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sábado, 12 de setembro de 2020

A bolsodiplomacia autoriza os EUA a adotarem medidas unilaterais CONTRA o Brasil - Patricia Campos Mello (7/11/2019)

Um dos primeiros exemplos da completa subordinação da diplomacia brasileira aos interesses americanos. Esta notícia é de novembro de 2019, mas ela se seguiu e antecedeu a várias outras demonstrações de sabujice da bolsodiplomacia ao governo Trump.

Não se trata aqui de apoiar a ditadura cubana, mas sim de enviar uma mensagem clara que o Brasil não tolera leis extra-territoriais, e não tolera medidas unilaterais.

O governo Bolsonaro começou por aí dizendo que os EUA podem sancionar unilateralmente o Brasil, e que vamos acatar essas medidas como legítimas.

Uma vergonha para a nossa diplomacia.

Paulo Roberto de Almeida

Brasil cede aos EUA, rompe tradição de 27 anos e não condena embargo a Cuba

Itamaraty ignorou argumentos de embaixador brasileiro na ONU, que defendia abstenção

Patrícia Campos Mello

Folha de S. Paulo, 7 de novembro de 2019

https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2019/11/brasil-cede-aos-eua-rompe-tradicao-de-27-anos-e-nao-condena-embargo-a-cuba.shtml

Pela primeira vez em 27 anos, o Brasil cedeu às pressões dos EUA e votou contra a resolução anual da ONU que condena o embargo econômico americano a Cuba. Apenas Israel e Estados Unidos votaram da mesma maneira que o Brasil.

Nas últimas semanas, o governo americano, por meio da divisão de Hemisfério Ocidental do Departamento de Estado, pediu duas vezes que o Itamaraty mudasse seu posicionamento histórico de rechaço a medidas econômicas unilaterais e se alinhasse aos EUA na votação.

Os americanos argumentaram que, ao condenar o embargo contra Cuba, o Brasil passaria a mensagem de que o país caribenho pode continuar interferindo impunemente na Venezuela e que o governo brasileiro tolera as violações de direitos humanos da ditadura cubana.

O presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, durante discurso na Assembleia Geral da ONU, em Nova York
O presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, durante discurso na Assembleia Geral da ONU, em Nova York - Johannes Eisele - 24.set.19/AFP

Segundo os americanos, venezuelanos e cubanos já obtiveram uma vitória com a eleição da Venezuela para o Conselho de Direitos Humanos da ONU, em outubro, e o voto do Brasil seria outro trunfo internacional para o regime hoje liderado por Miguel Díaz-Canel.

O chanceler brasileiro, Ernesto Araújo, cedeu às pressões americanas, apesar de grande resistência do atual embaixador do Brasil na ONU, Mauro Vieira.

Mesmo países que têm relação muito próxima aos EUA e dependem pesadamente de ajuda econômica americana resistiram às pressões de Washington. A Colômbia e a Ucrânia, por exemplo, abstiveram-se na votação.

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A Guatemala, único país a acompanhar os EUA e transferir sua embaixada em Israel de Tel Aviv para Jerusalém, votou a favor.

No total, foram três votos contra a resolução, duas abstenções e 187 votos a favor do texto que condena o embargo americano imposto há 50 anos, no início da revolução promovida por Fidel Castro. A Moldova não votou.

O voto brasileiro contraria o posicionamento histórico do Itamaraty de condenar medidas unilaterais econômicas contra países, vetadas pela legislação internacional e pela ONU.
 
Em telegramas nos últimos meses, o embaixador Mauro Vieira tentou argumentar que um voto a favor da resolução não representaria um sinal de apoio à política de direitos humanos da ditadura cubana, mas sim uma posição tradicional do governo brasileiro em relação à ingerência em outros países.

Também defendeu que um voto contrário não seria visto apenas como um gesto contra o país, mas um posicionamento contra o princípio de não interferência, o que desagradaria todos os países sujeitos a essas medidas.

