O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

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segunda-feira, 29 de abril de 2019

Uma lágrima para Georges Couffignal - IHEAL (Paris Sorbonne)

Georges Couffignal foi o professor francês quem primeiro publicou um trabalho meu sobre o Mercosul em uma obra coletiva editada por ele, embora em espanhol, não em francês.
Depois recebeu a mim e Carmen Lícia para jantar em sua residência, nos subúrbios de Paris, quando eu estava dando aulas no Instituto que ele presidia, o IHEAL, vinculado à Sorbonne (Paris III), em 2012. Tínhamos diferenças, pois ele julgava positivamente os experimentos altamente controversos de Hugo Chávez na Venezuela, e se mostrou contrio ao ingresso da Turquia na UE, quando eu sempre julguei que esse seria um evento histórico, capaz de encerrar definitivamente a batalha de Lepanto.
Mas era um grande professor, amigo da América Latina, e um grande mestre.
Saudades...
Paulo Roberto de Almeida


C’est avec une infinie tristesse que toute l’équipe de l’IHEAL et du CREDA a appris le décès de Georges Couffignal le dimanche 28 avril 2019.

Professeur de science politique à la Sorbonne Nouvelle entre 1994 et 2013, Georges Couffignal était un connaisseur subtil des systèmes politiques latino-américains et a formé des générations d’étudiants avec une passion, une bienveillance et un goût pour la transmission des savoirs qui ne se sont jamais démentis. Directeur de l’IHEAL à deux reprises, il a été un grand serviteur du service public de l’enseignement supérieur et a joué un rôle déterminant dans la consolidation institutionnelle du latino-américanisme en France. Directeur de l’Institut Français d’Amérique latine à Mexico entre 1982 et 1986 puis Conseiller de coopération et d’action culturelle à Santiago du Chili entre 2001 et 2005, il a aussi été un acteur majeur des relations universitaires entre la France et l’Amérique latine. Paru en 2013, son dernier livre intitulé La nouvelle Amérique latine, laboratoire politique de l’Occident (Presses de Sciences Po) a été traduit en espagnol en 2015 (Santiago du Chili, LOM Ediciones). 

Les personnels enseignants et administratifs de l’IHEAL et du CREDA, ainsi que l’ensemble de la communauté étudiante, s’associent à la douleur de son épouse Carmen et de ses trois enfants. Un hommage sera rendu à Georges Couffignal à l’IHEAL dans les semaines qui viennent.

IHEAL-CREDA
28 rue Saint-Guillaume 
75007 Paris

domingo, 28 de abril de 2019

Psicopatas: desvendando os fundamentos

Bom saber, o que não nos previne de efeitos indesejáveis, caso alguns ultrapassem a barreira da política... (Paulo Almeida)

Inteligência do psicopata é uma mentira, diz neurocientista

Neurocientista explica que psicopatas não são inteligentes e bem sucedidos como mostram os filmes

Ilustração do computador de uma rede neural dos cérebros quebrados representada por linhas e por pontos. Algumas áreas não estão conectadas, descrevendo demência e doença de Alzheimer.
Rio de Janeiro — O neurocientista Ricardo Oliveira da UniRio e do Instituto D’Or é um especialista na mente dos psicopatas. A ausência das chamadas emoções morais (a culpa e a pena) é a principal característica dos psicopatas. Mas, garante, ao contrário do que mostram muitos filmes, os psicopatas não são especialmente inteligentes. “Isso não é verdade”, disse, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo. “Uma minoria pequeníssima é inteligente, mas são esses que sobressaem.”
O distúrbio afeta 3% dos homens e menos de 1% das mulheres. Oliveira fala nesta sexta-feira, 26, sobre o tema na Rio2C, a conferência sobre inovação na Cidade das Artes, na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio.

Como definir um psicopata?
É uma coleção de achados. Entre os mais importantes estão a redução ou ausência das emoções morais – que são, essencialmente, a culpa e a pena, que formam a base da moral. Depois temos algumas outras características, mas que podem variar muito de pessoa para pessoa. Mentiras repetidas, a incapacidade de manter ocupações regulares (como escola e trabalho). Mas é importante deixar claro o seguinte: é preciso ter muito cuidado com isso, ou qualquer desafeto passa a ser um “psicopata”. A psicopatia é um diagnóstico altamente técnico, não é intuitivo.
A psicopatia pode ser classificada como uma doença?
Depende de como você define doença. Num sentido estritamente médico, como falamos de pneumonia, meningite, não é uma doença. O que chamamos de doenças mentais, como esquizofrenia e depressão, são distúrbios pontuais. No caso da psicopatia, é um distúrbio de personalidade, não algo pontual. Agora, se consideramos a doença como uma condição biológica que te deixa em desvantagem, aí podemos dizer que sim, é uma doença.
Tem tratamento?
Não, não tem. Houve algumas tentativas, mas nada consistente. Mas há um outro grupo, o dos sociopatas, que é composto por indivíduos antissociais, mas que não têm a frieza, a ausência de emoções morais dos psicopatas, ou seja, não são casos tão graves.
Os psicopatas são inteligentes?
Isso é mentira. Existe essa mística de que o psicopata é inteligente. Mas não é verdade. A grande maioria é mau aluno, tem uma carreira acadêmica precária, briga com todo mundo, não consegue parar em nenhum emprego. Os psicopatas institucionais, os de colarinho branco, podem ficar alguns anos no topo, mas acabam caindo por causa do distúrbio. Ele dá tanto golpe que acaba sendo pego.
A psicopatia, ou essa ausência das emoções morais, tem uma origem genética?
As emoções são criadas no cérebro, mas existe um determinismo genético sim, de mais de 60%. Da mesma forma que a variação de altura, da cor dos olhos, da cor da pele, a gente sabe hoje que as coisas psíquicas têm uma contribuição genética muito forte.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

O governo obscurantista e as humanidades - manifesto de protesto

Manifesto é sempre de protesto: desculpem a redundância.
Mas, aproveito para sugerir que, como o seu ex-contraparte japonês, o atual ministro brasilero da (des)educação também apresente a sua renúncia.
Mais, aquele subsofista da Virgínia, que seus devotos seguidores acham que é filósofo, poderia vir em apoio dos cursos de filosofia, ou ele também é contra, porque não fez nenhum e nunca poderia dar aulas numa faculdade, de qualquer cousa?
Paulo Roberto de Almeida

