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sábado, 27 de fevereiro de 2021

Desafios da pandemia e pós-pandemia para o desenvolvimento da diplomacia - Paulo Roberto de Almeida

 Desafios da pandemia e pós-pandemia para o desenvolvimento da diplomacia 



Paulo Roberto de Almeida

(www.pralmeida.orghttp://diplomatizzando.blogspot.com)

[Objetivonotas para palestra oralfinalidade3º. CONRI; dia 27/02; 20:00hs]

 

O mundo pós-pandemia não será muito diferente do que temos hoje, assim como o mundo pós-Peste Negra, no século XIV, não foi muito diferente daquele que existia no cenário pré-pandemia, que dizimou, ao que parece, entre 25% e 30% da população da Europa ocidental em suas diversas ondas. O que ocorreu foi, se ouso dizer, até “positivo”, uma vez que, com a diminuição de uma oferta abundante de mão-de-obra (que vinha sendo garantida por progressos lentos, mas reais, na produção de alimentos ao longo do período final da Idade Média), tanto o custo do trabalho quanto a produtividade do trabalho registraram ganhos expressivos. Tampouco o mundo pós-Gripe Espanhola, que na verdade era americana em sua origem, foi muito diferente daquele que existia ao final da Grande Guerra, apenas que, talvez, mais propenso a acelerar as pesquisas científicas que levaram, alguns anos depois, a novas vacinas e ao milagroso antibiótico, assim como a melhores cuidados com saneamento básico e medidas associadas a tratamentos preventivos e curativos.

O mundo, tal como ele existe em suas estruturas braudelianas de longa duração, não se altera radicalmente como resultado das pandemias; tampouco as diplomacias nacionais conhecem mudanças significativas, apenas que determinadas tendências existentes são aceleradas, ao passo que outras podem ser relegadas a segundo plano. A Peste Negra trouxe várias mudanças nas relações de trabalho e nos ganhos de produtividade, assim como a Gripe Espanhola gerou progressos gerais nos serviços de saneamento básico e nas instituições estatais cuidando da saúde pública. No plano da psicologia coletiva, o mundo do século XV e o mundo da terceira década do século XX não conheceram mudanças significativas no comportamento das pessoas, dada a tendência a esquecer os horrores vividos, esquecer os mortos e tratar dos sobreviventes e dos novos vivos. A humanidade tende a esquecer grandes tragédias, como ocorreu, talvez, ao final da Grande Guerra e no seguimento do Holocausto da segunda Guerra Mundial, que só começou verdadeiramente a ser relembrado duas ou três décadas depois. Não ocorreu nenhum Tribunal de Nuremberg ao final da Grande Guerra e o que foi realizado em 1945-46 não produziu instituições permanentes de condenação de criminosos de guerra, até o surgimento do mais recente Tribunal Penal Internacional. 

As mudanças foram mais significativas no campo das relações internacionais. A diplomacia da segunda metade do século XX deu grandes passos para aprofundar a nova modalidade do multilateralismo, mas essa já era uma tendência que vinha sendo reforçada desde as grandes conferências do final do século XIX – propriedade intelectual, comunicações, direito internacional da guerra e da paz, acordos setoriais, etc. – e que conheceu um grande impulso com o surgimento da Liga das Nações, mas ela foi mais o resultado dos 14 pontos de Wilson do que da Gripe Espanhola, que começou a se propagar desde que os soldados americanos chegaram à França em 1917; o presidente Wilson pode, aliás, ter sido vítima dessa gripe, pois nunca se recuperou quando retornou de vários meses de estada na Europa. 

O desafio ao principal ponto de seu plano de paz, a própria Liga, veio mais do Senado americano do que da pandemia, e assim parte do grande exercício de “pacificação” das relações internacionais no pós-Grande Guerra se perdeu, inclusive porque surgiram problemas para acomodar os interesses das grandes potências militaristas e fascistas – Itália mussoliniana, Alemanha hitlerista, Japão expansionista e União Soviética stalinista – e o ambiente de crises e depressões econômicas tampouco ajudou no restabelecimento de relações de cooperação entre os principais atores das relações internacionais. Foi preciso uma nova e devastadora guerra, impulsionada por essas mesmas potências desafiadoras para que, a partir de Ialta, Potsdam e San Francisco, se desenhasse uma espécie de “paz cartaginesa”, com a derrota completa, a destruição e ocupação das potências agressoras, que permitiu o surgimento de um arranjo neo-westfaliano capaz de impor a paz e a segurança internacional com base em mecanismos fortemente oligárquicos (como aliás já tinha sido o caso no modelo original do século XVII, em Viena em 1815, e em Paris em 1919). 

Depois de Bretton Woods, os progressos do multilateralismo foram realmente vários e relevantes, embora o processo decisório nas grandes agências do sistema multilateral das Nações Unidas tenha permanecido mais ou menos oligárquico entre 1945 e 1980. Apenas na terceira onda da globalização, as novas dinâmicas econômicas, a partir da consolidação do processo de convergência – depois de quase dois séculos da Grande Divergência –, criaram uma abertura nos processos decisórios, embora tenha sido apenas dez anos atrás que o “resto do mundo” superou, pela primeira vez na história, o pequeno pelotão das economias mais avançadas na formação do PIB global. Esse processo começou nos anos 1960, quando a industrialização das nações periféricas aumenta a participação do Terceiro Mundo na oferta de produtos manufaturados. Desde então, graças sobretudo à Ásia Pacífico, em especial a China, que tinha sido a maior economia mundial até o século XVIII, e a mais avançada cientificamente até o início da era moderna, quando a Europa ocidental conhece sua fulgurante ascensão para a hegemonia mundial. Mas, já no final da Guerra da Secessão, uma nova potência ascendente marca sua presença dominante no contexto da segunda Revolução Industrial. O mundo tinha sido europeu do século XVI ao XIX, e passa a ser americano, a partir do século XX, talvez desde 1898, e mais acentuadamente a partir de 1917, quando os boys desembarcam pela primeira vez nos campos de batalha do velho mundo.

