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segunda-feira, 21 de setembro de 2020

Sob pressão ambiental pela segunda vez, Bolsonaro dirá na ONU que foi bem na pandemia e que Brasil alimenta o mundo (BBC Brasil)

 Sob pressão ambiental pela segunda vez, Bolsonaro dirá na ONU que foi bem na pandemia e que Brasil alimenta o mundo

Mariana Sanches, BBC Brasil (de Washington), 21/09/2020

https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/bbc/2020/09/21/sob-pressao-ambiental-pela-segunda-vez-bolsonaro-dira-na-onu-que-foi-bem-na-pandemia-e-que-brasil-alimenta-o-mundo.htm

Bolsonaro grava vídeo em foto de 2019; discurso de abertura da Assembleia Geral da ONU também será gravado, por conta da pandemia de coronavírus - Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro grava vídeo em foto de 2019; discurso de abertura da Assembleia Geral da ONU também será gravado, por conta da pandemia de coronavírus Imagem: Marcos Corrêa/PR

Presidente brasileiro enviou discurso gravado para a abertura da Assembleia Geral da ONU, na próxima terça-feira.

Sob intenso escrutínio mundial por seu desempenho na condução do Brasil durante a pandemia de coronavírus e pelas queimadas na Amazônia e no Pantanal, ainda mais intensas do que em 2019, o presidente Jair Bolsonaroabrirá na próxima terça-feira (22/09), a 75ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas.

Em um discurso gravado ainda na semana passada, ele deve defender que o país não só teve um bom desempenho doméstico na crise sanitária como garantiu a segurança alimentar de um bilhão de pessoas ao redor do mundo graças ao agronegócio nacional, alvo real daqueles que criticam a atual gestão ambiental brasileira, segundo a interpretação do governo.

Condução da pandemia

Com mais de 4,5 milhões de infectados e 135 mil mortos por covid-19, o governo brasileiro adotou postura contrária a medidas de isolamento social e ao uso de máscara, recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), e advogou por tratamentos à doença sem comprovação científica, como a hidroxicloroquina.

Mas a recente tendência de queda no número de novos contágios e mortes no país deve dar a Bolsonaro subsídios para argumentar que a situação do Brasil parece sob controle.

Ele também deve dizer que graças à sua resistência em determinar a paralisação das atividades econômicas e ao auxílio-emergencial de R$ 600 mensais recebido por mais de 60 milhões de brasileiros, o chamado "coronavoucher", a economia brasileira seguiu em funcionamento e as perspectivas de recessão do país não são tão severas quanto as de outras nações emergentes, como a Índia.

O impacto do auxílio no bolso de parcela relevante da população é apontado por especialistas como uma das explicações para as taxas de popularidade atuais do presidente, que chegou a estudar meios para tornar permanente ao menos parte do programa.

"Bolsonaro vai defender sua atuação na pandemia e sugerir que as críticas a ela eram mera perseguição política", afirma a professora de relações internacionais Elaini da Silva, da PUC-SP.

Meio ambiente, indígenas e agronegócio

O presidente deve lembrar ainda que, mesmo diante da crise, o Brasil cumpriu um papel pelo qual merece respeito internacional: forneceu alimentos para uma série de países no mundo. O presidente tem dito que se tivesse continuado a fazer demarcações de terra indígena, essa produção não seria possível.

"A ONU queria que nós passássemos de 14% para 20% de território demarcado. Falei-lhes: 'Não'. Nós não podemos sufocar aquilo que nós temos aqui que tem nos garantido a nossa segurança alimentar bem como a de mais de um bilhão de habitantes do mundo", afirmou Bolsonaro em discurso na sexta-feira, 18, em Sinop (MT).

No ano passado, para contrapor acusações de que desrespeitava os direitos dos povos indígenas, Bolsonaro levou ao plenário da Assembleia Geral a jovem liderança indígena Ysani Kalapalo, que hoje se diz decepcionada com o presidente. E em seu discurso, atacou o líder indígena caiapó Raoni Metuktire, a quem acusou de ser manipulado por ONGs e governos estrangeiros com interesses escusos na Amazônia.

Durante a pandemia, a tensão entre governo e os indígenas se intensificou. A Organização Panamericana de Saúde (OPAS), braço da OMS nas Américas, afirmou que as populações nativas têm sido cinco vezes mais atingidas do que a média da população brasileira. E em relatório lançado em agosto, o relator especial da ONU sobre direitos humanos e substâncias e resíduos tóxicos, Baskut Tuncak, afirmou que "no Brasil, as comunidades Yanomami encaram uma crise existencial e sanitária pelo contato com mineradores ilegais".

Bolsonaro deve ainda dizer que as queimadas são processos naturais e que tem acontecido não só no Brasil, como nos Estados Unidos e na África. E que o agronegócio brasileiro é eficiente e não têm responsabilidade pela devastação. Como já fez no discurso na ONU no ano passado, Bolsonaro acusará os críticos de ter motivação protecionista. A pauta ambiental seria apenas uma desculpa para que países europeus fechassem seus mercados para produtos brasileiros.

Há cinco dias, Alemanha, Reino Unido, França, Itália, Dinamarca, Noruega, Países Baixos e Bélgica assinaram uma carta aberta endereçada ao vice presidente Hamilton Mourão em que se dizem "profundamente preocupados" com o desmatamento da Amazônia que "tem crescido em níveis alarmantes".

Quase 20% do Pantanal já foi destruído por incêndios. Já na Amazônia, as queimadas cresceram 12% esse ano. Mourão tem dito que o Brasil reconhece que há um problema, mas que não aceita interpretações "simplistas" do fato. Membros do alto escalão do Itamaraty que conversaram com a BBC News Brasil anteveem ao menos um momento de constrangimento brasileiro no evento.

Os diplomatas esperam ataques diretos ao país durante uma sessão da cúpula de líderes em biodiversidade. O chanceler Ernesto Araújo foi o escalado para rebater, em vídeo de 3 minutos, às possíveis críticas.

Líderes online

Pela primeira vez em seus 75 anos, a ONU não verá os discursos dos chefes de Estado ao vivo e presencialmente em sua sede em Nova York (EUA). Primeiro grande epicentro da pandemia em território americano, Nova York enfrentou um extenso período de quarentena que tem sido relaxado gradualmente.

Ainda assim, a ONU tem mantido boa parte de suas atividades diplomáticas em modo remoto. Apenas votações de resoluções em que não há consenso têm sido feitas por um integrante de cada delegação em plenário — a organização chegou a cogitar a possibilidade de votação online, mas países como a Rússia se opuseram por considerar haver risco de hackeamento.

E embora o presidente americano Donald Trump e ao menos uma dezena de outros líderes estrangeiros tenham expressado interesse de ir pessoalmente fazer o discurso, a organização da Assembleia Geral deixou claro que nenhuma autoridade seria dispensada de cumprir um rígido isolamento de 14 dias antes de poder se apresentar no púlpito, o que desencorajou os mandatários.

Normalmente apinhado de representantes, dessa vez o plenário da ONU terá apenas um representante da delegação fixa de cada país, responsável por apresentar o discurso de seu chefe de Estado antes da entrada do vídeo.

Menos agressividade

Integrantes do Itamaraty acreditam que o discurso do presidente será menos agressivo dessa vez do que no ano passado, quando ele quebrou o protocolo para afrontar nominalmente cidadãos de seu próprio país, como Raoni, e afirmou que sua eleição salvará o Brasil do socialismo. Alguns motivos explicam essa leitura. Naquele momento, poucos meses após a posse, argumentam os diplomatas, Bolsonaro precisava "marcar uma posição", "reposicionar o Brasil".

Agora é diferente. Nos últimos dois meses, o presidente tem adotado uma estratégia de comunicação mais moderada e menos verborrágica em suas falas públicas. Além disso, o próprio fato de o discurso ter sido gravado pressupõe a possibilidade de ensaio e de edição e evita mudanças de tom de último minuto, como aconteceu em 2019.

"Eu apostaria em uma atitude mais defensiva e menos virulenta. Digamos que um repeteco com menos brilho até porque ninguém deve dar muita importância ao discurso dele", afirmou o embaixador Paulo Roberto de Almeida.

Para a professora de relações internacionais Elaini da Silva, as ações de política internacional do governo no último ano, quando o Brasil passou a mostrar um alinhamento ideológico consistente com os Estados Unidos, acabaram por levar a um certo isolamento do país que devem tirar relevância do discurso de Bolsonaro.

"Pode haver até uma certa curiosidade antropológica das outras delegações. Mas tanto pela pandemia quanto pelas queimadas, o Brasil erodiu a autoridade que teria para falar aos outros países a partir de sua experiência, queimou muito 'soft power'", afirma Silva, mencionando um conceito da diplomacia que se refere à capacidade de influência cultural e ideológica de um país sobre os demais.

Trump

O discurso de Bolsonaro pode ser ainda eclipsado pelo de Donald Trump. Concorrendo à reeleição em menos de 50 dias, o republicano não deve desperdiçar a oportunidade de se dirigir diretamente ao eleitorado americano em seu discurso na Assembleia Geral da ONU.