NOTA DE REPÚDIO A DECLARAÇÕES DO MINISTRO DA EDUCAÇÃO E DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA SOBRE AS FACULDADES DE HUMANIDADES, NOMEADAMENTE FILOSOFIA E SOCIOLOGIA
A Associação Nacional de Pós-graduação em Filosofia (ANPOF) e associações abaixo mencionadas repudiam veementemente as falas recentes do atual presidente da república e de seu ministro da educação sobre o ensino e a pesquisa na área de humanidades, especificamente em filosofia e sociologia.
As declarações do ministro e do presidente revelam ignorância sobre os estudos na área, sobre sua relevância, seus custos, seu público e ainda sobre a natureza da universidade. Esta ignorância, relevável no público em geral, é inadmissível em pessoas que ocupam por um tempo determinado funções públicas tão importantes para a formação escolar e universitária, para a pesquisa acadêmica em geral e para o futuro de nosso país.
O ministro Abraham Weintraub afirmou que retirará recursos das faculdades de Filosofia e de Sociologia, que seriam cursos “para pessoas já muito ricas, de elite”, para investir “em faculdades que geram retorno de fato: enfermagem, veterinária, engenharia e medicina”. O ministro apoia sua declaração na informação de que o Japão estaria fazendo um movimento desta natureza.
De fato, em junho de 2015 o Ministério da Educação, Cultura, Esportes, Ciência e Tecnologia do Japão enviou carta às universidades japonesas recomendando que fossem priorizadas áreas estratégicas e que fossem cortados investimentos nas áreas de humanidades e ciências sociais.
Após forte reação das principais universidades do país, incluindo as de Tóquio e de Kyoto (as únicas do país entre as cem melhores do mundo), e também da Keidanren (a Federação das Indústrias do Japão) – que defendeu que “estudantes universitários devem adquirir um entendimento especializado no seu campo de conhecimento e, de forma igualmente importante, cultivar um entendimento da diversidade social e cultural através de aprendizados e experiências de diferentes tipos” – o governo recuou e afirmou que foi mal interpretado.
A proposta foi inteiramente abandonada quando o ministro da educação teve de renunciar ao cargo, ainda em 2015, por suspeita de corrupção. Da forma como o ministro Abraham Weintraub apresenta o caso trata-se, portanto, de uma notícia falsa.
O ministro foi seguido pelo presidente, que mencionou que o governo “descentralizará investimentos em faculdades de filosofia”, sem especificar o que isto significaria, mas deixando claro que se trata de abandonar o suporte público a cursos da área de humanidades, nomeadamente os de Filosofia e de Sociologia. O presidente indica que investimentos nestes cursos são um desrespeito ao dinheiro do contribuinte e, ao contrário do que pensa a Federação das Indústrias do Japão, afirma que a função da formação é ensinar a ler, escrever, fazer conta e aprender um ofício que gere renda.
O ministro e o presidente ignoram a natureza dos conhecimentos da área de humanidades e exibem uma visão tacanha de formação ao supor que enfermeiros, médicos veterinários, engenheiros e médicos não tenham de aprender sobre seu próprio contexto social nem sobre ética, por exemplo, para tomar decisões adequadas e moralmente justificadas em seu campo de atuação. Ignoram que os estudantes das universidades públicas, e principalmente na área de humanidades, são predominantemente provenientes das camadas de mais baixa renda da população. Ignoram, por fim, a autonomia universitária, garantida constitucionalmente, quando sugerem o fechamento arbitrário de cursos de graduação.
Uma das maiores contribuições dos cursos de humanidades é justamente o combate sistemático a visões tacanhas da realidade, provocando para a reflexão e para a pluralidade de perspectivas, indispensáveis ao desenvolvimento cultural e social e à construção de sociedades mais justas e criativas.
Seguiremos combatendo diuturnamente os ataques à universidade pública e aos cursos de humanidades movidos pelo ressentimento, pela ignorância e pelo obscurantismo, também porque julgamos que esta é uma contribuição maiúscula da área de humanidades para o melhoramento da sociedade à nossa volta.
Associação Brasileira de Ensino de Ciências Sociais (ABECS)
Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia (ANPEGE)
Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional (ANPUR)
Sociedade Brasileira de Estudos de Cinema e Audiovisual (SOCINE)
Sociedade Brasileira de História da Educação (SBHE)
Sociedade Brasileira de História da Ciência (SBHC)
Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd)
Associação Brasileira de Estudos Sociais das Ciências e das Tecnologias (ESOCITE)
União Latina de Economia Política da Informação, da Comunicação e da Cultura (Ulepicc-Brasil)
Associação Nacional de História  (ANPUH)
Centro de Investigaciones Filosóficas (CIF/Argentina)
Sociedade Brasileira de Psicologia (SBP)
Fórum Nacional de Diretores de Faculdades, Centros de Educação ou Equivalentes das Universidades Públicas Brasileiras (FORUMDIR)
ODARA - Grupo Interdisciplinar de Pesquisa em Cultura, Identidade e Diversidade
Associação Brasileira de Antropologia (ABA)
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes)
Associação Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências (ABRAPEC)
Associação Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo (SBPJOR)
Associação Brasileira de História das Religiões (ABHR)
Asociación Costarricense de Filosofía (Acofi)
Associação Brasileira de Psicologia Política (ABPP)
Sociedade Brasileira de Ensino de Química (SBEnQ)
Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (Anfope)
Associação dos Professores da UDESC (Aprudesc - ANDES-SN)
Fórum Nacional dos Coordenadores Institucionais do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (FORPIBID)
Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Música (ANPPOM)
Associação Brasileira de Estudos Populacionais (ABEP)
Asociación Filosófica Argentina (AFRA)
Associação Brasileira de Ensino de Biologia (SBEnBio)
Fórum de Ciências Humanas, Sociais, Sociais Aplicadas, Letras e Artes (FCHSSALA)
Associação Brasileira de Economistas pela Democracia (ABED)
Associação Brasileira de Educação Musical (ABEM)

BRICS: uma agenda ainda indefinida (DCI)

Política externa deve afastar País do BRICS

Sem sinalizações claras sobre as intenções brasileiras com os emergentes e as falas contraditórias entre os ministros de Bolsonaro podem distanciar Brasil da China

