sábado, 28 de agosto de 2010

Paixoes desatadas: os blogs como evidencias da estupidez crescente

Um leitor deste blog reclamou, ainda ontem, de minha tendência a considerar a educação no Brasil como perdida pelos próximos anos. Ele acha que eu fiz previsões catastrofistas sem qualquer razão para fazê-lo.
Em resposta, disse a ele que eu não estava fazendo previsões, mas apenas constatando o que já existe de fato na atualidade, basta olhar em volta.
Com efeito, quem conhece a realidade educacional do país, não apenas pelos indicadores, estes sim verdadeiramente catastróficos do PISA (recomendo uma visita ao site da OCDE, para maiores precisões, estarrecedoras), mas também pelo contato direto -- e quem tem filhos em escolas brasileiras, mesmo privadas, sabe o horror que são os professores, com muitas exceções, claro -- com alunos e professores (e eu tenho, pelos meus encargos acadêmicos), sabe que a realidade da educação no Brasil é muito pior do que possamos imaginar, e bota pior nisso.
Mas eu também me dedico -- só pode ser por esporte masoquista -- a ler os comentários de leitores nos blogs e colunas de jornalistas de grandes meios, em quase todos os que permitem publicação de comentários de leitores. Posso garantir que a impressão que se tem é arrasadora.
Sempre li as cartas de leitores nos grandes jornais e revistas -- Estadão, Globo, FSP, Veja, etc. -- pois elas revelam o que vai realmente na alma do povo. Mas essas cartas são rigorosamente selecionadas e as redações eliminam as mais chocantes ou mais mal escritas. Outra forma de saber dessa "opinião popular" é conversar com motoristas de taxi, mas aí o universo é imenso, e eu não ando muito de taxi, salvo em viagens, quando não tenho tempo ou paciência para ficar conversando com motoristas de SP ou Rio.
Mais instrutivos, e muito mais estarrecedores, são, portanto, esses comentários em blogs e colunas de jornalistas, sobretudo os que não são moderados devidamente.
Começa que a linguagem é a pior possível, em muitos casos, com expressões que normalmente seriam substituídas por apitos sonoros nos programas de televisão e por sinais característicos -- #@*+x&! -- nos textos escritos. Os argumentos, então, são os mais alucinantes que se pode encontrar na literatura fantástica, ou de botequim.

Portanto, quero contradizer meu comentarista e dizer o que segue.
Confesso que me assusta a mediocridade galopante e a estupidez crescente. O Brasil vem, sim, caminhando para a decadência mental.
Deixo vocês com este texto que retrata, de forma educada, essa nova realidade.
Paulo Roberto de Almeida

Paixões perigosas
Nelson Motta
O Estado de S.Paulo, 27 de agosto de 2010

Não é só nas novelas que a paixão cega, ensurdece, escurece a mente e embota a inteligência. Ela nos leva a fazer o inconcebível, a aceitar o inaceitável, a esquecer o inesquecível. Como em um transe, uma possessão, ela se incorpora e comanda, atropela a ética, a estética e as evidencias.

Paixão é droga pesada, que provoca êxtase e dependência, é insaciável, e sua falta produz desespero, vazio e dor. Mas sem paixão, dizia Nelson Rodrigues, não se pode nem chupar um Chicabon.

É impossível imaginar grandes conquistas pessoais e coletivas sem paixão, sem entrega. É ela que nos move além do instinto, da razão e de nós mesmos. Fora as carnais, que são hors concours, as paixões mais perigosas parecem ser as políticas, esportivas e religiosas.

É fascinante, e assustador, ver pessoas educadas e delicadas se transformando em bestas boçais cuspindo fogo e soltando coices verbais por um jogo de futebol. Filmados, não se reconheceriam. Reconhecidos, se vexariam. Mas é mais forte do que eles.

Na faculdade, já achava meio ridículos os debates acalorados nas assembleias estudantis, movidos a slogans, palavras de ordem, acusações, bravatas e ameaças. E não raro, força bruta e intimidação. Nobres e pobres paixões juvenis.

Hoje, ler os comentários de leitores nos blogs é chafurdar no que há de mais estúpido na paixão política, e pior, partidária. Pelo seu potencial destruidor, por emburrecer os inteligentes, fortalecer os intolerantes, afastar os diferentes, entorpecer a razão, inviabilizar qualquer convivência.

É a paixão desses militantes sinceros e radicais, de qualquer partido, coitados, que serve de massa de manobra para políticos apaixonados - não pelo País ou a cidade - mas pelo poder, e por eles mesmos.

Como equilibrar a paixão necessária com a razão e a serenidade indispensáveis para viver e crescer em liberdade? Paixões são indomáveis e incontroláveis, delas nascem as piores formas de servidão. Nos resta esperar o lançamento de um Super Paixoneitor Control Tabajara, e não perder a novela Passione, uma aula sobre os estragos que ela provoca.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Comentários são sempre bem-vindos, desde que se refiram ao objeto mesmo da postagem, de preferência identificados. Propagandas ou mensagens agressivas serão sumariamente eliminadas. Outras questões podem ser encaminhadas através de meu site (www.pralmeida.org). Formule seus comentários em linguagem concisa, objetiva, em um Português aceitável para os padrões da língua coloquial.
A confirmação manual dos comentários é necessária, tendo em vista o grande número de junks e spams recebidos.