“Onze de Setembro, dez anos: recepção no mundo, reações no Brasil”, Revista Espaço Acadêmico, dossiê especial Onze de Setembro (ano 11, n. 124, setembro de 2011, p. 21-26; ISSN: 1519-6186, link: http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/14042/7731). Relação de Originais n. 2290
mas é original em sua maior parte, senão em sua quase totalidade.
Paulo Roberto de Almeida
O
Onze de Setembro visto do Brasil
Paulo Roberto de Almeida
Diplomata, professor universitário.
Blog do Paulo Roberto de Almeida (http://www.observadorpolitico.org.br/blogs/pralmeida/) no Observador Político (10/09/2011; link: http://www.observadorpolitico.org.br/2011/09/o-onze-de-setembro-visto-do-brasil/).
Blog do Paulo Roberto de Almeida (http://www.observadorpolitico.org.br/blogs/pralmeida/) no Observador Político (10/09/2011; link: http://www.observadorpolitico.org.br/2011/09/o-onze-de-setembro-visto-do-brasil/).
Três, basicamente, foram as
atitudes dos brasileiros – cidadãos, personagens políticos e governantes – em
relação aos ataques do Onze de Setembro. Todos, é claro, tomados de surpresa,
ficaram chocados com a violência das imagens dos aviões, das explosões em New
York e Washington e da derrubada das torres gêmeas de Manhattan.
Passada a surpresa inicial,
começaram as reações públicas. Os cidadãos comuns expressaram de diversas
maneiras seu horror em face de um dos mais espetaculares ataques terroristas de
todos os tempos. Quantidade apreciável de brasileiros de classe média conheciam
New York e muitos visitaram as torres gêmeas, marco visual e arquitetônico do sul
de Manhattan: a solidariedade foi imediata, mas a estupefação dominou os
sentimentos durante vários dias.
O presidente Fernando Henrique
Cardoso falou imediatamente em “guerra”, curiosamente o conceito que seria
retomado – equivocadamente, do ponto de vista político, tático, ou até
estratégico – pelo presidente George Bush, em sua “guerra ao terror”. Seu
chanceler, Celso Lafer, retomou, de seu lado, uma instituição da Guerra Fria, o
Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (1947), para invocar, na OEA, o
princípio da solidariedade hemisférica, oportunamente lembrado desse vetusto
instrumento pelo presidente Vicente Fox, do México, que em visita a Washington,
uma semana antes, havia pedido, simplesmente, a eliminação formal de um ato
internacional que parecia desadaptado aos novos tempos de globalização e de fim
do socialismo.
Os atores políticos reagiram
cada qual à sua maneira, mas cabe o registro de declarações moralmente abjetas
de certos militantes de esquerda que responsabilizaram os próprios Estados
Unidos, e sua “política imperialista”, pelos ataques terroristas. O mais
conhecido desses personagens, Aloísio Mercadante, então deputado do PT e secretário de relações
internacionais do partido, depois senador, hoje ministro, desdenhou o número de vítimas, afirmando expressamente que não
se deveria “exagerar na dimensão do episódio. Qualquer terremoto ou furacão na
Flórida faz mais vítimas e provoca estragos muito maiores” (Jornal da Tarde,
18/09/2001). Trata-se de um tipo de afirmação – no mínimo insensível e, no
limite, eticamente inaceitável – que revela um desprezo dificilmente admissível
em face da perda de vidas humanas, quando elas resultam de algum tipo de
“enfrentamento político” que possa colocar num dos lados da balança o alegado
“opressor imperialista”.
Passado o choque
dos eventos a quente, e iniciada a “guerra ao terror” do presidente Bush, o
governo brasileiro atuou cautelosamente, num primeiro momento, apoiando,
obviamente, a
resolução do Conselho de Segurança da ONU que determinou a responsabilidade do
regime talibã do Afeganistão pelo abrigo dado à rede terrorista Al Qaeda.
Depois, nas “reações a frio” do governo que sucedeu à
administração FHC, a atitude foi bem menos cooperativa. O governo Lula não
apenas se empenhou ativamente, no plano diplomático, em obstar as iniciativas
de Bush no sentido de vincular a administração iraquiana de Saddam Hussein ao
fenômeno terrorista – o que poderia ser considerado como razoável, uma vez que
nunca se provou a existência das famosas “armas de destruição em massa” ou os
alegados vínculos – como também demonstrou pouca vontade de cooperar, no plano
operacional, com a administração americana na ofensiva contra grupos terroristas
eventualmente presentes na região.
Essa atitude do
governo Lula pode estar fundamentada nos laços de cooperação que o PT, enquanto
um dos partidos promotores do Foro de São Paulo, junto com o Partido Comunista
Cubano, sempre manteve com as FARC, identificadas como grupo terrorista tanto
pelo governo colombiano quanto pelo americano. Ao contrário, o assessor
presidencial em temas internacionais, Marco Aurélio Garcia, um homem de
confiança dos cubanos e um dos fundadores do Foro de São Paulo, ofereceu-se
junto ao governo colombiano para servir de “intermediário no conflito” entre o
governo de Álvaro Uribe e aquele grupo guerrilheiro, na verdade
narcoterrorista, colombiano, no que foi imediatamente repudiado por nota
diplomática daquele governo. Depois de dois anos, as FARC foram discretamente
aconselhadas a não mais participar publicamente das reuniões do Foro de São
Paulo, o que não quer dizer que elas tenham deixado de assistir informalmente a
esses encontros da esquerda latino-americana anti-imperialista.
Mas o Brasil do
governo Lula nunca associou-se formalmente aos esforços de definição de
movimentos terroristas, como também sempre repudiou, pelo menos abertamente, as
alegações dos EUA sobre a eventual ação de grupos terroristas na tríplice fronteira
de Foz de Iguaçu (o que não impediu a existência de contatos informais entre os
órgãos de segurança dos dois países a esse respeito). Na verdade, o governo
brasileiro manteve, nas instâncias diplomáticas internacionais, uma atitude
defensiva a respeito da caracterização de grupos ou ações terroristas,
preferindo insistir nas causas supostamente “sociais” do fenômeno terrorista –
injustiça, pobreza, dominação ocidental – e na necessidade de iniciativas
“reparadoras” dessas situações por meio do diálogo e da cooperação, não por
meio de ações militares ou taticamente ofensivas. De forma geral, esse tipo de
atitude se mantém até hoje.
Brasília, 9/09/2011
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