A aproximação do presidente Jair Bolsonaro com os Estados Unidos e a indicação de entrada do Brasil na Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômico (OCDE) desalinham o País do BRICS e podem impactar nas relações com os parceiros do grupo. 
A principal preocupação, nesse cenário, seria um maior distanciamento da China ante uma possível resolução da guerra comercial entre o país asiático e os Estados Unidos. A solução do conflito – que já se desenrola desde 2018 – viria de uma redução nas medidas protecionistas de Donald Trump (presidente dos EUA) e de um consequente acordo sobre as taxas de importações entre os dois países. Com isso, a China – que é o maior parceiro comercial brasileiro – voltaria a transacionar produtos agropecuários com a potência norte-americana e diminuiria sua demanda pelos nossos produtos.
De acordo com o professor do curso de relações internacionais da Faculdade Armando Álvares Penteado (FAAP) Vinicius Rodrigues Vieira, ainda que o BRICS não seja um grupo institucionalizado, a postura de Bolsonaro se distancia ideologicamente dos países emergentes.
“Não há um discurso claro do governo sobre como nossa relação com os BRICS se dará nessa gestão, mas nos mantermos no grupo e próximos da China é uma questão de sobrevivência. Até agora, no entanto, o Brasil não está agindo estrategicamente de forma a maximizar seus ganhos num ambiente de fim da guerra comercial”, avalia. 
Ele explica que a ideia, nesse sentido, é que o País utilizasse da maior aproximação com o país asiático ante o conflito comercial para conseguir barganhar algo em relação à exportação de nossos produtos agrícolas, por exemplo. 
“Nós não sabemos aproveitar o BRICS como deveríamos. E tanto a proximidade do Bolsonaro com os EUA como o pleito de entrada na OCDE indicam que embora o Brasil possa continuar formalmente associado, ele não está mais alinhado com o grupo”, diz.
Segundo os dados do Indicador do Comércio Exterior (Icomex), divulgado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) a China corresponde por mais de um quarto de participação no total de exportações brasileiras. A soja, principal produto vendido para o país asiático, corresponde por mais de 20% do total exportado.
Os especialistas reiteram, no entanto, que mesmo sem sinalizações claras do relacionamento com os BRICS, deixar o grupo político é inviável para o Brasil, uma vez que uma das principais fontes de crédito internacional para o País é o Novo Banco de Desenvolvimento, também conhecido como Banco dos BRICS.
A instituição – que serve como uma alternativa ao Fundo Monetário Internacional (FMI) e ao Banco Mundial – também foi desenhada para promover uma maior cooperação financeira entre os cinco mercados emergentes do grupo.
“Além disso, já temos muitos projetos no Pará e no Maranhão, por exemplo, que são do interesse do agronegócio e, consequentemente, relevantes para o governo Bolsonaro. O investimento vindo do Banco dos BRICS é importante e essa é uma premissa que nos permite dizer que o Brasil continuará associado. Só resta saber se haverá mais entusiasmo com o grupo do que temos visto até agora”, afirma Vieira. 
Ao mesmo tempo, a falta de alinhamento entre Paulo Guedes, ministro da Economia, e Ernesto Araújo, ministro de relações exteriores, também pode trazer alguns impasses internacionais.
“É um discurso confuso e inconsistente porque a postura antiglobalização de Araújo vai contra até mesmo a liberação econômica que Guedes tem proposto. Não dá para imaginar um governo patriota e nacionalista que tem que crescer sem uma noção de comércio internacional. Os BRICS são parceiros estratégicos importantes e dependemos deles”, explica o professor da Pontifícia Universidade Católica, Roland Veras Saldanha Junior. 
Soma-se a isso a má articulação política demonstrada até agora e as dificuldades do governo em passar rapidamente reformas estruturais importantes para o desempenho econômico brasileiro, que também “prejudicam a percepção do mundo sobre o País”, avaliam os especialistas.
“A percepção do Bolsonaro num cenário internacional é negativa, principalmente devido às declarações anteriores a sua posse. E embora ele já tenha moderado o discurso, isso continua um fardo que temos que carregar”, opina Vieira. 
Para Saldanha Junior, porém, mesmo que o Brasil receba retaliações internacionais nas esferas diplomáticas, “essas manifestações não trazem reflexos efetivos” na área de comércio exterior. “É preciso um certo tempo para conseguirmos abrir a nossa economia e forçar mais nossa inserção internacional, mas não demora muito para o presidente perceber que o Brasil é bem menor do que os Estados Unidos e não tem força para tentar mostrar independência e soberania”, diz o professor. 
Entrada na OCDE
Ele completa que, até lá, a ideia é a entrada do Brasil na OCDE seja levada a sério e traga, consigo, maior “disciplina” e menos afirmações contraditórias no governo.

Tragédias: o primeiro artigo de Armínio Fraga na FSP

Tragédias

Somos um país de renda média e também um dos mais desiguais, atrasado portanto

Entrego aqui o primeiro artigo para o espaço mensal que esta Folha acaba de me conceder e pelo qual sou grato. 

Temendo algum bloqueio, sentei para escrever na Sexta-Feira Santa. Naquele dia, no caderno Mercado, li uma matéria sobre a evolução da participação do nosso PIB no PIB mundial desde 1980: caiu de 4,4% para 2,5%. Se tivéssemos acompanhado a média do crescimento global, teríamos um PIB 76% maior. Imaginem só como seria. 
Com frequência se diz que o Brasil é a oitava economia do mundo. Tudo bem, não é de se jogar fora. Mas o que importa mesmo é a renda per capita, e aí caímos para a 75ª posição. Somos um país de renda média e também um dos mais desiguais, atrasado portanto. Refiro-me a dados do FMI e do Banco Mundial.
Estamos como na estorinha irlandesa: um viajante perdido no campo verde para na estrada e pergunta a um velho pastor como se chega a Dublin. Ele responde: "Não sei, mas não começaria aqui...".
Como não temos essa opção, nos resta por ora evitar problemas maiores e avançar onde der. Mas as pessoas estão descrentes de tudo e todos, e sentem que se exige mais sacrifício dos que menos podem, não sem razão. Quero discutir neste espaço como criar genuínas oportunidades para os que menos podem e como exigir dos que mais podem uma contribuição relevante. 
Um país atrasado em tese deveria ser capaz de acelerar seu crescimento investindo mais do que os avançados, especialmente em gente, e absorvendo melhores tecnologias e práticas. Não foi o que aconteceu aqui. Isso fica claro quando se compara a evolução da nossa renda per capita com a dos Estados Unidos. A comparação é deprimente: estamos em torno de 20% desde 1960.
Perdura uma certa nostalgia quanto ao período do pós-guerra, quando atingimos 29% da renda americana, mas se ignora que a estratégia adotada (economia fechada e estatizada) foi incapaz de nos levar até os padrões de vida dos avançados, por falhas fatais de desenho (fragilidade macroeconômica, descaso com educação e desigualdade). A economia acabou se espatifando na década perdida de 1981-1993, quando se devolveu boa parte dos ganhos auferidos desde 1960.
Verdade que desde então avançamos bastante com a estabilização e a mudança de foco do Estado a partir de 1995, mas aos poucos um bom caminho foi sendo abandonado. A partir de 2011, o intervencionismo e a radical perda de disciplina fiscal levaram a um novo colapso. Foi uma volta a erros do passado, amplamente apoiada pelo andar de cima. A queda na renda per capita repetiu os 10% da década perdida, desta vez em um terço do tempo. Voltamos aos 20% da renda americana de 1960.
Não fora suficiente a atual depressão econômica, metade das pessoas empregadas não tem carteira assinada e se aposenta mais tarde. A educação continua deficiente e metade das moradias não tem esgoto adequado. Não há solução para melhorar a vida de quem mora nas favelas e tampouco para a violência. E por aí vai.
E agora? Como construir um caminho para um desenvolvimento mais inclusivo, acelerado e sustentável? Estamos diante de múltiplas crises, que se reforçam, desafiam as instituições e ameaçam a qualidade da democracia. Difícil imaginar um caminho completo, coerente e viável a partir daqui. 
No momento a prioridade é a reforma da Previdência, passo crucial para sanar a crise fiscal e redutora ela própria de desigualdade. Urge também uma reforma do Estado, que precisa fazer mais com menos. Em ambos os casos as resistências já estão se armando. Como parte da resposta, urge também a eliminação dos subsídios e vantagens tributárias aos de renda mais alta, que envenenam o tecido social. Só assim as pessoas apoiarão as transformações necessárias.