O século americano, inclusive na diplomacia, teve uma vigência de apenas um século, e o século XXI começa pela fulgurante ascensão da China, retomando posições que ela já tinha tido num passado distante. O impacto dessa ascensão será sentido pelo resto do século, mas sua influência nas relações internacionais, e nas práticas diplomáticas, tem muito mais a ver com as dinâmicas econômicas do que com os efeitos sistêmicos da pandemia. Esta será superada em relativamente breve tempo, graças aos avanços fantásticos das tecnologias farmacêuticas, e ela terá consequências sobretudo na aceleração de tendências já presentes anteriormente na economia e na política mundiais, não tanto em mudanças estruturais de grande monta. Ou seja, o mundo não será muito diferente no pós-pandemia, a não ser que diversas atividades – inclusive a diplomacia – terão continuidade no terreno virtual, o que antes seguia um ritmo de tartaruga, dadas as facilidades de transportes e comunicações. A partir de agora, contatos, reuniões e viagens serão mais facilmente substituídos pela versão digital, aliás, com menos despesas e maior frequência.

 

Uma grande consequência tem a ver com a nova geopolítica do restante do século XXI, mas ela depende mais da postura americana no “enfrentamento” da ascensão chinesa do que propriamente das novas modalidades de práticas diplomáticas. Não tenho tempo de desenvolver aqui essa questão, que vem sendo muito mal conduzida pelos acadêmicos dos EUA em relações internacionais, que aparentemente foram contaminados pela paranoia dos generais do Pentágono, na adoção de uma postura confrontacionista em relação à China. Parto do princípio que a segunda Guerra Fria, que tem um caráter sobretudo econômico, já foi vencida pela China, que tem uma estratégia correta, assim como foi a estratégia da Grã-Bretanha no estabelecimento de sua hegemonia no século XIX, que foi a globalização e o livre comércio, assim como a exportação de capitais, assim como a consolidação de meios e instrumentos de pagamentos que mantiveram Londres no centro das relações econômicas mundiais durante um século e meio. O eixo financeiro só se deslocou de Londres para Nova York com o deslanchar da Segunda Guerra Mundial, embora desde a Grande Guerra os EUA já fossem um grande credor e investidor internacional. Esse eixo vai ter uma base sólida na Ásia Pacífico, em especial na China, inclusive por meio de criptomoedas que vão oferecer concorrência ao dólar, dominante neste século americano (e ainda influente nas próximas décadas). 

A própria pandemia revelou enormes fragilidades do sistema americano de saúde, inclusive pelo efeito acrescido da grande desigualdade social que ainda caracteriza o gigante norte-americano, comparativamente a estruturas mais igualitárias na Europa ocidental. Mas a China acaba de proclamar a eliminação da pobreza, ou da miséria, em seu território, o que é um feito extraordinário para um país que tinha falhado sua inserção nas duas primeiras revoluções industriais e que só se encaixou realmente na globalização no decurso da quarta revolução industrial. O mundo do futuro não será necessariamente chinês, mas ele será forçosamente mais diversificado, inclusive com a ascensão do segundo gigante asiático, a Índia, embora ela continua persistentemente protecionista, a ponto de ter preferido não integrar o RCEP, o grande bloco comercial liderado pela China. 

Quanto ao Brasil, ele é a grande decepção mundial nas últimas três ou quatro décadas, e não parece perto de ser capaz de superar suas enormes dificuldades políticas para vencer obstáculos estruturais – educação, produtividade, nova industrialização e redução das desigualdades sociais e regionais – que se opõem à sua inserção econômica global. Na verdade, o Brasil exibe uma não inserção na interdependência mundial, dado seu renitente protecionismo e a introversão típica de um país dotado de elites tacanhas e mesquinhas (não fosse assim não teriam demorado tanto tempo para extinguir o tráfico e abolir a escravidão). No plano diplomático, aliás, o Brasil é um dos raros países no mundo a ter perpetrado uma espécie de suicídio diplomático, ao ter deliberadamente escolhido ser pária, um pouco como a Coreia do Norte e Mianmar. É algo realmente vergonhoso para um país que tinha construído, ao longo dos quase dois séculos de independência, uma diplomacia tida por excelente, e que teve um papel decisivo na construção da nação, como já argumentou o embaixador Rubens Ricupero em sua obra clássica A diplomacia na construção do Brasil, 1750-2016 (2017). Mas, imagino que sua leitura, atualmente, teria o dom de provocar depressão em boa parte do corpo diplomático profissional, assim como na quase totalidade dos analistas e estudiosos das relações internacionais do Brasil. 

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 3860, 27 de fevereiro de 2021

Texto de apoio para exposição oral de 30 minutos no 3º. Congresso de Relações Internacionais, dia 27/02, 19h45, via WebinarJam;.

Prevendo o fim do capitalismo: resenha sobre as previsões erradas, de Marx a Keynes - Francesco Boldizzoni

 Infelizmente, o Wall Street Journal só permite ler um pedaço de suas matérias para os não-assinantes, mas o importante é ter o nome do autor e o título do seu livro para procurar na Amazon e ler mais um pouco. Transcrevo o que tem na Amazon como informação sibre o livro, já tendo enviado um Sample para minha consulta, antes de transcrever uma pequena parte do book-review do WSJ:

Francesco Boldizzoni:

Foretelling the End of Capitalism: Intellectual Misadventures since Karl Marx

(Harvard University Press, 2020)


PRODUCT DESCRIPTION

Intellectuals since the Industrial Revolution have been obsessed with whether, when, and why capitalism will collapse. This riveting account of two centuries of failed forecasts of doom reveals the key to capitalism’s durability.

Prophecies about the end of capitalism are as old as capitalism itself. None have come true. Yet, whether out of hope or fear, we keep looking for harbingers of doom. In Foretelling the End of Capitalism, Francesco Boldizzoni gets to the root of the human need to imagine a different and better world and offers a compelling solution to the puzzle of why capitalism has been able to survive so many shocks and setbacks.

Capitalism entered the twenty-first century triumphant, its communist rival consigned to the past. But the Great Recession and worsening inequality have undermined faith in its stability and revived questions about its long-term prospects. Is capitalism on its way out? If so, what might replace it? And if it does endure, how will it cope with future social and environmental crises and the inevitable costs of creative destruction? Boldizzoni shows that these and other questions have stood at the heart of much analysis and speculation from the early socialists and Karl Marx to the Occupy Movement. Capitalism has survived predictions of its demise not, as many think, because of its economic efficiency or any intrinsic virtues of markets but because it is ingrained in the hierarchical and individualistic structure of modern Western societies.