Crítico ao multilateralismo, Trump tem atuado para fragilizar organismos internacionais como a própria ONU e, com mais intensidade, a OMS e a Organização Mundial do Comércio (OMC). No caso da OMS, o governo americano iniciou a retirada formal do país dos quadros da organização e não participa do consórcio de mais de 70 países para o desenvolvimento de uma vacina contra covid-19.

Trump acusa a OMS, a OMC e a própria ONU de terem sido ao menos parcialmente sequestradas pelos interesses chineses. No caso da OMS, o governo americano afirma que a organização foi "leniente"e "corrupta" na maneira como conduziu a crise do coronavírus, protegendo a China, que teria escondido a gravidade do vírus.

Entre diferentes delegações em Nova York existe a tensão de que em seu discurso na Assembleia, Trump possa ameaçar cortar fundos da ONU ou até algum tipo de retirada americana da organização. Essa poderia ser uma jogada política com ressonância em seu eleitorado. Trump afirma ser defensor dos Estados Unidos em primeiro lugar e explora uma certa confusão no público em geral sobre o que são organismos multilaterais e como eles lidam com a China, cuja aversão é hoje prevalente tanto entre republicanos quanto entre democratas.

O presidente americano ainda não definiu se fará seu discurso de forma gravada ou em transmissão online ao vivo.

"Se for ao vivo, as pessoas podem tratar como algo dito no improviso e não levar tão a sério. Mas se ele disser isso em um vídeo gravado, com um roteiro, é muito mais difícil retroceder ou ignorar ", disse Richard Gowan, Diretor do Grupo de Crises Internacionais da ONU ao site americano Político.

É também incerto se em seu próprio discurso Bolsonaro fará alguma menção à tentativa de reeleição de Trump, a qual apoia. Reservadamente, um embaixador brasileiro afirmou que qualquer menção seria totalmente não recomendada, especialmente porque Trump aparece em desvantagem nas pesquisas eleitorais e pode vir a perder para o democrata Joe Biden.

Um comentário sobre preferência por Trump em um evento de alto nível como a Assembleia Geral deixaria o Brasil marcado para estabelecer relacionamento com um novo governo americano, caso Biden vença.

"Mas a gente sabe como o Bolsonaro é. No apoio com o Macri, ele foi até o fim, mesmo quando já estava claro que ele ia perder a presidência argentina", diz o embaixador.


Frente Ampla (para a democracia) - Rubens Ricupero (Fundação Astrojildo Pereira)

 Frente ampla

Ao Brasil falta muito, quase tudo, para ser o sonho intenso de que fala o nosso hino. Uma lista exaustiva das carências nos aproximaria do infinito. O problema maior, no entanto, não é a ausência de muitas coisas desejáveis. O pior é que nos privamos da única condição indispensável para um dia conquistar o que nos falta. Perdemos a esperança, isto é, a confiança de que o futuro nos trará remédio às agruras do presente, da mesma forma que antes o presente costumava superar problemas do passado. Vivemos um déficit agudo de esperança. E sem esperança, não existe possibilidade de construir o futuro.

O sentimento tem precedentes, geralmente em momentos de profunda desestabilização das instituições e das pessoas, como na súbita derrubada da monarquia. Joaquim Nabuco temia até o desmembramento do país ou a perda da noção de liberdade. O visconde de Taunay chegava a sentir “intensa vergonha de não ter morrido!” Silveira Martins comparava o Brasil ao que Diderot escrevera da civilização russa: “um fruto que apodrecera antes de amadurecer”.

O regime de Pedro II que esses brasileiros confundiam com o melhor Brasil possível possuía aspectos respeitáveis. Era, contudo, um país de pouco mais de 14 milhões de habitantes, a maioria analfabeta, com expectativa de vida inferior a 30 anos, muitos recém-saídos da escravidão e abandonados à própria sorte.

Houve depois outras fases de abatimento, mas a versão mais grave data de poucos anos atrás, de 2015/16, o instante em que começou a desfazer-se a ilusão de que o país tinha dado certo. Guardadas as proporções, o naufrágio da hegemonia do PT cumpre na história brasileira função análoga ao do colapso do comunismo no mundo. Para melhor explicar a afirmação, peço licença para transcrever na íntegra uma observação de Emmanuel Levinas sobre o sentido do fim do comunismo.

O jornal La Stampa lhe havia perguntado, pouco antes de sua morte em 1995, se pensava que esse acontecimento havia sido uma grande vitória para a democracia e o filósofo respondeu:

“Não, penso que as democracias perderam e muito. Apesar de todos seus horrores, seus excessos, o comunismo havia sempre representado a esperança […]de uma ordem social mais equitativa. Não é que os comunistas tivessem uma solução ou estivessem preparando uma, ao contrário. Existia, no entanto, a ideia de que a História possuía um sentido, uma direção e que viver não era insensato, absurdo. […]. Não creio que haver perdido essa ideia para sempre seja uma grande conquista espiritual.[…]. Acreditávamos saber para onde ia a História e que valor dar ao tempo. Agora caminhamos sem rumo, perguntando-nos a cada instante: ‘que horas são?’ De maneira fatalista, um pouco como se faz o tempo todo na Rússia: ‘que horas são?’ Ninguém sabe a resposta.”
Se trocarmos a palavra “comunismo” por “petismo”, impressiona como o trecho parece retratar o que sucedeu no Brasil. Excessos à parte, o PT também expressava a esperança de uma sociedade mais justa. Obviamente, além do PT, muitos brasileiros partilhavam a mesma aspiração. Foi o PT, porém, que teve a oportunidade de tentar em mais de 13 anos de governo aplicar inúmeras políticas públicas para reduzir a desigualdade, outra semelhança com o comunismo “real” e seus mais de 70 anos no poder.

Lula dava a sensação de encarnar uma notável transformação da sociedade. As medidas de transferência de renda, as quotas raciais, o acesso dos pobres ao ensino superior, prometiam um futuro de superação da desigualdade extrema herdada do passado. Sem base financeira adequada, as fórmulas petistas se tornaram insustentáveis. Algumas concorreram poderosamente para desencadear, primeiro a crise fiscal, em seguida o gravíssimo colapso que prostrou a economia até este momento.

A associação que se estabeleceu entre a ruína das contas públicas e o combate às injustiças sociais abalou as fundações da crença de que somos capazes de superar a desigualdade. Após os sucessos do Plano Real, do crescimento do governo Lula, da conquista do grau de investimento, a debacle da economia trouxe de volta aos brasileiros o efeito psicológico desmoralizante do fracasso.

A isso se somou o trauma do impeachment de Dilma, da condenação e prisão de Lula, de seu alijamento da campanha eleitoral de 2018, gerando contestações sobre a legitimidade democrática do poder. O pouco que sobrava do prestígio das instituições políticas se viu, ao longo de três intermináveis anos, estremecido pelas revelações quase diárias de escândalos pela Lava Jato, ela mesmo ora em vias de desmoralização devido a excessos e erros próprios, assim como à reação defensiva de setores políticos.

O Brasil jamais tinha passado por retrocesso tão destrutivo na vida das pessoas por meio do desemprego, do aumento da pobreza, do desalento. Nem experimentara nada equiparável ao profundo impacto depressivo dos escândalos de corrupção que destruíram a autoestima de todo um povo. Em conjunto, essas desgraças simultâneas produziram efeito equivalente ao da guerra sobre uma sociedade até então poupada de catástrofes históricas como derrotas e ocupações estrangeiras.

Tenho usado os verbos no passado a fim de situar no tempo o momento em que ocorreram as causas da situação que vivemos. Esse nosso passado próximo, contudo, não acabou de passar, é ainda o nosso presente. Neste mesmo instante, ele continua a nos fazer sofrer na persistência da estagnação econômica, do desemprego, do retrocesso social, da barbárie das prisões, da corrupção, da destruição da Amazônia, da degradação dos homens que nos desgovernam. A mais angustiante crise de nossa História se prolonga como obra de demolição em pleno andamento, como um work in progress. Agravada pelo advento de um governo retrógrado cujo único programa reside na demolição sistemática do passado.

Se a analogia com o contexto externo for correta, deve-se esperar, também por aqui, uma transição dolorosamente longa até que desponte período histórico diferente. No mundo, o sonho de uma sociedade mais justa acabou antes que no Brasil. Uma de suas primeiras expressões foi o ensaio do pensador e jornalista norte-americano William Pfaff por volta de 1995/1996, que partia da pergunta: “E se não houvesse nenhuma razão de pensar que o futuro será melhor que o presente, ou, pior ainda, melhor que o passado?”

Desde o Iluminismo, acreditava-se que a História se encaminhava a um futuro que, retrospectivamente, daria sentido ao passado. Essa bela confiança tinha se evaporado.