Vieira ainda defendeu que um voto como esse poderia prejudicar os interesses brasileiros —por exemplo, no caso da possibilidade de sanções econômicas contra o Brasil devido à política ambiental na Amazônia.

Assim, o governo Bolsonaro teria dificuldade em angariar apoio de países contra esse tipo de interferência.

Ao responder as argumentações de Vieira, as mensagens do gabinete do chanceler Ernesto Araújo eram sempre secas, afirmando apenas que o governo brasileiro manterá a instrução previamente passada.

Vieira teria argumentado que, caso o Brasil quisesse mandar um sinal ao regime cubano, poderia pedir a palavra durante o voto na sessão e fazer uma declaração, deixando claro que o gesto não é um apoio a violações de direitos humanos em Cuba.

Por fim, o embaixador sugeriu que o Brasil se abstivesse em vez de votar contra a resolução, porque não seria um movimento tão grave nem isolaria o país. De novo, foi ignorado.

"Sanções indiscriminadas como embargos afetam negativamente a população em geral e, por isso, são consideradas já há anos uma medida inadequada”, diz Camila Asano, coordenadora de programas da Conectas Direitos Humanos.

“A mudança de voto também preocupa por ser mais um exemplo do alinhamento automático do Brasil com a política externa americana sem que tais mudanças dramáticas sejam devidamente debatidas no Brasil, como junto ao Congresso Nacional."

O governo brasileiro vem se alinhando sistematicamente a interesses americanos. O país abriu mão do tratamento especial e diferenciado na OMC (Organização Mundial do Comércio) a pedido dos Estados Unidos, que querem modificar o mecanismo para não beneficiar a China em negociações comerciais.

Bolsonaro chegou a anunciar a transferência da embaixada brasileira em Israel para Jerusalém, mas acabou recuando e abrindo apenas um escritório comercial, diante de ameaças de países árabes, grandes importadores de carnes brasileiras.

O Brasil ampliou e renovou neste ano cotas sem tarifa para importação de etanol e trigo, reivindicações americanas. Por outro lado, frustrando expectativas, os EUA não removeram as barreiras sanitárias que impedem a importação de carne bovina in natura nem anunciaram modificações na proteção do açúcar americano, outro pedido brasileiro.

O apoio dos EUA à entrada do Brasil na OCDE, o clube dos países ricos, prometido pelo presidente Donald Trump em março, tampouco se materializou. O governo de Bolsonaro vê a entrada no órgão como um selo de qualidade de políticas macroeconômicas.

Recentemente, em carta à organização, Washington reiterou o apoio às candidaturas de Argentina e Romênia na OCDE, mas se opuseram a uma ampliação maior no número de membros do órgão, o que, na prática, solapa as ambições brasileiras.

O governo Trump vinha se opondo à ampliação da OCDE, dando a entender que a entrada muito rápida de novos membros desvirtuaria a organização, que ficaria inchada e sem propósito —além da ojeriza natural da atual gestão da Casa Branca a instituições multilaterais.

ENTENDA O EMBARGO

Quando começou?
Os EUA impuseram sanções econômicas a Cuba em 1960, cerca de um ano depois de a Revolução Cubana de Fidel Castro ser bem sucedida e ele assumir o poder.

A medida foi resposta à estatização de empresas e propriedades americanas. As relações diplomáticas foram rompidas.

Qual o efeito das sanções na economia cubana?
Em 2018, a Comissão Econômica para a América Latina e Caribe da ONU confirmou a estimativa do regime cubano de que o embargo já tinha custado US$ 130 milhões nos últimos 60 anos.

Como o embargo afeta da vida dos americanos?
Washington não emite vistos de turismo para a ilha. Qulquer pessoa partindo dos EUA em direção a Cuba deve pedir autorização ao Departamento do Tesouro.

Cartões de crédito e débito emitidos nos EUA raramente são aceitos.

E a dos cubanos?
O turismo é uma das principais atividades econômicas do país, mas o embargo e as restrições de viagem prejudicam o mercado.