Foretelling the End of Capitalism takes us on a fascinating journey through two centuries of unfulfilled prophecies. An intellectual tour de force and a plea for political action, it will change our understanding of the economic system that determines the fabric of our lives.

REVIEW

Boldly written and brimming with new insights on every page, this is not your grandfather's old and staid intellectual history. Boldizzoni takes us through a fast-paced history of capitalism's failed doomsayers--only to then explain why they clearly underestimated its elongated life expectancy and stubborn durability. A superb intellectual history of how people have (wrongly) predicted and imagined the end of capitalism from the time of Marx until today.--Eli Cook, author of The Pricing of Progress

Foretelling the End of Capitalism is an essential book for anyone interested in intellectual history and political economy. It will play a major role in current debates on capitalism and its future, as well as on crisis and crisis theory.--Wolfgang Streeck, author of How Will Capitalism End?

Francesco Boldizzoni shows how predicting the collapse of capitalism is as old as capitalism itself. He illuminates a tradition of economic thinking that has justified do-nothing posturing in the name of revolution, and how it resists learning lessons of its own failures. This book is also a brilliant study of the cult of forecasting.--Jeremy Adelman, Princeton University

This beautifully written book captures the peculiar complicity between hope and disappointment that characterizes prophecies about the end of capitalism over the last three centuries. It will be of great interest to readers, both as a cautionary tale about prophecy and as a model study of the logic of capitalism itself.--Arjun Appadurai, New York University

ABOUT THE AUTHOR

Francesco Boldizzoni is Professor of Political Science at the Norwegian University of Science and Technology and the author of two books about economic and intellectual history, The Poverty of Clio: Resurrecting Economic Historyand Means and Ends: The Idea of Capital in the West, 1500-1970.

PRODUCT DETAILS

  • ASIN: B082DK6MBC
  • Publisher: Harvard University Press (May 12, 2020)
  • Publication date: May 12, 2020
  • Language: English
  • File size: 2172 KB

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Politics: ‘Foretelling the End of Capitalism’ Review

From  Mill to Marx and on to Keynes, a history of misdiagnosis.

The New York Stock Exchange.

PHOTO: ANADOLU AGENCY VIA GETTY IMAGES

‘Prophecies about the end of capitalism . . . have dotted the history of modern social science since its inception,” Francesco Boldizzoni observes in “Foretelling the End of Capitalism: Intellectual Misadventures Since Karl Marx” (Harvard, 326 pages, $35). “Almost all of the great social theorists, at one point or another in life, engaged in forecasting.” I am inclined to look favorably on any book purporting to expose the follies of revered intellectuals, and the prospect of a history chronicling end-of-capitalism predictions filled me with anticipation.  

Mr. Boldizzoni was of course under no obligation to write the book I was hoping he had written, and he has not done so. He accepts his prognosticators’ premise that capitalism is basically a malign system that exacerbates inequality and “turns culture into business and . . . enslaves minds to its logic.” Moreover his explanations for the failure of predictions by Karl Marx, John Stuart Mill, Max Weber and John Maynard Keynes, among others, strike this reviewer as hopelessly abstruse and heavily reliant on the economic theories that lured these intellectuals into making foolish predictions in the first place.

The abrasiveness of the book’s title, together with the author’s highly self-assured tone, led me to expect a bit more in the way of demolition. Mr. Boldizzoni treats his subjects and their “misadventures” with ample deference. He gently concedes, for example, that Marx’s labor theory of value—the theory that a product or service’s value is determined by the labor required to produce it —was wrong. That’s a pretty important thing to be wrong about for a man whose economic theories dominated half the globe for a century, is it not? Mr. Boldizzoni brushes the problem aside, since it “does not disprove the claim that exploitation and the appropriation of surplus value underlie the wage-labor relation.” It doesn’t disprove a lot of things, but it does prove that Marx was a poor judge of economics and human relations.

So reluctant is he to confront the hubris of his subjects’ theories that Mr. Boldizzoni, a professor of political science at the Norwegian University of Science and Technology, actually does precisely what he criticizes them for doing: He predicts the end of capitalism. “Capitalism will indeed end sooner or later,” he writes, without the slightest sense of irony. He can draw this conclusion, he reasons, because “capitalism is a historically bound formation just like the economic and social systems that preceded it in antiquity, the Middle Ages, and the early modern period.” 

Is it, though? Mr. Boldizzoni, like almost all writers on the left and some on the right, writes of capitalism as a “system,” sometimes even assigning agency to it, as if it were designed by some nefarious force. It’s never clear what he means by the term. What if the thing intellectuals call capitalism is nothing more than the freedom and order necessary to borrow money for the...

(fim da resenha aberta no WSJ)

 


sexta-feira, 26 de fevereiro de 2021

As fraudes do FIES e do ProUni, obras do PT (Veja)

 O PT dilapidou recursos públicos — dos pobres, pois são os que mais pagam impostos no Brasil — para enganar jovens estudantes com a ilusão de um diploma do ensino “superior” (qualquer diploma, mesmo de Faculdades Tabajara) e para dar mais dinheiro ainda a quem já é rico, que foi o que mais o partido fez na presidência, sabendo que parte desse dinheiro voltaria para o partido.

Desde o início me pronunciei contrariamente à demagogia, mas não sabia que ela também tinha provocado uma FRAUDE BILIONÁRIA. 

Paulo Roberto de Almeida

Copio do blog do Orlando Tambosi, 25/02/2021


Dois escândalos do FIES e a farsa da "universidade para todos"


Era óbvio e previsível que muitas faculdades seriam abertas apenas com a intenção de receber recursos do Ministério da Educação, sem qualquer preocupação com a qualidade do ensino. Coluna de Luciano Trigo para a Gazeta do Povo:


A revista “Veja” noticiou nesta semana uma fraude de R$ 1 bilhão no FIES, o programa criado para financiar graduações de alunos carentes em universidades privadas. Segundo a revista, auditores da CGU (Controladoria-Geral da União) identificaram fortes indícios de que recursos do Fundo de Financiamento Estudantil foram desviados para lobistas, servidores e um grupo de instituições de ensino. A Polícia Federal já abriu inquérito.

