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segunda-feira, 17 de maio de 2010
Alternancia onde não deve ser feita: politica monetaria...
Marcelo de Paiva Abreu*
O Estado de São Paulo, segunda-feira, 17.5.2010
A herança mais importante a ser legada pelo governo Lula é o sucesso de sua política econômica e, em menor medida, de suas políticas sociais. Com todas as qualificações que possam ser feitas, consolidou-se a recuperação da credibilidade do País iniciada no governo anterior e criaram-se condições básicas para o crescimento sustentado. É essencial preservar essa conquista.
É dessa perspectiva que deve ser analisada a tempestuosa entrevista do principal candidato oposicionista à eleição presidencial sobre a política econômica do atual governo e, em especial, a política monetária. O candidato foi extremamente crítico da atuação do Banco Central (BC), insistindo nas oportunidades perdidas para a redução da taxa de juros. Curiosamente, omitiu-se quanto às crescentes peraltices na política fiscal do governo, conduzida, segundo ele, por "homens sérios". Diversas alegações do ex-governador não correspondem aos fatos, como, por exemplo, de que o Brasil aumentou juros quando o resto do mundo os havia reduzido. Em particular, foi ventilada uma revolucionária teoria sobre "efeitos psicológicos" na determinação da taxa de juros: relevantes são as variações, e não os níveis das taxas. A bobagem deve ser levada a sério, pois permite delinear o tipo de interferência sobre o Banco Central que poderia ocorrer no caso de vitória da oposição.
A política monetária no Brasil lida com limitações à redução da taxa de juros que têm que ver com o desempenho fiscal. Se as contas públicas forem efetivamente postas em ordem, haverá espaço para taxas de juros. Não há milagre "psicológico" que remova essa restrição. É claro que sempre haverá a possibilidade de buscar o ajuste por meio de mais permissividade com relação à inflação. Isso implicaria, entretanto, o sucateamento do regime de metas de inflação, hipótese ainda não ventilada pelo candidato, embora seja evidente a sua antipatia visceral por essa forma de condução da política monetária.
A repercussão negativa da entrevista suscitou tentativas de remendo não muito convincentes. Mencionou-se até a "intervenção" dos governos europeus no Banco Central Europeu para equacionar a crise financeira grega e o seu contágio. O argumento parece potente para explicar exatamente o contrário. De fato, a despeito da autonomia do Banco Central Europeu, foi possível, em meio à crise, buscar ação coordenada que defendesse da melhor forma possível a estabilidade financeira europeia. Já o posicionamento oficioso do PSDB envolve substancial esforço em reescrever a história da crise de 2008, trocando datas e detectando quase imaginária deflação, com base no comportamento do Índice Geral de Preços - Mercado (IGP-M). Talvez não seja irrelevante lembrar que o índice de preços que baliza o regime de metas é o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que teve comportamento diferente do IGP-M.
A entrevista foi infeliz não apenas no conteúdo, como na forma. A julgar por suas declarações, os que dele discordam ou são obtusos ou mal-intencionados. Não foi um bom trailer do que poderá ser o processo decisório de um eventual governo Serra. E, pior, relativizou as críticas que são habitualmente feitas ao autoritarismo enfático da candidata da situação. Uma democracia madura requer um sistema de pesos e contrapesos sofisticado para que se evitem abusos e sejam minimizados os erros no exercício do poder. Isso se aplica tanto à diretoria do Banco Central quanto ao presidente da República. Nem os diretores do Banco Central nem os candidatos a presidente da República são infalíveis. O candidato parece reconhecer apenas a falibilidade dos banqueiros centrais.
A crítica de Serra à política monetária abriu espaço para que a candidata da situação se apresentasse, em contraste com sua postura no passado, como defensora do Banco Central. Configura-se uma situação esdrúxula na qual o candidato do PSDB consolida sua postura de crítico da política econômica herdada pelo governo Lula do governo Fernando Henrique Cardoso, enquanto Dilma tece loas à autonomia do BC. Quem tem boa memória se lembrará das reticências, quando não da discordância explícita, de José Serra a diversos aspectos da política econômica desde a implantação do Plano Real - que levou à sua saída do Ministério do Planejamento rumo ao Ministério da Saúde -, que escalaram depois de 1999, no segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso.
O argumento mais poderoso para justificar o voto em candidatos de oposição é a alternância no poder. A coalizão liderada pelo presidente Lula tem aparelhado a máquina pública, com o objetivo claro de dificultar a reversão das políticas que lhe são caras. É difundida a percepção de que esse processo foi muito além do desejável e que deveria ser revertido. A entrevista de Serra dá margem à interpretação de que, caso eleito, a alternância se faria sentir de forma contundente na condução da política monetária. Seria uma lamentável reversão que não consulta os interesses do País. Talvez ainda haja tempo para que o candidato reformule suas ideias.
*Doutor em economia pela Universidade de Cambridge, é professor tutular no Departamento de Economia da PUC-Rio.
Um comentário:
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"Seria uma lamentável reversão que não consulta os interesses do País. Talvez ainda haja tempo para que o candidato reformule suas ideias."
ResponderExcluirDesculpem-me, mas desde que o Serra voltou do Chile que ele tem essa OPINIÃO.
Não me venham com a desculpa de que ele, depois de eleito, mudará sua posição.
Aos que forem votar nele, ja sabe: O SERRA IRÁ RETIRAR A AUTONOMIA DO BC!!!