Profético, o ensaio de Pfaff antecedeu as calamidades que se sucederiam nos anos seguintes. A lista é interminável: o genocídio de Ruanda, os massacres da Bósnia, os atentados do Onze de Setembro, a eterna guerra do Afeganistão, a invasão do Iraque, a proliferação do terrorismo, a guerra civil da Síria, a anarquia na Líbia, as massas desesperadas de refugiados, a devastadora crise financeira de 2008, o aumento da desigualdade, a conquista do poder nos EUA pelo mais reacionário dos populismos.

A passagem para um novo milênio se cumpriu sob o signo da tragédia que voltou a pautar a História. Ubíqua, a crise da democracia liberal se manifesta por todo lado. Cobrem já boa parte da população mundial os regimes antiliberais, anticientíficos, negadores da mudança climática, hostis às elites intelectuais, à tolerância da diversidade, ao respeito do outro em matéria sexual ou cultural.

Dos quatro centros do poder mundial, três – os EUA de Trump, a China do presidente vitalício Xi, a Rússia do czar Putin – colocam o egoísmo nacional acima de uma ordem internacional baseada em leis, movida pela busca do consenso. O quarto, a União Europeia, último reduto da democracia liberal, do bem-estar social, da defesa do ambiente, sofre da desunião, do Brexit, do populismo de direita na Itália, Hungria, Polônia.

Os regimes atuais, quer o capitalismo ocidental, quer a versão estatizante chinesa, são incapazes de resolver os três maiores problemas humanos: o aquecimento global, o aumento da desigualdade, o desemprego estrutural agravado pelos robôs e a inteligência artificial. A possibilidade de que a mudança climática se torne irreversível traz de volta a ansiedade pela sobrevivência individual que se sentia no final da Antiguidade.

Coroando tudo, os ocidentais perdem a confiança na própria cultura, atacada com prepotência pelos adversários do liberalismo e da democracia. Batidos pelos chineses na expansão rápida da economia, amanhã, quem sabe, na vanguarda das tecnologias de ponta, americanos, europeus, temem a emergência, pela primeira vez em quinhentos anos, de uma superpotência não-ocidental.

Como será o mundo do futuro? Que valores refletirá a partir da influência do poder chinês? Até que ponto a ordem mundial continuará a se inspirar no Iluminismo, na Declaração dos Direitos do Homem, na democracia? É possível confiar na evolução de um regime como o chinês que confina centenas de milhares de uigures em campos de lavagem cerebral, que não tolera a diversidade de Hong Kong?

É nesse nevoeiro espesso de incertezas que se esconde o horizonte do futuro. Não foi muito diferente, cem anos atrás, quando o Brasil se aproximava do primeiro centenário. O mundo saia da Grande Guerra destroçado nas estruturas e nas almas. Em 1919, negociava-se o Tratado de Versalhes, Paul Valéry escrevia “nós civilizações sabemos agora que somos mortais […] sentimos que uma civilização tem a mesma fragilidade que uma vida”.

Os tempos não eram melhores que os de hoje. Basta lembrar que o ano do centenário da independência coincidiu com a marcha de Mussolini sobre Roma, a primeira conquista de um país pelo fascismo. A década de 1920 se encerraria com o colapso da Bolsa de Nova York e a Grande Depressão. A seguinte assistiria ao sinistro triunfo do nazismo, ao estalinismo, ao estalar da Segunda Guerra Mundial com o cortejo de horrores que se seguiu: o Holocausto, os campos de extermínio, as bombas atômicas sobre Hiroshima e Nagasaki.

Nada disso impediu o Brasil de avançar. Ao completar cem anos de vida independente, a sociedade brasileira deu balanço no passado, espantando-se com o déficit. No sugestivo estudo que dedicou ao centenário, A nação faz cem anos, a Professora Marly Silva da Motta mencionava o severo juízo de Capistrano de Abreu, ao concluir em 1907 seus Capítulos de história colonial. O legado de três séculos de colônia teria sido a pobreza intelectual, moral e material, a inexistência de vida social, a incapacidade organizativa. A monarquia escravocrata não havia sido capaz de superar tal herança em 67 anos de crescimento modorrento.

O debate intelectual, jornalístico, antes e depois do centenário, produziria, em 1924, a coletânea À margem da história da República. Seu organizador, Vicente Licínio Cardoso, afirmava que o desafio de sua geração consistia em empreender “nova Obra de construção, ou seja, fixar […] o Pensamento e a Consciência da Nacionalidade Brasileira”, tudo com maiúsculas. Nas palavras de Marly Motta, “ser moderna, eis a aspiração da sociedade brasileira às vésperas do Centenário da Independência”, embora a autora advirta que os diferentes atores tinham concepções diferentes da modernidade.

A diversidade marca, de fato, as manifestações do centenário, que se inauguram, em fevereiro, com a Semana de Arte Moderna de São Paulo, seguindo-se a fundação do Partido Comunista do Brasil, a do Centro Dom Vital, núcleo do pensamento católico conservador, por Jackson de Figueiredo, o sacrifício heroico dos 18 do Forte de Copacabana, primeira manifestação pública do Tenentismo, a Exposição Internacional de setembro, e a instituição, no último dia do ano, do imposto de renda!

O carcomido sistema político da República Velha não soube captar os sinais de que a sociedade ansiava por mudanças profundas: a greve geral de 1917, a pulsação dos movimentos artísticos, a inconformidade das baixas patentes do Exército com as fraudes eleitorais. Mostrou-se assim incapaz de deter o processo de autodestruição que culminaria na Revolução de 30.

Nascido com a Primeira República em 1889, Vicente Licínio Cardoso manifestava a decepção dos contemporâneos com os 35 anos do regime em palavras que parecem expressar os nossos sentimentos em relação aos 34 anos da Nova República: “A grande e triste surpresa de nossa geração foi sentir que o Brasil retrogradou. Chegamos quase à maturidade na certeza de que já tínhamos vencido certas etapas […]resolv(ido) de vez certos problemas essenciais. E a desilusão, a tragédia […] foi sentir quanto de falso havia nessas suposições”

Apesar do igual desapontamento, há uma evidente diferença entre a efervescência de 1922 e a desesperança de hoje. O contraste talvez se deva à crueldade do choque recente por haver sido precedido da ilusão de que o Brasil era “a maior história de sucesso da América Latina”, como afirmou a revista Economist na edição da fatídica capa do Cristo Redentor decolando, em novembro de 2009. Sem a mesma frustração de um tempo melhor, os brasileiros de 22 só viam, ao olhar para trás, um passado de atraso, ignorância, insucesso. A própria crise do sistema político vinha de longe, tornara-se crônica. O governo de Epitácio, que terminava em 22, até se comparava com vantagem aos anteriores, embora a situação não tardasse em se agravar com o advento de Artur Bernardes.

O confronto entre o primeiro e o segundo centenário põe em evidência o inédito da experiência corrente: a de que, em alguns aspectos importantes, nosso presente é pior que nosso passado. Não se trata do vulgar sentimento de que “a nuestro parescer, cualquier tiempo pasado fue mejor”, como dizia Jorge Manrique nas Coplas por la muerte de su padre.

Quem negaria, por exemplo, que os tempos atuais são piores que os da modernização do Estado e industrialização dos anos 1930 a 1950, aos “50 anos em 5” de JK, aos da Política Externa Independente de Jânio e San Tiago Dantas, aos 16 anos de estabilidade, crescimento, conquistas sociais de FHC e Lula? Se essa avaliação for julgada subjetiva, existe um critério mensurável indiscutível: o do crescimento econômico.

Segundo o professor Rogério Furquim Werneck, entre 1940 e 1980, a economia apresentou taxa média de crescimento de 7% ao ano, expansão rápida e estável, pois, em 40 anos, apenas em um, (1942), registrou-se queda do produto. O longo período de crescimento, comparável aos asiáticos, permitiu multiplicar o PIB real por quinze. Apesar da população haver triplicado no período, o produto por habitante cresceu mais de cinco vezes!

Compare-se agora com as quatro décadas seguintes, de acordo com os dados do estudo da Goldman Sachs (maio de 2019) intitulado: Brasil: duas décadas perdidas em 40 anos. Poderia o país perder meio século? Afirma o estudo que “nas quatro décadas entre 1981 e 2020, o crescimento real do PIB per capita quase certamente ficará em menos de 0,8% ao ano na média; nesse passo, levará 87 anos para dobrar a renda per capita […] em duas das últimas quatro décadas, o Brasil experimentou declínio de crescimento real do PIB per capita: a de 1980 e provavelmente a de 2010 […] a próxima década poderia também ser perdida, nesse caso, o Brasil teria perdido meio século”.

Esta última frase parece ecoar as palavras do barão de Cotegipe ao barão de Penedo sobre a guerra do Paraguai: “Maldita guerra, atrasa-nos meio século!” Um fracasso de 50 anos é assustador! É preciso martelar esses dados a fim de combater a complacência e reconhecer que estamos diante do maior desastre de desempenho coletivo de nossa história recente!