Há dois escândalos aí.

O primeiro escândalo:

Vamos ao primeiro, o escândalo da fraude, detalhado pela reportagem de “Veja”. O caso teve pouca repercussão e nem chegou a chocar e surpreender, dada a frequência com que a corrupção anda de mãos dadas com o dinheiro público no nosso país. Deveria, sim, causar muita indignação, porque cada real roubado da educação representa um prejuízo muito maior lá na frente – mas, enfim, estamos no Brasil.

Pois bem, mais de R$ 1 bilhão teria sido repassado de forma ilegal para instituições impedidas de participar do FIES por terem dívidas gigantescas junto à Receita Federal e ao Tesouro Nacional. Sempre segundo a revista, a fraude envolveu a ação de lobistas, a falsificação de documentos e a cumplicidade de servidores do MEC: no final do processo, 30% dos valores repassados às universidades pelo Ministério voltavam para Brasília, na forma de propina.

O absurdo não para aí. Suspeita-se que 20 universidades de pequeno e médio porte inventaram estudantes-fantasmas para vitaminar o aporte de recursos públicos: a “Veja” cita o caso de duas faculdades abertas em 2012 em Mato Grosso, que em cinco anos receberam mais de R$ 20 milhões do FIES.

A revista conclui a matéria com uma declaração do ex-ministro da Educação Cristovam Buarque que merece reflexão: “Socialmente, o FIES foi ótimo, economicamente tem sido um desastre, do ponto de vista pedagógico o resultado não é o esperado e, sem dúvida, é maravilhoso para os donos das faculdades”.

Por fim, a reportagem informa, en passant, que o FIES acumula atualmente um prejuízo de... R$ 13 bilhões, provocado pela inadimplência dos alunos que solicitaram o financiamento e, depois de formados, não tiveram condições de pagar a dívida.

É isso mesmo. O valor da inadimplência no FIES é 13 vezes maior que o surrupiado pela corrupção: R$ 13 bilhões. E chegamos assim ao segundo escândalo.

O segundo escândalo:

Este é um escândalo a céu aberto: desde a criação do FIES, a inadimplência só faz aumentar, mas sempre se fez de conta que o problema não existe. Talvez porque não pegue bem chamar a atenção para um fato desagradável: o que essa inadimplência bilionária revela é o equívoco estrutural e conceitual do programa – que, contrariamente às aparências, longe de reduzir a desigualdade, apenas alimenta e reproduz uma dinâmica social perversa e excludente.

O FIES é um programa complementar ao PROUNI – Programa Universidade para Todos, cujo objetivo está explícito no próprio nome: garantir acesso ao ensino superior a todos os brasileiros, independente do mérito, do esforço ou da vocação. Mas o que, à primeira vista, parece muito bonito, bem intencionado e justo do ponto de vista do papel redistributivo do Estado – usar recursos públicos para ampliar o acesso de estudantes carentes ao ensino superior, reduzindo o fosso que separa os mais pobres das universidades – na prática não funciona.

O principal efeito do PROUNI foi, sobretudo nos governos do PT, estimular a criação de centenas de “Uni-esquinas” Brasil afora, instituições caça-níqueis que oferecem cursos de péssima qualidade e distribuem diplomas a rodo sem qualificar ninguém – sem falar no terreno fértil aberto para esquemas de corrupção como o apontado pela reportagem de “Veja”.

Ora, desde sempre era óbvio e previsível que muitas faculdades seriam abertas apenas com a intenção de receber recursos do Ministério da Educação, sem qualquer preocupação com a qualidade do ensino.

Mas talvez a intenção de alguns envolvidos na gestão do programa fosse esta mesmo: não a melhoria e democratização do ensino superior, mas a conquista demagógica de mais votos em troca de diplomas e ilusões. Na prática, recursos acabaram sendo redistribuídos, sim, mas dos pobres – a imensa maioria dos contribuintes – para os ricos – aqueles empresários, políticos e burocratas mal intencionados, sempre dispostos a encontrar uma forma de levar vantagem e usar o sistema a seu favor.

No sistema de educação de qualquer país próspero, como a Coreia do Sul, existe um sistema de seleção que faz com que cheguem à universidade apenas os alunos mais preparados

Mas, mesmo que contasse com a honestidade de todos (não contam) e fossem programas à prova de desvios e de corrupção (não são), o FIES e o PROUNI jamais teriam como dar certo, porque partem de uma premissa errada. Em nenhum país do mundo se cogita garantir, com recursos públicos, universidade para todos – não por maldade ou por aversão aos pobres, mas porque o mercado não absorve esse batalhão de recém-formados que as universidades despejam todos os semestres na vida real – aliás, cada vez mais despreparados.

No sistema de educação de qualquer país próspero, como a Coreia do Sul, existem um afunilamento natural e um sistema de seleção que fazem com que cheguem à universidade apenas os alunos mais preparados, e em quantidade adequada às demandas e a capacidade de absorção do mercado. Se é injusto (e é) que essa competição seja desigual, o caminho é lutar por uma educação básica universal e de qualidade, que mitigue essa diferença de preparo e busque garantir oportunidades iguais para todos os estudantes que quiserem disputar uma vaga, independentemente da sua classe social.

Só quem não tem a mínima noção de como a economia funciona no mundo real pode acreditar que a solução para a educação é uma intervenção do Estado que garanta vagas e diplomas para todos, com o pretexto de proteger os pobres e oprimidos. O resultado dessa intervenção é a mediocrização da qualidade do ensino superior – inevitável, em função das sequelas trazidas do ensino básico ruim.

Somente na utopia de uma sociedade planificada seria possível imaginar que é função do Estado financiar bolsas de ensino superior para toda a população do país. Mas a História demonstra que sociedades planificadas sempre terminam em desastre.

No Brasil, em vez de atacar o problema no ponto de partida – a educação básica – tenta-se resolvê-lo na linha de chegada – garantindo a distribuição de diplomas por meio de cotas e programas de financiamento (na verdade, dinheiro a fundo perdido, já que a inadimplência, como vimos, é bilionária).

“Ain, mas tem que ter vaga para todos sim! Nenhum direito a menos!” Se o objetivo for apenas ter um diploma debaixo do braço, tudo bem: que se abram mais Uni-esquinas e se criem vagas para todos no ensino superior, financiadas com o dinheiro do contribuinte.

