Quando alguém quer saber qual sua renda, no Brasil, ou na Europa, essa pessoa geralmente pergunta:
"Quanto você GANHA?" (Enfatizo o verbo por ele ter uma conotação importante, como se verá.)
Quando a mesma pergunta é feita nos Estados Unidos, o indivíduo geralmente pergunta:
"How much you MAKE?" (Ou seja, não quanto você ganha, mas quanto você FAZ de dinheiro.)
Essa pequena diferença de verbos, entre o "how much you earn?" e o "how much you make?" faz TODA A DIFERENÇA de mentalidades, e não só de universos mentais, mas de ambiente de negócios, entre um país dinâmico, onde as pessoas fazem dinheiro por sua própria conta e esforço, e outros países, onde as pessoas "ganham" dinheiro de uma fonte qualquer, pode ser assalariado privado, funcionário público, honorários, rendas, whatever...
Nos EUA, se alguém quer ficar rico -- e suponho que muita gente queira -- essa pessoa começa a pensar em maneiras de ganhar dinheiro, mais exatamente, MAKE MONEY, em algum negócio qualquer, que ela vai construir, a partir do fundo da garagem, com dinheiro catado aqui e acolá, e transformar aquilo num empreendimento lucrativo. Daí o sujeito compra sua mansão, o seu iate, casa de campo, etc, com o dinheiro que ELE FEZ, não com favores governamentais ou trapaças empresariais.
Esta é uma história tipicamente americana, e deveria ser a normalidade um pouco em todas as partes do mundo, mas infelizmente não é.
Pois bem, no Brasil, para alguém ficar rico rapidamente, ele tem algumas escolhas, talvez três basicamente: o mercado, os negócios protegidos e o dinheiro público, diretamente.
Pode inventar algo absolutamente genial e ficar riquíssimo em pouco tempo, mas não me lembro de exemplos do gênero nos últimos anos (ou séculos). Com exceção de Santos Dumont -- que dizem que inventou o avião, mas nunca o patenteou, como os irmãos Whright, e não tinha, digamos assim, "tino empresarial", sendo mais um dandy modernoso, com suas manias aéreas -- não me lembro de algum gênio da inventividade nacional; e todos sabem que o Brasil não se distingue particularmente pela inventividade nacional, sendo pífio, medíocre, absolutamente nulo no registro de patentes nacionais de mais alto significado para a indústria e o mercado. Excluímos essa portanto.
Existem, contudo, grandes empresários nacionais. Se formos analisar bem as origens dessas riquezas, veremos que elas não estão exatamente no sucesso empresarial enquanto tal, mas na exploração de um setor qualquer que se beneficiou de prebendas e proteções estatais. Existem, claro, alguns "reis da soja", "reis do gado", que fizeram fortuna graças a seu trabalho, mas em algum momento eles vão buscar dinheiro público para aumentar seus negócios e monopolizarem um setor qualquer, esses setores.
Quanto aos "reis do cimento", "reis do aço", dos supermercados, disso ou daquilo, podem constatar, eles se fizeram graças à proteção, aos monopólios e cartéis, à colusão com os poderes públicos e ao dinheiro estatal (ou seja, nosso). Gostaria de conhecer empresários brasileiros ao estilo americano, mas vejo poucos, muito poucos. As grandes construtoras, os grandes bancos o são devido ao fechamento do mercado brasileiro aos concorrentes estrangeiros, e certa promiscuidade com os governantes de plantão.
A terceira forma é essa descrita abaixo, muito comum, absolutamente corriqueira no Brasil: você rouba dinheiro público, diretamente, simplesmente, facilmente. Nem vou me estender sobre as modalidades, pois elas estão sendo descritas diariamente nos jornais.
Passem bem (ou mal, em vista desse tipo de notícia) o resto do fim de semana.
Paulo Roberto de Almeida
“Ah, é pro governo, joga o valor pra três, tudo vezes três”
Folha de S.Paulo, 13/08/2011
Conversas telefônicas interceptadas na Operação Voucher da Polícia Federal mostram investigados falando sobre como superfaturar e até falsificar documentos em licitações com o governo. Nas conversas, os suspeitos de integrar o esquema chegam a afirmar que “quando o dinheiro é público não pesa no bolso” e apontam Brasília como um paraíso para obtenção de facilidades: “Mandou para Brasília, ficou fácil”, diz uma investigada. Na terça, a PF prendeu 36 suspeitos de desviar recursos do Ministério do Turismo em convênios com ONGs -entre servidores e empresários que faziam negócios com a pasta. Em conversa gravada com autorização judicial, em 21 de junho de 2011, o empresário Humberto Silva Gomes diz que no Brasil “o governo paga e quer que você apenas gaste direitinho, ele não quer um retorno”. Ele é sócio da Barbalho Reis, uma das empresas suspeitas de integrar o esquema, e está foragido.
“Quando é dinheiro público, não pesa no seu bolso. Aí você joga pro alto mesmo, até porque se você não jogar você vai perder logo de cara, porque todo mundo vai jogar. Criou essa ideia aqui: “Ah, é pro governo, joga o valor pra três, tudo vezes três’”, diz Humberto: “Superfaturamento sempre existe”. Em outro diálogo, de 26 de maio, Sandro Saad, diretor financeiro da ONG Ibrasi, conversa com um empresário sobre um edital da Prefeitura de São Vicente (SP) que nem sequer tinha sido lançado. No áudio, Sandro pergunta se eles vão “falsificar os outros [concorrentes] ou tentar compor o jogo” e diz que “o pessoal lá de dentro” quer que ele pegue a licitação. Em outra escuta, os diretores do Ibrasi, Maria Helena Necchi e Luiz Gustavo Machado, falam sobre como vão adulterar papéis do convênio no Amapá para simular comprovação de despesas que não teriam sido realizadas.
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