28 de abril: dia mundial da educação (menos no Brasil)

O Uniceub (onde sou professor) me envia a seguinte mensagem, e eu fico me perguntando como é que nós fomos cair tão baixo em matéria de educação...
Paulo Roberto de Almeida
O Dia Internacional da Educação, celebrado em 28 de abril, traz à memória um importante acordo assinado pela grande maioria dos países que participaram do Fórum Mundial da Educação, ocorrido no ano de 2000 em Dakar, no Senegal. 
O encontro contou com a participação de 180 países, e 164 deles firmaram o compromisso de garantirem a educação básica e secundária para todas as crianças e jovens. À época, cerca de 20% da população adulta de todo o mundo ainda não sabia ler e escrever. Outro dado desanimador é que em 2000, 113 milhões de jovens não eram escolarizados, e destes, 110 milhões moravam em países em desenvolvimento. 
Foram estabelecidas no encontro 6 metas para a educação, nos quais os países que estavam participando concordaram em cumpri-las. 
A ONU apresentou relatório que apontou que, desde o Fórum Mundial da Educação, 34 milhões de crianças que não tinham acesso à educação básica passaram a frequentar escolas em todo o mundo. O resultado é considerado moderado, uma vez que 58 milhões ainda estão fora das escolas. 
Em 2015, durante o Fórum Mundial da Educação, em Seul, na Coreia, foi assinado um novo documento que dá continuidade ao Marco de Dakar com o prazo para cumprimento das metas até 2030. O Brasil é um dos países que assinaram esse acordo.

O desafio do movimento revolucionário-reacionário do olavismo-bolsonarismo - Augusto de Franco (Dagobah)

Um importante artigo, conceitual e de natureza tático-estratégica, sobre o movimento revolucionário-reacionário representado pelo olavismo-bolsonarismo. Ele não é tão desprovido de doutrina quanto parece: tem narrativa, tem estratégia, tem metas e objetivos, assim como métodos e ferramentas para alcançá-los, enfim representa um poderoso desafio ao caráter democrático (mas de baixíssima qualidade) de nosso sistema político. Ler, refletir e, portanto, levar a sério o movimento reacionário em curso. Não subestimem a capacidade dos atuais inimigos da democracia, ainda que eles sejam toscos, rústicos, intelectualmente medíocres e culturalmente paupérrimos, mas eles têm uma imensa sede de poder e nenhum escrúpulo.
Paulo Roberto de Almeida
Uberlândia, 28/04/2019

Está em curso, no Brasil, um movimento revolucionário (para trás) contra a democracia