Mas qual será o resultado concreto disso? Um exército de desempregados, jovens sem nenhuma qualificação que podem ostentar seu diploma em selfies no Instagram, mas que não encontram emprego nem foram capacitados para competir no mercado. Segundo a última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), o índice de desemprego entre jovens de 18 a 24 anos já está em 30% (índice muito superior ao do do país, que era de 13,3% na época da pesquisa). E vai piorar.

Não adianta tentar enxugar gelo na linha de chegada: não há cotas nem bolsas que consertem o mal que foi causado no ensino básico. O PROUNI e o FIES podem até criar a ilusão de que uma injustiça histórica e social está sendo reparada, mas na prática o modelo apenas reproduz uma estrutura geradora de desigualdade, mal maquiada pelo discurso de que será distribuindo diplomas universitários que se corrigirá o problema da educação no Brasil. Universidade para todos é uma ilusão. O uso político dessa ideia deveria ser um escândalo.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2021

A “involução” da classe política no Brasil - Paulo Roberto de Almeida

 A “involução” da classe política no Brasil

Paulo Roberto de Almeida

A chamada classe política, do mais modesto vereador de província ao mais poderoso senador da República, congrega um estamento, quase uma casta, de privilegiados inconsequentes e descompromissados com o interesse público, indiferentes ao destino do país e às condições da nação e de sua população, inteiramente focados nos seus interesses mais mesquinhos e tendentes a aumentar ainda mais seus ganhos patrimoniais, ao acréscimo de seus privilégios exorbitantes, sem qualquer limitação ou risco de serem alcançados por outra “justissa” que não a sua própria, corporativa e autocentrada. 

Esse estamento de políticos acima e à margem da lei desfruta de mais prebendas, privilégios e vantagens do que as classes do primeiro e do segundo estados — aristocratas e clero — dos antigos regimes nobiliárquicos, anteriores até mesmo ao absolutismo monárquico da era moderna.

O Brasil sequer chegou à contemporaneidade do terceiro estado, o regime igualitário da burguesia, pois isso seria contemporâneo demais para um país ainda imerso no patrimonialismo. O pior de tudo é que, a despeito de algumas reformas cosméticas, esse patrimonialismo assume, em diversas de suas manifestações, características próximas do gangsterismo político, regimes de tipo mafioso que começaram nos meios sindicais e se espalharam em outras “corporações” de corte miliciano, como torcidas organizadas ou determinados partidos e “indústrias” de vocação falsamente religiosa. 

Fui extremamente parcial e excessivamente rigoroso em minha avaliação da classe política como um todo?

É possível, ou até provável, mas é o que vejo todos os dias, ao observar atentamente e ao constatar o comportamento abusivo dessa casta superior na formação social da nação brasileira. Qualquer reforma moralizadora, que traga de volta essa malta de privilegiados a padrões éticos mais próximos da normalidade do conjunto da população, demorará muito tempo, talvez mais do que duas gerações. Até lá, o conjunto de produtores de riquezas — empresários e trabalhadores do setor privado — continuará a sustentar os privilégios nababescos desse estamento de privilegiados irresponsáveis.

Existe, claro, um limite para o declínio e esse é o afundamento do país e a erosão moral da nação. Com a crise aparecem as soluções, mas depois de muitas perdas e sofrimentos para os mais humildes. Nós ainda somos relativamente privilegiados, justamente por termos a oportunidade e os meios para discutirmos esse problema. A maioria da população está ocupada apenas com a sua sobrevivência.

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 25/02/2021


A China eliminou a pobreza extrema: um feito admirável em qualquer época histórica - CGTN; nota introdutória: Paulo Roberto de Almeida

 Sobre a eliminação da pobreza na China

Paulo Roberto de Almeida

Gostaria de chamar a atenção para esse feito extraordinário na história econômica de toda a Humanidade. Começo esclarecendo que não defendo o regime comunista ou a ditadura do PCC, nos últimos 71 anos à frente do povo chinês. Apenas constato a realização de algo excepcional na história de qualquer outro povo, em qualquer outra época dos últimos DEZ MIL ANOS. 

A pobreza, ou a penúria, é um traço inerente à história humana desde os albores da humanidade. Os povos que se alçaram à condição de uma razoável situação de bem-estar o fizeram ao longo de um lentíssimo processo de melhorias graduais, convivendo ainda com muitos pobres, ou mesmo miseráveis, até uma data ainda recente da história humana, basicamente a partir da segunda revolução industrial, no arco civilizatório da Europa ocidental e seus off-shots na América do Norte e em algumas outras poucas partes do mundo.

Nenhum país periférico ou “subdesenvolvido”, ex-colônia, tutelado ou “dependente”, conseguiu eliminar a miséria extrema ou a simples pobreza “normal”, por suas próprias forças, com pouquíssimas exceções (Coreia do Sul, Singapura, um ou outro da Europa central). 

A China sempre foi a nação mais avançada da Humanidade — quando metade do mundo vivia na pobreza extrema, inclusive a Europa pós-Império romano, a despeito das elites privilegiadas —, mas falhou a primeira e a segunda revolução industrial, e manteve-se atrasada durante a maior parte do século XX, inclusive e principalmente sob o maoísmo demencial, um experimento comunista que fracassou como todos os demais empreendimentos comunistas. 

Quando o PCC se converteu ao capitalismo e liberou as energias do povo chinês, o país se desenvolveu, sob um capitalismo administrado, como são, aliás, as democracias de mercado avançadas, com a única diferença que o governo da China é administrado por um Partido formalmente comunista (ou até leninista), uma ditadura que para legitimar-se conduziu esse processo de redução administrada da pobreza , combinando mecanismos de mercado e indutores estatais. 

Os mandarins do PCC fizeram um bom trabalho nessa área, algo absolutamente inédito e excepcional, volto a dizer, na história da Humanidade. Pode até ser propaganda exagerada do governo comunista, mas é algo que pode ser facilmente verificado por observadores independentes e burocratas de organismos internacionais.

