Há muito tempo que a Argentina sabota deliberada e conscientemente o Mercosul, para seus fins exclusivos (no que contou, aliás, com a plena colaboração do governo Lula, notoriamente vocacionado a fazer favores ao vizinho, em total desrespeito e em detrimento dos interesses dos exportadores brasileiros).
Um vice-ministro do governo Lula, notório pelo seu antiamericanismo primário, combatia um fantasmagórico imperialismo comercial americano e ao mesmo tempo colaborava com o protecionismo comercial do vizinho platino.
Não se pode dizer que não tenha sido agraciado com os fatos: a Argentina usou e abusou da complacência irracional e ilegítima do governo brasileiro para extrapolar e se exceder nos atos ilegais, abusivos e arbitrários contra o Brasil e contra o Mercosul.
Não pode haver surpresa no que está ocorrendo hoje.
Agora, demonstrações de "machismo comercial", como essas retaliações contra exportações argentinas, numa guerra de nervos totalmente arbitrária, não vão ajudar em nada no processo.
Só demonstra adesão do Brasil aos mesmos métodos equivocados dos argentinos.
Que talvez levar um caso ao sistema de solução de controvérsias da OMC?
Paulo Roberto de Almeida
AMÉRICA DO SUL
Argentina e Brasil: os caminhos que se bifurcam
Sergio Leo
Valor Econômico, 16/01/2012
Com a entrada dos dólares de turistas, o rescaldo das festas de fim de ano e a venda de estoques agrícolas, a economia na Argentina passou por breve calmaria (se é que pode haver calmaria na Argentina), em antecipação ao mau tempo que os especialistas preveem engrossar no segundo semestre. A quebra de safra com a seca, as pressões inflacionárias, o descontentamento popular e a fuga de dólares devem ser o signo deste 2012 no país vizinho. E a Argentina já sabe o que espera do Brasil nesse momento; o Brasil é que parece não saber o que fazer com a Argentina.
Na sexta-feira 13, o Diário Oficial trouxe um novo mau augúrio aos brasileiros, logo interpretado por especialistas, como a consultoria Abeceb.com, como a oficialização do controle sobre as importações pelo polêmico secretário de Comércio Interior, Guillermo Moreno.
Uma resolução publicada nesse dia incluiu Moreno - autor de ameaças telefônicas e pessoais a empresários que contrariam as vontades do governo - entre os burocratas que devem opinar sobre as informações antecipadas agora exigidas dos importadores para operações de comércio.
Moreno terá 15 dias de prazo para se pronunciar sobre as declarações de importação obrigatoriamente entregues pelos empresários ao governo. Discorrendo sobre a "importância qualitativa e/ou quantitativa das importações", a nova resolução prevê uma avaliação "para impedir que o mercado interno se veja afetado negativamente".
Somada ao controle de câmbio, às ameaças veladas e explícitas e aos atrasos na emissão de licenças de importação, em alguns casos superiores aos 60 dias máximos permitidos pela Organização Mundial do Comércio (OMC), a decisão argentina aumenta a insegurança nos negócios e o custo para produtores e consumidores argentinos. É incerto também o futuro macroeconômico do país, e as recentes medidas serviram para aumentar os temores - sem fundamento, pelo menos por enquanto - de crise cambial.
Carente de fontes de financiamento desde a moratória de 2001, e em briga com o Fundo Monetário Internacional (FMI), com quem ensaia uma incerta reaproximação, a Argentina tem usado suas fartas reservas de US$ 42 bilhões para assegurar compromissos externos. A tarefa será mais difícil neste ano, com a possibilidade de que o país veja transformar-se em déficit seu tradicional superávit em contas correntes - em atividades como comércio e turismo.
A quebra nas safras de soja e milho, com a seca, segundo calcula Dante Sica, da Abeceb.com, deve podar as receitas de exportação em US$ 1,8 bilhão, quase 6% da receita com esses produtos na safra anterior. A seca também afeta o fornecimento hidrelétrico, o que obriga o país a importar energia, aumentando o peso desse item na balança comercial. Obrigada, por questões fiscais, a retirar subsídios aos serviços públicos, o que aumentou tarifas e assanhou os sindicatos, a presidente Cristina Kirchner terá um duro início de mandato, num cenário nada animador para investidores.
O governo vizinho poderia apostar no longo prazo, estabelecendo políticas capazes de estimular a poupança, encorajar investimentos e criar empregos. É o que acredita estar fazendo, com uma sucessão de medidas arbitrárias e repentinas, que dificultam a compra de moeda e mercadorias estrangeiras. O objetivo é forçar empresas a se instalar no país, como a Argentina fez com a brasileira Baterias Moura, que teve de montar lá uma fábrica para abastecer clientes argentinos.
Na Casa Rosada, espera-se que os controles e barreiras contra importações sejam recebidos com tolerância pelo Brasil. Afinal, o principal sócio da Argentina no continente tem crescentes superávits no comércio bilateral (US$ 5,8 bilhões em 2011) e uma pauta de qualidade: 90% do que é exportado pelo Brasil à Argentina é de manufaturados, principalmente do setor automotivo (93%, se somados produtos semimanufaturados).
A qualidade das exportações brasileiras ao vizinho deve cair, se for bem sucedida a estratégia da Argentina - que, paradoxalmente, ao aumentar seus custos de produção terá de contar cada vez mais com o Brasil para vender seus bens industrializados, confiando na vantagem proporcionada pelo acordo de livre comércio do Mercosul. O setor automotivo será essencial, já que veículos, partes e peças somam quase 45% do que a Argentina vende ao Brasil e cerca de 40% do que o Brasil vende à Argentina. Como o Brasil não pretende assistir imóvel à transferência de fábricas ao país vizinho, deve haver bastante ruído nessa estrada em 2012.
Duvidosa e contraditória, essa é a política planejada pela Argentina. No Brasil, fala-se em reagir buscando "complementação de cadeias produtivas" - e, mais reservadamente, em aprofundar a política do olho por olho, dente por dente, dificultando a entrada de mercadorias argentinas para forçar alguma flexibilidade do outro lado. Essa complementação, sonhada e nunca alcançada, é tarefa difícil entre dois países com políticas macroeconômicas que tendem a se distanciar. E a lei de Talião, se aplicada ao comércio bilateral, pode acabar deixando o Mercosul caolho e desdentado.
Sergio Leo é repórter especial e escreve às segundas-feiras.
O Brasil se rebaixando ao nível das medidas que vêm sendo adotadas pela Argentina por meio da Lei do Talião, mostra que, na verdade, é líder apenas na irracional tributação de sua população.
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