Temos de admitir que o nosso presente é, sob esses aspectos, muito pior do que certas fases do nosso passado. Existem, claro, luzes que se contrapõem às sombras. Estes 40 anos de altos e baixos coincidem com a consolidação da democracia. Sem arbítrio nem poderes especiais, a democracia encontrou soluções a problemas criados ou agravados pelos militares: a crise da dívida externa, a inflação explosiva, a destruição dos direitos humanos, a ruina do Estado de direito.

Nesse período, em especial nos 20 anos entre 1995 e 2015, alcançou-se a maior redução relativa da pobreza e da indigência de nossa História. O plano Real criou uma moeda estável, institui-se o ministério da Defesa para subordinar os militares ao poder civil, atingiu-se a universalização do ensino fundamental, os estudantes das classes CDE no ensino superior saltaram de 87 mil a 2,1 milhões, lançaram-se as bases de um serviço de saúde universal.

Os progressos são reais, o problema é que, depois de gerar tais resultados, o sistema político-econômico mostra sinais de esgotamento, produzindo rendimentos decrescentes. Ora, se a estagnação se perpetuar, muitas conquistas se revelarão insustentáveis a longo prazo. Foi o que sucedeu na Argentina, onde os progressos educacionais e sociais vêm sendo gradualmente erodidos pela crise quase permanente. O bicentenário da independência argentina em 2016 encontrou a nação pior do que cem anos antes, no primeiro centenário, quando era a quinta maior economia do mundo. O decadentismo, o declínio secular, que nos habituamos a atribuir a nossos vizinhos do rio da Prata é, na verdade, doença contagiosa que já transpôs nossas fronteiras.

A exemplo de cem anos atrás, a aproximação do segundo centenário fornece estímulo para reagir à doença antes que se torne crônica. Em 22, esse papel pioneiro correspondeu, em primeiro lugar, à Semana de Arte Moderna. Um século depois, ultrapassado o debate de 22 sobre a modernidade e a questão da identidade nacional, o que nos cabe é identificar razões para confiar que o futuro será melhor que o presente e superior aos melhores momentos do passado. Precisamos de razões plausíveis para recuperar o que perdemos devido aos sucessivos fracassos: a confiança em nossa capacidade de influenciar o futuro, de dar-lhe um sentido humano.

O ponto de partida terá de ser a renovação da cultura, da filosofia, da literatura, das artes, como na Semana de Arte Moderna, na geração espanhola de 1898 e na experiência de outros povos. De 1922, o que ficou na memória coletiva foi a Semana de Arte Moderna. É por referência a Mário de Andrade, a Oswald, a Bandeira, a Drummond, a Villa Lobos, aos que vieram depois, que nos definimos na consciência de uma identidade bem diferente da que prevalecia anteriormente.

No campo das ideias, os sinais não são encorajadores. A novidade, se é que cabe tal palavra, é a versão brasileira requentada de fenômeno mundial, a seita de extrema-direita que mistura ideólogos pós-fascistas com iluminados, astrólogos, apocalípticos e lunáticos de todo o gênero. Em política, a polarização e radicalização da sociedade se aproximam dos níveis da véspera do golpe militar de 64. Consolida-se um quadro perverso que lembra o italiano no período em que o Partido Comunista se mantinha como primeira força de oposição, atingia um terço do eleitorado, mas não lograva romper esse teto. Dizia-se então que a Itália não era um país normal como os demais da Europa Ocidental pois não existia possibilidade de uma alternância democrática, que equivaleria à chegada do comunismo ao poder.

A eleição brasileira de 2018 ajusta-se a essa descrição. O padrão se reproduzirá por muito tempo se não se romper a polarização entre extrema direita e PT, com o medo empurrando os segmentos médios na direção da direita. Superar o medo requer algo parecido ao compromisso histórico que se frustrou na Itália, isto é, a aliança entre o centro socialmente progressista e a esquerda democraticamente renovada.

A eficácia econômica, a responsabilidade financeira, que tomaram o lugar da luta contra a miséria depois do colapso da era Dilma não bastarão se não forem acompanhadas de vida melhor para os marginalizados. A paixão capaz de galvanizar a sociedade brasileira só pode vir da busca da maior igualdade possível. Uma população dividida por profunda desigualdade de condições jamais se empolgará por ideais liberais de competição, eficácia, meritocracia, produtividade. Necessárias para tornar sustentável a economia, essas qualidades precisam ser conciliadas com forte redistribuição da propriedade e da renda.

Nos anos 20, o vácuo criado no debate público pelo fim do abolicionismo começava apenas a ser ocupado pela “questão social”, sob impacto das greves operárias, dos primeiros sindicatos, da agitação dos jornais e elementos anarco-sindicalistas. Dos 17,5 milhões de habitantes de 1900, rurais e analfabetos na sua maioria, a população atingiria cerca de 31 milhões no ano do centenário. A partir de então acelera-se a dupla explosão demográfica e urbana, hoje em grande parte concluída, até chegar aos atuais 209 milhões, 86% vivendo em cidades.

O crescimento concentrou-se maciçamente nos pobres. Deu nascimento às favelas, às gigantescas periferias que circundam as cidades, mesmo as pequenas do interior. Nelas se desenvolve um ator social novo, de cultura original até na religiosidade carismática e na expressão política. Esse ator novo exige um lugar ao sol na vida política, na economia, na cultura. A história dos últimos cem anos se confunde com o esforço de integração da periferia, das resistências aos avanços, dos políticos e partidos que tentaram canalizar a luta ou se beneficiar dela, Vargas, PTB, Lula, PT.

Ninguém se iluda, o aparecimento de um novo ator social e político tem sempre efeito desestabilizador. Assim sucedeu na Europa da Revolução Industrial, com as revoluções de 1830, 1848, da Comuna de 1871. Entre nós e no resto da América Latina não será diferente: não haverá paz, estabilidade, retomada do desenvolvimento sem a integração progressiva do novo ator como cidadão, produtor, consumidor, agente de cultura.

Urge por isso dobrar a página desta anomalia monstruosa produzida pelo medo na última eleição, reabrindo o caminho para devolver a esperança a todos os brasileiros, em especial aos que mais carecem dela. Depois desta hora do poder das trevas, impõe-se dar sentido à História, recuperar o sentimento de que a vida humana no Brasil não é absurda e insensata.

Nesse esforço cabem à renovação da cultura e aos intelectuais um papel insubstituível. Trata-se, com efeito, como escrevia Marcuse em O Homem Unidimensional, de fazer com que os extremos se encontrem, isto é, que a consciência humana mais evoluída se ponha a serviço da força humana mais explorada.

Não está escrito nas estrelas que o nosso futuro será melhor ou pior que o presente e o passado. Sem o consolo das certezas ilusórias, depende apenas de nós, de nossa ação consciente, que os próximos cem anos revertam o declínio, garantindo-nos um futuro melhor que o presente e superior ao passado. Devemos devolver ao Brasil não uma esperança qualquer, mas aquela de que afirmava Walter Benjamin: “É apenas por causa dos que não têm esperança que a esperança nos foi dada”.

*Rubens Ricupero é diplomata

Fonte: Fundação Astrojildo Pereira

Críticas de senadores à atitude subserviente do chanceler bolsolavista

 Após visita de Pompeo, senadores querem adiar sabatina de embaixadores

Grupo de parlamentares diz que, diante do impasse diplomático criado pela passagem de Pompeo a Roraima, o momento não é adequado para a votação desta segunda-feira (21/09)
Marina Barbosa
Correio Braziliense, 20/09/2020 20:30

A passagem do secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo, por Roraima não só renovou as críticas à política externa do governo de Jair Bolsonaro, como pode atrapalhar a retomada das atividades presenciais do Senado, prevista para esta segunda-feira (21/09). É que o primeiro compromisso presencial dos senadores é destravar a indicação de 34 embaixadores brasileiros. Porém, um grupo de parlamentares avalia que o momento não é de fazer votações desse tipo, mas de rever a postura do Itamaraty. Por isso, ameaça não comparecer às sabatinas.

O Correio apurou que mais da metade dos 19 titulares da Comissão de Relações Exteriores (CRE) do Senado pediu o adiamento da votação. Eles reclamam que o governo Bolsonaro adota uma política de subserviência aos Estados Unidos que ameaça a soberania e a defesa brasileira. E dizem que a "submissão" ficou clara nesta semana, quando Mike Pompeo usou um palanque montado em solo brasileiro para fazer duras críticas ao governo da Venezuela, com quem, lembram os parlamentares, o Brasil compartilha mais de dois mil quilômetros de fronteira.

"A sociedade, a diplomacia e o Parlamento estão abismados com a acelerada degradação da nossa política externa, que coloca em risco a soberania e a defesa. Não é hora do Senado aprovar embaixadores em massa. Sejamos responsáveis. É urgente fazer um balanço do Itamaraty", reclamou o senador Telmário Mota (Pros-RR), um dos que pediu a suspensão da votação desta segunda-feira. "Nossa política externa não vai bem.[...] Devemos deixar votação de embaixador para depois e reposicionar o Itamaraty", reforçou o senador Renan Calheiros (MDB-AL), nas redes sociais.

