Editorial da Folha de S.Paulo critica a iniciativa de países avançados no sentido de reforçar a proteção da propriedade intelectual, o que é considerado um gesto arrogante e unilateral.
Deve-se considerar que grande parte do PIB desses países atualmente é formado justamente no terreno dos intangíveis, não na produção manufatureira, e que os mercados de TI, de luxo, de medicamentos, de inovação enfim, vem sendo implacavelmente pirateados, por vezes de forma até oficial, se ouso dizer.
Deve-se também considerar que muitos países em desenvolvimento que pretendem ter acesso a esses produtos sem pagar os seus custos associados estão bloqueando o tratamento do problema nessas organizações multilaterais.
O editorial da FSP quer sugerir que os produtores de tecnologias inovadoras devem apenas assistir passivamente ao roubo de sua produção legítima?
Quando a cenoura dos incentivos não funciona, aparece logo o porrete da disciplina. Talvez no meio do caminho uma solução seja encontrada, e os direitos de PI passem a ser mais respeitados em todos os países. Se depender de alguns, não o será...
Paulo Roberto de Almeida
Acordo pirata
Da Redação
Folha de S. Paulo, 8 de maio de 2010
É de evidente interesse público a defesa da propriedade intelectual, tanto quanto o combate à pirataria.
Sem os mecanismos legais que garantem às empresas a exploração comercial exclusiva de seus produtos, o processo de crescimento econômico de longo prazo seria solapado. Cessariam os incentivos para investimentos privados em pesquisa, responsáveis por grande parte dos confortos que facilitam a vida nas sociedades modernas.
De remédios mais eficientes a computadores com maior capacidade de processamento de dados, o comércio de bens e serviços de ponta ocorre em escala global. Daí que também se articulem em âmbito internacional os interesses dos produtores. Para isso existem instâncias como a OMC e a Organização Mundial da Propriedade Intelectual.
Que no entanto não parecem suficientes ou satisfatórias para um grupo seleto de governos. EUA, União Europeia e outros nove países negociam um acordo antipirataria que exclui o restante do mundo e passa ao largo das instituições multilaterais.
O objetivo do grupo é criar mecanismos mais rígidos de garantia da propriedade intelectual. No esboço do documento, que deve ser concluído até o final do ano, estão previstas medidas drásticas, como o banimento de infratores da internet e a apreensão unilateral de produtos, como remédios genéricos.
É surpreendente a inabilidade diplomática, para não dizer a arrogância, de tal iniciativa. O acordo, ademais, pode ter efeitos contrários aos pretendidos por seus patrocinadores. Ao dividir o mundo entre repressores e países piratas e esvaziar órgãos multilaterais, será mais difícil articular a cooperação internacional necessária para se combater, com eficácia, a pirataria global.
Seria mais proveitoso reforçar as instituições hoje existentes e, em seu âmbito, negociar sanções mais rigorosas contra infratores.
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Materia de jornal:
Acordo de pirataria, liderado por EUA, preocupa governo
Eliane Oliveira e Cássia Almeida
O Globo, 7 de maio de 2010
Para especialistas, discussão fora OMC não vai prosperar
O governo brasileiro vê com preocupação as negociações capitaneadas por Estados Unidos, Japão e União Europeia sobre acordo comercial antipirataria (Acta, sigla em inglês). Segundo o diretor do Departamento Econômico do Itamaraty, Carlos Márcio Cozendey, as regras seriam criadas à margem da Organização Mundial do Comércio (OMC). Especialistas, contudo, acreditam que o acordo não vai prosperar.
— Estamos acompanhando e nos parece que ainda é cedo para uma avaliação. Desde já achamos preocupante um grupo de países criar regras que interessam a todos e, ao mesmo tempo, vão além do que está na OMC — disse Cozendey ao GLOBO.
Numa análise preliminar, o governo teme problemas na distribuição de medicamentos genéricos e a ampliação de fóruns de arbitragem envolvendo propriedade intelectual, já que existe a Organização Mundial de Propriedade Intelectual (Ompi).
O acordo não é visto com bons olhos pela diplomacia brasileira.
Estanislau do Amaral, encarregado da propriedade intelectual na missão brasileira em Genebra, disse que o Brasil não participa dele “nem quer”, por entender que os temas têm de estar em OMC e Ompi: — É um acordo plurilateral o que gera desequilíbrios.
Para Lampreia, China é o alvo do acordo
Para o ex-ministro Rubens Ricupero, a reação dos países em desenvolvimento, ONGs e o próprio Parlamento Europeu vão abortar o acordo. Para Luiz Felipe Lampreia, ex-ministro das Relações Exteriores, o acordo tem alvo certo: a China.
— Os países são muito prejudicados com falsificação.
Em Washington, o Brasil acompanha as negociações.
— Canadá, Japão e outros países interpretam certas iniciativas como tentativa dos EUA de impor padrões da política de defesa intelectual. Isso não será concluído agora, é coisa para anos — avaliou uma fonte do governo.
COLABOROU: Fernando Eichenberg, correspondente
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