Não estou louvando o PCC ou a ditadura comunista pelo feito, e sim a energia do povo chinês. Os mandarins do PCC fizeram o que todo governo decente deveria fazer: garantir um quadro de estabilidade relativa (num processo extraordinário de reformas radicais, para sair do comunismo), oferecer toda a infraestrutura necessária para sustentar um processo de crescimento sustentado (e agora, finalmente, sustentável) e uma grande ousadia (fácil, sob uma ditadura) para inserir decisivamente a economia chinesa na interdependência global. 

Teria sido muito melhor se tudo isso tivesse sido feito em condições de liberdades e governança democrática, mas processos políticos obedecem a uma lógica própria, que não necessariamente corresponde às dinâmicas da vida econômica. 

Em todo caso, viva o povo chinês, por estar, mais uma vez, na vanguarda da Humanidade, como já esteve desde milhares de anos no passado, e ainda estará no futuro previsível neste século.

Paulo Roberto de Almeida 

Brasília, 25/02/2021

Transcrevo, sem acreditar em tudo, algumas matérias de opinião e reportagens factuais da CGTN, uma boa agência de notícias, controlada pelo governo do PCC (eu sei distinguir verdade e mentira, propaganda e relato objetivo).


Special coverage on China's accomplishments in poverty eradication

Xi to attend event marking China's poverty eradication, award role models
CGTN
449

Chinese President Xi Jinping will attend a gathering in Beijing Thursday to mark the country's accomplishments in poverty eradication.

Xi, also general secretary of the Communist Party of China Central Committee and chairman of the Central Military Commission, will present awards and certificates to national honorary title recipients for their contributions to the poverty alleviation work. He will also deliver a speech.

Stay tuned to CGTN's special coverage.

Click here for more about China's poverty alleviation efforts.


Updated 21:16, 24-Feb-2021
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 Beijing, China

Over the past 40-plus years of reform and opening up, more than 700 million people in China have been lifted out of poverty, contributing to more than 70 percent of global poverty reduction. By the end of 2020, nearly 100 million impoverished rural residents had escaped poverty since 2012, and all 832 national-level poverty-stricken counties had shaken off poverty. 

A grand gathering to review China's decades-long journey towards eliminating poverty and outline the tasks ahead takes place in Beijing on Thursday morning. Chinese President Xi Jinping, also General Secretary of the Communist Party of China Central Committee, delivers a keynote speech after presenting awards to outstanding contributors to the poverty alleviation cause.


How to eradicate extreme poverty: Part 1 - China's governing system
Keith Lamb
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Editor's note: Keith Lamb is a University of Oxford graduate with an MSC degree in Contemporary Chinese Studies. His primary research interests are China's international relations and "socialism with Chinese characteristics." The article reflects the author's opinions and not necessarily the views of CGTN.

In November 2020 China announced it has lifted its remaining 5.51 million citizens out of absolute poverty. This was a monumental achievement considering that the country has helped over 850 million people shake off poverty over the last 40 years, according to World Bank data.

Considering that absolute poverty remains a severe problem in the Global South and the U.S. now has over 567,000 homeless people, China's unprecedented accomplishment and the methods it used to eradicate absolute poverty demand attention.

China's success against poverty is multifaceted comprising of both macro and micro factors. All factors though are intricately interwoven with China's governing and philosophical system which acts as the macro foundation for China's success in alleviating extreme poverty.

For example, China's principle of non-interference in sovereign affairs works two ways. China does not demand political and economic changes in other states and it likewise rejects external interference into its own system. This means China has the ability to act independently of external foreign powers and implement policies suited to its own needs based on its own judgement.

Hence, China's cooperation with foreign capital has led to employment and the acquiring of capital and technology needed to implement poverty alleviation. However, concurrently China's marketization was not allowed to be dictated by the neoliberal Washington consensus which has led to the ruin of many economies in the Global South.

As such, China implemented market reforms but kept its large state-owned enterprises which allows China to redistribute resources accordingly. Furthermore, the players in the market are not allowed to bite the hand that feeds them. They are subject to the laws of central government rather than making the laws for themselves which leads to cannibalizing the principle of free-market competition and eventually the market itself.

China's specific political form allows for long-term economic planning which has been crucial for drawing up strategies for extreme poverty alleviation. Had China fallen victim to a foreign-imposed liberal democratic system then long-term planning for all would be negated by the vested interests of capital which overshadow liberal systems.

Take universal health care, which feeds into poverty alleviation, as an example. Despite the vast wealth of the U.S., socialized health care falls behind other developed states. Even the right of social health care is still undemocratically contested by big pharmaceutical businesses who lobby on Capitol Hill.

In contrast, for China, socialized health care is not a question of "if" but "how and when." In 2009 China launched health care reforms towards building universal health coverage. This led to basic health coverage increasing from 22.1 percent of the population in 2003 to 95.1 percent in 2013. During this time life expectancy increased from 72 to 76.4 years and maternal mortality dropped from 59 to 29 per 100,000 live births.

Continuing on from China's advances in providing universal healthcare is the "Health China 2030" strategy which aims to solve China's identifiable health care problems. This includes improving service quality, strengthening financial protection, and increasing the quality of medical care.

Officials who led the poverty-relief work visit a resident's house in Nanping City, Fujian Province, September 14, 2017. /Xinhua

Evidently, then, in China's case, working outside of the four-year cycle of liberal democracy has benefits. Contest this if you will but no other political-economic system has lifted so many people out of poverty so quickly. Should China be successful in its long-term 2030 healthcare plan then it will make huge strides not just in alleviating extreme poverty but also in making sure people don't fall back into it.

China's ability to eradicate extreme poverty comes down not only to the body of its governing system, which allows for certain measures to be implemented. The spirit within the system which is China's governing philosophy also plays a significant role.

This is in contrast to capitalism which sees life as a Darwinian struggle where the poor inherently deserve to be poor. Such an attitude can alleviate the government's responsibility for poverty which becomes seen as a natural phenomenon.

The spirit or the identity of a nation's political-economic system is reflected in its mass media. In the West, news revolves around whom to punish, invade and sanction. In contrast, in China news media is predominantly focused on improving the livelihood of China's citizens and the development of the country as a whole.

Such media shapes the very conception of what is possible and holds governments to account. For example, Donald Trump, compared to other presidents, is praised for not starting any new wars and only continuing with existing conflicts. In contrast, Chinese citizens who are well aware of poverty alleviation plans use these plans to hold both local and central governments to account.