Para Calheiros, até ex-chanceleres brasileiros clamaram para que “o Senado exerça seu papel e vele pelo artigo 4º da Constituição”, segundo o qual as relações internacionais brasileiras devem ser regidas por princípios como a independência nacional, a autodeterminação dos povos, a não-intervenção e a defesa da paz. O senador se referia a uma nota conjunta divulgada neste domingo (20/09) pelos ex-chanceleres brasileiros Fernando Henrique Cardoso, Aloysio Nunes Ferreira, Celso Amorim, Celso Lafer, Francisco Rezek e José Serra.

Na nota, os ex-chanceleres lembram que foram os "responsáveis pelas relações internacionais do Brasil em todos os governos democráticos desde o fim da ditadura militar" e salientam que "temos a obrigação de zelar pela estabilidade das fronteiras e o convívio pacífico e respeitoso com os vizinhos, pilares da soberania e da defesa". "Nesse sentido, condenamos a utilização espúria do solo nacional por um país estrangeiro como plataforma de provocação e hostilidade a uma nação vizinha", acrescentam.

Os ex-ministros das Relações Exteriores ainda congratularam o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que repudiou a visita de Pompeo e foi criticado pelo atual chanceler brasileiro, Ernesto Araújo, em nota divulgada nesse sábado (19/09) pelo Itamaraty, por conta disso. E pediram que, dando sequência a essa posição de Maia, o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal "exerçam com plenitude as atribuições constitucionais de velar para que a política internacional do Brasil obedeça rigorosamente no espírito e na letra aos princípios estatuídos no Artigo 4º da Constituição Federal".

Presidente da CRE do Senado, Nelsinho Trad (MSD-MS) confirmou que muitos senadores ameaçaram não comparecer à votação desta segunda-feira. Porém, está tentando convencê-los a mudar de ideia, apesar de também classificar o episódio de Pompeo como “lamentável”.

"A comissão vai avaliar a competência de diversos servidores de carreira do Itamaraty de servir o país, na sua melhor das intenções. Esses diplomatas não têm culpa pelo que aconteceu e não devem ser penalizados", justificou Trad. Ele ainda lembrou que muitas das 34 indicações aguardam a avaliação do Senado há meses. E ressaltou que, devido à pandemia de covid-19, o Senado pode não ter outra oportunidade de destravar essas indicações tão cedo.

O senador Otto Alencar (PSD-BA), um dos que criticou a "invasão do nosso território por um representante norte-americano", entendeu o recado. "Alguns senadores não estão dispostos a votar, mas não vou ser radical. Porém, não podemos aceitar submissão, não podemos ficar nos ajoelhando aos pés do governo dos Estados Unidos, como faz de forma aberta o ministro Ernesto Araújo, querendo ajudar a eleição de Trump", avisou Alencar.

Trad admitiu, contudo, que será preciso aguardar o início da sessão, previsto para a manhã desta segunda-feira, para ver se os demais senadores vão seguir o plano e votar as indicações ou vão suspender a deliberação em protesto à postura do Itamaraty.

Bolsonaro
Apesar desse impasse político e diplomático, o presidente Jair Bolsonaro saiu em defesa de Mike Pompeo e do presidente americano, Donald Trump, neste domingo (20/09). Ele disse que a visita do secretário de Estado norte-americano a Roraima "representa o quanto nossos países estão alinhados na busca do bem comum" e parabenizou Trump "pela determinação de seguir trabalhando, junto com o Brasil e outros países, para restaurar a democracia na Venezuela". Nas redes sociais, o chefe do Executivo também elogiou as ações coordenadas pelo governo brasileiro para acolhida dos venezuelanos “que fugiram do regime comunista”.

https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2020/09/4876689-apos-visita-de-pompeo-senadores-querem-adiar-sabatina-de-embaixadores.html

Contra Ernesto Araújo, senadores querem cancelar sabatina com embaixadores

Por João Frey 
Congresso em Foco, 20 set, 2020 - 18:37 

Um grupo de senadores começou a se movimentar neste fim de semana para derrubar as reuniões da Comissão de Relações Exteriores do Senado destinadas a sabatinar 34 diplomatas indicados a postos de embaixador. O estopim do movimento foi a visita do secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo, a Roraima, na última sexta-feira (18). Os senadores avaliam que o movimento foi um desrespeito à soberania brasileira endossado pelo chanceler Ernesto Araújo.

A tentativa de derrubar as sessões está sendo capitaneada pelos senadores Telmário Mota (Pros/RR), Renan Calheiros (MDB/AL), Randolfe Rodrigues (Rede/AP), Kátia Abreu (PP/TO), além dos senadores do PT.

Renan Calheiros
@renancalheiros
Nossa política externa não vai bem. A soberania e defesa nacional estão em risco. Os chanceleres FHC,Rezek,Lafer,Amorim,Serra e Aloísio clamam para que o Senado exerça seu papel e vele pelo art.4 da CF. Devemos deixar votação de embaixador para depois e reposicionar o Itamaraty.
1:36 PM · 20 de set de 2020

Telmário Mota
@TelmarioMotaRR
O @ernestofaraujo destrói a tradição do Itamaraty. Pisa no art. 4º da CF. Cede o território para um agente dos EUA ameaçar um país amigo. Ataca o presidente @rodrigomaia. Ex-chanceleres saem na defesa da CF. Em tamanha crise, o Senado deve suspender a aprovação de embaixadores!
1:46 PM · 20 de set de 2020

Randolfe Rodrigues 🇧🇷
@randolfeap
O Comportamento de nosso Ministro de Relaçoes Exteriores fere o artigo 4°. de nossa Constituição e a tradição do Itamaraty, nosso país não pode se tornar um pária global.    A prioridade do Senado não pode ser “votar embaixador”, mas enquadrar a nossa política externa.
5:12 PM · 20 de set de 2020

Kátia Abreu
@KatiaAbreu
“ TODOS os chanceleres da nova república repudiaram o ocorrido em Roraima : FHC gov Itamar, Rezek gov Collor,Lafer do gov FHC, Amorim do gov. Lula e Serra e Aluísio do gov. Temer. Descumprimento do artigo 4° da CF.”
1:54 PM · 20 de set de 2020

Um nota publicada neste domingo por seis ex-chanceleres cobrou esforços do Congresso no sentido de preservar o artigo quarto da Constituição, que prevê que “A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:

I – independência nacional;

II – prevalência dos direitos humanos;

III – autodeterminação dos povos;

IV – não intervenção;

V – igualdade entre os estados;

VI – defesa da paz;

VII – solução pacífica dos conflitos;

VIII – repúdio ao terrorismo e ao racismo;

IX – cooperação entre os povos para o progresso da humanidade;

X – concessão de asilo político.”

https://congressoemfoco.uol.com.br/legislativo/contra-ernesto-araujo-senadores-querem-cancelar-sabatina-com-embaixadores/


Ex-titulares do Itamaraty divulgam nota de apoio a Maia
Deutsche Welle, 21/09/2020

Antigos ministros das Relações Exteriores também repudiaram visita de Mike Pompeo a Roraima. Na sexta-feira, presidente da Câmara criticou presença do americano semanas antes de eleição nos EUA.
Seis ex-ministros das Relações Exteriores do Brasil publicaram neste domingo (20/09) uma nota de apoio ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que na última sexta-feira criticou a visita do chefe da diplomacia dos EUA, Mike Pompeo, ao estado de Roraima.

Na ocasião, o secretário de Estado americano visitou um centro de acolhida de refugiados em Boa Vista e fez um discurso linha-dura contra o regime chavista, chamando Nicolás Maduro de "traficante de drogas". Ele ainda se encontrou com Ernesto Araújo, o ultraconservador ministro das Relações Exteriores de Jair Bolsonaro.

A nota de apoia a Maia é assinada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (que chefiou o Itamaraty no governo Itamar Franco) e pelos ex-ministros Francisco Rezek (governo Collor), Celso Lafer (governos Collor e FHC), Celso Amorim (governos Itamar e Lula), José Serra e Aloysio Nunes Ferreira (governo Temer).

No texto, eles compartilham a opinião de Maia, que havia criticado especialmente o timing da visita – menos de seis semanas antes da eleição presidencial dos EUA. O deputado ainda afirmou que permitir a presença de Pompeo junto à fronteira com a Venezuela – com quem os EUA mantêm uma relação hostil – estava em desacordo "com a boa prática diplomática internacional e afronta as tradições de autonomia e altivez" das "políticas externa e de defesa" do Brasil.

A nota do ex-ministros elogia Maia pelo tom crítico, e afirma que o deputado agiu como "intérprete dos sentimentos do povo brasileiro".

"Responsáveis pelas relações internacionais do Brasil em todos os governos democráticos desde o fim da ditadura militar, os signatários se congratulam com o deputado Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados, pela nota de 18 de setembro, pela qual repudia a visita do Secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, a instalações da Operação Acolhida, em Roraima, junto à fronteira com a Venezuela", diz o texto.