Alguém tem de dizer o óbvio (que, frequentemente, não é percebido em toda sua crueza). Há em curso, no Brasil atual, um movimento revolucionário (para trás) contra a democracia. O próprio presidente, seus filhos, seu guru e seus sequazes alimentam, ostensiva ou ocultamente, esse movimento bolsonarista.
Isso não significa dizer que esse movimento vai prosperar, mas que há um movimento, há. Negar o que é evidente é sucumbir diante da ameaça. Para os democratas equivale a um suicídio político.
Vejamos agora as características desse movimento revolucionário (para trás) bolsonarista.
1 – Qual é a sua narrativa?
2 – Qual é a sua estratégia?
3 – Quem são os seus principais agentes?
4 – Como se configuraram as condições para que tal movimento vicejasse?
5 – Por que e como esse movimento ameaça a democracia?
6 – Qual deve ser a atitude dos democratas diante da revolução bolsonarista?
A NARRATIVA
A narrativa bolsonarista (na verdade, olavista) começou a ser formulada durante o processo de impeachment e foi estruturada e codificada durante a campanha eleitoral de 2018. O encadeamento da narrativa olavista-bolsonarista é tão simplório que acaba colando em mentes rudes e nas pessoas sem experiência política. Neste sentido, é uma boa narrativa do ponto de vista da propaganda. Ela pode ser resumida em 7 pontos (tal como formulada durante a campanha eleitoral):
1 – Os comunistas querem destruir a religião, a família, a nação, a pátria, enfim, a civilização ocidental cristã e seus valores (a ordem, a hierarquia, a disciplina, a obediência, o comando-e-controle, a fidelidade). Eles são o inimigo.
2 – Os comunistas dominaram o Brasil e ensejaram a corrupção. Os comunistas são corruptos e os corruptos são comunistas. Todos os políticos e os partidos da (falsa) democracia brasileira são comunistas-corruptos ou corruptos-comunistas. É tudo a mesma coisa.
3 – Só não vivemos numa ditadura comunista graças aos militares que fizeram a revolução redentora de 1964 (já na antessala da ditadura do proletariado que seria instalada pela esquerda). Houve uma guerra civil entre 1967 e 1977 que, felizmente, foi vencida pelos militares patriotas. Não houve ditadura militar: os militares fizeram uma intervenção saneadora atendendo ao clamor da maioria da população.
4 – Os comunistas assumiram o governo após o impeachment de Collor, colocaram no poder FHC (também comunista e corrupto) que, como um Kerenski brasileiro, preparou o caminho para a ascensão de Lula (outro comunista-corrupto). Neste período, a esquerda subsidiada, com o apoio da mídia comprada, satisfez os interesses da elite bilionária globalista e antinacional. Para tanto, desarmaram o povo, tentaram sexualizar e tirar a pureza de nossas crianças (induzindo-as para que elas sejam gays) e estimularam a bandidagem geral na sociedade (o objetivo principal dos comunistas-corruptos, não se pode esquecer, é destruir a civilização ocidental cristã).
5 – Os comunistas-corruptos continuaram organizados antes, durante e após o impeachment de Dilma. E querem voltar ao poder, seja por meio de alguém do PT, seja por meio dos demais candidatos do campo democrático, que são todos comunistas ou corruptos ou ligados à elite globalista: Álvaro, Alckmin, Amoedo, Marina ou Meirelles – todos são a mesma coisa. O único diferente, não-contaminado pela ideologia comunista ou globalista ou pela corrupção, o único verdadeiro patriota, é Bolsonaro.
6 – Eleger Bolsonaro em 2018 é a última chance de acabar com a patifaria dos políticos e botar ordem na casa. Só Bolsonaro pode fazer isso, evitando a volta dos esquerdistas. Do contrário os comunistas, globalistas e corruptos predominarão e acabaremos virando uma Venezuela ou coisa pior.
7 – Foram os mesmos comunistas e corruptos, a serviço das elites globalistas, os mandantes da facada contra Bolsonaro. Votar em Bolsonaro é votar contra os comunistas, globalistas e corruptos, que além de tudo são assassinos – tanto é assim que, diante do medo da vitória de Bolsonaro, não hesitaram em mandar esfaquear o único candidato honesto e patriota. São, aliás, os mesmos que estão planejando fraudar as eleições manipulando as urnas eletrônicas – único meio de impedir a vitória de Bolsonaro.
As respostas para tais alegações piradas já foram apresentadas no artigo A narrativa olavista-bolsonarista em 7 pontos.
Depois da campanha, com a vitória de Bolsonaro, a narrativa permaneceu basicamente a mesma, com pequenas adaptações e acréscimos:
8 – Toda a imprensa é comunista (é a “extrema-imprensa”) e ataca Bolsonaro, publica fake news para destruir seu governo, por ideologia e porque sabe que a fonte de recursos públicos vai secar.
9 – Articulação com partidos e parlamentares significa negociação espúria, velha política, troca de votos por cargos ou dinheiro.
10 – O Congresso ameaça não aprovar as reformas porque está querendo aprisionar Bolsonaro na sua dinâmica corrupta e enlameá-lo com a velha política do toma-lá-dá-cá.
11 – Os elementos do parlamento que se opõem a Bolsonaro devem ser denunciados, se possível perseguidos e processados pelos justiceiros lavajatistas (com o fim do foro privilegiado).
12 – O STF é a principal instituição que protege os comunistas-corruptos e, por isso, deve ser desmoralizado, neutralizado, reformado ou destruído.
A ESTRATÉGIA
Em primeiro lugar é preciso entender que o bolsonarismo é um populismo. A estratégia bolsonarista (quer dizer, olavista) só poderia ser uma estratégia populista, ainda que acentuadamente autoritária. O seu objetivo é tornar a nossa democracia menos liberal e, em seguida, pervertê-la de democracia eleitoral em autocracia eleitoral (ou seja, em um regime claramente i-liberal). O objetivo dos bolsonaristas nunca foi trocar de governo nos marcos da democracia realmente existente e sim operar uma mudança no regime político. Este é o propósito comum do populismo-autoritário que viceja em várias partes do mundo nesta segunda década do século 21.
Para tanto, tal como em outros países estão procedendo os populistas-autoritários, os bolsonaristas concorreram às eleições com o fito de eleger um líder capaz de estabelecer uma ligação direta com as massas, bypassando as mediações institucionais vigentes no Estado democrático de direito. A estratégia aposta na formação de uma vigorosa corrente de opinião pública capaz de reproduzir a narrativa bolsonarista (já exposta acima) e de dar apoio às mudanças que, gradualmente, serão capazes de alterar o DNA do regime democrático (transformando-o em uma democracia i-liberal e, em seguida, numa autocracia eleitoral).
Todavia, há um problema nessa estratégia. Esse processo gradual – de mudar progressivamente o regime (tornando-o i-liberal) a partir do governo, em vez de encetar um golpe de Estado em termos clássicos – leva tempo e seu caminhar é incerto diante da natural resistência das instituições democráticas (como o judiciário e a imprensa, por exemplo). Orban levou uma década para conseguir transformar a democracia eleitoral húngara em (quase uma) autocracia eleitoral. Erdogan levou também o mesmo tempo para dar uma guinada autoritária na Turquia (e ainda precisou inventar ou aproveitar um golpe fajuto ou fracassado). Na Polônia de Kaczynski e Duda e na Itália de Salvini e Di Maio, processos semelhantes que estão em curso vão igualmente demorar e não se sabe se e quando serão vitoriosos.
