University’s post-graduate student residence. I immediately wrote to him and he responded, asking me to come for tea. I spent a wonderful afternoon in his presence and kept in touch with him during my remaining time at St Andrews.
Last time I saw him, he came to the launch of the libertarian student magazine Catallaxy, which my friend, Alex Singleton, and I wrote together. As he took his leave, I saw him walk down Market Street and got a distinct feeling that it would be for the last time. Shortly after I graduated and moved to Washington. A new life and new job took precedence and St Andrews slowly receded down memory lane.
Neil Monnery’s book made those wonderful memories come alive again. His work has immortalised a man to whom so many owe so much. Architect of Prosperity is an economic and intellectual history. Above all, it is a tribute to a principled, self-effacing, consequential and deeply moral man. Monnery deserves our gratitude for writing it.
Marian Tupy is Editor of HumanProgress.org and a senior policy analyst at the Center for Global Liberty and Prosperity

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