As sanções também limitam o fluxo de dinheiro de cubanos vivendo no exterior, importante fonte de renda para a população.

Há escassez de alguns produtos básicos, incluindo alimentos, e o governo impõe racionamento.

Cubanos podem viajar aos EUA desde que obtenham um visto.

Como Obama se aproximou do regime cubano?
O então presidente restabeleceu relações diplomáticas, autorizou empréstimos de empresas americanas às cubanas da área de infraestrutura e permitiu que a ilha exportasse alguns produtos para os EUA.

O que mudou no governo Trump?
No início de junho deste ano, os EUA expandiram as restrições a viagens de americanos à ilha.

O governo pôs fim aos vistos de cinco anos para cubanos, que agora têm de pedi uma autorização para cada viagem.

Transações financeiras com entidades ligadas às Forças Armadas cubanas foram restringidas.


Meio século de reflexões sobre o Brasil - Paulo Roberto de Almeida

 Meio século de reflexões sobre o Brasil

Paulo Roberto de Almeida

Deve ser um pouco mais do que isso, uma vez que, ainda adolescente, rapidamente politizado pelo golpe militar de 1964, comecei a ler intensamente sobre o Brasil e seus problemas. Vários anos antes de ingressar na Universidade, eu já estava lendo algumas de nossas “vacas sagradas”, isto é, os clássicos da teoria social brasileira: Caio Prado Jr., Celso Furtado, Gilberto Freyre, Sergio Buarque de Holanda, Florestan Fernandes, Fernando Henrique Cardoso, Octavio Ianni, Nelson Werneck Sodré e, claro, muita literatura marxista e socialista. Em torno dos 16 anos eu já estava fazendo um resumo de uma edição resumida do Capital: creio que deu umas cinquenta páginas cuidadosamente datilografadas, a partir das 250 páginas da edição brasileira.

Mas deve ter sido um pouco mais tarde, já no circuito universitário, que comecei realmente a escrever sobre os problemas brasileiros e suas possíveis soluções, previsivelmente socialistas, como era o espirito da época, o meu pelo menos. O verdadeiro Zeitgeist eu o conheci logo depois, ao sair, com pouco mais de vinte anos, do nosso capitalismo subdesenvolvido para o socialismo real (talvez mais surreal) da Europa oriental, em plena era do brejnevismo senil. Saí em menos de três meses da mediocridade material e da miséria moral do socialismo realmente existente para uma vida de trabalho e retomada dos estudos universitários no capitalismo mais ou menos ideal da Bélgica, onde passei quase sete longos anos de intensas leituras e reflexões, no período mais sombrio da ditadura militar no Brasil.

Preenchi inúmeros cadernos de leituras e notas de trabalhos, sempre confiando em que, na volta ao Brasil, participaria de intensas atividades de correção das nossas mazelas mais gritantes, já não mais num sentido socialista, mas simplesmente na modéstia reformista da socialdemocracia.

Pois foi assim: quase não tive tempo, na volta, e ainda na ditadura, de exercer-me nas atividades acadêmicas, para as quais eu sempre estive vocacionado, pois logo ingressei na carreira diplomática e desviei um pouco minhas leituras e reflexões da sociologia política para as relações internacionais e a política externa do Brasil, mas sempre com uma orientação para as relações econômicas internacionais do Brasil (terreno no qual me exerci mais frequentemente na diplomacia e para onde foram dirigidos a maior parte dos meus livros). 

Em nenhum momento dessas várias décadas de leituras, reflexões, escritos e participação em debates públicos, presencialmente ou por meio de meus trabalhos escritos, eu abandonei a ideia, ou renunciei ao envolvimento ativo, de estar totalmente engajado na transformação, para melhor, do Brasil, e da vida dos brasileiros, sobretudo a dos que, como eu, vieram de uma condição extremamente modesta, mas que se fizeram pela educação e pelo trabalho. 