"Conforme salientado na nota do presidente da Câmara, temos a obrigação de zelar pela estabilidade das fronteiras e o convívio pacífico e respeitoso com os vizinhos, pilares da soberania e da defesa. Nesse sentido, condenamos a utilização espúria do solo nacional por um país estrangeiro como plataforma de provocação e hostilidade a uma nação vizinha", completa o texto.

No sábado, o atual titular do Itamaraty, Ernesto Araújo, que serviu como anfitrião de Pompeo, reagiu à nota de Maia e disse que a opinião do presidente da Câmara "baseia-se em informações insuficientes e em interpretações equivocadas".

"Buscar a paz não significa acovardar-se diante de tiranos e criminosos. A independência nacional não significa rejeitar parcerias que nos ajudem a defender nossos interesses mais urgentes e nossos valores mais caros. Promover a integração latino-americana não significa facilitar a integração dos cartéis da droga", escreveu Araújo num texto disponibilizado no site do Itamaraty.

Sem citar nomes, ele ainda criticou a atuação dos seus antecessores à frente do ministério nos últimos 20 anos, afirmando que eles alternaram um "silêncio cúmplice" ou "colaboração descarada” em relação ao regime chavista. "A triste história da diplomacia brasileira para a Venezuela entre 1999 e 2018 constitui exemplo de cegueira e subserviência ideológica, altamente prejudicial aos interesses materiais e morais do povo brasileiro e a toda a América Latina."

A visita de Pompeo a Roraima na sexta-feira foi a terceira etapa de um giro pela América do Sul. Na quinta-feira, ele já havia visitado Georgetown, a capital da Guiana, e Paramaribo, no Suriname, e se reunido com os presidentes desses países. Nas duas etapas anteriores, ele também fez pesadas críticas a Maduro. Parte da imprensa americana interpretou o giro como um gesto para conquistar votos entre o eleitorado de origem latina do estado americano da Flórida, considerado decisivo nas eleições presidenciais dos EUA, previstas para o início de novembro.

https://www.dw.com/pt-br/ex-titulares-do-itamaraty-divulgam-nota-de-apoio-a-maia/a-54996409


Itamaraty rebate críticas de Maia à visita do secretário de Estado dos EUA

Segundo o ministro das Relações Exteriores, Brasil e Estados Unidos estão “na vanguarda da solidariedade ao povo venezuelano”
Por Mariana Ribeiro, Valor — Brasília
19/09/2020 12h25  Atualizado há 23 horas

O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, criticou as declarações do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), em relação à visita do secretário de Estado dos Estados Unidos, Mike Pompeo, ontem, às instalações da Operação Acolhida, em Roraima, na fronteira entre o Brasil e a Venezuela.

Em nota divulgada neste sábado, Araújo diz que as falas de Maia se baseiam “em informações insuficientes e em interpretações equivocadas”.

Ontem, o presidente da Câmara divulgou nota em que diz que a visita, a 46 dias da eleição presidencial americana, "não condiz com a boa prática diplomática internacional e afronta as tradições de autonomia e altivez de nossas políticas externa e de defesa".

O ministro, por sua vez, diz que o povo brasileiro preza pela sua própria segurança “e a persistência na Venezuela de um regime aliado ao narcotráfico, terrorismo e crime organizado ameaça permanentemente essa segurança”. Ele segue dizendo que não há “autonomia e altivez”, citando a declaração de Maia, em ignorar o sofrimento do povo venezuelano ou em negligenciar a segurança do brasileiro. 

Autonomia e altivez há, sim, em romper uma espiral de inércia irresponsável e silêncio cúmplice, ou de colaboração descarada, a qual, praticada durante 20 anos frente aos crescentes desmandos do regime Chávez-Maduro, contribuiu em muito para esta que é talvez a maior tragédia humanitária já vivida em nossa região.”

Araújo destaca ainda que os Estados Unidos já doaram US$ 50 milhões para a Operação Acolhida e que, ontem, Pompeo anunciou a doação de mais US$ 30 milhões. Segundo ele, Brasil e Estados Unidos estão “na vanguarda da solidariedade ao povo venezuelano”.

Na sequência, cita a Constituição para dizer que a “prevalência dos direitos humanos” está entre os princípios que devem orientar as relações internacionais. “Nossa atuação descumpriria a Constituição se fechássemos os olhos à tragédia venezuelana."

Autonomia e altivez há, sim, em romper uma espiral de inércia irresponsável e silêncio cúmplice, ou de colaboração descarada, a qual, praticada durante 20 anos frente aos crescentes desmandos do regime Chávez-Maduro, contribuiu em muito para esta que é talvez a maior tragédia humanitária já vivida em nossa região.”

Araújo destaca ainda que os Estados Unidos já doaram US$ 50 milhões para a Operação Acolhida e que, ontem, Pompeo anunciou a doação de mais US$ 30 milhões. Segundo ele, Brasil e Estados Unidos estão “na vanguarda da solidariedade ao povo venezuelano”.

Na sequência, cita a Constituição para dizer que a “prevalência dos direitos humanos” está entre os princípios que devem orientar as relações internacionais. “Nossa atuação descumpriria a Constituição se fechássemos os olhos à tragédia venezuelana."

https://www.google.com.br/amp/s/valor.globo.com/google/amp/politica/noticia/2020/09/19/itamaraty-rebate-crticas-de-maia-visita-do-secretrio-de-estado-dos-eua.ghtml

domingo, 20 de setembro de 2020

Os descaminhos da nossa diplomacia servil a Trump - Janaina Figueiredo (La Nación)

La gira de Pompeo fortalece el alineamiento automático de EE.UU. y Brasil


La Nación, 20/09/2020
El secretario de Estado norteamericano, Mike Pompeo
El secretario de Estado norteamericano, Mike Pompeo  Fuente: AFP
19 de septiembre de 2020  • 19:52

RÍO DE JANEIRO.- En su libro Miedo: Trump en la Casa Blanca , el periodista norteamericano Bob Woodward menciona la estrecha relación entre el presidente y su par brasileño, Jair Bolsonaro , a quien alguna vez llamó "el Trump de los trópicos" . En uno de sus relatos, Woodward asegura que en marzo pasado, cuando la pandemia de coronavirus ya era una realidad en el continente y Washington sabía de su gravedad, el republicano hizo una excepción en su agenda externa y aceptó recibir a Bolsonaro en su residencia Mar-a-Lago, en Florida . Días después, tres integrantes de la comitiva brasileña confirmaron tener Covid-19 y el consejero de Seguridad Nacional, Robert O'Brien, relató a Woodward que "temió transformarse en el responsable de exponer Trump al virus".

Lo narrado por el periodista retrata el grado de cercanía entre los dos presidentes, que para importantes dirigentes brasileños ya es consideradainconstitucional Trump es el mayor ídolo de Bolsonaro y usa al gobierno brasileño como pieza clave en su estrategia regional. En este contexto debe entenderse la visita del secretario de Estado norteamericano, Mike Pompeo, al estado brasileño de Roraima ayer. Una visita que causó polémica en Brasil y llevó el presidente de la Cámara de Diputados, Rodrigo Maia, a calificarla de"ofensa a las tradiciones de autonomía" de la política exterior nacional.

La escala en Roraima tuvo el objetivo de discutir la crisis venezolana y enviarle un fuerte mensaje a Nicolás Maduro . En un estado brasileño que tiene una amplia frontera con Venezuela , el secretario de Estado, recibido con honores por el canciller Ernesto Araújo, le pidió a Maduro que renuncie. Para Maia y otros dirigentes, el gobierno de Bolsonaro cometió un acto inconstitucional al violar los principios de independencia nacional.

Para Trump, esa escala en territorio brasileño era importante por varios motivos. Seguir estrechando el vínculo con un aliado estratégico; enviarle un mensaje a los electores latinos de Florida y a su archienemigo venezolano. La sociedad con Bolsonaro le ha dado buenos resultados al magnate. El fin de semana pasado, el apoyo indispensable de Brasil le permitió a Estados Unidos ocupar, por primera vez en sus 60 años de historia, la presidencia del Banco Interamericano de Desarrollo (BID). Con un alto nivel de abstención, fue electo el norteamericano de origen cubano Mauricio Claver-Carone.

Si Brasil hubiera presentado un candidato a la altura de las circunstancias, hubiera tenido chances de quedarse con el cargo. Muy por el contrario, propuso al empresario y banquero Rodrigo Xavier, cercano al ministro de Economía, Paulo Guedes, que, según fuentes del BID, ni siquiera habla bien español. Con el lanzamiento de la candidatura de Claver-Carone, el gobierno de Bolsonaro retiró inmediatamente a Xavier y se puso en campaña para respaldar al hombre de Trump.