Ademais, as energias dispendidas para formar uma maioria ideologicamente alinhada – na sociedade e nas instituições – sem o que não se poderá alterar a natureza do regime, já que Bolsonaro e os demais bolsonaristas não têm, pelo menos inicialmente, o poder de desferir um golpe militar – prejudicam a governança, diminuindo a capacidade de governo. O governo, engalfinhado em disputas secundárias para a maioria da população, conquanto essenciais para coesionar uma legião de seguidores, não consegue dar respostas efetivas de curto prazo para problemas prementes (como baixo crescimento, desemprego e falta de boas políticas setoriais nas áreas de saúde, segurança, educação etc.). Dissipando forças em mil frentes de batalha, o governo tem dificuldade até mesmo de aprovar as reformas consabidamente necessárias (como a da Previdência, mas não só). E na medida em que não dá solução para os problemas reais, o governo tende a perder popularidade, elemento indispensável na estratégia do curto-circuito institucional promovido por um führer ou condutor de rebanhos.
Por último, essa estratégia exige algum tipo de intervenção nos tribunais superiores e nas liberdades de imprensa e de expressão em geral. Enquanto o judiciário estiver reformando medidas governamentais e a imprensa e as mídias sociais estiverem criticando essas medidas, torna-se dificílimo implementá-las. Esta é a razão pela qual populistas-autoritários como Orbán e Erdogan fizeram intervenções em suas supremas cortes e reduziram a liberdade de expressão em seus países.
Bolsonaro, no Brasil, atuando através de seus filhos e sequazes nas mídias sociais manipuladas, tenta diariamente jogar a população contra o Supremo Tribunal Federal e contra a imprensa. Mas isso é insuficiente para promover mudanças efetivas a seu favor nessas instituições do establishment.
Sem um fato extraordinário – uma mega-catástrofe, um atentado terrorista de grandes proporções, uma guerra com um país vizinho, uma tentativa de golpe de Estado (desferida pelo “inimigo interno”), um colapso institucional – a estratégia que prevê operar uma mudança de regime a partir do governo demora muito para ser implementada, mais do que a paciência da população é capaz de suportar.
Como a catástrofe é imponderável, atentados terroristas internos e guerras são improváveis, a única alternativa que resta é a provocação de uma crise seguida de colapso institucional, que dê motivos para a aprovação de leis autoritárias ou force a entrada em cena das forças armadas. É com isso, fundamentalmente, que os bolsonaristas contam.
Um governo democrático não precisa de altos índices de popularidade para continuar governando. Não cai só por isso, como vimos no caso de Michel Temer. Mas Temer não queria fazer revolução nenhuma, ao contrário do bolsonarismo. Um governo orientado por uma estratégia revolucionária (para trás) populista-autoritária – como é o bolsonarismo – precisa, sim, manter sua popularidade em altos níveis. Sem o mito e seu efeito mesmerizador de multidões, nada feito. Caso a popularidade de Bolsonaro continue caindo, a força política bolsonarista poderá partir para o desespero e não é despropositado supor que tentará forjar atentados (contra o presidente ou os seus filhos) ou cavar uma guerra (por exemplo, com a Venezuela). Tudo isso, todavia, é altamente arriscado, além de incerto. Resta, portanto, investir na crise institucional.
Desgraçadamente para o bolsonarismo, também é improvável que se consiga produzir uma crise institucional de alto impacto no Brasil que autorize e viabilize mudanças regressivas na Constituição Federal ou obrigue os militares a “pacificar” o país assumindo novamente o poder. Mas… eis o ponto! O investimento nessa saída autoritária, por si só, instalará no país uma guerra civil fria, acelerando a dilapidação do nosso capital social e enfreando o processo de democratização. Ou seja, em qualquer caso, mesmo no caso de fracasso político imediato, o revolucionarismo bolsonarista sairá vitorioso em termos sociais. Na pior hipótese, para o bolsonarismo, conseguirá reconfigurar o campo (ou deformar a rede) social, ensejando que nossa democracia fique menos liberal (como veremos mais adiante).
OS AGENTES
Os agentes principais da revolução (para trás) em curso no Brasil são o próprio presidente, seus filhos, seu guru e seus sequazes bolsonaristas (ou melhor, olavistas-bolsonaristas). Como em todo processo revolucionário, esses agentes se distribuem em diferentes níveis: dirigentes, formuladores, propagadores, apoiadores e simpatizantes (incluindo os famosos inocentes úteis). Quem são (excluído o próprio Jair Bolsonaro, que também é bolsonarista)?
01 – Carlos Bolsonaro
02 – Eduardo Bolsonaro
03 – Flávio Bolsonaro
04 – Olavo de Carvalho
05 – Abraham Weintraub
06 – Alexandre Borges
07 – Alexandre Garcia
08 – Allan dos Santos
09 – Ana Caroline Campagnolo
10 – Ana Paula
11 – Augusto Nunes
12 – Bene Barbosa
13 – Bernardo Küster
14 – Bia Kicis
15 – Bruno Garschagen
16 – Carla Zambelli
17 – Damares Alves (trata-se de uma fundamentalista-evangélica levada ao bolsonarismo pelas circunstâncias)
18 – Danilo Gentili
19 – Emilio Dalçoquio (empresário que puxou o locaute dos caminhoneiros)
20 – Ernesto Araújo
21 – Fabio Wajngarten
22 – Felipe Moura Brasil
23 – Flavio Morgenstern (Flávio Azambuja Martins)
24 – Flavio Rocha
25 – Filipe Martins
26 – Filipe Valerim (e a galera do Brasil Paralelo, que se esforça para não aparecer)
27 – Italo Lorenzon
28 – Joice Hasselmann
29 – José Carlos Sepúlveda
30 – Leandro Ruschel
31 – Luciano Hang (dono das Lojas Havan)
32 – Luiz Philippe de Orleans e Bragança
33 – Marcelo Reis
34 – Meyer Nigri
35 – Nando Moura
36 – Osmar Stábile (o cara que assumiu ter financiado o vídeo de falsificação histórica sobre o golpe de 1964 divulgado criminosamente pelo Planalto)
37 – Ricardo de Aquino Salles
38 – Roger Moreira (parecido com o Lobão, porém muito mais reacionário)
39 – Sebastião Bomfim (empresário)
A lista acima é apenas demonstrativa, não exaustiva. Faltam muitos agentes menos conhecidos. E nela não constam os nomes de milhares de militantes anônimos, as dezenas de milhares de pessoas-bot e as centenas de milhares de eleitores normais de Jair Bolsonaro (a maior parte dos quais nem é bolsonarista, mas apenas simpática a Bolsonaro) que, inadvertidamente, replicam as mensagens emitidas pelos chefes (os hubs da rede descentralizada bolsonarista), sobretudo aproveitando a possibilidade de broadcasting privado e de fluxo descendente em árvore no WhatsApp (a grande falta de proteção das mídias sociais contra a manipulação hierárquica que está permitindo a escalada do ataque à democracia no Brasil e em vários países).