Essa atitude fundamental, esse otimismo básico quanto ao sentido da minha ação, quanto à importância da participação na análise, discussão e proposição de políticas públicas condizentes com esse objetivo incontornável do desenvolvimento nacional, num ambiente político democrático e aberto a tidas as competências reformistas, eu os mantive até há pouco e, de certa forma, ainda mantenho, a despeito de algum pessimismo temporário, neste mesmo momento.

É passageiro, eu sei, mas não posso me impedir de pensar, como o grande Roberto Campos — a quem dediquei dois livros, nos seus cem anos, depois de ter sido um “inimigo cordial” na minha juventude— que “o Brasil é um país que não perde oportunidade de perder oportunidades”.

Ao contemplar o espetáculo gigantesco da corrupção nas mais altas esferas da vida pública, na verdade em todas as esferas e em tidos is níveis da federação, ao acompanhar a sucessão de esforços frustrados de reformas racionais e modernizante, ao constatar a continuidade deletéria de nossas elites predatórias e medíocres, não posso evitar essa sensação de desalento em face da enormidade da tarefa que ainda nos espera se pretendemos fazer do Brasil primeiro um país normal, depois uma nação melhor do que a indignidade  corrupta e anacrônica que temos hoje.

Vamos melhorar, eu sei, mas isso vai durar mais um pouco, talvez bem mais do que os poucos anos que eu estimava necessários para “consertar” o Brasil, como eu imaginava na minha juventude otimista quanto à capacidade do socialismo democrático de cumprir essa grandiosa tarefa. 

Nunca desistir, nunca desesperar, jamais renunciar à missão fixada ainda na adolescência de entregar aos filhos e netos um Brasil melhor do que o que recebemos de nossos pais e avós. Essa é a tarefa, vamos continuar na luta.

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 12 de setembro de 2020

ROUBO DA FAMILIA BOLSONARO: 29,5 MILHÕES

 

Revista: Supostos funcionários fantasmas dos Bolsonaros ganharam R$ 29,5 mi

Jair Bolsonaro acompanhado dos filhos Flávio, Eduardo e Carlos - Roberto Jayme/Ascom/TSE
Jair Bolsonaro acompanhado dos filhos Flávio, Eduardo e CarlosImagem: Roberto Jayme/Ascom/TSE

Do UOL, em São Paulo

11/09/2020 15h44 

Um levantamento da revista Época apontou que supostos funcionários fantasmas da família Bolsonaro receberam R$ 29,5 milhões em salários do total de R$ 105,5 milhões pagos entre 1991 e 2019 — os valores foram corrigidos pela inflação do período.

De acordo com a publicação, 28% do total pago a 286 funcionários dos gabinetes do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e de seus filhos Flávio, Carlos e Eduardo foram depositados na conta de servidores com indícios de que não trabalharam.

Segundo o levantamento da revista, ao menos 39 pessoas possuem indícios de que não trabalharam de fato nos cargos nos gabinetes e tinham outros empregos, como Nathalia Queiroz, filha do ex-assessor Fabrício Queiroz, investigado sobre suposto esquema de "rachadinha" no gabinete de Flávio Bolsonaro, então deputado estadual do Rio. A Época publicou que Nathalia, que é personal trainer, recebeu R$ 1,3 milhão, mesmo valor recebido por sua mãe, que se declarava cabeleireira.

Ainda de acordo com a revista, os 39 receberam um total de 16,7 milhões em salários brutos, o equivalente a R$ 29,5 milhões em valores corrigidos pela inflação, durante os trabalhos com a família Bolsonaro.

São 17 pessoas do gabinete de Flávio; 10 no de Carlos, que também é investigado pelo Ministério Público; três no gabinete do então deputado federal Jair Bolsonaro; outras nove pessoas passaram por diferentes gabinetes da família.

UOL tenta contato com as defesas de Jair Bolsonaro, Carlos BolsonaroEduardo Bolsonaro e Flávio Bolsonaro.