As such, the goal of alleviating extreme poverty by 2020 was taken seriously and all manner of measures were implemented to achieve this aim. Tragically, being trapped in cages of limited possibilities, in the West populations do not dare to even imagine such lofty expectations from their governing systems.

In the West, people are seen as surplus to the historical process. They are "human beings" where history acts objectively upon them but is not part of them. Thus, history is conceived as an invisible and objective universal force that brings "enlightenment."

In contrast, in China, the human is conceived as the maker and the creator of history. They are "human makers" who have the inherent capacity to transform their social conditions for the better. In this conception of man's place in the world poverty is not something that exists forever as a natural state rather it is something which man has the inherent capacity to overcome.

This conception of the world may seem trivial but without it no poverty alleviation could take place. This is because if one is stuck in the dogma of believing one is unable to alter their material state then a self-fulfilling prophecy of material stagnation ensues.

(If you want to contribute and have specific expertise, please contact us at opinions@cgtn.com.)



Xi Jinping announces China's eradication of extreme poverty
CGTN

Chinese President Xi Jinping on Thursday announced China's eradication of extreme poverty at a national commendation conference.

Xi first raised the concept of "targeted poverty alleviation" in November 2013, during an inspection tour of central China's Hunan Province.

Through eight years of sustained work, China has lifted the remaining 100 million rural poor people, under the current standard, out of extreme poverty.


quarta-feira, 24 de fevereiro de 2021

Pastore: acabou a ilusão de um Bolsonaro liberal (entrevista)

Acabou a ilusão do liberalismo de Bolsonaro', diz Affonso Celso Pastore

Economia - Estadão, 25/02/2021

Para economista, demissão de Roberto Castello Branco da Petrobrás mostra que o presidente ‘não tem nenhum compromisso com a democracia’

 https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,acabou-a-ilusao-do-liberalismo-de-bolsonaro-diz-affonso-celso-pastore,70003626018                                                                                                                                                                                                                                      

A decisão do presidente Jair Bolsonaro de demitir Roberto Castello Branco do comando da Petrobrás “acabou com a ilusão de que o suposto liberalismo econômico do governo levaria à retomada do crescimento”. A conclusão é do economista e consultor Affonso Celso Pastore*, e vem com uma ironia: “Fixar preço de petróleo não é como fixar o preço do misto-quente”. 

O presidente, diz ele, mostrou que “não tem nenhum compromisso com a democracia, com o Brasil e com a melhoria das condições de vida da população. Visa, apenas, a votos para a sua reeleição em 2022”. Com um olhar veterano – 81 anos, tendo passado, entre outros, pelo comando do Banco Central e da Secretaria da Fazenda paulista –, o professor e doutor em Economia pela USP adverte para duas prioridades que o País tem hoje: vacinar, vacinar, vacinar e buscar com urgência o equilíbrio fiscal. 

No entanto, nesta entrevista para o programa Cenários, parceria do Estadão com o Banco Safra, o que temos hoje é “uma política fiscal completamente aleatória e errada” – e o resultado disso é que os dólares de que o Brasil tanto precisa, em investimentos, “estão indo para outros países emergentes”. A seguir, os principais trechos da conversa. 

Como o sr. avalia a decisão de Bolsonaro de demitir o presidente da Petrobrás?

Com a demissão de Roberto Castello Branco da Petrobrás acabou-se a ilusão de um suposto “liberalismo econômico” do governo Bolsonaro que levaria à retomada do crescimento. Fixar o preço do petróleo não é como fixar o preço de um misto-quente. Ao repassar para os preços domésticos as variações do preço internacional do petróleo, a Petrobrás elevava os lucros e atraía capitais externos, o que ajudava a recuperar a economia. Se o governo ainda tivesse uma pálida sombra do liberalismo que propagava durante a campanha eleitoral, teria de deixar a empresa livre para fixar os preços no mercado interno, respondendo às variações internacionais. 

E que impacto essa mudança trará para a política e a economia do País?

Bolsonaro não é liberal, e sim um populista, semelhante a Viktor Orbán, na Hungria, (Recep) Erdogan, da Turquia, (Vladimir) Putin, na Rússia, com propensão a ser um ditador, como (Nicolás) Maduro, na Venezuela. Não tem nenhum compromisso com a democracia, com a melhoria das condições de vida da população. Visa, apenas, à sua reeleição em 2022 e proteger-se contra o impeachment. 

Como ex-presidente do Banco Central, nos anos 80, de que forma avalia a nova norma que cria um BC realmente independente? 

Essa independência agora aprovada é no sentido de que seus diretores têm mandato fixo e não coincidente com o do presidente da República. Há um outro conceito de independência – que aqui já existe –, estabelecido muitos anos atrás pelo (economista) Stanley Fisher e que enfatiza a independência no uso dos instrumentos. O que isso quer dizer? Que para um BC poder cuidar da política monetária, tem de ter liberdade total para mexer na taxa de juros. Quando o Arminio Fraga presidiu o banco (1999 a 2003), e entramos no regime de metas de inflação, o governo deu informalmente essa liberdade ao BC. Mas o presidente do banco continuava passível de demissão pelo presidente da República.

E para que isso serve, na prática?

Isso significa que o BC pode fazer a política monetária, que é condição essencial para que o País cresça. O controle da inflação é fundamental. A propósito, quero lembrar que o Roberto Campos criou – no governo Castelo Branco – o BC independente, em que seu presidente teria mandato fixo e não coincidente com o do presidente da República. Mas aí colocou o Dênio Nogueira na sua presidência e usou todos os argumentos possíveis para convencer o sucessor de Castelo, o general Costa e Silva, a manter o Dênio. Não conseguiu. Como ele conta no seu livro A Lanterna na Popa, o sucessor lhe perguntou por que deveria manter o Dênio e o BC independente. “Porque ele é o guardião da moeda”, disse Campos. Eu presumo que Costa e Silva tenha batido no peito e dito: “O guardião da moeda sou eu!”. E a independência do BC foi jogada às urtigas e a diretoria toda demitida. Queriam, sim, interferir na política monetária. 

Houve alguma época em que o Brasil praticou de fato o equilíbrio fiscal?