E não estão incluídos na lista acima os militares que infestam o governo, alguns dos quais intervencionistas (e claramente antidemocratas) e os jacobinos-restauracionistas que compõem a “liga da justiça”, uma espécie de milícia legal (não prevista em nosso arcabouço constitucional) em que se transformou a Lava Jato: ambos aliados, explícitos ou tácitos, dos bolsonaristas.
Mas… atenção! É preciso dar nome aos bois. Se essas cerca de 40 pessoas, mencionadas na lista acima, pararem de emitir diretivas, se alguns desses hubs forem desativados (pela pressão social pacífica ou por outro meio legal), o bolsonarismo propriamente dito – no estágio organizativo em que atualmente se encontra – se desfaz.
AS CONDIÇÕES SUBJETIVAS E OBJETIVAS
O populismo-autoritário bolsonarista chega ao governo brasileiro num momento de recessão e desconsolidaçãodemocrática mundial com a ascensão de populismos de direita ou de esquerda.
Já se sabe que hoje, no mundo e no Brasil, os principais adversários das democracias realmente existentes – sobretudo das democracias liberais – não são mais os fascistas ou os comunistas e sim os populistas (sejam ditos “de direita” ou de “esquerda”) que usam a democracia contra a democracia para torná-la menos liberal e mais majoritarista.
O populismo, seja na suas versões de esquerda, neopopulistas, seja nas suas versões autoritárias de extrema-direita, contribuiu para invalidar as ideias liberais como as seguintes:
i) que é normal que a sociedade esteja dividida entre muitas — e às vezes transversais — clivagens,
ii) que a melhor maneira de lidar com essas clivagens é por meio de um debate aberto e livre, sob uma cultura política que valoriza a moderação e busca o consenso, e
iii) que o Estado de direito e os direitos de minorias precisam ser respeitados.
Ao contrário, os populismos reforçaram ideias avessas à democracia, como as de que:
i) a sociedade está dividida por uma única clivagem, separando a vasta maioria (o povo) do “establishment” (as elites),
ii) a polarização (elites x povo) deve ser encorajada e os representantes do povo (que seriam os atores legítimos ou mais legítimos) não devem fazer acordos (a não ser táticos) ou construir consensos (idem) com os representantes das elites (posto que estes são ilegítimos ou menos legítimos) e sim buscar sempre suplantá-los, fazendo maioria em todo lugar (majoritarismo),
iii) minorias políticas (antipopulares) não devem ser toleradas (e devem ser deslegitimadas) quando impedem a realização das políticas populares e a legalidade institucional (erigida para servir às elites) não deve ser respeitada quando se contrapõe aos interesses do povo.
É o caso, à direita, de Orbán (na Hungria), mas também os de Putin (na Rússia) e Recep Erdogan (na Turquia) – que já viraram ditaduras; e também o de Jaroslaw e Lech Kaczynski e  Andrzej Duda (na Polônia), de Matteo Salvini (na Itália), de Le Pen (na França), de Geert Wilder (na Holanda), de Hans-Christian Strache (na Áustria), de Jörg Meuthen e Alexander Gauland (na Alemanha) e, na Asia, de Rodrigo Duterte (das Filipinas); além, é claro, de Donald Trump (nos USA) e dos líderes do Brexit (como Boris Johnson e Nigel Farage, na Inglaterra) e agora, na América Latina, de Jair Bolsonaro (no Brasil) – que se transformaram nas principais ameaças à democracia liberal no plano global. Todos estes representam, com suas especificidades, forças políticas populistas-autoritárias.
E é o caso, à esquerda, de Hugo Chávez e Nicolás Maduro (na Venezuela) e de Daniel Ortega (na Nicarágua) – que também já viraram ditaduras; mas ainda de Evo Morales (na Bolívia), de Rafael Correa (no Equador), assim como foi o de Mauricio Funes (em El Salvador), o de Manuel Zelaya (em Honduras), o de Fernando Lugo (no Paraguai), o de Néstor e Cristina Kirchner (na Argentina) e o de Lula e Dilma (no Brasil). E todos estes representam, com suas especificidades, forças políticas neopopulistas (nas diversas variantes, hard ou soft, do que ficou conhecido como bolivarianismo).
É importante notar que, para todos esses populistas – sejam considerados de direita ou de esquerda -, o principal inimigo é a democracia liberal. Ou seja, todos os populistas pervertem a democracia como uma continuação da guerra por outros meios, mas não propriamente para se engalfinhar em processos de destruição mútua (direita x esquerda) e sim para neutralizar, desativar ou destruir as forças políticas democráticas.
Diga-se o que se quiser dizer, o PT é o principal responsável por Bolsonaro ter sido eleito. O lulopetismo gerou o bolsonarismo. Um populismo engendrou outro populismo (de sinal trocado), afastando os democratas – os verdadeiros inimigos de ambos – da cena pública. Mas dizer que o PT é o principal responsável pela eleição de Bolsonaro não é dizer que ele é o único responsável e sim, apenas, como está escrito, que é o principal. Em segundo lugar vem o PSDB, que se recusou a fazer oposição para valer durante mais de uma década e se descredenciou aos olhos da população revoltada com os abusos lulopetistas.
Os abusos lulopetistas provocaram uma reação em cadeia da população, sobretudo nos setores sociais que não participavam da política, não tinham – e não têm – a menor noção de democracia e viraram agentes, em grande parte inconscientes, da escalada autoritária em curso.
Mas não é possível negar que sem o lajatismo militante, Bolsonaro jamais teria vencido a eleição. Como já foi dito em outro artigo, o lavajatismo militante, quer dizer, a instrumentalização política da operação Lava Jato, levou Bolsonaro ao governo. Há uma evidência incontrastável. O apoio popular ao combate à corrupção virou campanha política: mais de 90% de todos os grupos que se formaram para apoiar a Lava Jato e endeusar Moro e Deltan (como as tais “Repúblicas de Curitiba”) viraram comitês eleitorais de Bolsonaro. Vencida a eleição, o lavajatismo original foi entronizado no governo, via Sérgio Moro, para se transformar em bolsolavajatismo oficial.
A NATUREZA DA AMEAÇA
É difícil compreender a natureza da ameaça bolsonarista. Não é um movimento político tradicional. Não é um partido (o PSL foi apenas a sigla comprada por Bolsonaro para poder concorrer). Apesar das semelhanças com o lulopetismo – justas na medida em que ambos são populistas e pretendem, inicialmente por vias legais, eleitorais, alterar o DNA da democracia – o bolsonarismo é muito diferente do PT e tem características inéditas no Brasil.