La alianza entre Brasil y Estados Unidos también hizo jugadas fuertes en la Organización de los Estados Americanos ( OEA ), donde apoyaron a principios de año la reelección del uruguayo Luis Almagro como secretario general. Meses más tarde, Bolsonaro logró que Almagro diera un fuerte impulso a varias denuncias administrativas contra Paulo Abrão, ahora exsecretario general de la Comisión Interamericana de Derechos Humanos (CIDH). Abrão fue funcionario de los gobiernos del Partido de los Trabajadores (PT) y, además de eso, promovía investigaciones sobre supuestas violaciones de los derechos humanos en países como Brasil.

Para completar el cuadro, Bolsonaro acaba de enviar a su exasesor especial Arthur Weintraub a Washington para ocupar una secretaría del gabinete de Almagro. El hermano del exasesor -el exministro de Educación Abraham Weintraub, envuelto en conflictos diplomáticos con China y famoso por haber dicho que todos los jueces del Supremo Tribunal Federal (STF) deberían estar presos- fue enviado al Banco Mundial.

Queda claro que el vínculo Trump-Bolsonaro es útil a ambos. Aunque en el caso del brasileño lo sea más en temas personales y no de interés nacional. El alineamiento automático con Estados Unidos no le generó beneficios económicos o comerciales a Brasil. Todo lo contrario: el gobierno acaba de adoptar medidas que favorecerán las exportaciones de etanol y arroz norteamericano y, en este último caso, que perjudican a sus socios del Mercosur. Las barreras proteccionistas al acero aplicadas por Estados Unidos demuestran que, a la hora de priorizar, salen ganando los intereses nacionales.

Bolsonaro le sirve mucho más a Trump que viceversa. La Casa Blanca busca ampliar su influencia en la región, principalmente para contraponerse a China . Eso explica, en gran medida, el interés por la presidencia del BID, ámbito donde se toman decisiones sobre reglas de inversión.

"América Latina está muy dividida, y el símbolo de esa fragmentación es la mala relación entre Brasil y la Argentina . En ese contexto, Estados Unidos aprovecha las divisiones para imponerse", explicó a LA NACION Mauricio Santoro, profesor de Relaciones Internacionales de la Universidad Estadual de Río de Janeiro (UERJ).

El presidente brasileño tiene dedicación exclusiva a su ídolo y, como escribió recientemente un internauta en Twitter, se transformó en una especie de "Trump con cinco días de delay . Estuvieron unidos en la defensa de la cloroquina como medicamento supuestamente eficaz contra el Covid-19; minimizaron la pandemia; criticaron a la Organización Mundial de la Salud(OMS); cuestionan los organismos multilaterales, como la Organización Mundial de Comercio (OMC), y en la región sostienen el discurso más duro contra Venezuela, acompañados por la Colombia de Iván Duque , por donde pasó Pompeo.

El canciller brasileño dice públicamente que su gobierno no tendría problemas en relacionarse con una eventual administración demócrata. Pero internamente se sabe que Bolsonaro apuesta a la reelección de Trump. "¿Podrías imaginar a un secretario de Estado demócrata llegando a Roraima? Yo lo veo más visitando la Amazonia, o el Pantanal, y demostrando preocupación por los incendios", dijo Santoro.

El embajador Paulo Roberto de Almeida, tal vez el mayor crítico de Araújo en actividad, dijo que Roraima fue "un set de la campaña de propaganda de Trump". Para el embajador, una eventual derrota de Trump dejaría al presidente brasileño totalmente aislado en la región y el mundo.



Sobre ser diplomata atualmente - Paulo Roberto de Almeida

 Sobre ser diplomata atualmente 

 

Paulo Roberto de Almeida

(www.pralmeida.orghttp://diplomatizzando.blogspot.com)

[Objetivopalestra online para secundaristasfinalidadeRotary Club Curvelo]

 

 

Sumário:

Introdução: Atribuições relacionadas ao seu ofício

1. O mercado de trabalho para a profissão atualmente.

2. Possíveis áreas de pesquisa relacionadas a formação

3. A relação entre vida pessoal e profissional

4. Melhores faculdades

5. Motivo pelo qual escolheu esta profissão

6. Média salarial

Conclusões: ser diplomata é uma grande profissão

 

 

Introdução: Atribuições relacionadas ao seu ofício

Trata-se de uma burocracia de alto nível de qualificação técnica com ampla abertura para as humanidades e o conhecimento especializado. É a mais intelectualizada carreira na burocracia federal, combinando aspectos da carreira acadêmica, da pesquisa aplicada e da elaboração de decisões em ambiente altamente competitivo, tanto interna, quanto externamente. Uma elite, como se costuma dizer. As funções são aquelas clássicas: informação, representação, negociação, para o que se exige não apenas conhecimento especializado, mas também experiência prática, que se adquire ao longo da carreira, participando de conferências internacionais, defendendo os interesses do Brasil no plano externo, no plano bilateral, em foros regionais e em organizações multilaterais.

 

1. O mercado de trabalho para a profissão atualmente.

É preciso distinguir entre o mercado de trabalho da diplomacia estrito senso – que é reservado exclusivamente aos que ingressam na carreira por concurso público, em número necessariamente limitado a cada ano – e o mercado mais amplo do internacionalista, ou seja o egresso dos cursos de relações internacionais, ou os que formados em quaisquer outras áreas, resolvem trabalhar em ocupações que requeiram algum conhecimento especializado nesse enorme terreno, que vai de empresas vinculadas ao comércio internacional, finanças e serviços transnacionais, e quaisquer outras atividades que se desenvolvam no plano externo. 

O “mercado” da diplomacia, se o termo se aplica, é cativo dos aprovados no concurso da carreira, mas outros profissionais podem encontrar empregos no setor privado, nos bancos, nas empresas de publicidade, em ONGs ou até em organizações internacionais, que também são muito solicitadas e requerem um bom currículo e concursos. Em função dessas características, eu recomendaria uma formação bem mais adaptada ao mercado privado do que ao concurso para a diplomacia, uma vez que a seleção é impiedosa, e as pessoas precisam trabalhar antes de conseguir passar no concurso.

 

2. Possíveis áreas de pesquisa relacionadas à formação

Ciências Sociais, ou Humanidades, no sentido lato, embora muitos dos candidatos à carreira sejam egressos dos cursos da própria área, ou seja, Relações Internacionais. Mas Direito, Economia e Administração podem ser válidos, desde que completados por uma boa formação em história e política internacional. No meu caso, acredito que uma formação ampla nas ciências sociais, com leituras em praticamente todas as áreas das Humanidades, foi fundamental para o ingresso e sucesso na carreira escolhida. Desde muito cedo inclinei-me para os estudos sociais, com forte ênfase na história, na política e na economia, complementados por uma dedicação similar a geografia, antropologia, línguas e cultura refinada, de uma maneira geral. Sou basicamente um autodidata e creio que isso facilitou-me enormemente o ingresso na carreira, pois quase não necessitei de muito estudo para os exames de ingresso. Aliás, entre a decisão de fazer o concurso (direto, no meu caso) e o ingresso efetivo, decorreram pouquíssimos meses (três). Minhas maiores dificuldades nos exames de ingresso estavam em Direito e inglês, já que eu havia estudado amplamente todas as demais matérias, mas não Direito, e todos os meus estudos foram feitos em francês, que eu dominava amplamente. Mas, o meu inglês era muito elementar, servindo tão somente para leituras. Acho que passei raspando nessas duas matérias, nas outras fui bem.

 

3. A relação entre vida pessoal e profissional

Nunca fui um carreirista, no sentido tradicional do termo, e não me preocupava em ser embaixador ou ocupar qualquer posto de distinção. O que me seduzia era a profissão em si, a mobilidade geográfica, o conhecimento de novos países, a possibilidade de estar sempre aprendendo, estudando, viajando. Sou basicamente um estudioso, um observador da realidade, um “compilador” de informações e análises e um escritor improvisado. Todo o resto me é secundário. Devo dizer que sou basicamente um acadêmico, sendo a diplomacia a profissão mais próxima de meus interesses de estudo. Nunca deixei de dar aulas, de fazer pesquisas, de publicar artigos e livros nas áreas de meus interesses de estudo. Mas, cabe enfatizar que muito na carreira, na vida simplesmente, tem a ver com a situação familiar, o companheirismo, e a sensação de compartilhamento. Eu nunca teria feito muito do que fiz se não fosse pela extraordinária sorte de ter encontrado uma pessoa maravilhosa, ainda mais estudiosa, leitora, nômade, aventureira e dedicada à família, que foi Carmen Lícia Palazzo, que conheci assim que ingressei na carreira, ela economista de formação, depois historiadora, e que me acompanha desde o início e ao longo dos últimos 43 anos. 

Ao me interessar por tantas atividades simultaneamente, reconheço que isso possa representar algum stress no plano familiar, e nisso sou particularmente reconhecido à Carmen Lícia, que me permitiu fazer tantas coisas ao mesmo tempo. Incorro em algum sacrifício para consegui fazer tudo aquilo que tenho vontade, pela simples razão que eu tenho vontade de ler tudo, o tempo todo, em qualquer circunstância, assim como tenho vontade de viajar, de participar de atividades acadêmicas e intelectuais, tendo ao mesmo tempo de desempenhar as funções atribuídas pela burocracia no meio de tudo isso. Ora, é praticamente impossível conciliar tantas vontades, e ainda ser um marido perfeito, um pai de família perfeito e outras coisas da vida social e relacional. Sem a compreensão de Carmen Lícia, e de meus filhos, eu não teria conseguido fazer sequer a metade do que fiz ao longo dos anos.

