segunda-feira, 2 de julho de 2012

China-India: amigos-inimigos - The Economist

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Relações comerciais entre China e Índia ainda precisam de uma boa dose de equilíbrio (Peter Schrank)
ÁSIA



A conturbada relação entre chineses e indianos

Forte parceria comercial entre China e Índia ainda é prejudicada por antigos rancores

fonte | A A A
As relações entre a Índia e a China são frágeis em muitos aspectos. Ricos laços culturais existiram há muito tempo, desde o estudo dos eclipses até os cânticos budistas, mas quase ninguém se lembra disso hoje, lamenta Amartya Sen, um economista ganhador do Prêmio Nobel. Depois de um momento de amor durante a década de 1950, a China derrotou a Índia em uma guerra fronteiriça em 1962, e os dois continuaram a rosnar sobre sua fronteira de alta altitude desde então. Indianos invejam a ascensão econômica da China, mas consolam-se, salientando que o país não é uma democracia. Além de demonstrações rígidas de fraternidade em encontros internacionais, mais recentemente na cúpula do G20 no México, a China parece não perder muito tempo pensando na Índia. Os fluxos de investimento são desprezíveis. Ainda não há voos diretos entre cidade como Pequim ou Xangai e Mumbai, o centro comercial da Índia.
E ainda assim, uma grande mudança ocorreu na configuração do comércio indiano. Quando a Índia começou a liberalizar sua economia em 1991, o Ocidente ainda dominava a economia mundial, e foi para o Ocidente que a Índia virou suas aspirações comerciais. A ascensão da China mudou tudo para a Índia. A China é agora o seu terceiro maior parceiro comercial de bens, e o maior, se você incluir Hong Kong. Para os vizinhos da China no leste asiático, um comércio dominante com a China é um presente, mas os indianos ainda estão tentando digerir a ideia.
O aumento do comércio com a China tem sido bom para a Índia. Ela importa principalmente bens de capital chineses, com as empresas que se beneficiam de equipamento barato e decente. A gigante Reliance Group comprou equipamentos para centrais elétricas e redes de telecomunicações – em parte pagos com empréstimos chineses competitivos. As empresas chinesas, muitas vezes se esforçam para ganhar tais negócios. Song Pan, da Shanghai Electric, que produz equipamentos de energia para a Reliance, entre outros, relembra anos de trabalho árduo na Índia.
Mas a China é responsável por um quinto do déficit comercial da Índia com o mundo, mais da metade se o petróleo for excluído. Com a problemática balança de pagamentos da Índia, a rúpia caiu em 20% nos últimos anos, e até mesmo empresários chineses temem que a discrepância no comércio bilateral seja pouco saudável.
E ela pode aumentar. Para começar, a pequena produção industrial da Índia tende a ser bastante sofisticada. Com as empresas chinesas mudando para formas mais complexas de produção, elas tornarão a vida mais difícil para as empresas indianas. Saif Qureishi de Kryfs, que fabrica os núcleos de metal de transformadores utilizados em redes de energia, diz que a China ganhou um terço do mercado de transformadores da Índia e está dando “uma surra” nos locais.
Enquanto isso, a Índia não produz muito que a China queira comprar, um buraco que governantes coloniais britânicos conseguiram preencher com as exportações de ópio indiano. Hoje, as principais exportações da Índia para a China são matérias-primas, principalmente minerais e algodão. Mas o seu sucesso contínuo não é um acidente. Nos últimos dois anos, os rios que fluem para Goa na costa oeste da Índia já fervilhavam com barcaças que transportavam minério de ferro com destino à China. No entanto, uma ofensiva no final de 2011 sobre a mineração ilegal diminuiu esses números em um quinto, diz Atul Jadhav, da Associação dos Proprietários de Embarcações de Goa. Em março, a Índia proibiu brevemente as exportações de algodão devido a temores de escassez.
A Índia é realmente propensa a impulsos protecionistas. Nenhum acordo de livre comércio bilateral existe, e a Índia, muitas vezes flerta com a ideia de impostos sobre as importações chinesas, mais recentemente, de equipamentos de energia. As vendas indianas da Huawei, uma empresa de telecomunicações, caíram pela metade depois que ela foi atingida com taxas anti-dumping e rotulada como um risco à segurança. As empresas chinesas reclamam de problemas com vistos.
Indianos querem aumentar suas exportações para a China. No encontro do G20, o país fechou um acordo para vender mais arroz. A Índia também gostaria que empresas líderes em setores que incluem drogas, automóveis e Tecnologia de Informação tivessem melhor acesso à China. A maioria já tem uma presença, mesmo que apenas para os contratos. No entanto, o que é bom para as multinacionais indianas pode não gerar empregos ou divisas para a Índia. A Tata Sons, com a maior operação na China, vende principalmente carros Range Rover, fabricados na Inglaterra, e serviços de TI, em grande parte contratando equipes chinesas.
Logo, o déficit da balança comercial parece ter vindo para ficar. Mas a China poderia fazer mais para ajudar a financiá-lo, se tivesse a chance. Mais empréstimos dos bancos chineses seriam bons – até agora a Índia tem sido cautelosa, com apenas um banco chinês autorizado a ter uma filial no país. Mais investimento estrangeiro direto também ajudaria. Em 2011, Narendra Modi, o ministro-chefe do Estado de Gujarat, visitou a China para angariar investimento. Mais frequentemente, a Índia parece considerar o investimento direto estrangeiro como um presente que vem apenas de multinacionais ocidentais.
Não precisa ser assim. Numa porção empoeirada do estado de Maharashtra está uma das primeiras fábricas chinesas na Índia, dirigida pela Sany, que fabrica escavadeiras e máquinas de construção. Richard Deng, seu chefe, diz que já investiu US$ 70 milhões e emprega 460 moradores; se tudo correr bem ele pretende dobrar de tamanho em pouco tempo. T.C.A. Ranganathan, presidente do Exim Bank of India, afirma que dez empresas chinesas têm ou estão construindo usinas na Índia, e 100 empresas têm escritórios no país.
Apesar dos habituais temores que estrangeiros têm sobre a Índia (burocracia e diferenças culturais), os executivos chineses concordam que a produção mais local irá acontecer. Dom Haiyan, da Trina Solar, uma empresa de equipamentos de energia solar, diz que, como uma empresa global, deve ter fabricação local. Wu Rong, da ZTE, uma empresa de telecomunicações, diz que emprega principalmente os habitantes e está produzindo mais na Índia. A Huawei, apesar de seus problemas na Índia, está construindo um campus de pesquisa novo, em Bangalore. Niu Qingbao, cônsul da China em Mumbai, diz que as empresas chinesas estão interessadas em investir em infraestrutura, ainda que permaneçam um pouco assustadas.
Isso pode ser o início de uma onda de investimentos chineses? A Índia precisa de capital externo e experiência na fabricação e na infraestrutura. A China deve investir seus fundos de excedentes no exterior, de preferência não apenas em títulos do governo, como acontece principalmente nos Estados Unidos e, de preferência, em países que não estejam prestes a quebrar, como pode acontecer na Europa. O investimento chinês na Índia é uma ideia cujo momento chegou, se apenas os dois lados puderem superar um legado de desconfiança.

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