O PT já era um partido consolidado e sua estratégia visava conquistar hegemonia sobre a sociedade a partir do Estado aparelhado pelo partido com o fito de nunca mais sair do governo. Essa estratégia neopopulista preconizava ganhar eleições sucessivamente até poder conquistar as instituições por dentro, privatizando-as partidariamente para colocá-las a serviço do seu projeto. Poderia até dar certo, mas não deu por várias razões que não cabem neste artigo. Pode-se dizer aqui apenas que se não tivesse sido interrompido pelo impeachment e se Dilma tivesse se comportado de maneira mais razoável, é bem provável que, dispondo de mais 4 anos, o PT conseguisse alcançar seu intento. O Brasil seria transformado em uma democracia formal, menos liberal, parasitada por uma força política manipuladora, com discurso socialista e comportamento bolivariano, porém à brasileira. O Brasil petista dificilmente seria uma Venezuela (onde o projeto neopopulista descambou para o vale-tudo da narco-ditadura e gerou uma crise política e social de grandes proporções e um desastre humanitário) e se consolidaria como um regime autoritário de facto, porém não reacionário no que tange aos costumes e aos direitos humanos.
Ou seja, bolsonarismo e lulopetismo são, ambos, ameaças à democracia, mas não a mesma ameaça.
Como já foi dito, o bolsonarismo ensejou a irrupção repentina de matrizes da cultura patriarcal – preconceituosa, intolerante, excludente, deslegitimadora do outro, do diferente, do divergente, não valorizadora do diálogo, do entendimento e da negociação e avessa aos direitos humanos – que sempre esteve no fundo do poço da consciência (ou inconsciência) da maioria da nossa população (ainda que em termos de convicções privadas).
O bolsonarismo se transformou, assim, num desaguadouro dessas matrizes de pensamento e comportamento mais incompatíveis com a democracia que repousam no baixo ventre da história (desde que existe Estado). A democracia surgiu precisamente como uma brecha nesse tipo de cultura patriarcal, hierárquica e guerreira. Só a democracia pode domesticar esse monstro que se esconde nos subterrâneos da cultura predominante no que chamam de civilização (que ainda é a civilização patriarcal).
Sim, o papel da democracia, como modo de administração política do Estado, é domar (ou drogar) o Leviatã (com a fórmula do Estado democrático de direito, capaz de conter, em parte, a fome pantagruélica, a belicosidade e a ferocidade do Estado-nação – um fruto da guerra, da paz de Westfália). Mas o papel da democracia como modo de vida é modificar, pelo processo interativo de fermentação de opiniões, inerente à formação da opinião pública, esses elementos desumanizantes da cultura patriarcal, impedindo que eles irrompam em estado puro na cena pública e acabem definindo o rumo das sociedades. Toda vez que isso acontece, não pode haver democracia. Ora, como já mostrou Ralf Dahrendorf, não há democracia sem democratas. Como há um deficit de democratas atuando na cena pública brasileira, as portas do inferno se abriram e multidões de zumbis levantaram de suas tumbas.
De um ponto de vista político, pode-se dizer que o lulopetismo era (e talvez ainda seja, conquanto improvável) mais perigoso do que o bolsonarismo na medida em que tinha (e talvez ainda tenha) força política organizada, enraizamento social, agentes infiltrados em todos os escaninhos do Estado, narrativa ideológica estruturada, apoio internacional e recursos de monta e de toda ordem. Mas o bolsonarismo, de um ponto de vista cultural (quer dizer, social), é a invasão dos bárbaros: a subida da lama que está depositada, camada sobre camada, no fundo do poço da cultura patriarcal.
A ameaça bolsonarista é mais perigosa do ponto de vista social do que político. É uma revivescência patriarcal, antissocial (no sentido em que Maturana emprega o termo). Todavia, se essa ameaça social se transformar em força política, triplicando (ou mesmo apenas dobrando) o número de seus agentes, aí sim poderemos ter um colapso do regime democrático.
De qualquer modo, mesmo que não consiga se expandir em termos políticos, o bolsonarismo já causou uma deformação social irreparável no curto prazo. Seja qual for o desfecho do projeto bolsonarista, nossa democracia já está ficando menos liberal diante da sua simples presença na cena pública.
A ATITUDE DOS DEMOCRATAS
A atitude dos democratas diante da ameaça que está posta só pode ser uma: a combinação de oposição formal, de caráter partidário-parlamentar, nas instituições, sobretudo no Congresso e a resistência democrática na sociedade. Não se trata de escolher uma ou outra: as duas coisas – oposição e resistência – são necessárias.  Este tema já foi tratado no artigo Como resistir ao avanço de ideias e práticas autoritárias na sociedade brasileira.
Apesar dos alertas insensatos de alguns analistas e jornalistas políticos pollyannas, está havendo, sim, resistência democrática no Brasil. Felizmente, instituições do Estado e da sociedade estão resistindo ao avanço do bolsonarismo (e isso nada tem a ver com a tal resistência “democrática” anunciada pelo PT). Se tivéssemos dado ouvidos aos metidos a bem-pensantes, racionais e moderados, a revolução para trás dos malucos olavistas estaria correndo solta. Não está, pelo menos por enquanto. Graças à (verdadeira) resistência democrática.
Os jornalistas e analistas pollyannas dificultaram bastante a compreensão do fenômeno ao propagarem ideias erradas sobre (o caráter de) Bolsonaro e (a natureza) do bolsonarismo. Não entenderam bem qual é a ameaça à democracia que está em curso. Seguem abaixo alguns exemplos de avaliações erradas cometidas por muitos considerados bem-pensantes:
Bolsonaro é conservadorErrado. É reacionário.
Olavo é conservadorErrado. É retrogradador.
O bolsonarismo é de direitaErrado. É de extrema-direita.
Guedes é liberalErrado. É apenas um liberal-econômico, mas nunca foi um liberal político.
Bolsonaro é liberalErrado. É nacionalista, quer dizer, estatista.
Bolsonaro em campanha foi uma coisa, no governo será outraErrado. Ele continua em campanha há mais de 80 dias no governo.
Bolsonaro é contra a velha políticaErrado. Como parlamentar ele sempre fez a velha política corporativa durante 30 anos e, no governo, está se mostrando contra a política.
O establishment vai domesticar BolsonaroErrado. O bolsonarismo é anti-establishment e Bolsonaro é bolsonarista.
Guedes e os Generais vão controlar Bolsonaro e afastá-lo da influência dos seus filhosErrado. Erigiu-se uma familiocracia impenetrável e ela é bolsonarista.
Depois de um período inicial de adaptação Bolsonaro vai acabar aprendendo o que é ser presidenteErrado. Bolsonaro não é uma entidade capaz de aprender.
Agora chegou a hora de rever tais avaliações equivocadas. Há um movimento antidemocrático no Brasil, como nunca houve na história – nem mesmo durante a ditadura militar. Esse movimento tem base social e fôlego para durar por muito tempo, independentemente do destino de seu líder Jair Bolsonaro. Somente a oposição formal – necessária e comum em qualquer democracia – não é suficiente para barrar o avanço das ideias e práticas autoritárias na sociedade. É necessário resistir pacificamente a essa escalada autoritária, em todo lugar e por todos os meios legais disponíveis.

Democracy Unschool é um ambiente de livre investigação-aprendizagem sobre democracia, composto por vários itinerários. O primeiro itinerário é um programa de introdução à democracia chamado SEM DOUTRINA. Para saber mais clique aqui