Houve, e começou em 2002. Quando ocorreu o Plano Real, o BC emitia moeda para financiar déficits – e a dívida pública já era muito alta. O FHC e o Pedro Malan, ministro da Fazenda, compreenderam isso e decidiram criar aquele regime do “tripé da política econômica”. Metas de inflação e metas de superávit primário de modo a estabilizar ou reduzir a relação dívida/PIB. Eles cumpriram isso, mas não para o controle dos gastos. 

E aí vieram os aumentos de impostos

Sim, aumento de impostos. E isso tem um custo econômico, pois, a cada imposto ou alíquota que você cria, prejudica a eficiência econômica e reduz o crescimento. Aquele regime de metas durou até 2014. Aí a Dilma decidiu sair do regime de superávit primário, gastou e gerou déficits. Resultado: o Brasil, já promovido a grau de investimento, perdeu essa classificação em 2015. 

É possível fazer hoje uma projeção do crescimento da economia mundial?

Você não tem uma resposta para isso. Você nunca viveu antes uma pandemia. O que sabemos, e é muito pouco, é que a pandemia atua do lado da oferta e do lado da procura. Da oferta, botou todo mundo em casa, impediu fábricas de funcionar, mexeu na demanda e na oferta. Nos modelos econômicos, esse fenômeno não é conhecido por ninguém. 

Tem algum caminho para que o País possa voltar a crescer?

Para isso precisamos de duas coisas. Uma, a vacinação eficaz, rápida, pra que se possa voltar ao mais próximo possível de uma vida normal. A segunda coisa: precisamos de estímulos econômicos. Mas estamos falhando na vacinação e, com o desequilíbrio fiscal que temos, não podemos pensar num pacote fiscal como o dos Estados Unidos. Eles chegaram a US$ 1,9 trilhão, 10% do PIB. Podem fazer isso porque não têm o problema da sustentabilidade da dívida.

Mas que medidas deveriam ser tomadas no curto prazo?

Vacinar, vacinar. Mas o presidente e o ministro da Saúde foram negligentes, negacionistas nessa questão da vacina. A segunda coisa a fazer é tomar cuidado com a política fiscal. E mais: é impossível, com desemprego alto e a distribuição de renda assimétrica que temos, não ter uma ajuda emergencial para as pessoas atingidas.

Qual a possibilidade de uma CPMF digital? O governo brasileiro jamais conseguiu, na sua história, cortar custos. 

Fizemos a reforma da Previdência. Ela cortou. E precisamos de uma reforma administrativa. Ela também corta. Quanto à uma nova CPMF, a única vantagem é que é fácil de recolher. Mas é injusta, impopular. O que precisamos é de um consenso político. Para isso, no entanto, se precisa de uma liderança política. Coisa que o nosso presidente, infelizmente, não tem.

Não tem, de fato.

Ele perde as estribeiras, xinga as pessoas, diz que é preciso ser macho para enfrentar a pandemia... As coisas não se resolvem com essas bravatas. Resolvem-se com planejamento, articulação política, diagnóstico. É como o médico. Médico não sai dando remédio ao paciente a torto e a direito, primeiro faz um diagnóstico da doença. E só depois começa a executar. 

Existe alguma brecha, algo que possa trazer um alento ao País? O excesso de liquidez, o capital procurando algum lugar para aterrissar...

Eu preparei um trabalho pegando 20 países emergentes, o Brasil entre eles. Há uma arrogância de gente afirmando que essa liquidez só pode vir para um lugar, o Brasil... Ela foi provocada pelos Estados Unidos, que em maio de 2020 baixaram os juros a zero e compraram US$ 2,5 trilhões em títulos públicos. Pois eu acompanhei a taxa de câmbio do Brasil e a desses emergentes, que – com exceção de Turquia e África do Sul – seguiram o dólar. Aí, o dólar enfraqueceu, eles se fortaleceram. O real só se depreciou de lá para cá. E tem capital que está saindo daqui. Para onde? Para outros países emergentes.

E o que isso significa?

Estamos vivendo com um real fraco, hoje em torno de R$ 5,40 (por dólar). Isso reflete a percepção de risco da nossa economia. E qual é a origem desse risco? É o fato de termos uma política fiscal completamente aleatória e errada. Se consertarmos, não tenho dúvida de que esses capitais vão voltar, comprando ações, imóveis. O que exige coordenação política e liderança – mas estamos bem longe disso. 

Em suma, temos um quadro com o mundo se recuperando aos poucos e o Brasil ficando para trás?

Há alguns dias o FMI publicou umas projeções de crescimento. Na China, o PIB caiu só por um trimestre e agora eles crescem. Ainda na Ásia, você olha para Japão, Coreia do Sul, Austrália, Nova Zelândia, aquela área ganhou de 10 a 0 dos Estados Unidos. Neste ano, veio o Joe Biden, com uma visão a favor de um apoio fiscal, ‘tá’ fazendo um impulso enorme. A Europa, liderada pela Angela Merkel, aprovou um pacote de investimentos para aumentar a produtividade dos menos desenvolvidos, como Polônia, Espanha, Itália. A América Latina está atrasada em relação ao resto do planeta, e o Brasil junto com ela. 

O que o sr. considera relevante aí pela frente, para dizer aos mercados financeiros e para o governo?

Em um livro que estou acabando de ler, Radical Uncertainty, os autores, Mervyn King (ex-BC americano) e John Kay, tratam da incerteza. A pandemia, tipicamente, foi uma incerteza radical. Os empresários aceitam o desafio da incerteza. Mas eles têm de sair da casca e começar a gritar no plano político.

Não estão começando a fazer isso?

Vejo hoje uma retração como nunca vi antes. O sujeito escreve um artigo dizendo “olha, não chacoalha muito, um dia o Bolsonaro vai embora...” O empresariado tem de se posicionar, olhar para o futuro do País. Não só o dele, o da empresa. Acho que é preciso um pouco mais de proatividade no campo político para que a gente construa um País melhor. A superação do desafio não vem sozinha.


*DIRETOR DO DEPTO. DE ECONOMIA DA USP, FOI PRESIDENTE DO BANCO CENTRAL (1983-85) E SECRETÁRIO DA FAZENDA DE SP (1979-83). É SÓCIO-FUNDADOR DA A.C.PASTORE & ASSOCIADOS.