Em síntese, outros aspectos, não especificamente burocráticos ou familiares, foram de certa forma sacrificados no empenho pessoal em ler, estudar e escrever. Reconheço essas imperfeições, mas não se pode ter tudo na vida: escolhas são inevitáveis, e as minhas estão do lado da leitura, do saber e da escrita. São atividades nas quais eu me realizo plenamente. Em outros termos, ninguém consegue integrar todos os seus interesses perfeitamente, e algum aspecto (ou vários) acaba sempre sendo sacrificado; no meu caso, são horas de sono, de lazer, de simples far niente, e também certa negligência familiar, reconheço. Não pratico esportes, a não ser caminhadas moderadas, já em idade madura. Pratico leituras múltiplas, com alguma intensidade, eu diria intensíssima, e sobretudo o gosto da escrita. No mais, sou um pouco eremita...

 

4. Melhores faculdades

Atualmente existem bons cursos de relações internacionais em praticamente todas as universidades públicas do país, mas também existem excelentes cursos em instituições privadas, geralmente muito caras, tipo Católicas, FGV, Insper, Ibmec, etc. Minha própria instituição, o Uniceub, oferece curso de graduação nessa área, mas eu estou vinculado aos programas de mestrado e doutorado em Direito. Como já disse, não acredito que o candidato ou o jovem vocacionado para a diplomacia deva necessariamente fazer um curso de relações internacionais, pois acho que ele deva moldar uma carreira normal de mercado, e se tornar praticamente um autodidata no estudo preparatório para os exames de ingresso na carreira.

 

5. Motivo pelo qual escolheu esta profissão

Não tenho certeza de ter escolhido a profissão de diplomata; talvez eu possa dizer que, de certa forma, foi a profissão que me escolheu, uma vez que, desde muito cedo, comecei a viajar, primeiro pelo Brasil, depois pela América do Sul e, finalmente, ao completar 21 anos, em 1970, decidi estudar na Europa, por meus próprios meios e obtendo meus próprios recursos. Mas, isso não tinha sido planejado até aquela época: eu pretendia terminar o meu curso de Ciências Sociais, que eu havia iniciado na FFLCH da USP em 1969, mas que tinha sido dramaticamente atingido pelo AI-5, da ditadura militar: praticamente todos os meus professores mais importantes do curso – Florestan Fernandes, Fernando Henrique Cardoso, Octavio Ianni e outros – foram compulsoriamente aposentados; eu então decidi abandonar o curso no Brasil e tentar retomá-lo na Europa. Foi uma escolha que me preparou para uma vida nômade e aventureira. Nunca me arrependi de me ter lançado ao mundo em fase precoce, ainda no segundo ano da graduação. Depois de algum esforço para encontrar a situação mais conveniente, combinando trabalho e estudo, realizei meu intento, ao reiniciar o curso de Ciências Sociais na Universidade de Bruxelas; ele foi completado por um mestrado em economia e a inscrição num doutoramento, em 1976. Quando regressei ao Brasil, depois de quase sete anos na Europa, eu já estava preparado, digamos assim, para tornar-me diplomata. Foi uma decisão repentina, pois não tinha pensado antes: se ouso dizer, “tropecei” com a carreira. Até aquele, eu só queria derrubar o governo militar. 

 

6. Média salarial

Atualmente, ela parece situar-se num patamar razoável, em torno de 14 mil líquidos. Mas já foi muito pior; lembro que quando ingressei na carreira, meu salário de terceiro secretário, irrisório, não me permitia ter crediário em loja de departamento para adquirir os primeiros móveis para mobiliar o apartamento funcional que o Itamaraty colocava à disposição dos diplomatas de carreira.

 

Conclusões: ser diplomata é uma grande profissão

Em todas a etapas de minha carreira, eu fui muito feliz com as experiências, as boas e as más, ao longo de minha carreira, pois em todos esses anos, e em cada posto, eu fiz aquilo que mais gosto: viajar, muito e intensamente, ler, também intensamente, escrever, observar, aprender, em toda e qualquer circunstância, mesmo em situações difíceis de abastecimento, conforto, restrições monetárias ou outras. Toda a minha carreira me trouxe algo de bom, mesmo em situações temporárias de sacrifício. Nunca deixei de fazer aquilo que mais gosto: viajar, conhecer novos países, povos, situações, visitar museus, bibliotecas, cidades. 

Cabe reconhecer que alguns postos no exterior apresentam dificuldades materiais, desconfortos psicológicos, desafios razoáveis: por pequenos momentos, chega-se a desejar voltar ao Brasil e retornar à rotina burocrática do cerrado central, onde os atrativos são menores, mas também as surpresas. De toda forma, sempre aproveitei os momentos de dificuldade para refletir e escrever, como sempre, aliás. Talvez eu devesse ter dedicado menos atenção aos livros e mais às pessoas, mas essas são escolhas que fazemos deliberadamente, por opções próprias, pensadas ou não. Quem tem a compulsão pela leitura e pela escrita, não consegue acalmar-se a menos de satisfazer o seu “vicio”, daí o sacrifício de outros aspectos da vida social que muita gente valoriza em primeiro lugar. 

Por outro lado, nunca, na carreira, fui obrigado a assumir obrigações que eu mesmo não desejasse assumir, como por exemplo trabalhar em áreas para as quais eu não me sinto talhado nem tenho a mínima vontade de experimentar: administração, por exemplo, ou cerimonial; mas, eu tinha um preconceito contras as atividades consulares, o que não faz o menor sentido: trabalhei em consulado e me senti extremamente útil para a comunidade brasileira no exterior, que já é muito grande. Mas tive oportunidade de escolher as áreas nas quais eu me sentia mais feliz, que são as relações econômicas internacionais, num sentido bem amplo. Meu terreno natural de interesse são os estudos de qualquer tipo: geográfico, político, econômico, cultura, antropológico, no sentido amplo. Todas as áreas funcionais de caráter geográfico, político ou sobretudo econômico me servem perfeitamente. 

Creio que sou capaz de fazer análises contextuais que envolvam conhecimento histórico, embasamento econômico e situação política, ou seja, tenho instrumentos analíticos e amplos conhecimentos que me permitem situar qualquer problema (ou quase) em um contexto mais amplo, e daí extrair alguns elementos de informação para a instrução de um processo decisório que tenha em conta o interesse nacional. Toda a minha vida eu estudei o Brasil e o mundo, visando tornar o primeiro melhor, num mundo que nem sempre é cooperativo. Registre-se que eu não pretendo tornar o Brasil melhor para si mesmo, ou seja, uma grande potência ou qualquer pretensão desse gênero, que encontro simplesmente ridícula. Eu pretendo tornar o Brasil melhor para os brasileiros, ponto. 

Contento-me apenas com isso. Minha perspectiva, a despeito de ser um funcionário de Estado, não é a do Estado. Não pretendo trabalhar no Estado, para o Estado, com o Estado: minha perspectiva é a dos indivíduos concretos, e meus objetivos são promover os indivíduos, se preciso for contra o Estado. Não tenho nenhum culto ao Estado e nem pretendo torná-lo maior ou mais poderoso, apenas mais eficiente para servir aos indivíduos, não a si mesmo. Desespera-me essas pretensões nacionalistas estatizantes, pois elas se fazem, em geral, em detrimento do bem-estar individual da maior parte dos cidadãos

Meus pontos fortes, portanto, são minha capacidade analítica, meus conhecimentos acumulados e meu devotamento à causa dos indivíduos, não dos Estados, e sempre tento passar esses pontos à frente de qualquer outra consideração. Não hesito em defender meus pontos de vista, mesmo contra meus interesses imediatos, que poderiam recomendar uma acomodação com a situação presente – a lei da inércia é uma das mais disseminadas na humanidade – ou com autoridades de qualquer tipo. Não costumo fazer concessões a autoridades apenas para obter vantagens pessoais, e acho essa atitude basicamente correta (ainda que a um custo por vezes enorme no plano pessoal). Talvez seja teimosia de minha parte, mas considero isso antes uma virtude, do que um defeito. Enfim, tendo concepções fortes sobre determinados temas, me é muito mais fácil preparar e expor posições do interesse do Brasil, com base em conhecimentos previamente acumulados, o que me dispensa de longas pesquisas ou buscas em arquivos.

 

Por fim, recomendo uma consulta a diversos materiais que produzi sobre a carreira, o acesso, dicas de estudos, que figuram em meu site (http://pralmeida.org/294-2/), assim como no blog Diplomatizzando (link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2009/07/1192-diplomacia-dicas-gerais-para.html).

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 3758, 19 de setembro de 2020